É apenas legalmente admissível a inscrição registral definitiva, quer do direito de propriedade (de veículo automóvel), quer da locação financeira.
Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto I – A..........., Lda e outros intentaram no tribunal da comarca de ............ o presente procedimento cautelar comum contra: - Auto ..........; - Auto L.........., Lda; e - J.............., Lda, neste peticionando que seja ordenado à Conservatória do Registo de Automóveis para que proceda ao registo inicial, provisório por natureza, da propriedade de doze veículos automóveis devidamente identificados nos autos, a favor da requerida J..........., Lda, bem como aos registos subsequentes, igualmente provisórios por natureza, quer da propriedade, quer da locação financeira, esta apenas quanto a alguns daqueles veículos, a favor dos restantes requerentes. Para tal, a requerente A........., Lda alegou que adquiriu os indicados veículos à Auto ............, empresa sediada em França, através da requerida Auto L........, Lda, sendo os mesmos facturados, por proposta desta última e em obediência a motivos fiscais, pela requerida J.........., Lda, a qual era uma empresa fictícia, cujos sócios gerentes se encontram detidos. Assim, e uma vez que os aludidos veículos já foram adquiridos e integralmente pagos pelos restantes requerentes, tendo igualmente a requerente A........, Lda procedido também ao seu pagamento, aquela J........, Lda, porém, não procedeu ao envio das respectivas facturas comprovativas de tal pagamento, nem de alguns dos documentos indispensáveis à efectivação dos registos de propriedade e de locação financeira, facto este que impede o registo dos veículos em nome daqueles restantes requerentes. Tal situação vem causando prejuízos na actividade comercial da requerente A........., Lda, já que apresenta grave quebra nas suas vendas, pois ninguém se dispõe a comprar um veículo automóvel a uma empresa de quem tem à partida receio de não poder vir a obter os documentos necessários ao registo do mesmo, enquanto que, e no que se reporta aos restantes requerentes, a falta dos documentos comprovativos dos registos da propriedade e da locação financeira, conduzem à possibilidade da apreensão dos respectivos veículos, pelas autoridades policiais. Citados os requeridos, apenas a Auto ......... veio deduzir oposição, alegando que nenhuma das viaturas indicadas pelos requerentes na petição foi por si vendida à A..........., Lda, pelo que concluí pela improcedência da providência peticionada. Realizada a audiência final, e após a enunciação dos factos tidos como provados, foi proferido despacho, considerando improcedente o procedimento cautelar instaurado. De tal decisão os requerentes agravaram, tendo, nas conclusões apresentadas nas suas alegações, referido que se verificam todos os pressupostos legais atinentes à providência cautelar requerida, nomeadamente o periculum in mora, que serviu de fundamento à improcedência do peticionado. Não foram apresentadas contra alegações e o Senhor Juiz sustentou o despacho proferido, aduzindo, embora, um fundamento diverso, quanto à razão de ser do decidido, o que mereceu oposição dos recorrentes. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar. + + + + + + II – Como foi referido no antecedente relatório do presente aresto, através do presente procedimento cautelar comum, os requerentes pretendem que seja decretada a providência cautelar, consistente na prolação de despacho a ordenar ao Ex.mo Conservador do Registo de Automóveis que proceda à inscrição, provisória, em nome da requerente A......., Lda, da titularidade dos registos iniciais relativos ao direito de propriedade sobre os veículos indicados na petição apresentada nos autos, e, quanto aos restantes requerentes, que proceda aos registos subsequentes, igualmente provisórios, da titularidade do mesmo direito, bem como, também, quanto a alguns daqueles veículos, o registo do regime de locação financeira em que os mesmos se encontram. Caberá, porém, desde já salientar, que a figura jurídica do registo inicial, ou prévio, constitui uma inovação introduzida pelo Código do Registo de Bens Móveis - - art. 1º do DL n.º 277/95, de 25/10 -, já que, neste diploma, se veio dispor que, como princípio geral, o primeiro registo do bem móvel é o de propriedade – art. 6º -, registo este, que, no que diz respeito a veículos, pode ser lavrado como definitivo ou como provisório por natureza – art. 26º,n.º s 3 e 4. Todavia, aquela codificação, cujo início de vigência ficou condicionado à entrada em vigor do Regulamento do Registo de Bens Móveis referido no art. 4º do DL n.º 277/95 – art. 1º do DL n.º 311-A/95, de 21/11 -, por omissão da publicação daquele diploma regulamentar, não se encontra ainda em vigor, havendo, portanto, e para tal, que lançar mão das normas constantes do DL n.º 54/75, de 24/02. Ora, neste último diploma, onde se contém as normas que passaram a regulamentar o registo de automóveis, revogando, tacitamente, todo o conteúdo do DL n.º 47.952, de 22/09/1967, antecedentemente vigente, dispõe-se, expressamente, que o direito de propriedade ou quaisquer outros factos jurídicos que a codificação substantiva civil declara sujeitos a registo, só podem no mesmo ingressar, quando tal registo seja efectuado com carácter definitivo – arts. 5º, n.º 1, als. a) e g) e 7º, n.º 1 -, uma vez que, nas situações em que é admissível o registo provisório por natureza, nenhuma daquelas se enquadra – art. 5º, n.º 2. Assim, na situação em apreço, os requerentes peticionam, como se referiu, o registo meramente provisório dos direitos a inscrever no mesmo, o que lhes é absolutamente vedado pelos normativos indicados, e já do antecedente também decorria do estatuído no art. 7º do DL n.º 47.952, onde se consagrava a inadmissibilidade do registo provisório do direito de propriedade relativamente a veículos automóveis. E, se é certo que a locação financeira não foi directamente contemplada naquele citado DL n.º 54/75, o que colhe plena justificação atento o facto de que a sua primeira regulamentação legal apenas decorre do DL n.º 171/79, de 06/06, já no diploma pelo qual a mesma actualmente se rege – DL n.º 149/95, de 24/06 – encontra-se consignada a obrigatoriedade legal da sua inscrição registral, quando tenha por objecto bens móveis sujeitos a registo – art. 3º, n.º 3. Porém, dada a patente similitude de tal contrato com o contrato civil de locação – arts. 1º do DL n.º 149/95 e 1022º do CC -, ainda que não na sua totalidade, propendemos, por analogia, e uma vez que não se verificou qualquer modificação legislativa do conteúdo do citado art. 5º do DL n.º 54/75, decorrente da publicação dos sucessivos diplomas regulamentadores da locação financeira, a integrar tal obrigatoriedade, no estrito âmbito registral, no preceituado na al. g) do n.º 1 daquele normativo. E, como argumento adjuvante da pertinência do aludido enquadramento registral daquele contrato, poder-se-á chamar à colação o estatuído no, ainda que não vigente, art. 11º, n.º 1, al. d) do Código do Registo de Bens Móveis, onde expressamente se contempla tal situação, como constituindo facto sujeito a registo. Temos, portanto, que, sendo apenas legalmente admissível a inscrição registral definitiva, quer do direito de propriedade, quer da locação financeira, será totalmente despicienda de qualquer relevância, a apreciação, quer do eventual enquadramento da situação retractada nos autos em qualquer das apontadas nas várias alíneas do n.º1 do art. 33º do Código do Registo de Bens Móveis, quer da existência ou inexistência, na factualidade apurada pelo tribunal recorrido, de matéria susceptível de configurar o requisito do periculum in mora, a que alude o n.º 1 do art. 381º do CPC, uma vez que aquela inscrição definitiva apenas pode decorrer de decisão judicial devidamente transitada em julgado e proferida em competente acção comum. Improcedem, pois, todas as conclusões dos recorrentes. + + + + + + III – Perante o que vem de expor-se, decide-se negar provimento ao recurso interposto, e manter o despacho agravado, embora por fundamentos diversos dos do mesmo constantes. Custas pelos agravantes. + + + + + + PORTO, 20 de Março de 2003 José Joaquim de Sousa Leite António Domingos Ribeiro Coelho da Rocha Estevão Vaz Saleiro de Abreu
Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto I – A..........., Lda e outros intentaram no tribunal da comarca de ............ o presente procedimento cautelar comum contra: - Auto ..........; - Auto L.........., Lda; e - J.............., Lda, neste peticionando que seja ordenado à Conservatória do Registo de Automóveis para que proceda ao registo inicial, provisório por natureza, da propriedade de doze veículos automóveis devidamente identificados nos autos, a favor da requerida J..........., Lda, bem como aos registos subsequentes, igualmente provisórios por natureza, quer da propriedade, quer da locação financeira, esta apenas quanto a alguns daqueles veículos, a favor dos restantes requerentes. Para tal, a requerente A........., Lda alegou que adquiriu os indicados veículos à Auto ............, empresa sediada em França, através da requerida Auto L........, Lda, sendo os mesmos facturados, por proposta desta última e em obediência a motivos fiscais, pela requerida J.........., Lda, a qual era uma empresa fictícia, cujos sócios gerentes se encontram detidos. Assim, e uma vez que os aludidos veículos já foram adquiridos e integralmente pagos pelos restantes requerentes, tendo igualmente a requerente A........, Lda procedido também ao seu pagamento, aquela J........, Lda, porém, não procedeu ao envio das respectivas facturas comprovativas de tal pagamento, nem de alguns dos documentos indispensáveis à efectivação dos registos de propriedade e de locação financeira, facto este que impede o registo dos veículos em nome daqueles restantes requerentes. Tal situação vem causando prejuízos na actividade comercial da requerente A........., Lda, já que apresenta grave quebra nas suas vendas, pois ninguém se dispõe a comprar um veículo automóvel a uma empresa de quem tem à partida receio de não poder vir a obter os documentos necessários ao registo do mesmo, enquanto que, e no que se reporta aos restantes requerentes, a falta dos documentos comprovativos dos registos da propriedade e da locação financeira, conduzem à possibilidade da apreensão dos respectivos veículos, pelas autoridades policiais. Citados os requeridos, apenas a Auto ......... veio deduzir oposição, alegando que nenhuma das viaturas indicadas pelos requerentes na petição foi por si vendida à A..........., Lda, pelo que concluí pela improcedência da providência peticionada. Realizada a audiência final, e após a enunciação dos factos tidos como provados, foi proferido despacho, considerando improcedente o procedimento cautelar instaurado. De tal decisão os requerentes agravaram, tendo, nas conclusões apresentadas nas suas alegações, referido que se verificam todos os pressupostos legais atinentes à providência cautelar requerida, nomeadamente o periculum in mora, que serviu de fundamento à improcedência do peticionado. Não foram apresentadas contra alegações e o Senhor Juiz sustentou o despacho proferido, aduzindo, embora, um fundamento diverso, quanto à razão de ser do decidido, o que mereceu oposição dos recorrentes. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar. + + + + + + II – Como foi referido no antecedente relatório do presente aresto, através do presente procedimento cautelar comum, os requerentes pretendem que seja decretada a providência cautelar, consistente na prolação de despacho a ordenar ao Ex.mo Conservador do Registo de Automóveis que proceda à inscrição, provisória, em nome da requerente A......., Lda, da titularidade dos registos iniciais relativos ao direito de propriedade sobre os veículos indicados na petição apresentada nos autos, e, quanto aos restantes requerentes, que proceda aos registos subsequentes, igualmente provisórios, da titularidade do mesmo direito, bem como, também, quanto a alguns daqueles veículos, o registo do regime de locação financeira em que os mesmos se encontram. Caberá, porém, desde já salientar, que a figura jurídica do registo inicial, ou prévio, constitui uma inovação introduzida pelo Código do Registo de Bens Móveis - - art. 1º do DL n.º 277/95, de 25/10 -, já que, neste diploma, se veio dispor que, como princípio geral, o primeiro registo do bem móvel é o de propriedade – art. 6º -, registo este, que, no que diz respeito a veículos, pode ser lavrado como definitivo ou como provisório por natureza – art. 26º,n.º s 3 e 4. Todavia, aquela codificação, cujo início de vigência ficou condicionado à entrada em vigor do Regulamento do Registo de Bens Móveis referido no art. 4º do DL n.º 277/95 – art. 1º do DL n.º 311-A/95, de 21/11 -, por omissão da publicação daquele diploma regulamentar, não se encontra ainda em vigor, havendo, portanto, e para tal, que lançar mão das normas constantes do DL n.º 54/75, de 24/02. Ora, neste último diploma, onde se contém as normas que passaram a regulamentar o registo de automóveis, revogando, tacitamente, todo o conteúdo do DL n.º 47.952, de 22/09/1967, antecedentemente vigente, dispõe-se, expressamente, que o direito de propriedade ou quaisquer outros factos jurídicos que a codificação substantiva civil declara sujeitos a registo, só podem no mesmo ingressar, quando tal registo seja efectuado com carácter definitivo – arts. 5º, n.º 1, als. a) e g) e 7º, n.º 1 -, uma vez que, nas situações em que é admissível o registo provisório por natureza, nenhuma daquelas se enquadra – art. 5º, n.º 2. Assim, na situação em apreço, os requerentes peticionam, como se referiu, o registo meramente provisório dos direitos a inscrever no mesmo, o que lhes é absolutamente vedado pelos normativos indicados, e já do antecedente também decorria do estatuído no art. 7º do DL n.º 47.952, onde se consagrava a inadmissibilidade do registo provisório do direito de propriedade relativamente a veículos automóveis. E, se é certo que a locação financeira não foi directamente contemplada naquele citado DL n.º 54/75, o que colhe plena justificação atento o facto de que a sua primeira regulamentação legal apenas decorre do DL n.º 171/79, de 06/06, já no diploma pelo qual a mesma actualmente se rege – DL n.º 149/95, de 24/06 – encontra-se consignada a obrigatoriedade legal da sua inscrição registral, quando tenha por objecto bens móveis sujeitos a registo – art. 3º, n.º 3. Porém, dada a patente similitude de tal contrato com o contrato civil de locação – arts. 1º do DL n.º 149/95 e 1022º do CC -, ainda que não na sua totalidade, propendemos, por analogia, e uma vez que não se verificou qualquer modificação legislativa do conteúdo do citado art. 5º do DL n.º 54/75, decorrente da publicação dos sucessivos diplomas regulamentadores da locação financeira, a integrar tal obrigatoriedade, no estrito âmbito registral, no preceituado na al. g) do n.º 1 daquele normativo. E, como argumento adjuvante da pertinência do aludido enquadramento registral daquele contrato, poder-se-á chamar à colação o estatuído no, ainda que não vigente, art. 11º, n.º 1, al. d) do Código do Registo de Bens Móveis, onde expressamente se contempla tal situação, como constituindo facto sujeito a registo. Temos, portanto, que, sendo apenas legalmente admissível a inscrição registral definitiva, quer do direito de propriedade, quer da locação financeira, será totalmente despicienda de qualquer relevância, a apreciação, quer do eventual enquadramento da situação retractada nos autos em qualquer das apontadas nas várias alíneas do n.º1 do art. 33º do Código do Registo de Bens Móveis, quer da existência ou inexistência, na factualidade apurada pelo tribunal recorrido, de matéria susceptível de configurar o requisito do periculum in mora, a que alude o n.º 1 do art. 381º do CPC, uma vez que aquela inscrição definitiva apenas pode decorrer de decisão judicial devidamente transitada em julgado e proferida em competente acção comum. Improcedem, pois, todas as conclusões dos recorrentes. + + + + + + III – Perante o que vem de expor-se, decide-se negar provimento ao recurso interposto, e manter o despacho agravado, embora por fundamentos diversos dos do mesmo constantes. Custas pelos agravantes. + + + + + + PORTO, 20 de Março de 2003 José Joaquim de Sousa Leite António Domingos Ribeiro Coelho da Rocha Estevão Vaz Saleiro de Abreu