O pagamento que ficou a cargo do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores, pelo facto de o pai do menor não cumprir a obrigação alimentar a que estava vinculado e a mãe não ter capacidade económica, cessa com a maioridade, não podendo responsabilizar-se o Fundo pelas prestações que ultrapassem esse nível etário nos termos previstos no artigo 1880 do Código Civil.
Acordam em conferência na Secção Cível da Relação do Porto: Pelo Tribunal de Família e Menores de..... correu processo de regulação do exercício do poder paternal relativamente aos menores Emanuela..... e Abílio Filipe...... Os respectivos progenitores, Libania..... e José....., chegaram a acordo quanto a esse exercício, acordo que foi judicialmente homologado. O pai dos menores ficou vinculado a pagar a cada um deles a quantia mensal de 15.000$00 a título de alimentos, a actualizar. Considerando que o pai dos menores não cumpriu esta obrigação e dado que a mãe não apresentava capacidade económica, o Ministério Público requereu, ao abrigo do disposto no artº 3º, nº 1 da Lei nº 75/98 e dos artºs 3º e 4º do DL nº 164/99, que se impusesse ao Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores a obrigação de suportar os alimentos aos menores. Este pedido veio a ser deferido, tendo o Mmº juiz fixado em 15.750$00 para cada um dos menores a quantia a pagar pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS), a actualizar. Porém, mais decidiu que a obrigação de pagar os alimentos se mantinha para lá da menoridade dos alimentandos, se verificados os requisitos do artº 1880º do Código Civil. Contra o decidido relativamente a este último particular interpôs o IGFSS o presente recurso. Da respectiva alegação extrai as seguintes conclusões: 1. A Lei nº 75/98 e o DL nº 164/99 que a veio regulamentar, constituem lei especial, que prefere ao artº 1880º do CC, que constitui lei geral. 2. Esta disposição da lei civil não pode aplicar-se às situações de pagamento a cargo do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, quando os destinatários daquele Fundo atingem a maioridade. 3. Tal aplicação contrariava frontalmente o espírito e a letra da Lei nº 75/98 e do DL nº 164/99. 4. Os citados diplomas referem sempre de forma expressa a sua aplicação a menores - v. artºs 1º e 2º da Lei nº 75/98 e artºs 1º e 2º do DL nº 164/99. 5. Assim sendo, o pagamento das prestações é feito às pessoas a cuja guarda aqueles se encontram. 6. Aliás, o preâmbulo do DL nº 164/99 menciona a sua aplicação às crianças e jovens até aos 18 anos de idade, nos termos de recomendações do Conselho da Europa no sentido da protecção social àquele extracto populacional, mais desprotegido e carente. ** O Ministério Público respondeu ao recurso, concluindo pela respectiva procedência. O Mmº juiz sustentou a sua decisão. ** Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir. O que está em discussão neste recurso é tão somente a questão de saber se a decisão recorrida se apresenta juridicamente correcta quando impõe ao recorrente a obrigação de suportar os alimentos dos menores para além da menoridade, posto que se verifique o pressuposto do artº 1880º do CC. O recorrente sustenta que assim não devia ter acontecido. A nosso ver o recorrente tem razão. Tanto da Lei nº 75/98, como do DL nº 164/99 decorre claro que o fim visado pelo legislador foi o de acudir aos alimentos de que fossem credores menores e não também a pessoas maiores credoras de alimentos nos termos do artº 1880º do CC. O elemento literal não deixa margens para dúvidas. A Lei nº 75/98 epigrafa-se ela própria de "Garantia dos alimentos devidos a menores". No seu artº 1º fala de alimentos a menor. No artº 2º fala em necessidades específicas do menor. No artº 3º fala em necessidades do menor e no artº 6º fala em "Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores". O DL nº 164/99 refere-se sempre a menores, como se pode ver dos respectivos artºs 2º, 3º, 9º e 10º. O preâmbulo deste diploma mostra à evidência, até mesmo pelas referências ao artº 69º da CRP e à Convenção dos Direitos da Criança, que só se teve em mente a protecção dos menores. As menções que se fazem no nº 4 do artº 3º da Lei nº 75/98 e no nº 1 do artº 9º do DL nº 164/99 de que a concessão dos alimentos é exigível até que cesse a obrigação a que o devedor está vinculado, só pode ser interpretada no sentido de que a concessão é devida (exigível) até à maioridade do alimentando, visto que com a maioridade cessa a obrigação de alimentos fixada ao abrigo do DL nº 314/78 (da redacção do artº 1º da Lei nº 75/98 resulta que os alimentos de que se trata são os decorrentes de obrigação judicialmente imposta, e esta imposição só pode fazer-se nos termos daquele diploma). Mas para o Mmº juiz a quo haverá que ir mais longe. Desde que a obrigação de alimentos pode existir para além da menoridade, nos termos do artº 1880º do CC, então também a garantia de alimentos se deverá manter. Discordamos. Desde logo não vemos em que é que a circunstância, aludida pelo Mmº juiz, do Estado ficar sub-rogado pelas quantias prestadas aos menores releva para o caso. O Estado fica sub-rogado pelo que prestar em substituição do devedor dos alimentos, mas o que importa saber é até que ponto (até que momento) está (pode estar) obrigado a substitui-se ao devedor. E não vemos também que o artº 1412º do CPC, aludido igualmente pelo Mmº juiz, ajude muito à questão. O que esse normativo estabelece é que quando surja a necessidade de se providenciar sobre alimentos a filhos maiores ou emancipados, nos termos do artº 1880º do Código Civil, seguir-se-á, com as necessárias adaptações, o regime previsto para os menores. Tendo havido decisão sobre alimentos a menores, a maioridade ou emancipação do filho não impedem que a alteração ou a cessação corram por apenso (nº 2 do citado artº 1412º). Com esta última regra, manifestamente infeliz na sua redacção, quis a lei dizer que quando se queira fazer alterar ou fazer cessar os alimentos que tenham sido fixados pelo tribunal a favor de um menor, que entretanto se tornou maior ou emancipado mas que os continuou a receber por se reconhecer que a eles tinha direito, o processo respectivo (a que a lei chama, mas sem grande cabimento, incidente), corre por apenso àquele onde os alimentos haviam sido fixados. A desajeitada letra do citado nº 2 do artº 1412º dá alguma base á interpretação [Que transparece, vg, do Ac da RE, de 30.1.97, BMJ 463, pág 662), de cujo sumário se lê: "I. O artº 1880º do Código Civil permite e aconselha o entendimento de que verificado o condicionalismo ali referido ou seja «se o filho não houver completado a sua formação profissional», a obrigação alimentar existente se mantém, enquanto se não fizer cessar. (...)". No mesmo sentido, se pronuncia Remédio Marques, Algumas Notas Sobre Alimentos (Devidos a Menores), pág 258 e 334.], que se reputa de errada, de que a maioridade ou emancipação não fazem cessar imediata e automaticamente a obrigação de alimentos ao filho. Ora, à parte a circunstância de não ser decisiva a letra desta norma de natureza processual (sendo que o que está em questão é matéria de direito substantivo), temos por certo que, regulado o exercício do poder paternal onde foram fixados alimentos ao menor, a maioridade (ou a emancipação), faz cessar a obrigação de alimentos, justamente porque o regime de regulação do exercício do poder paternal, caduca com a maioridade [Sem prejuízo porém para o que se estabelece no artº 131º do CC: estando pendente contra o menor, ao atingir a maioridade, acção de interdição ou inabilitação, manter-se-á o poder paternal até ao trânsito em julgado da respectiva sentença. Se a interdição ou inabilitação forem decretadas, pode acontecer que a obrigação de alimentos não se suspende apesar da maioridade.], mesmo que o filho se encontre na situação do artº 1880º do CC. Por outras palavras, os alimentos fixados em atenção á menoridade do filho, que são decorrência estrita da obrigação legalmente imposta a quem detém (ainda que o não exerça) o poder paternal, ou seja, os progenitores (v. artºs 1877º e 1878º n º 1 do CC), só se mantêm enquanto existe poder paternal. Extinto este, caduca automaticamente a obrigação do progenitor alimentante, sem necessidade, pois, de qualquer pedido de cessação judicial dos alimentos. O artº 1880º do CC não estabelece que os alimentos que foram fixados no decurso da menoridade se mantêm, mas sim que a obrigação de prestar alimentos ao filho se mantém, o que está longe de ser a mesma coisa. O filho continua a ter direito a alimentos e não propriamente aos que foram fixados tendo por causa de pedir a circunstância de ser menor. Esta questão tem um evidente interesse prático, designadamente a nível do impulso processual e do ónus da prova, isto em caso de litígio quanto à obrigação de alimentos. Como assim, contrariamente ao que sucede aquando da menoridade (em que a obrigação de alimentos é inerente e co-natural ao poder paternal que aos progenitores pertence), atingida a maioridade não é o progenitor alimentante que tem de provar que o filho não se encontra carecido de alimentos (por não se encontrar na situação do artº 1880º do CC), mas é sim o filho que tem de provar que se encontra carecido (por se encontrar nessa situação). Por isso, consideramos criteriosa aquela jurisprudência (de que é paradigma o Ac da RL de 15.7.82, BMJ 325, pág 595) que sustenta que o direito a alimentos advindo da condição jurídica de menor se extingue com o advento da maioridade, sendo que o maior só manterá o direito a alimentos se se verificar o condicionalismo previsto no artº 1880º do CC, mas para tanto (e à falta de acordo extra-judicial nesse sentido) terá de convencer judicialmente o obrigado de que o direito a alimentos existe. No caso vertente a obrigação de alimentos que acaba por recair sobre o recorrente emerge das obrigações decorrentes do poder paternal que os progenitores dos menores detêm (conquanto apenas a mãe o exerça, conforme o acordo que foi judicialmente homologado), tendo a obrigação incumprida resultado da regulação do exercício do poder paternal dos menores. Com a maioridade dos alimentandos o poder paternal cessa e com ele a obrigação de alimentos fixada à sombra desse poder-dever. E se cessa a obrigação de alimentos, óbvio é que, da mesma maneira que cessam os alimentos fixados em atenção à menoridade dos menores, a responsabilidade do ora recorrente nunca pode subsistir, pois que esta só existe enquanto houver lugar à prestação dos alimentos por parte dos progenitores nos termos estabelecidos na acção de regulação do exercício do poder paternal. Como assim, sem prejuízo dos menores, atingida a maioridade, terem o direito a reclamar dos respectivos progenitores alimentos ao abrigo do artº 1880º do CC, não tem o recorrente que por eles se responsabilizar. Procede pois o recurso. ** Decisão: Pelo exposto acorda-se em conceder provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida na parte em que determina que se mantém a obrigação do recorrente para lá da menoridade se verificados os requisitos do artº 1880º do CC. Sem custas de recurso. ** Porto, 20 de Novembro de 2001 José Inácio Manso Raínho Eurico Augusto Ferreira de Seabra Armando Fernandes Soares de Almeida
Acordam em conferência na Secção Cível da Relação do Porto: Pelo Tribunal de Família e Menores de..... correu processo de regulação do exercício do poder paternal relativamente aos menores Emanuela..... e Abílio Filipe...... Os respectivos progenitores, Libania..... e José....., chegaram a acordo quanto a esse exercício, acordo que foi judicialmente homologado. O pai dos menores ficou vinculado a pagar a cada um deles a quantia mensal de 15.000$00 a título de alimentos, a actualizar. Considerando que o pai dos menores não cumpriu esta obrigação e dado que a mãe não apresentava capacidade económica, o Ministério Público requereu, ao abrigo do disposto no artº 3º, nº 1 da Lei nº 75/98 e dos artºs 3º e 4º do DL nº 164/99, que se impusesse ao Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores a obrigação de suportar os alimentos aos menores. Este pedido veio a ser deferido, tendo o Mmº juiz fixado em 15.750$00 para cada um dos menores a quantia a pagar pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS), a actualizar. Porém, mais decidiu que a obrigação de pagar os alimentos se mantinha para lá da menoridade dos alimentandos, se verificados os requisitos do artº 1880º do Código Civil. Contra o decidido relativamente a este último particular interpôs o IGFSS o presente recurso. Da respectiva alegação extrai as seguintes conclusões: 1. A Lei nº 75/98 e o DL nº 164/99 que a veio regulamentar, constituem lei especial, que prefere ao artº 1880º do CC, que constitui lei geral. 2. Esta disposição da lei civil não pode aplicar-se às situações de pagamento a cargo do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, quando os destinatários daquele Fundo atingem a maioridade. 3. Tal aplicação contrariava frontalmente o espírito e a letra da Lei nº 75/98 e do DL nº 164/99. 4. Os citados diplomas referem sempre de forma expressa a sua aplicação a menores - v. artºs 1º e 2º da Lei nº 75/98 e artºs 1º e 2º do DL nº 164/99. 5. Assim sendo, o pagamento das prestações é feito às pessoas a cuja guarda aqueles se encontram. 6. Aliás, o preâmbulo do DL nº 164/99 menciona a sua aplicação às crianças e jovens até aos 18 anos de idade, nos termos de recomendações do Conselho da Europa no sentido da protecção social àquele extracto populacional, mais desprotegido e carente. ** O Ministério Público respondeu ao recurso, concluindo pela respectiva procedência. O Mmº juiz sustentou a sua decisão. ** Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir. O que está em discussão neste recurso é tão somente a questão de saber se a decisão recorrida se apresenta juridicamente correcta quando impõe ao recorrente a obrigação de suportar os alimentos dos menores para além da menoridade, posto que se verifique o pressuposto do artº 1880º do CC. O recorrente sustenta que assim não devia ter acontecido. A nosso ver o recorrente tem razão. Tanto da Lei nº 75/98, como do DL nº 164/99 decorre claro que o fim visado pelo legislador foi o de acudir aos alimentos de que fossem credores menores e não também a pessoas maiores credoras de alimentos nos termos do artº 1880º do CC. O elemento literal não deixa margens para dúvidas. A Lei nº 75/98 epigrafa-se ela própria de "Garantia dos alimentos devidos a menores". No seu artº 1º fala de alimentos a menor. No artº 2º fala em necessidades específicas do menor. No artº 3º fala em necessidades do menor e no artº 6º fala em "Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores". O DL nº 164/99 refere-se sempre a menores, como se pode ver dos respectivos artºs 2º, 3º, 9º e 10º. O preâmbulo deste diploma mostra à evidência, até mesmo pelas referências ao artº 69º da CRP e à Convenção dos Direitos da Criança, que só se teve em mente a protecção dos menores. As menções que se fazem no nº 4 do artº 3º da Lei nº 75/98 e no nº 1 do artº 9º do DL nº 164/99 de que a concessão dos alimentos é exigível até que cesse a obrigação a que o devedor está vinculado, só pode ser interpretada no sentido de que a concessão é devida (exigível) até à maioridade do alimentando, visto que com a maioridade cessa a obrigação de alimentos fixada ao abrigo do DL nº 314/78 (da redacção do artº 1º da Lei nº 75/98 resulta que os alimentos de que se trata são os decorrentes de obrigação judicialmente imposta, e esta imposição só pode fazer-se nos termos daquele diploma). Mas para o Mmº juiz a quo haverá que ir mais longe. Desde que a obrigação de alimentos pode existir para além da menoridade, nos termos do artº 1880º do CC, então também a garantia de alimentos se deverá manter. Discordamos. Desde logo não vemos em que é que a circunstância, aludida pelo Mmº juiz, do Estado ficar sub-rogado pelas quantias prestadas aos menores releva para o caso. O Estado fica sub-rogado pelo que prestar em substituição do devedor dos alimentos, mas o que importa saber é até que ponto (até que momento) está (pode estar) obrigado a substitui-se ao devedor. E não vemos também que o artº 1412º do CPC, aludido igualmente pelo Mmº juiz, ajude muito à questão. O que esse normativo estabelece é que quando surja a necessidade de se providenciar sobre alimentos a filhos maiores ou emancipados, nos termos do artº 1880º do Código Civil, seguir-se-á, com as necessárias adaptações, o regime previsto para os menores. Tendo havido decisão sobre alimentos a menores, a maioridade ou emancipação do filho não impedem que a alteração ou a cessação corram por apenso (nº 2 do citado artº 1412º). Com esta última regra, manifestamente infeliz na sua redacção, quis a lei dizer que quando se queira fazer alterar ou fazer cessar os alimentos que tenham sido fixados pelo tribunal a favor de um menor, que entretanto se tornou maior ou emancipado mas que os continuou a receber por se reconhecer que a eles tinha direito, o processo respectivo (a que a lei chama, mas sem grande cabimento, incidente), corre por apenso àquele onde os alimentos haviam sido fixados. A desajeitada letra do citado nº 2 do artº 1412º dá alguma base á interpretação [Que transparece, vg, do Ac da RE, de 30.1.97, BMJ 463, pág 662), de cujo sumário se lê: "I. O artº 1880º do Código Civil permite e aconselha o entendimento de que verificado o condicionalismo ali referido ou seja «se o filho não houver completado a sua formação profissional», a obrigação alimentar existente se mantém, enquanto se não fizer cessar. (...)". No mesmo sentido, se pronuncia Remédio Marques, Algumas Notas Sobre Alimentos (Devidos a Menores), pág 258 e 334.], que se reputa de errada, de que a maioridade ou emancipação não fazem cessar imediata e automaticamente a obrigação de alimentos ao filho. Ora, à parte a circunstância de não ser decisiva a letra desta norma de natureza processual (sendo que o que está em questão é matéria de direito substantivo), temos por certo que, regulado o exercício do poder paternal onde foram fixados alimentos ao menor, a maioridade (ou a emancipação), faz cessar a obrigação de alimentos, justamente porque o regime de regulação do exercício do poder paternal, caduca com a maioridade [Sem prejuízo porém para o que se estabelece no artº 131º do CC: estando pendente contra o menor, ao atingir a maioridade, acção de interdição ou inabilitação, manter-se-á o poder paternal até ao trânsito em julgado da respectiva sentença. Se a interdição ou inabilitação forem decretadas, pode acontecer que a obrigação de alimentos não se suspende apesar da maioridade.], mesmo que o filho se encontre na situação do artº 1880º do CC. Por outras palavras, os alimentos fixados em atenção á menoridade do filho, que são decorrência estrita da obrigação legalmente imposta a quem detém (ainda que o não exerça) o poder paternal, ou seja, os progenitores (v. artºs 1877º e 1878º n º 1 do CC), só se mantêm enquanto existe poder paternal. Extinto este, caduca automaticamente a obrigação do progenitor alimentante, sem necessidade, pois, de qualquer pedido de cessação judicial dos alimentos. O artº 1880º do CC não estabelece que os alimentos que foram fixados no decurso da menoridade se mantêm, mas sim que a obrigação de prestar alimentos ao filho se mantém, o que está longe de ser a mesma coisa. O filho continua a ter direito a alimentos e não propriamente aos que foram fixados tendo por causa de pedir a circunstância de ser menor. Esta questão tem um evidente interesse prático, designadamente a nível do impulso processual e do ónus da prova, isto em caso de litígio quanto à obrigação de alimentos. Como assim, contrariamente ao que sucede aquando da menoridade (em que a obrigação de alimentos é inerente e co-natural ao poder paternal que aos progenitores pertence), atingida a maioridade não é o progenitor alimentante que tem de provar que o filho não se encontra carecido de alimentos (por não se encontrar na situação do artº 1880º do CC), mas é sim o filho que tem de provar que se encontra carecido (por se encontrar nessa situação). Por isso, consideramos criteriosa aquela jurisprudência (de que é paradigma o Ac da RL de 15.7.82, BMJ 325, pág 595) que sustenta que o direito a alimentos advindo da condição jurídica de menor se extingue com o advento da maioridade, sendo que o maior só manterá o direito a alimentos se se verificar o condicionalismo previsto no artº 1880º do CC, mas para tanto (e à falta de acordo extra-judicial nesse sentido) terá de convencer judicialmente o obrigado de que o direito a alimentos existe. No caso vertente a obrigação de alimentos que acaba por recair sobre o recorrente emerge das obrigações decorrentes do poder paternal que os progenitores dos menores detêm (conquanto apenas a mãe o exerça, conforme o acordo que foi judicialmente homologado), tendo a obrigação incumprida resultado da regulação do exercício do poder paternal dos menores. Com a maioridade dos alimentandos o poder paternal cessa e com ele a obrigação de alimentos fixada à sombra desse poder-dever. E se cessa a obrigação de alimentos, óbvio é que, da mesma maneira que cessam os alimentos fixados em atenção à menoridade dos menores, a responsabilidade do ora recorrente nunca pode subsistir, pois que esta só existe enquanto houver lugar à prestação dos alimentos por parte dos progenitores nos termos estabelecidos na acção de regulação do exercício do poder paternal. Como assim, sem prejuízo dos menores, atingida a maioridade, terem o direito a reclamar dos respectivos progenitores alimentos ao abrigo do artº 1880º do CC, não tem o recorrente que por eles se responsabilizar. Procede pois o recurso. ** Decisão: Pelo exposto acorda-se em conceder provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida na parte em que determina que se mantém a obrigação do recorrente para lá da menoridade se verificados os requisitos do artº 1880º do CC. Sem custas de recurso. ** Porto, 20 de Novembro de 2001 José Inácio Manso Raínho Eurico Augusto Ferreira de Seabra Armando Fernandes Soares de Almeida