Processo:0632162
Data do Acordão: 10/05/2006Relator: FERNANDO BAPTISTATribunal:trp
Decisão: Meio processual:

I- O processo de reclamação e graduação de créditos é um verdadeiro processo declarativo de estrutura autónoma, embora funcionalmente subordinado ao processo executivo, e não um mero incidente da acção executiva. II- Suspensa a instância executiva por ocorrer acordo de pagamento em prestações da dívida exequenda (ut artº 882º CPC), o facto de à data dessa suspensão ainda não estarem publicados os anúncios para citação dos credores desconhecido não constitui, só por si, obstáculo ao prosseguimento da reclamação de créditos, muito menos sendo fundamento para a extinção da instância de reclamação de créditos por impossibilidade legal superveniente desta lide. III- Face e para os efeitos do disposto no artº 885º do CPC, na redacção emergente do DL nº 38/2003, de 08.03, não é obstáculo ao impulso da execução pelo credor reclamante o facto de o seu crédito ainda não ter sido admitido, bastando que o crédito esteja vencido. IV- O requerimento de prosseguimento da execução por parte do credor reclamante, nos termos do nº 1 do art. 885º C. Pr. Civil, tem de formulado, não a todo o tempo em que durar o plano de pagamento das prestações da dívida exequenda, mas no prazo de dez (10) dias a contar da notificação que para tal efeito àquele deve ser feita.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Processo
0632162
Relator
FERNANDO BAPTISTA
Descritores
EXECUÇÃO GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
No do documento
Data do Acordão
05/11/2006
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
AGRAVO.
Decisão
REVOGAR O DESPACHO RECORRIDO.
Sumário
I- O processo de reclamação e graduação de créditos é um verdadeiro processo declarativo de estrutura autónoma, embora funcionalmente subordinado ao processo executivo, e não um mero incidente da acção executiva. II- Suspensa a instância executiva por ocorrer acordo de pagamento em prestações da dívida exequenda (ut artº 882º CPC), o facto de à data dessa suspensão ainda não estarem publicados os anúncios para citação dos credores desconhecido não constitui, só por si, obstáculo ao prosseguimento da reclamação de créditos, muito menos sendo fundamento para a extinção da instância de reclamação de créditos por impossibilidade legal superveniente desta lide. III- Face e para os efeitos do disposto no artº 885º do CPC, na redacção emergente do DL nº 38/2003, de 08.03, não é obstáculo ao impulso da execução pelo credor reclamante o facto de o seu crédito ainda não ter sido admitido, bastando que o crédito esteja vencido. IV- O requerimento de prosseguimento da execução por parte do credor reclamante, nos termos do nº 1 do art. 885º C. Pr. Civil, tem de formulado, não a todo o tempo em que durar o plano de pagamento das prestações da dívida exequenda, mas no prazo de dez (10) dias a contar da notificação que para tal efeito àquele deve ser feita.
Decisão integral
ACÓRDÃO NA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO 

I. RELATÓRIO:

No Tribunal Judicial de Oliveira de Azeméis, …º Juízo, correm termos uns autos de execução ordinária instaurados, em 12.09.2003, pela B…… de Oliveira de Azeméis contra Ilídio Reis de Almeida e mulher C….., em que foi dado à execução um escrito particular de empréstimo feito por aquela a estes (cfr. doc. junto a fls. 3 dos autos de execução).
No decurso da execução, veio a exequente nomear à penhora dois prédios urbanos propriedade dos executados, identificados no requerimento de fls. 19 da execução.
Teve lugar a penhora dos aludidos imóveis (fls. 26 da execução).
Os executados foram notificados do despacho que ordenou a penhora, bem assim da realização desta.
A exequente junta aos autos certificado de registo da penhora e certidão dos ónus dos prédios penhorados, em conformidade com o artº 838º do CPC (docs. de fls. 38 a 41), da qual consta, além do mais, uma hipoteca voluntária a favor do Banco D….., SA, sobre um dos prédios urbanos penhorados na execução-- qual seja, o prédio composto por casa de habitação com rés-do-chão, anexos para arrumos, garagem e quintal, inscrito na matriz urbana sob o artº 359ºe descrito na Conservatória do Registo predial de Oliveira de Azeméis sob o nº 00119/251191--, para garantia do capital mutuado por aquela instituição de crédito aos executados no valor de 55.000.000$00, e respectivos juros (doc. de fls. 4 a 18 deste apenso).
Mais requer a exequente o cumprimento do disposto no artº 864º do CPC.

Junta a aludida certidão da penhora e dos ónus e encargos relativos aos prédios penhorados, o Mmº Juiz ordena se dê cumprimento ao disposto no artº 864º do CPC (fls. 45 da execução).

Foram, então, enviados, em 09.12.2004, ao exequente os anúncios para citação dos credores desconhecidos, bem assim foi remetida ao supra referido credor Banco D…., SA carta de citação, expedida na mesma data de 09.12.2004, para, na qualidade de credor inscrito, reclamar, querendo, no prazo legal, o pagamento dos seus créditos pelo produto da venda dos bens penhorados, sobre que tenha garantia real, nos termos do disposto no artº 865º do CPC (cfr. fls. 50 e 51 da execução).

No decurso do prazo de reclamações de crédito, veio, em 13.01.2005, o Banco D…., SA reclamar o seu crédito sobre os executados, relativo ao mútuo que lhes concedeu, identificado supra, sendo, em 17.01.2005, autuado o respectivo apenso à execução (cfr. “TERMO DE APENSAÇÃO” de fls. 67 da execução).
Alegou a reclamante que a dívida se venceu, face ao incumprimento por parte dos mutuários. 

Na execução veio, entretanto, a exequente informar que chegara a acordo com os executados relativamente ao pagamento da dívida exequenda, requerendo a suspensão da execução “até integral cumprimento do acordo de pagamento em prestações…” (fls. 68 verso).

Da mesma forma, em 7 de Abril de 2005 veio a exequente informar que, dado o acordo a que chegara com os executados, não chegou a publicar os anúncios para convocação de credores desconhecidos, aguardando o deferimento da suspensão da instância (cfr. fls. 71 da execução).

Por despacho de fls. 76 da execução (datado de 12.04.2005) é proferido despacho a ordenar a suspensão da instância executiva “… até ao dia 1/3/2010” - sublinhado nosso.

Concluso em 2005.06.07 o apenso de reclamação de créditos, é nesta data proferido o seguinte despacho:
“Nos presentes autos, a Exequente não diligenciou pela publicação dos competentes anúncios com vista a proceder – se à citação dos credores desconhecidos – Art.º 864º, nº1, al. c) e 2) do C.P.C., em virtude de ter acordado com os executados um acordo de pagamento em prestações – vide: fls. 71 dos autos principais.
A atitude das partes principais constituiu, por ora, um obstáculo incontornável ao prosseguimento do apenso de reclamação de créditos, por falta de citação dos restantes créditos com garantia real.
E constituiu um obstáculo incontornável já que o propósito das partes de obterem a suspensão da execução pelo período de 10 semestres leva a que não se cumpriu, nem se pode vir a cumprir com a formalidade essencial destinada a chamar à instância os restantes credores. 
Destrate, considerado o estado dos autos de reclamação de créditos (o crédito reclamado ainda não foi objecto de despacho liminar, nem se efectuou a citação dos credores desconhecidos) constata – se haver uma impossibilidade legal superveniente no seu prosseguimento, por causa imputável às partes principais.
Pelo exposto, decido:
- Julgar extinta a instância de reclamação de créditos por impossibilidade legal superveniente nos termos previstos no art.º 287º, al. e) do C.P.C..
Custas a suportar pelas partes principais (exequente e executados).
Registe e notifique, enviando – se cópia do acordo de pagamento em prestações à Credora Reclamante para melhor esclarecimento.”

Inconformado com este despacho que julgou “extinta a instância de reclamação de créditos por impossibilidade legal superveniente”, veio dele recorrer o credor reclamante Banco D…., SA, apresentando alegações que remata com as seguintes

CONCLUSÕES:
“1) Vem o presente recurso interposto da sentença de fls 27 que julgou extinta a instância de reclamação de créditos por impossibilidade legal superveniente.

2) Muito embora o Mm° Juiz "a quo" não refira expressamente, na sentença em crise, a aplicação do arfo 885°, do C.P.C., é manifesto que ao afirmar que "(...) considerando o estado dos autos de reclamação de créditos (o crédito reclamado não foi objecto de despacho liminar (...)) constata-se haver uma impossibilidade legal superveniente no seu prosseguimento (...) ", a decisão proferida se fundamento no citado preceito legal, na redacção anterior ao Decreto-Lei n° 38/2003, de 8 de Março.

3) É, todavia, pacífico o entendimento de que à reclamação de créditos apresentada após a entrada em vigor da nova lei é aplicável esta mesma nova lei processual, razão pela qual deveria o Mm° Juiz "a quo", salvo o devido respeito, ter aplicado o disposto no n°1 do art° 885°, do C.P.C., na redacção dada pelo D.L. n° 38/2003, de 8 de Março e ordenado a notificação do Banco Reclamante, ora Recorrente, nos termos e para os efeitos do previsto naquele artigo, de acordo com o qual "Fica sem efeito a sustação da execução se algum credor reclamante, cujo crédito esteja vencido requerer o prosseguimento da execução para satisfação do seu crédito" - realçado nosso.

Todavia, e sem prescindir,
4) Ao não ter proferido o despacho liminar de' admissão da reclamação de créditos da Recorrente no prazo legalmente estipulado - recorde-se que a mesma deu entrada em Tribunal no dia 12 de Janeiro de 2005 e a sentença recorrida data de 7 de Junho de 2005 - o Tribunal "a quo" violou, salvo o devido respeito, os art°s 156°, n° 1 e 160°, n° 1, do C.P.C, devendo esta sentença ser revoqada.

5) De acordo com os citados art°s 156°, n° 1 e 160°, n° 1, do C.P.C é dever do Mm° Juiz "a quo" solucionar a questão processual resultante da omissão do seu despacho (de admissão liminar) em vez de, pura e simplesmente, extinguir a instãncia.

Ainda sem prescindir do alegado supra,

6) Mesmo no caso de se entender que a sentença recorrida não pode ser revogada e substituída por despacho de admissão liminar da reclamação de créditos apresentada pela Recorrente - o que apenas se admite por mera hipótese de raciocínio - ao abrigo do disposto no n° 1, do art° 885°, do C.P.C., na sua versão actual, impõe-se uma outra solução processual para a questão em apreço, diversa da plasmada na decisão recorrida, sob pena de a Recorrente ver totalmente precludido o seu direito de crédito. Isto porque:

7) Na hipótese de, por algum motivo (por exemplo em virtude do incumprimento do acordo de pagamento por parte dos Executados), vir a ser declarada a cessação da suspensão da execução, a Recorrente não será novamente citada no âmbito desta mesma acção, não podendo, por isso, voltar a reclamar o seu crédito hipotecário.

8) Mesmo que a Recorrente decidisse instaurar a competente acção executiva e no âmbito da mesma registasse a penhora sob o imóvel descrito na C.R.P. de Oliveira de Azeméis sob o n° 00119, iria deparar-se com o despacho de sustação dessa mesma execução, ao abrigo do disposto no artº 871, do C.P.C., sendo remetida, de novo, para os presentes autos.

9) Mas existindo já caso julgado formal no que respeita ao despacho que ordena a citação dos credores com garantia real e (i) tendo já ocorrido a citação da Recorrente no âmbito do art° 864°, do C.P.C., (ii) tendo esta apresentado a sua reclamação de créditos e (iii) tendo a instância respectiva sido julgada extinta, não poderá a mesma reclamar, de novo, o seu crédito, vendo-se, pois, totalmente impedida de ser ressarcida do valor em dívida.

10) Impõe-se que a sentença em crise seja revogada e substituída por despacho que admita liminarmente a reclamação de créditos da Recorrente por forma a que esta possa fazer prosseguir a execução, ultrapassando-se, assim, o "obstáculo incontornável" a que alude o Mm° Juiz "a quo" e que fundamentou a decisão de extinção da instância por impossibilidade legal superveniente ou, se assim não se entender, por despacho que dê sem efeito a citação da Recorrente efectuada nos termos e para os efeitos do disposto nos art°s 864° e 865°, do C.P.C., por forma a que esta possa vir a reclamar o seu crédito ao abrigo do preceituado no art° 871 °, do citado diploma.

11) A sentença recorrida viola os art°s 287°, al. e), 885°, n° 1, 156°, n° 1 e 160, n° 1, do Cód. Proc° Civil.

Nestes termos e nos mais de direito que V.s Ex.°s muito doutamente suprirão:
Deve ser por V.°s Ex.°s concedido provimento ao recurso e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida, nos termos supra expostos”.

Não houve contra-alegações.
O Mmº Juiz  a quo limitou-se a um lacónico “mantenho o despacho..”.

Foram colhidos os vistos.

II. FUNDAMENTAÇÃO

II. 1. AS QUESTÕES:
Tendo presente que:
- O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (arts. 684º, nº3 e 690º, nºs 1 e 3, do C. P. Civil);
- Nos recursos se apreciam questões e não razões;
- Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido,

as questões suscitadas pelo agravante são:
- Lei aplicável ao “apenso” de reclamação de créditos;
- Se a suspensão da instância executiva antes de estarem publicados os anúncios para citação dos credores desconhecidos, não só obsta ao prosseguimento da instância de reclamação de créditos, como constitui até fundamento para a sua extinção por impossibilidade legal superveniente desta lide.
- Se deveria o tribunal a quo ter proferido despacho a admitir liminarmente a reclamação da agravante e notificado esta para os efeitos do disposto no artº 885º do CPC (para que possa fazer prosseguir a execução)-- ou se se impunha solução diferente da adoptada, e qual.

II. 2. OS FACTOS:
Os supra referidos, que nos dispensamos de repetir.

III. O DIREITO:

Vejamos, então, as questões suscitadas nas conclusões das alegações do agravante.

Primeira questão: lei aplicável ao “apenso” de reclamação de créditos:

Parece - embora o não refira o Mmº Juiz a quo de forma clara - que a decisão recorrida (fls. 27), ao referir que “… considerando no estado dos autos de reclamação de créditos (o crédito reclamado não foi objecto de despacho liminar (…)) constata-se haver uma impossibilidade legal superveniente no seu prosseguimento (…)”, se estribou na redacção do artº 885º, do CPC, anterior à reforma do processo civil operada pelo Dec.-lei nº 38/2003, de 8 de Março.

Impõe-se, assim, antes de mais, ver qual a redacção das normas atinentes ao processo de execução aplicáveis ao apenso de reclamação de créditos.

Adiantando solução, cremos que as normas aplicáveis aos autos são as decorrentes das alterações introduzidas ao processo de execução pelo aludido Dec.-Lei nº 38/2003, de 8 de Março, e não as que vigoravam antes da reforma operada por este Dec.-Lei ( cfr. artº 21º deste diploma e redacção que lhe foi dada pelo DL nº 199/2003, de 10.09).

Como resulta da factualidade referida supra, se é certo que a execução foi instaurada em 12.09.2003, já a reclamação de créditos foi autuada em 17.01.2005 (cfr. fls. 67).
Ora, dispõe o aludido artº 21º do DL nº 38/2003 que “as alterações ao Código de processo Civil, [….], só se aplicam nos ou relativamente aos processos instaurados a partir do dia 15 de Setembro de 2003”.

A pergunta põe-se, então: Qual a natureza do apenso de reclamação de créditos: é um verdadeiro processo (autónomo), ou, antes, apenas um incidente do processo executivo?
Se for mero incidente, teremos aplicáveis à situação sub judice as normas anteriores ao aludido DL nº 38/2003 aplicáveis ao processo de execução; se de verdadeiro processo se tratar, então teremos aplicáveis as normas do processo executivo aplicáveis à data da instauração deste “processo” (as decorrentes da alteração que aquele DL introduziu), pois a reclamação de créditos é posterior a 15.09.2003.

Parece, salvo melhor opinião, que o processo de reclamação e graduação de créditos é um verdadeiro processo e não mero incidente da acção executiva.
Com efeito, assim é designado por inúmeros autores, como pode ver-se em Prof. Alberto dos Reis (Proc. de Execução, II, pág. 267 - “já daqui se infere que o processo de verificação de créditos é, sob o ponto de vista formal, um verdadeiro processo ordinário ou sumário, que só difere destes na fase dos articulados”), Prof. Lebre de Freitas (A Acção executiva Depois da Reforma, pág. 317), Teixeira de Sousa (A acção Executiva Singular, pá. 338 - que fala em “Processo de reclamação”), Prof. Castro Mendes (Obras Completas, ed. Da AAFDL, III, pág. 448 - que usa por diversas vezes a palavra processo, designadamente ao falar em “Na marcha do processo de execução… podem enxertar-se quatro processos apensos declarativos”), Dr. Amâncio Ferreira (Curso de Processo de Execução, 2ª ed., a pág. 233 - que escreveu: “baseando a petição da reclamação de créditos um processo cível enxertado na execução”).
Trata-se -- a execução e a reclamação de créditos --, com efeito, de processos perfeitamente diferenciados, que visam objectivos bem específicos e de certo modo autónomos - apenas se reencontrando na fase do pagamento.
Assim, portanto, também para nós temos que a reclamação, verificação e graduação dos créditos se realiza numa acção declarativa - embora, é certo, de carácter incidental--, pois que todas as reclamações que forem deduzidas pelos vários credores são autuadas num único apenso - um novo processo -- ao processo de execução (art. 865º, nº 8, do C. Proc. Civil, na redacção actual) - ut Prof. Miguel Teixeira de Sousa, "ob. cit., Lisboa, 1998, pág. 341. E não é pelo facto de se tratar de uma acção que se caracteriza por visar directamente aos fins da execução, isto é, com uma índole instrumental e auxiliar desta -- o que lhe imprime configuração e regime em vários aspectos diversos do módulo normal dos processos declaratórios (Artur Anselmo de Castro, "A Acção Executiva Singular Comum e Especial", Coimbra, 1970, pag. 263) - que deixa de ser uma verdadeira acção declarativa.
Diríamos, assim, com Prof. José Lebre de Freitas (A Acção Executiva à luz do Código Revisto", 2ª edição, Coimbra, 1997, págs. 258 e 259), que se trata de mais “um processo declarativo de estrutura autónoma, mas funcionalmente subordinado ao processo executivo". 
Assim sendo - isto é, assente que o processo de reclamação e graduação de créditos é um verdadeiro processo e não mero incidente da acção executiva -, e tendo em conta que se trata de processo instaurado “a partir de 15 de Setembro de 2003”, conclui-se que são aplicáveis ao caso sub judice as normas do processo executivo emergentes das alterações introduzidas pelo Dec.-Lei nº 38/2003, ut seu artº 21º.
Veja-se, ainda, entre outros, o Ac. da Rel. de Lisboa, de 12.10.2000, in www.dgsi.pt, onde se escreveu que “à reclamação de créditos, [….], é-lhe aplicável a nova lei processual ainda que o processo executivo tenha sido instaurado ao abrigo do Código de Processo Civil”.

Assim procede esta primeira questão.

Segunda questão: se a suspensão da instância executiva mesmo antes de estarem publicados os anúncios para citação dos credores desconhecidos, não só obsta ao prosseguimento da instância de reclamação de créditos, como constitui até fundamento para a sua extinção por impossibilidade legal superveniente desta lide.

Uma questão prévia:
No seguimento do requerimento de fls. 68 da execução - onde se informa que “exequente e executados chegaram a um acordo e pagamento da quantia exequenda e respectivos juros, em prestações…” - foi ordenada a suspensão da instância executiva (fls. 76 da execução), “até ao dia 1/03/2010” - isto é, nos termos em que foi requerido, qual seja, “até integral cumprimento do acordo de pagamento em prestações conseguido”-- “dez prestações semestrais” - “sem prejuízo do prosseguimento da execução, nos termos legais e da cláusula 3ª” (“caso uma das prestações não seja pontualmente liquidada pelos executados”).

Ora, a doutrina e a jurisprudência eram praticamente uniformes no sentido de que norma do artº279º CPC - que permite a suspensão da instância “por determinação do juiz” não era aplicável à acção executiva (cfr. Prof. Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, 3º, pág. 274, Cons. Rodrigues Bastos, Notas o Código de Processo Civil, II, pág. 45, P.G.A. Lopes do Rego, Comentários ao Código de processo Civil, 2ª ed., 281/282, e Acs. do STJ de 04/06/1980, BMJ 298º-232, de 14/01/1993, CJ, T1-59, e de 18/06/1996, CJ, T2-149, da R.L. de 08/04/2003, CJ, T2-113, da R.C. de 01/09/1999, BMJ 488º-416, da R.P. de 07/07/2003, CJ, T4-163, e da R.E. de 04/07/1996, CJ, T4-275).
E isto era assim porque se entendia que, uma vez que a suspensão resultava de estar a decisão da causa dependente do julgamento de outra já proposta, parecia clara a sua inaplicabilidade ao processo de execução, em que não há que proferir decisão sobre o fundo da causa, visto o direito que se pretende efectivar já estar declarado.

No entanto, já se não viam razões para advogar a inaplicabilidade do preceito no que respeita às fases declarativas que, por vezes, se enxertam no processo executivo (v. Cons. Rodrigues Bastos, ob. e local citados), como acontece no apenso de reclamação de créditos.
Assim, portanto, já então se aceitava a aplicação do aludido preceito (artº 279º CPC) à reclamação de créditos.

Importa realçar, contudo, que, independentemente de constituir uma faculdade do tribunal (“O tribunal pode ordenar…”, nos dizeres do preceito), embora não se trate de um poder a exercer arbitrariamente, o mesmo preceito pressupõe que não haja ainda decisão no processo dependente, como resulta expressamente da sua redacção, ao dizer que “O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão” (o realce é nosso) “da causa estiver dependente…”.
Por isso, só existirá prejudicialidade e dependência quando na primeira se discuta, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta a título incidental.

No entanto, com o acordo de pagamento introduzido no direito processual civil pela revisão de 1995-1996, pôs-se fim à aludida controvérsia - se seria lícito ao juiz suspender a acção executiva, com base no artº 279º-1 CPC (“motivo justificado”…).
O Dec.-Lei nº 329-A/95 veio esclarecer essa dúvida, criando, para a suspensão da instância executiva com esse fundamento, um regime especial, liberto do prazo de seis meses por ele imposto com o limite temporal da suspensão do processo (declarativo ou executivo) por acordo das partes (ver Lopes do Rego, Comentário ao CPC…, artº 882-1).

Assim, portanto, nada a censura à decisão do Mmº Juiz em suspender a instância executiva nos termos em que o fez.

Vejamos, então, a questão suscitada.

Entendeu o Mmº Juiz a quo que, estando suspensa a instância executiva - devido ao acordo de pagamento em prestações da dívida exequenda - o processo de reclamação de créditos não só não podia prosseguir, como até se impunha a extinção desta instância de reclamação de créditos, já que o crédito da reclamante ainda não foi objecto de despacho liminar e não foram publicados os anúncios para citação dos credores desconhecidos.
Qui juris?

Como vimos, são aplicáveis ao caso presente – ao processo de reclamação de créditos, ou melhor, ao destino que se lhe há-de dar - as normas do processo de execução emergentes das alterações que decorrem do supra aludido Dec.-Lei nº 38/2003.
O que é de capital importância, desde logo atenta a redacção actual do artº 885º do CPC.

Com efeito, dispõe-se no actual artº 885º do CPC:
“(Tutela dos direitos dos restantes credores)
1 – Fica sem efeito a sustação da execução se algum credor reclamante, cujo crédito esteja vencido, requerer o prosseguimento da execução para satisfação do seu crédito.
2. No caso previsto no número anterior é notificado o exequente para, no prazo de 10 dias, declarar se: 
a) Desiste da garantia a que alude o nº 1 do artigo 883.º; 
b) Requer também o prosseguimento da execução para pagamento do remanescente do seu crédito, ficando sem efeito o pagamento em prestações acordado. 
3. A notificação a que alude o número anterior é feita com a cominação de, nada dizendo o exequente, se entender que desiste da penhora já efectuada. 
4. Desistindo o exequente da penhora, o requerente assume a posição de exequente, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto nos nºs 2 a 4 do artigo 920.º.
5 – O disposto nos números anteriores é aplicável quando o exequente e o executado acordem na suspensão da instância, nos termos do n.º 4 do artigo 279.º.

Na redacção anterior prescrevia-se:
“1. Fica sem efeito a sustação da execução se algum credor, cujo crédito esteja vencido e cuja reclamação haja sido admitida, requerer o prosseguimento da execução para satisfação do seu crédito ou se, no caso previsto no artigo 871.º, for apresentada reclamação nos 15 dias posteriores à notificação do despacho de sustação”. 

As diferenças de redacção entre a anterior norma e a actual estão, fundamentalmente, no facto de já se não exigir que a reclamação do crédito vencido tenha sido admitida para que o credor reclamante possa requerer o prosseguimento da execução, bem assim na introdução do nº 5 – prevendo expressamente a aplicabilidade dos nºs anteriores ao caso de ter ocorrido acordo de executado e exequente para suspensão da instância executiva (artº 279º, nº4 CPC).

Daqui logo se vê que, ao contrário do que se consignou no despacho recorrido, o facto de o crédito reclamado ainda não ter sido “objecto de despacho liminar” só por si não constitui – agora - entrave à tutela dos direitos dos restantes credores, in casu ao direito de prosseguimento da execução a impulso do reclamante/ora agravante.

Aliás, - como bem salienta o agravante - mesmo que fosse aplicável a anterior redacção do artº 885º do CPC, não se vê como podia ser o reclamante penalizado pelo facto de ainda não ter sido proferido despacho liminar a admitir a reclamação, quando a mesma foi deduzida em 13.01.2005 e só em 07.06.2005 é prolatado o primeiro despacho nesse apenso - precisamente o despacho ora em crise!
Veja-se que o despacho a ordenar o cumprimento do artº 864º do CPC foi proferido em 6.12.2004 e logo em 9.12.2004 foram enviados ao mandatário da exequente os anúncios para publicação (cfr. fls. 45 e 50).
Assim sendo, não se compreende que os autos permaneçam em “banho Maria” durante meses sem qualquer actividade do exequente -- só passados mais de 3 meses sobre o envio dos anúncios é que o exequente vem aos autos dar sinal de vida, mas, mesmo aí, ainda não para informar que diligenciou pela publicação dos anúncios, mas apenas e só dar conta das diligências que tem feito com o executado no sentido de obter um acordo de pagamento da dívida exequenda! (fls. 68 da execução).
Veja-se, também, que só em 15.03.2005 o Mmº Juiz deu prazo (de dez dias) ao exequente para publicar os anúncios em falta (fs. 69), ao que este se limitou a responder (em 7.04.2005- fls. 71) que ainda o não fez porque estava a “… negociar a forma de pagamento da dívida”!

O certo é que só em 02.06.2005 é proferido despacho a suspender a instância executiva ( fls. 76). 
Mas de anúncios… nada - em manifesto desrespeito dos interesses dos credores desconhecidos que tenham créditos sobre os executados e os pretendam reclamar aqui.

Não vemos que o Mmº Juiz a quo tenha sido diligente para que os anúncios fossem atempadamente publicados, providenciando pelo “andamento regular e célere do processo, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da acção” ( artº 265º, nº1 CPC).
E da mesma forma, também é patente a passividade do exequente, não actuando em conformidade com o princípio da cooperação que vem previsto no artº 266º do mesmo CPC.
E por tudo isso, a reclamação encontra-se na “estaca zero”. E é precisamente com base nesse mesmo estado da reclamação de créditos - que só ao tribunal e à exequente parece ser imputado - que no despacho recorrido se fundamenta a “impossibilidade legal superveniente” no prosseguimento da reclamação, invocando-se a não publicação dos aludidos anúncios como um “obstáculo incontornável ao prosseguimento do apenso de reclamação de créditos” !
Repete-se: se os anúncios não foram atempadamente publicados, tal se deve apenas e só ao tribunal e … à exequente. E, como tal, não parece justo que as consequências de tal inacção devam ser suportadas pelo credor reclamante, ora agravante, que reclamou o seu crédito tempestiva e de forma correcta.

Como vimos, perante a actual redacção do artº 885º do CPC, não é obstáculo ao impulso da execução pelo credor reclamante o facto de o seu crédito ainda não ter sido admitido, bastando que o crédito esteja vencido.
Saliente-se que o novo nº 5 desse normativo teve o cuidado de prever expressamente que o aludido prosseguimento da execução possa ter lugar “quando o exequente e o executado acordem na suspensão da instância, nos termos do nº4 do artº 279º” do mesmo Código.
É precisamente a situação ora em apreciação (cfr. fls. 68 e verso da execução - o requerimento foi subscrito por exequente e executados).

Um óbice parece opor-se, porém, relativamente ao crédito do credor reclamante, ora agravante.

É um facto que, como, a partir da reclamação de créditos (artº 865º CPC), há que atender também ao interesse dos credores reclamantes, o nº 1 do artº 885º confere ao credor que reclamou crédito vencido (artº 865º, nº7) o direito de prosseguir com a execução para sua satisfação. E cremos que essa manifestação de vontade do credor deve ter lugar no prazo de 10 dias ( artº 153º), contados da notificação que para o efeito é feita aos credores que já tenham reclamado, ao abrigo do nº 2 ou do nº 3 do artº 865º.

No entanto, como escreve Lebre de Freitas, CPC Anotado,  em anotação ao artº 885º, aqui em apreciação - já na actual redacção --, “outro tanto se diria dos credores que tenham garantia real sobre o bem concreto penhorado (mas já não dos que gozam de privilégio mobiliário geral), se a função da reclamação de créditos não fosse determinada pela extinção, pela venda executiva, dos direitos reais de garantia, […], não postos em crise quando a execução se suspende à espera do pagamento que a extinguirá: não jogando aqui a mesma razão de urgência invocável pelo credor que tenha obtido a segunda penhora e se veja impedido, por via do artº 871º, de prosseguir com a execução, a reclamação de novos créditos não pode ter lugar na pendência da suspensão (artº 283º-1).”.
Isto é, como os direitos reais de garantia se extinguem com a venda executiva do bem penhorado (sobre que incidem tais direitos reais), não ocorrendo tal venda, obviamente que tal perigo para o credor reclamante que disponha dessa garantia não existe. É precisamente o caso presente, em que a execução apenas se suspendeu. Aqui o seu direito real de garantia não é afectado. Manter-se-ia em “banho-maria” à espera do prosseguimento da execução, caso o acordo de pagamento não fosse cumprido.

No entanto, cremos que as coisas no caso sub judice não devem ficar por aqui.
Com efeito, o mesmo autor, em anotação ao mesmo artigo, acrescenta:
“A tutela do interesse dos credores leva o nº 5 a estender o regime dos números anteriores ao acordo de suspensão da instância executiva celebrado ao abrigo do artº 279º-4”.
E continua: “… havia igualmente que acautelar o interesse dos credores reclamantes. É que, embora a reclamação de créditos tenha por função permitir a transmissão dos bens penhorados livres dos direitos reais de garantia que os onerem (…), há que atender a que não podem ser prejudicados pelo acordo entre exequente e executado os credores que, à data da suspensão, já tenham reclamado,” - mesmo que o seu crédito ainda não tenha sido admitido - “bem como aqueles que, por se verem impossibilitados de, em execução própria, executar os bens sobre os quais têm garantia ( visto se encontrarem já penhorados), se vêm forçados a reclamar na execução, para satisfação do seu crédito”. Os sublinhados são nossos.

Portanto, uma vez que o agravante - mesmo munido da garantia real-- já tinha reclamado o seu crédito à data da suspensão, não pode ser prejudicado pelo acordo entre exequente e executados.

Por isso, cremos que a solução correcta a adoptar é notificar o credor reclamante – ora agravante-- para, no prazo de 10 dias [A questão do prazo para requerer o prosseguimento da execução pode gerar alguma controvérsia.
Com efeito, perante a redacção do artº 885º pode pensar-se que o credor reclamante pode durante todo o tempo em que durar o plano de pagamento da dívida acordado entre exequente e executado requerer tal prosseguimento da execução.
Este entendimento foi sufragado, v.g., pelo Ac. da Rel. do Porto de 26 de Abril de 2005 (relator Alberto de Jesus Sobrinho), in www.dgsi.pt. Mas foi-o antes da entrada em vigor do Dec.-Lei nº 38/2003.
Ora, por um lado, no anterior artº 885º exigia-se, para poder ser requerido o prosseguimento da execução pelo credor reclamante, que a sua reclamação tivesse sido admitida (ut nº1) - o que não é exigido actualmente (redacção do DL 38/2003 - que se basta com o facto de o crédito estar “vencido”. Ou seja, antes era mais restrito o campo da admissibilidade da aludida possibilidade de requerer-se o prosseguimento da execução.
Ora, se já se abriu o leque dos credores reclamantes que podem requerer o prosseguimento da execução, cremos que igualmente se justificará agora algum limite temporal ao requerimento que podem fazer.
Por outro lado - e na senda do aqui defendido--, vê-se que essa limitação temporal foi expressamente consagrada no caso da renovação da execução extinta por banda do credor reclamante, fixando-se, agora, o prazo de 10 dias para esse efeito, como se vê da nova redacção do artº 920º, nº2 CPC ( a lei fala em “dez dias a contar da notificação da extinção da execução”). Limitação essa que não existia na anterior redacção do citado artº885º, onde se previa a possibilidade de ser requerida a renovação da execução pelo credor reclamante “até ao trânsito da sentença que declarou extinta a execução”.
Não vemos, agora, razão para que, à semelhança do que ocorre no artigo 920º, também na situação prevista no artº 885º não deva ter lugar um prazo para que o credor reclamante, “cujo crédito esteja vencido” possa vir requerer o prosseguimento da execução para satisfação do seu crédito.
Veja-se, ainda, que o citado Dec.-Lei nº 83/2003 introduziu um nº 5 ao mesmo artº 885º, dispondo que “o disposto nos números anteriores é aplicável quando o exequente e o executado acordem na suspensão da instância, nos termos do nº 4 do artº 279º” - pelo que, então, por aplicação, com as devida adaptações, dos nºs 2 e 3 do mesmo normativo, o prazo de 10 dias ali referido após a “notificação do exequente”, funcionará para o reclamante.] (ut artº 153º CPC), requerer, querendo, o prosseguimento da execução, seguindo-se, então, os demais termos previstos no mesmo artº 885º, maxime nºs 2 e 3.

Dito de outra forma, entendemos que o requerimento de prosseguimento da execução por parte do credor reclamante, nos termos do nº 1 do art. 885º C.Pr.Civil, tem de ser feito, não a todo o tempo em que durar o plano de pagamento das prestações da dívida exequenda, mas, sim, no prazo de dez (10) dias a contar da notificação que para tal efeito lhe deve ser feita.
E assim sempre podia ser ultrapassado o “obstáculo incontornável” (?!) de que fala o despacho recorrido, mais não fosse, assumindo o reclamante a posição de exequente, providenciando, então, ele próprio pela publicação dos anúncios em falta ( ver nº 4 do artº 885º).

O que não parece curial é obrigar-se o reclamante a permanecer inactivo-- diríamos mesmo “amarrado”--, à espera que o longo período de tempo (cinco anos !) do acordo de pagamento decorresse para, só então, ver prosseguir a sua pretensão!

Aliás, parece que a solução aqui propugnada até se impõe por outra razão - de que bem faz eco o agravante.
Efectivamente, a manter-se a extinção do processo de reclamação de créditos, nos termos do despacho recorrido, obviamente que ficava o reclamante impedido de ver satisfeito o seu crédito pelo produto dos bens penhorados - o que esvaziaria o valor da garantia real.
E era assim, tivesse lugar, ou não, o cumprimento do acordo.

Efectivamente, por um lado, porque se declarou extinta a instância nesse apenso de reclamação, já nem, sequer, podia o reclamante lançar mão do artº 920º CPC [Anote-se que, face ao supra explanado - em que se considerou o processo de reclamação de créditos como dependente da acção executiva, tendente a abranger o pagamento dos créditos reclamados pelo produto da venda executiva--, inequívoca é a conclusão de que as reclamações apenas poderão ser deduzidas se e enquanto a execução em que são deduzidas estiver pendente (Cfr. Ac. RP de 21/07/83, in CJ Ano VIII, 4, pag. 230 (relator Flávio Ferreira).
Se, porventura, a execução já se não encontra a correr termos, isto é, já se não mostra pendente, encontrando-se extinta, pode o credor reclamante fazer uso do disposto no artº 920º, nº2 do CPC.
Interessará saber quando deve considerar-se pendente -- nomeadamente para os efeitos do artigo 871º do C.Proc.Civil-- a execução - designadamente aquela que foi sustada pelo pagamento da quantia exequenda e remetida à conta. 
Numa apreciação apriorística parece dever sustentar-se que "execução pendente equivale a execução a correr termos"( Ac. RP de 17/12/96, no Proc. 970/96 da 2ª secção (relator Gonçalves Vilar).
E tal afirmação, no que respeita ao processo executivo, é, por norma, compaginável com a ideia de que "a execução se encontra pendente enquanto não for julgada extinta" (Ac. RP de 05/06/90, in BMJ nº 398, pag. 581 (relator Martins da Costa).
Na verdade, "instância pendente é a proposta ou intentada que (não obstante poder estar suspensa, interrompida ou na situação de facto de parada) ainda não foi extinta por qualquer das modalidades previstas pela lei".((Ac. STJ de 12/03/91, no Proc. 80341 da 1ª secção (relator Beça Pereira).
E tal vem previsto no artº 919º do CPC.
Situação que não ocorre, portando, no caso sub júdice - em que apenas, e só, se suspendeu a execução durante o período de liquidação das prestações acordadas por exequente e executados.
Aliás, mesmo que se estivesse perante a situação em que tenha sido paga a quantia exequenda e, na sua sequência, seja ordenada a suspensão do processo e a sua remessa à conta para apuramento do valor da responsabilidade do executado, mesmo aqui não ocorreria ainda a extinção da execução, pois a aludida remessa à conta visava, precisamente, ser (pagas que estivessem as custas devidas) julgada extinta a execução. Ter-se-ia, sempre, que aguardar por uma operação contabilística para tanto necessária e destinada a pôr termo ao processo. A extinção da execução ficava, assim, sempre dependente do pagamento, pelos executados, das custas, da sua responsabilidade. 
Assim, só no caso dos executados procederem ao pagamento da dívida exe1quenda e das custas (artº 916º, nº1 CPC) é que se podia entender que a execução cessou, o que não acontecia no caso em que os executados se limitassem a comprovar que a quantia exequenda foi paga (art. 916º, nº 2), caso em que a execução apenas se consideraria suspensa, podendo prosseguir se as custas liquidadas não fossem satisfeitas. 
Só na altura em que for considerada a extinção da execução, nos termos do artº 919º-- com a prolação da respectiva sentença de extinção da execução--, termos a efectiva extinção da execução, sendo, então, ordenado o levantamento da penhora ali efectuada. 
Portanto, pendente que estava a execução, haveria que lançar mão do citado artº 885º do CPC, permitindo ao credor reclamante “requerer o prosseguimento da execução para satisfação do seu crédito”.
E, portanto, embora suspensa, a execução mantém-se pendente, só se verificando a sua extinção quando os executados procedam ao pagamento da quantia exequenda e custas da sua responsabilidade, o que significa, também, que o crédito reclamado terá que vir a ser, oportunamente, admitido, não se vendo qualquer razão para que fosse declarada “extinta a presente instância de reclamação de créditos por impossibilidade legal superveniente”.
Também no Ac. da Rel. do Porto, de 16.03.1999 (relator Mário Cruz) se defendeu que “I- Uma execução considera-se pendente desde o momento em que é instaurada até ao momento em que é julgada extinta.
II - Assim, ainda que a execução esteja parada ou tenha sido remetida à conta por inércia do exequente, deve a mesma considerar-se pendente para o efeito de permitir a reclamação de créditos nos termos do nº1 do artigo 871 do Código de Processo Civil.”].

Por outro lado, mesmo no caso do acordo de pagamento não ser cumprido e a execução vir a prosseguir - sendo, então, declarada a cessação da suspensão da execução--, como o agravante já foi citado para, na qualidade de credor inscrito, reclamar o seu crédito pelo produto da venda dos bens penhorados, mantendo-se válida tal citação, não poderia haver lugar a nova citação. E, por isso, também não podia a agravante voltar a reclamar o seu crédito hipotecário.

Dir-se-á: mas a agravante pode sempre instaurar nova execução para reaver o pagamento do seu crédito.
Só que, teria de proceder ao registo da penhora sobre o imóvel hipotecado e, então, tal execução seria sustada ao abrigo do disposto no artº 871º CPC - pois havia registo de penhora anterior (feita na presente execução) sobre o mesmo bem--, pelo que nessa nova execução seria proferido despacho a remeter a exequente - ora agravante - precisamente para a … presente execução (suspensa e, por isso, não extinta)!!
Teríamos, então, como que uma “pescadinha de rabo na boca”, que em nada adiantava ou satisfazia os interesses do ora reclamante.
Acrescente-se que -- como bem salienta a agravante, “havendo já caso julgado formal no que respeita ao despacho que ordena a citação dos credores com garantia real e tendo já ocorrido a citação da recorrente no âmbito do artº 864º, do C.P.C., tendo esta apresentado a sua reclamação de créditos e tendo a instância respectiva sido julgada extinta, não poderá a mesma reclamar, de novo, o seu crédito, vendo-se, pois, totalmente impedida de ser ressarcida do valor em dívida”.

Não pode ser!

Por isso - repete-se--, salvo o devido respeito por diferente opinião, a solução terá de ser a supra sugerida.
Poderá dizer-se que tal solução poderá eventualmente em perfeição não “encaixar” na letra da lei.
Porém, não só não vemos que assim seja - pelas razões supra explanadas--, como nunca se deve esquecer que, como ensinam A. Marques dos Santos, Lebre de Freitas e outros, 1997, 34, Aspectos do Novo Processo Civil, “O procedimento demasiado ritualizado e com efeitos preclusivos não permite atingir a justiça que se procura através do processo” - sublinhado nosso.
O que está em sintonia, v.g., com o facto de a reforma processual civil que o novo Código consubstancia, ter colocado o acento tónico na supremacia do direito substantivo sobre o processual, os princípios da cooperação e da descoberta da verdade material.
Só assim se logrará obter uma justiça que se quer acertada e célere.

Quod erat demonstrandum!

Terceira questão: se deveria o tribunal a quo ter proferido despacho a admitir liminarmente a reclamação da agravante e notificado esta para os efeitos do disposto no artº 885º do CPC (para que possa fazer prosseguir a execução) - ou se se impunha solução diferente da adoptada, e qual:

A solução a dar a esta questão já se encontra englobada na apreciação da questão anterior, que, por isso, nos dispensamos de repetir e para ela se remetendo.

Pelo exposto - embora com diferente fundamentação - procedem (no essencial) as conclusões das alegações do agravante.

CONCLUINDO:
O processo de reclamação e graduação de créditos é um verdadeiro processo declarativo de estrutura autónoma, embora funcionalmente subordinado ao processo executivo, e não um mero incidente da acção executiva.
Suspensa a instância executiva por ocorrer acordo de pagamento em prestações da dívida exequenda (ut artº 882º CPC), o facto de à data dessa suspensão ainda não estarem publicados os anúncios para citação dos credores desconhecido não constitui, só por si, obstáculo ao prosseguimento da reclamação de créditos, muito menos sendo fundamento para a extinção da instância de reclamação de créditos por impossibilidade legal superveniente desta lide. 
Face e para os efeitos do disposto no artº 885º do CPC, na redacção emergente do DL nº 38/2003, de 08.03, não é obstáculo ao impulso da execução pelo credor reclamante o facto de o seu crédito ainda não ter sido admitido, bastando que o crédito esteja vencido. 
O requerimento de prosseguimento da execução por parte do credor reclamante, nos termos do nº 1 do art. 885º C. Pr. Civil, tem de formulado, não a todo o tempo em que durar o plano de pagamento das prestações da dívida exequenda, mas no prazo de dez (10) dias a contar da notificação que para tal efeito àquele deve ser feita.


IV. DECISÃO:

Termos em que acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto em:
a) - conceder provimento ao recurso de agravo e, consequentemente,
b) - revogar o despacho recorrido que decidiu “Julgar extinta a instância de reclamação de créditos por impossibilidade legal superveniente …”, que deverá ser substituído por outro que notifique o credor reclamante -- ora agravante-- para, querendo, no prazo de dez dias, requerer o prosseguimento da execução para satisfação do seu crédito, ao abrigo do disposto no artº 885º do CPC, tudo nos termos e em conformidade com o sustentado supra - designadamente, para que seja ultrapassado o apelidado no despacho recorrido de “obstáculo incontornável ao prosseguimento do apenso de reclamação de créditos”, permitindo-se, oportunamente, além do mais, proceder à citação dos credores desconhecidos.

Sem custas do agravo.

Porto, 11 de Maio de 2006
Fernando Baptista Oliveira
José Manuel Carvalho Ferraz
Nuno Ângelo Rainho Ataíde das Neves

ACÓRDÃO NA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO I. RELATÓRIO: No Tribunal Judicial de Oliveira de Azeméis, …º Juízo, correm termos uns autos de execução ordinária instaurados, em 12.09.2003, pela B…… de Oliveira de Azeméis contra Ilídio Reis de Almeida e mulher C….., em que foi dado à execução um escrito particular de empréstimo feito por aquela a estes (cfr. doc. junto a fls. 3 dos autos de execução). No decurso da execução, veio a exequente nomear à penhora dois prédios urbanos propriedade dos executados, identificados no requerimento de fls. 19 da execução. Teve lugar a penhora dos aludidos imóveis (fls. 26 da execução). Os executados foram notificados do despacho que ordenou a penhora, bem assim da realização desta. A exequente junta aos autos certificado de registo da penhora e certidão dos ónus dos prédios penhorados, em conformidade com o artº 838º do CPC (docs. de fls. 38 a 41), da qual consta, além do mais, uma hipoteca voluntária a favor do Banco D….., SA, sobre um dos prédios urbanos penhorados na execução-- qual seja, o prédio composto por casa de habitação com rés-do-chão, anexos para arrumos, garagem e quintal, inscrito na matriz urbana sob o artº 359ºe descrito na Conservatória do Registo predial de Oliveira de Azeméis sob o nº 00119/251191--, para garantia do capital mutuado por aquela instituição de crédito aos executados no valor de 55.000.000$00, e respectivos juros (doc. de fls. 4 a 18 deste apenso). Mais requer a exequente o cumprimento do disposto no artº 864º do CPC. Junta a aludida certidão da penhora e dos ónus e encargos relativos aos prédios penhorados, o Mmº Juiz ordena se dê cumprimento ao disposto no artº 864º do CPC (fls. 45 da execução). Foram, então, enviados, em 09.12.2004, ao exequente os anúncios para citação dos credores desconhecidos, bem assim foi remetida ao supra referido credor Banco D…., SA carta de citação, expedida na mesma data de 09.12.2004, para, na qualidade de credor inscrito, reclamar, querendo, no prazo legal, o pagamento dos seus créditos pelo produto da venda dos bens penhorados, sobre que tenha garantia real, nos termos do disposto no artº 865º do CPC (cfr. fls. 50 e 51 da execução). No decurso do prazo de reclamações de crédito, veio, em 13.01.2005, o Banco D…., SA reclamar o seu crédito sobre os executados, relativo ao mútuo que lhes concedeu, identificado supra, sendo, em 17.01.2005, autuado o respectivo apenso à execução (cfr. “TERMO DE APENSAÇÃO” de fls. 67 da execução). Alegou a reclamante que a dívida se venceu, face ao incumprimento por parte dos mutuários. Na execução veio, entretanto, a exequente informar que chegara a acordo com os executados relativamente ao pagamento da dívida exequenda, requerendo a suspensão da execução “até integral cumprimento do acordo de pagamento em prestações…” (fls. 68 verso). Da mesma forma, em 7 de Abril de 2005 veio a exequente informar que, dado o acordo a que chegara com os executados, não chegou a publicar os anúncios para convocação de credores desconhecidos, aguardando o deferimento da suspensão da instância (cfr. fls. 71 da execução). Por despacho de fls. 76 da execução (datado de 12.04.2005) é proferido despacho a ordenar a suspensão da instância executiva “… até ao dia 1/3/2010” - sublinhado nosso. Concluso em 2005.06.07 o apenso de reclamação de créditos, é nesta data proferido o seguinte despacho: “Nos presentes autos, a Exequente não diligenciou pela publicação dos competentes anúncios com vista a proceder – se à citação dos credores desconhecidos – Art.º 864º, nº1, al. c) e 2) do C.P.C., em virtude de ter acordado com os executados um acordo de pagamento em prestações – vide: fls. 71 dos autos principais. A atitude das partes principais constituiu, por ora, um obstáculo incontornável ao prosseguimento do apenso de reclamação de créditos, por falta de citação dos restantes créditos com garantia real. E constituiu um obstáculo incontornável já que o propósito das partes de obterem a suspensão da execução pelo período de 10 semestres leva a que não se cumpriu, nem se pode vir a cumprir com a formalidade essencial destinada a chamar à instância os restantes credores. Destrate, considerado o estado dos autos de reclamação de créditos (o crédito reclamado ainda não foi objecto de despacho liminar, nem se efectuou a citação dos credores desconhecidos) constata – se haver uma impossibilidade legal superveniente no seu prosseguimento, por causa imputável às partes principais. Pelo exposto, decido: - Julgar extinta a instância de reclamação de créditos por impossibilidade legal superveniente nos termos previstos no art.º 287º, al. e) do C.P.C.. Custas a suportar pelas partes principais (exequente e executados). Registe e notifique, enviando – se cópia do acordo de pagamento em prestações à Credora Reclamante para melhor esclarecimento.” Inconformado com este despacho que julgou “extinta a instância de reclamação de créditos por impossibilidade legal superveniente”, veio dele recorrer o credor reclamante Banco D…., SA, apresentando alegações que remata com as seguintes CONCLUSÕES: “1) Vem o presente recurso interposto da sentença de fls 27 que julgou extinta a instância de reclamação de créditos por impossibilidade legal superveniente. 2) Muito embora o Mm° Juiz "a quo" não refira expressamente, na sentença em crise, a aplicação do arfo 885°, do C.P.C., é manifesto que ao afirmar que "(...) considerando o estado dos autos de reclamação de créditos (o crédito reclamado não foi objecto de despacho liminar (...)) constata-se haver uma impossibilidade legal superveniente no seu prosseguimento (...) ", a decisão proferida se fundamento no citado preceito legal, na redacção anterior ao Decreto-Lei n° 38/2003, de 8 de Março. 3) É, todavia, pacífico o entendimento de que à reclamação de créditos apresentada após a entrada em vigor da nova lei é aplicável esta mesma nova lei processual, razão pela qual deveria o Mm° Juiz "a quo", salvo o devido respeito, ter aplicado o disposto no n°1 do art° 885°, do C.P.C., na redacção dada pelo D.L. n° 38/2003, de 8 de Março e ordenado a notificação do Banco Reclamante, ora Recorrente, nos termos e para os efeitos do previsto naquele artigo, de acordo com o qual "Fica sem efeito a sustação da execução se algum credor reclamante, cujo crédito esteja vencido requerer o prosseguimento da execução para satisfação do seu crédito" - realçado nosso. Todavia, e sem prescindir, 4) Ao não ter proferido o despacho liminar de' admissão da reclamação de créditos da Recorrente no prazo legalmente estipulado - recorde-se que a mesma deu entrada em Tribunal no dia 12 de Janeiro de 2005 e a sentença recorrida data de 7 de Junho de 2005 - o Tribunal "a quo" violou, salvo o devido respeito, os art°s 156°, n° 1 e 160°, n° 1, do C.P.C, devendo esta sentença ser revoqada. 5) De acordo com os citados art°s 156°, n° 1 e 160°, n° 1, do C.P.C é dever do Mm° Juiz "a quo" solucionar a questão processual resultante da omissão do seu despacho (de admissão liminar) em vez de, pura e simplesmente, extinguir a instãncia. Ainda sem prescindir do alegado supra, 6) Mesmo no caso de se entender que a sentença recorrida não pode ser revogada e substituída por despacho de admissão liminar da reclamação de créditos apresentada pela Recorrente - o que apenas se admite por mera hipótese de raciocínio - ao abrigo do disposto no n° 1, do art° 885°, do C.P.C., na sua versão actual, impõe-se uma outra solução processual para a questão em apreço, diversa da plasmada na decisão recorrida, sob pena de a Recorrente ver totalmente precludido o seu direito de crédito. Isto porque: 7) Na hipótese de, por algum motivo (por exemplo em virtude do incumprimento do acordo de pagamento por parte dos Executados), vir a ser declarada a cessação da suspensão da execução, a Recorrente não será novamente citada no âmbito desta mesma acção, não podendo, por isso, voltar a reclamar o seu crédito hipotecário. 8) Mesmo que a Recorrente decidisse instaurar a competente acção executiva e no âmbito da mesma registasse a penhora sob o imóvel descrito na C.R.P. de Oliveira de Azeméis sob o n° 00119, iria deparar-se com o despacho de sustação dessa mesma execução, ao abrigo do disposto no artº 871, do C.P.C., sendo remetida, de novo, para os presentes autos. 9) Mas existindo já caso julgado formal no que respeita ao despacho que ordena a citação dos credores com garantia real e (i) tendo já ocorrido a citação da Recorrente no âmbito do art° 864°, do C.P.C., (ii) tendo esta apresentado a sua reclamação de créditos e (iii) tendo a instância respectiva sido julgada extinta, não poderá a mesma reclamar, de novo, o seu crédito, vendo-se, pois, totalmente impedida de ser ressarcida do valor em dívida. 10) Impõe-se que a sentença em crise seja revogada e substituída por despacho que admita liminarmente a reclamação de créditos da Recorrente por forma a que esta possa fazer prosseguir a execução, ultrapassando-se, assim, o "obstáculo incontornável" a que alude o Mm° Juiz "a quo" e que fundamentou a decisão de extinção da instância por impossibilidade legal superveniente ou, se assim não se entender, por despacho que dê sem efeito a citação da Recorrente efectuada nos termos e para os efeitos do disposto nos art°s 864° e 865°, do C.P.C., por forma a que esta possa vir a reclamar o seu crédito ao abrigo do preceituado no art° 871 °, do citado diploma. 11) A sentença recorrida viola os art°s 287°, al. e), 885°, n° 1, 156°, n° 1 e 160, n° 1, do Cód. Proc° Civil. Nestes termos e nos mais de direito que V.s Ex.°s muito doutamente suprirão: Deve ser por V.°s Ex.°s concedido provimento ao recurso e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida, nos termos supra expostos”. Não houve contra-alegações. O Mmº Juiz a quo limitou-se a um lacónico “mantenho o despacho..”. Foram colhidos os vistos. II. FUNDAMENTAÇÃO II. 1. AS QUESTÕES: Tendo presente que: - O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (arts. 684º, nº3 e 690º, nºs 1 e 3, do C. P. Civil); - Nos recursos se apreciam questões e não razões; - Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, as questões suscitadas pelo agravante são: - Lei aplicável ao “apenso” de reclamação de créditos; - Se a suspensão da instância executiva antes de estarem publicados os anúncios para citação dos credores desconhecidos, não só obsta ao prosseguimento da instância de reclamação de créditos, como constitui até fundamento para a sua extinção por impossibilidade legal superveniente desta lide. - Se deveria o tribunal a quo ter proferido despacho a admitir liminarmente a reclamação da agravante e notificado esta para os efeitos do disposto no artº 885º do CPC (para que possa fazer prosseguir a execução)-- ou se se impunha solução diferente da adoptada, e qual. II. 2. OS FACTOS: Os supra referidos, que nos dispensamos de repetir. III. O DIREITO: Vejamos, então, as questões suscitadas nas conclusões das alegações do agravante. Primeira questão: lei aplicável ao “apenso” de reclamação de créditos: Parece - embora o não refira o Mmº Juiz a quo de forma clara - que a decisão recorrida (fls. 27), ao referir que “… considerando no estado dos autos de reclamação de créditos (o crédito reclamado não foi objecto de despacho liminar (…)) constata-se haver uma impossibilidade legal superveniente no seu prosseguimento (…)”, se estribou na redacção do artº 885º, do CPC, anterior à reforma do processo civil operada pelo Dec.-lei nº 38/2003, de 8 de Março. Impõe-se, assim, antes de mais, ver qual a redacção das normas atinentes ao processo de execução aplicáveis ao apenso de reclamação de créditos. Adiantando solução, cremos que as normas aplicáveis aos autos são as decorrentes das alterações introduzidas ao processo de execução pelo aludido Dec.-Lei nº 38/2003, de 8 de Março, e não as que vigoravam antes da reforma operada por este Dec.-Lei ( cfr. artº 21º deste diploma e redacção que lhe foi dada pelo DL nº 199/2003, de 10.09). Como resulta da factualidade referida supra, se é certo que a execução foi instaurada em 12.09.2003, já a reclamação de créditos foi autuada em 17.01.2005 (cfr. fls. 67). Ora, dispõe o aludido artº 21º do DL nº 38/2003 que “as alterações ao Código de processo Civil, [….], só se aplicam nos ou relativamente aos processos instaurados a partir do dia 15 de Setembro de 2003”. A pergunta põe-se, então: Qual a natureza do apenso de reclamação de créditos: é um verdadeiro processo (autónomo), ou, antes, apenas um incidente do processo executivo? Se for mero incidente, teremos aplicáveis à situação sub judice as normas anteriores ao aludido DL nº 38/2003 aplicáveis ao processo de execução; se de verdadeiro processo se tratar, então teremos aplicáveis as normas do processo executivo aplicáveis à data da instauração deste “processo” (as decorrentes da alteração que aquele DL introduziu), pois a reclamação de créditos é posterior a 15.09.2003. Parece, salvo melhor opinião, que o processo de reclamação e graduação de créditos é um verdadeiro processo e não mero incidente da acção executiva. Com efeito, assim é designado por inúmeros autores, como pode ver-se em Prof. Alberto dos Reis (Proc. de Execução, II, pág. 267 - “já daqui se infere que o processo de verificação de créditos é, sob o ponto de vista formal, um verdadeiro processo ordinário ou sumário, que só difere destes na fase dos articulados”), Prof. Lebre de Freitas (A Acção executiva Depois da Reforma, pág. 317), Teixeira de Sousa (A acção Executiva Singular, pá. 338 - que fala em “Processo de reclamação”), Prof. Castro Mendes (Obras Completas, ed. Da AAFDL, III, pág. 448 - que usa por diversas vezes a palavra processo, designadamente ao falar em “Na marcha do processo de execução… podem enxertar-se quatro processos apensos declarativos”), Dr. Amâncio Ferreira (Curso de Processo de Execução, 2ª ed., a pág. 233 - que escreveu: “baseando a petição da reclamação de créditos um processo cível enxertado na execução”). Trata-se -- a execução e a reclamação de créditos --, com efeito, de processos perfeitamente diferenciados, que visam objectivos bem específicos e de certo modo autónomos - apenas se reencontrando na fase do pagamento. Assim, portanto, também para nós temos que a reclamação, verificação e graduação dos créditos se realiza numa acção declarativa - embora, é certo, de carácter incidental--, pois que todas as reclamações que forem deduzidas pelos vários credores são autuadas num único apenso - um novo processo -- ao processo de execução (art. 865º, nº 8, do C. Proc. Civil, na redacção actual) - ut Prof. Miguel Teixeira de Sousa, "ob. cit., Lisboa, 1998, pág. 341. E não é pelo facto de se tratar de uma acção que se caracteriza por visar directamente aos fins da execução, isto é, com uma índole instrumental e auxiliar desta -- o que lhe imprime configuração e regime em vários aspectos diversos do módulo normal dos processos declaratórios (Artur Anselmo de Castro, "A Acção Executiva Singular Comum e Especial", Coimbra, 1970, pag. 263) - que deixa de ser uma verdadeira acção declarativa. Diríamos, assim, com Prof. José Lebre de Freitas (A Acção Executiva à luz do Código Revisto", 2ª edição, Coimbra, 1997, págs. 258 e 259), que se trata de mais “um processo declarativo de estrutura autónoma, mas funcionalmente subordinado ao processo executivo". Assim sendo - isto é, assente que o processo de reclamação e graduação de créditos é um verdadeiro processo e não mero incidente da acção executiva -, e tendo em conta que se trata de processo instaurado “a partir de 15 de Setembro de 2003”, conclui-se que são aplicáveis ao caso sub judice as normas do processo executivo emergentes das alterações introduzidas pelo Dec.-Lei nº 38/2003, ut seu artº 21º. Veja-se, ainda, entre outros, o Ac. da Rel. de Lisboa, de 12.10.2000, in www.dgsi.pt, onde se escreveu que “à reclamação de créditos, [….], é-lhe aplicável a nova lei processual ainda que o processo executivo tenha sido instaurado ao abrigo do Código de Processo Civil”. Assim procede esta primeira questão. Segunda questão: se a suspensão da instância executiva mesmo antes de estarem publicados os anúncios para citação dos credores desconhecidos, não só obsta ao prosseguimento da instância de reclamação de créditos, como constitui até fundamento para a sua extinção por impossibilidade legal superveniente desta lide. Uma questão prévia: No seguimento do requerimento de fls. 68 da execução - onde se informa que “exequente e executados chegaram a um acordo e pagamento da quantia exequenda e respectivos juros, em prestações…” - foi ordenada a suspensão da instância executiva (fls. 76 da execução), “até ao dia 1/03/2010” - isto é, nos termos em que foi requerido, qual seja, “até integral cumprimento do acordo de pagamento em prestações conseguido”-- “dez prestações semestrais” - “sem prejuízo do prosseguimento da execução, nos termos legais e da cláusula 3ª” (“caso uma das prestações não seja pontualmente liquidada pelos executados”). Ora, a doutrina e a jurisprudência eram praticamente uniformes no sentido de que norma do artº279º CPC - que permite a suspensão da instância “por determinação do juiz” não era aplicável à acção executiva (cfr. Prof. Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, 3º, pág. 274, Cons. Rodrigues Bastos, Notas o Código de Processo Civil, II, pág. 45, P.G.A. Lopes do Rego, Comentários ao Código de processo Civil, 2ª ed., 281/282, e Acs. do STJ de 04/06/1980, BMJ 298º-232, de 14/01/1993, CJ, T1-59, e de 18/06/1996, CJ, T2-149, da R.L. de 08/04/2003, CJ, T2-113, da R.C. de 01/09/1999, BMJ 488º-416, da R.P. de 07/07/2003, CJ, T4-163, e da R.E. de 04/07/1996, CJ, T4-275). E isto era assim porque se entendia que, uma vez que a suspensão resultava de estar a decisão da causa dependente do julgamento de outra já proposta, parecia clara a sua inaplicabilidade ao processo de execução, em que não há que proferir decisão sobre o fundo da causa, visto o direito que se pretende efectivar já estar declarado. No entanto, já se não viam razões para advogar a inaplicabilidade do preceito no que respeita às fases declarativas que, por vezes, se enxertam no processo executivo (v. Cons. Rodrigues Bastos, ob. e local citados), como acontece no apenso de reclamação de créditos. Assim, portanto, já então se aceitava a aplicação do aludido preceito (artº 279º CPC) à reclamação de créditos. Importa realçar, contudo, que, independentemente de constituir uma faculdade do tribunal (“O tribunal pode ordenar…”, nos dizeres do preceito), embora não se trate de um poder a exercer arbitrariamente, o mesmo preceito pressupõe que não haja ainda decisão no processo dependente, como resulta expressamente da sua redacção, ao dizer que “O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão” (o realce é nosso) “da causa estiver dependente…”. Por isso, só existirá prejudicialidade e dependência quando na primeira se discuta, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta a título incidental. No entanto, com o acordo de pagamento introduzido no direito processual civil pela revisão de 1995-1996, pôs-se fim à aludida controvérsia - se seria lícito ao juiz suspender a acção executiva, com base no artº 279º-1 CPC (“motivo justificado”…). O Dec.-Lei nº 329-A/95 veio esclarecer essa dúvida, criando, para a suspensão da instância executiva com esse fundamento, um regime especial, liberto do prazo de seis meses por ele imposto com o limite temporal da suspensão do processo (declarativo ou executivo) por acordo das partes (ver Lopes do Rego, Comentário ao CPC…, artº 882-1). Assim, portanto, nada a censura à decisão do Mmº Juiz em suspender a instância executiva nos termos em que o fez. Vejamos, então, a questão suscitada. Entendeu o Mmº Juiz a quo que, estando suspensa a instância executiva - devido ao acordo de pagamento em prestações da dívida exequenda - o processo de reclamação de créditos não só não podia prosseguir, como até se impunha a extinção desta instância de reclamação de créditos, já que o crédito da reclamante ainda não foi objecto de despacho liminar e não foram publicados os anúncios para citação dos credores desconhecidos. Qui juris? Como vimos, são aplicáveis ao caso presente – ao processo de reclamação de créditos, ou melhor, ao destino que se lhe há-de dar - as normas do processo de execução emergentes das alterações que decorrem do supra aludido Dec.-Lei nº 38/2003. O que é de capital importância, desde logo atenta a redacção actual do artº 885º do CPC. Com efeito, dispõe-se no actual artº 885º do CPC: “(Tutela dos direitos dos restantes credores) 1 – Fica sem efeito a sustação da execução se algum credor reclamante, cujo crédito esteja vencido, requerer o prosseguimento da execução para satisfação do seu crédito. 2. No caso previsto no número anterior é notificado o exequente para, no prazo de 10 dias, declarar se: a) Desiste da garantia a que alude o nº 1 do artigo 883.º; b) Requer também o prosseguimento da execução para pagamento do remanescente do seu crédito, ficando sem efeito o pagamento em prestações acordado. 3. A notificação a que alude o número anterior é feita com a cominação de, nada dizendo o exequente, se entender que desiste da penhora já efectuada. 4. Desistindo o exequente da penhora, o requerente assume a posição de exequente, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto nos nºs 2 a 4 do artigo 920.º. 5 – O disposto nos números anteriores é aplicável quando o exequente e o executado acordem na suspensão da instância, nos termos do n.º 4 do artigo 279.º. Na redacção anterior prescrevia-se: “1. Fica sem efeito a sustação da execução se algum credor, cujo crédito esteja vencido e cuja reclamação haja sido admitida, requerer o prosseguimento da execução para satisfação do seu crédito ou se, no caso previsto no artigo 871.º, for apresentada reclamação nos 15 dias posteriores à notificação do despacho de sustação”. As diferenças de redacção entre a anterior norma e a actual estão, fundamentalmente, no facto de já se não exigir que a reclamação do crédito vencido tenha sido admitida para que o credor reclamante possa requerer o prosseguimento da execução, bem assim na introdução do nº 5 – prevendo expressamente a aplicabilidade dos nºs anteriores ao caso de ter ocorrido acordo de executado e exequente para suspensão da instância executiva (artº 279º, nº4 CPC). Daqui logo se vê que, ao contrário do que se consignou no despacho recorrido, o facto de o crédito reclamado ainda não ter sido “objecto de despacho liminar” só por si não constitui – agora - entrave à tutela dos direitos dos restantes credores, in casu ao direito de prosseguimento da execução a impulso do reclamante/ora agravante. Aliás, - como bem salienta o agravante - mesmo que fosse aplicável a anterior redacção do artº 885º do CPC, não se vê como podia ser o reclamante penalizado pelo facto de ainda não ter sido proferido despacho liminar a admitir a reclamação, quando a mesma foi deduzida em 13.01.2005 e só em 07.06.2005 é prolatado o primeiro despacho nesse apenso - precisamente o despacho ora em crise! Veja-se que o despacho a ordenar o cumprimento do artº 864º do CPC foi proferido em 6.12.2004 e logo em 9.12.2004 foram enviados ao mandatário da exequente os anúncios para publicação (cfr. fls. 45 e 50). Assim sendo, não se compreende que os autos permaneçam em “banho Maria” durante meses sem qualquer actividade do exequente -- só passados mais de 3 meses sobre o envio dos anúncios é que o exequente vem aos autos dar sinal de vida, mas, mesmo aí, ainda não para informar que diligenciou pela publicação dos anúncios, mas apenas e só dar conta das diligências que tem feito com o executado no sentido de obter um acordo de pagamento da dívida exequenda! (fls. 68 da execução). Veja-se, também, que só em 15.03.2005 o Mmº Juiz deu prazo (de dez dias) ao exequente para publicar os anúncios em falta (fs. 69), ao que este se limitou a responder (em 7.04.2005- fls. 71) que ainda o não fez porque estava a “… negociar a forma de pagamento da dívida”! O certo é que só em 02.06.2005 é proferido despacho a suspender a instância executiva ( fls. 76). Mas de anúncios… nada - em manifesto desrespeito dos interesses dos credores desconhecidos que tenham créditos sobre os executados e os pretendam reclamar aqui. Não vemos que o Mmº Juiz a quo tenha sido diligente para que os anúncios fossem atempadamente publicados, providenciando pelo “andamento regular e célere do processo, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da acção” ( artº 265º, nº1 CPC). E da mesma forma, também é patente a passividade do exequente, não actuando em conformidade com o princípio da cooperação que vem previsto no artº 266º do mesmo CPC. E por tudo isso, a reclamação encontra-se na “estaca zero”. E é precisamente com base nesse mesmo estado da reclamação de créditos - que só ao tribunal e à exequente parece ser imputado - que no despacho recorrido se fundamenta a “impossibilidade legal superveniente” no prosseguimento da reclamação, invocando-se a não publicação dos aludidos anúncios como um “obstáculo incontornável ao prosseguimento do apenso de reclamação de créditos” ! Repete-se: se os anúncios não foram atempadamente publicados, tal se deve apenas e só ao tribunal e … à exequente. E, como tal, não parece justo que as consequências de tal inacção devam ser suportadas pelo credor reclamante, ora agravante, que reclamou o seu crédito tempestiva e de forma correcta. Como vimos, perante a actual redacção do artº 885º do CPC, não é obstáculo ao impulso da execução pelo credor reclamante o facto de o seu crédito ainda não ter sido admitido, bastando que o crédito esteja vencido. Saliente-se que o novo nº 5 desse normativo teve o cuidado de prever expressamente que o aludido prosseguimento da execução possa ter lugar “quando o exequente e o executado acordem na suspensão da instância, nos termos do nº4 do artº 279º” do mesmo Código. É precisamente a situação ora em apreciação (cfr. fls. 68 e verso da execução - o requerimento foi subscrito por exequente e executados). Um óbice parece opor-se, porém, relativamente ao crédito do credor reclamante, ora agravante. É um facto que, como, a partir da reclamação de créditos (artº 865º CPC), há que atender também ao interesse dos credores reclamantes, o nº 1 do artº 885º confere ao credor que reclamou crédito vencido (artº 865º, nº7) o direito de prosseguir com a execução para sua satisfação. E cremos que essa manifestação de vontade do credor deve ter lugar no prazo de 10 dias ( artº 153º), contados da notificação que para o efeito é feita aos credores que já tenham reclamado, ao abrigo do nº 2 ou do nº 3 do artº 865º. No entanto, como escreve Lebre de Freitas, CPC Anotado, em anotação ao artº 885º, aqui em apreciação - já na actual redacção --, “outro tanto se diria dos credores que tenham garantia real sobre o bem concreto penhorado (mas já não dos que gozam de privilégio mobiliário geral), se a função da reclamação de créditos não fosse determinada pela extinção, pela venda executiva, dos direitos reais de garantia, […], não postos em crise quando a execução se suspende à espera do pagamento que a extinguirá: não jogando aqui a mesma razão de urgência invocável pelo credor que tenha obtido a segunda penhora e se veja impedido, por via do artº 871º, de prosseguir com a execução, a reclamação de novos créditos não pode ter lugar na pendência da suspensão (artº 283º-1).”. Isto é, como os direitos reais de garantia se extinguem com a venda executiva do bem penhorado (sobre que incidem tais direitos reais), não ocorrendo tal venda, obviamente que tal perigo para o credor reclamante que disponha dessa garantia não existe. É precisamente o caso presente, em que a execução apenas se suspendeu. Aqui o seu direito real de garantia não é afectado. Manter-se-ia em “banho-maria” à espera do prosseguimento da execução, caso o acordo de pagamento não fosse cumprido. No entanto, cremos que as coisas no caso sub judice não devem ficar por aqui. Com efeito, o mesmo autor, em anotação ao mesmo artigo, acrescenta: “A tutela do interesse dos credores leva o nº 5 a estender o regime dos números anteriores ao acordo de suspensão da instância executiva celebrado ao abrigo do artº 279º-4”. E continua: “… havia igualmente que acautelar o interesse dos credores reclamantes. É que, embora a reclamação de créditos tenha por função permitir a transmissão dos bens penhorados livres dos direitos reais de garantia que os onerem (…), há que atender a que não podem ser prejudicados pelo acordo entre exequente e executado os credores que, à data da suspensão, já tenham reclamado,” - mesmo que o seu crédito ainda não tenha sido admitido - “bem como aqueles que, por se verem impossibilitados de, em execução própria, executar os bens sobre os quais têm garantia ( visto se encontrarem já penhorados), se vêm forçados a reclamar na execução, para satisfação do seu crédito”. Os sublinhados são nossos. Portanto, uma vez que o agravante - mesmo munido da garantia real-- já tinha reclamado o seu crédito à data da suspensão, não pode ser prejudicado pelo acordo entre exequente e executados. Por isso, cremos que a solução correcta a adoptar é notificar o credor reclamante – ora agravante-- para, no prazo de 10 dias [A questão do prazo para requerer o prosseguimento da execução pode gerar alguma controvérsia. Com efeito, perante a redacção do artº 885º pode pensar-se que o credor reclamante pode durante todo o tempo em que durar o plano de pagamento da dívida acordado entre exequente e executado requerer tal prosseguimento da execução. Este entendimento foi sufragado, v.g., pelo Ac. da Rel. do Porto de 26 de Abril de 2005 (relator Alberto de Jesus Sobrinho), in www.dgsi.pt. Mas foi-o antes da entrada em vigor do Dec.-Lei nº 38/2003. Ora, por um lado, no anterior artº 885º exigia-se, para poder ser requerido o prosseguimento da execução pelo credor reclamante, que a sua reclamação tivesse sido admitida (ut nº1) - o que não é exigido actualmente (redacção do DL 38/2003 - que se basta com o facto de o crédito estar “vencido”. Ou seja, antes era mais restrito o campo da admissibilidade da aludida possibilidade de requerer-se o prosseguimento da execução. Ora, se já se abriu o leque dos credores reclamantes que podem requerer o prosseguimento da execução, cremos que igualmente se justificará agora algum limite temporal ao requerimento que podem fazer. Por outro lado - e na senda do aqui defendido--, vê-se que essa limitação temporal foi expressamente consagrada no caso da renovação da execução extinta por banda do credor reclamante, fixando-se, agora, o prazo de 10 dias para esse efeito, como se vê da nova redacção do artº 920º, nº2 CPC ( a lei fala em “dez dias a contar da notificação da extinção da execução”). Limitação essa que não existia na anterior redacção do citado artº885º, onde se previa a possibilidade de ser requerida a renovação da execução pelo credor reclamante “até ao trânsito da sentença que declarou extinta a execução”. Não vemos, agora, razão para que, à semelhança do que ocorre no artigo 920º, também na situação prevista no artº 885º não deva ter lugar um prazo para que o credor reclamante, “cujo crédito esteja vencido” possa vir requerer o prosseguimento da execução para satisfação do seu crédito. Veja-se, ainda, que o citado Dec.-Lei nº 83/2003 introduziu um nº 5 ao mesmo artº 885º, dispondo que “o disposto nos números anteriores é aplicável quando o exequente e o executado acordem na suspensão da instância, nos termos do nº 4 do artº 279º” - pelo que, então, por aplicação, com as devida adaptações, dos nºs 2 e 3 do mesmo normativo, o prazo de 10 dias ali referido após a “notificação do exequente”, funcionará para o reclamante.] (ut artº 153º CPC), requerer, querendo, o prosseguimento da execução, seguindo-se, então, os demais termos previstos no mesmo artº 885º, maxime nºs 2 e 3. Dito de outra forma, entendemos que o requerimento de prosseguimento da execução por parte do credor reclamante, nos termos do nº 1 do art. 885º C.Pr.Civil, tem de ser feito, não a todo o tempo em que durar o plano de pagamento das prestações da dívida exequenda, mas, sim, no prazo de dez (10) dias a contar da notificação que para tal efeito lhe deve ser feita. E assim sempre podia ser ultrapassado o “obstáculo incontornável” (?!) de que fala o despacho recorrido, mais não fosse, assumindo o reclamante a posição de exequente, providenciando, então, ele próprio pela publicação dos anúncios em falta ( ver nº 4 do artº 885º). O que não parece curial é obrigar-se o reclamante a permanecer inactivo-- diríamos mesmo “amarrado”--, à espera que o longo período de tempo (cinco anos !) do acordo de pagamento decorresse para, só então, ver prosseguir a sua pretensão! Aliás, parece que a solução aqui propugnada até se impõe por outra razão - de que bem faz eco o agravante. Efectivamente, a manter-se a extinção do processo de reclamação de créditos, nos termos do despacho recorrido, obviamente que ficava o reclamante impedido de ver satisfeito o seu crédito pelo produto dos bens penhorados - o que esvaziaria o valor da garantia real. E era assim, tivesse lugar, ou não, o cumprimento do acordo. Efectivamente, por um lado, porque se declarou extinta a instância nesse apenso de reclamação, já nem, sequer, podia o reclamante lançar mão do artº 920º CPC [Anote-se que, face ao supra explanado - em que se considerou o processo de reclamação de créditos como dependente da acção executiva, tendente a abranger o pagamento dos créditos reclamados pelo produto da venda executiva--, inequívoca é a conclusão de que as reclamações apenas poderão ser deduzidas se e enquanto a execução em que são deduzidas estiver pendente (Cfr. Ac. RP de 21/07/83, in CJ Ano VIII, 4, pag. 230 (relator Flávio Ferreira). Se, porventura, a execução já se não encontra a correr termos, isto é, já se não mostra pendente, encontrando-se extinta, pode o credor reclamante fazer uso do disposto no artº 920º, nº2 do CPC. Interessará saber quando deve considerar-se pendente -- nomeadamente para os efeitos do artigo 871º do C.Proc.Civil-- a execução - designadamente aquela que foi sustada pelo pagamento da quantia exequenda e remetida à conta. Numa apreciação apriorística parece dever sustentar-se que "execução pendente equivale a execução a correr termos"( Ac. RP de 17/12/96, no Proc. 970/96 da 2ª secção (relator Gonçalves Vilar). E tal afirmação, no que respeita ao processo executivo, é, por norma, compaginável com a ideia de que "a execução se encontra pendente enquanto não for julgada extinta" (Ac. RP de 05/06/90, in BMJ nº 398, pag. 581 (relator Martins da Costa). Na verdade, "instância pendente é a proposta ou intentada que (não obstante poder estar suspensa, interrompida ou na situação de facto de parada) ainda não foi extinta por qualquer das modalidades previstas pela lei".((Ac. STJ de 12/03/91, no Proc. 80341 da 1ª secção (relator Beça Pereira). E tal vem previsto no artº 919º do CPC. Situação que não ocorre, portando, no caso sub júdice - em que apenas, e só, se suspendeu a execução durante o período de liquidação das prestações acordadas por exequente e executados. Aliás, mesmo que se estivesse perante a situação em que tenha sido paga a quantia exequenda e, na sua sequência, seja ordenada a suspensão do processo e a sua remessa à conta para apuramento do valor da responsabilidade do executado, mesmo aqui não ocorreria ainda a extinção da execução, pois a aludida remessa à conta visava, precisamente, ser (pagas que estivessem as custas devidas) julgada extinta a execução. Ter-se-ia, sempre, que aguardar por uma operação contabilística para tanto necessária e destinada a pôr termo ao processo. A extinção da execução ficava, assim, sempre dependente do pagamento, pelos executados, das custas, da sua responsabilidade. Assim, só no caso dos executados procederem ao pagamento da dívida exe1quenda e das custas (artº 916º, nº1 CPC) é que se podia entender que a execução cessou, o que não acontecia no caso em que os executados se limitassem a comprovar que a quantia exequenda foi paga (art. 916º, nº 2), caso em que a execução apenas se consideraria suspensa, podendo prosseguir se as custas liquidadas não fossem satisfeitas. Só na altura em que for considerada a extinção da execução, nos termos do artº 919º-- com a prolação da respectiva sentença de extinção da execução--, termos a efectiva extinção da execução, sendo, então, ordenado o levantamento da penhora ali efectuada. Portanto, pendente que estava a execução, haveria que lançar mão do citado artº 885º do CPC, permitindo ao credor reclamante “requerer o prosseguimento da execução para satisfação do seu crédito”. E, portanto, embora suspensa, a execução mantém-se pendente, só se verificando a sua extinção quando os executados procedam ao pagamento da quantia exequenda e custas da sua responsabilidade, o que significa, também, que o crédito reclamado terá que vir a ser, oportunamente, admitido, não se vendo qualquer razão para que fosse declarada “extinta a presente instância de reclamação de créditos por impossibilidade legal superveniente”. Também no Ac. da Rel. do Porto, de 16.03.1999 (relator Mário Cruz) se defendeu que “I- Uma execução considera-se pendente desde o momento em que é instaurada até ao momento em que é julgada extinta. II - Assim, ainda que a execução esteja parada ou tenha sido remetida à conta por inércia do exequente, deve a mesma considerar-se pendente para o efeito de permitir a reclamação de créditos nos termos do nº1 do artigo 871 do Código de Processo Civil.”]. Por outro lado, mesmo no caso do acordo de pagamento não ser cumprido e a execução vir a prosseguir - sendo, então, declarada a cessação da suspensão da execução--, como o agravante já foi citado para, na qualidade de credor inscrito, reclamar o seu crédito pelo produto da venda dos bens penhorados, mantendo-se válida tal citação, não poderia haver lugar a nova citação. E, por isso, também não podia a agravante voltar a reclamar o seu crédito hipotecário. Dir-se-á: mas a agravante pode sempre instaurar nova execução para reaver o pagamento do seu crédito. Só que, teria de proceder ao registo da penhora sobre o imóvel hipotecado e, então, tal execução seria sustada ao abrigo do disposto no artº 871º CPC - pois havia registo de penhora anterior (feita na presente execução) sobre o mesmo bem--, pelo que nessa nova execução seria proferido despacho a remeter a exequente - ora agravante - precisamente para a … presente execução (suspensa e, por isso, não extinta)!! Teríamos, então, como que uma “pescadinha de rabo na boca”, que em nada adiantava ou satisfazia os interesses do ora reclamante. Acrescente-se que -- como bem salienta a agravante, “havendo já caso julgado formal no que respeita ao despacho que ordena a citação dos credores com garantia real e tendo já ocorrido a citação da recorrente no âmbito do artº 864º, do C.P.C., tendo esta apresentado a sua reclamação de créditos e tendo a instância respectiva sido julgada extinta, não poderá a mesma reclamar, de novo, o seu crédito, vendo-se, pois, totalmente impedida de ser ressarcida do valor em dívida”. Não pode ser! Por isso - repete-se--, salvo o devido respeito por diferente opinião, a solução terá de ser a supra sugerida. Poderá dizer-se que tal solução poderá eventualmente em perfeição não “encaixar” na letra da lei. Porém, não só não vemos que assim seja - pelas razões supra explanadas--, como nunca se deve esquecer que, como ensinam A. Marques dos Santos, Lebre de Freitas e outros, 1997, 34, Aspectos do Novo Processo Civil, “O procedimento demasiado ritualizado e com efeitos preclusivos não permite atingir a justiça que se procura através do processo” - sublinhado nosso. O que está em sintonia, v.g., com o facto de a reforma processual civil que o novo Código consubstancia, ter colocado o acento tónico na supremacia do direito substantivo sobre o processual, os princípios da cooperação e da descoberta da verdade material. Só assim se logrará obter uma justiça que se quer acertada e célere. Quod erat demonstrandum! Terceira questão: se deveria o tribunal a quo ter proferido despacho a admitir liminarmente a reclamação da agravante e notificado esta para os efeitos do disposto no artº 885º do CPC (para que possa fazer prosseguir a execução) - ou se se impunha solução diferente da adoptada, e qual: A solução a dar a esta questão já se encontra englobada na apreciação da questão anterior, que, por isso, nos dispensamos de repetir e para ela se remetendo. Pelo exposto - embora com diferente fundamentação - procedem (no essencial) as conclusões das alegações do agravante. CONCLUINDO: O processo de reclamação e graduação de créditos é um verdadeiro processo declarativo de estrutura autónoma, embora funcionalmente subordinado ao processo executivo, e não um mero incidente da acção executiva. Suspensa a instância executiva por ocorrer acordo de pagamento em prestações da dívida exequenda (ut artº 882º CPC), o facto de à data dessa suspensão ainda não estarem publicados os anúncios para citação dos credores desconhecido não constitui, só por si, obstáculo ao prosseguimento da reclamação de créditos, muito menos sendo fundamento para a extinção da instância de reclamação de créditos por impossibilidade legal superveniente desta lide. Face e para os efeitos do disposto no artº 885º do CPC, na redacção emergente do DL nº 38/2003, de 08.03, não é obstáculo ao impulso da execução pelo credor reclamante o facto de o seu crédito ainda não ter sido admitido, bastando que o crédito esteja vencido. O requerimento de prosseguimento da execução por parte do credor reclamante, nos termos do nº 1 do art. 885º C. Pr. Civil, tem de formulado, não a todo o tempo em que durar o plano de pagamento das prestações da dívida exequenda, mas no prazo de dez (10) dias a contar da notificação que para tal efeito àquele deve ser feita. IV. DECISÃO: Termos em que acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto em: a) - conceder provimento ao recurso de agravo e, consequentemente, b) - revogar o despacho recorrido que decidiu “Julgar extinta a instância de reclamação de créditos por impossibilidade legal superveniente …”, que deverá ser substituído por outro que notifique o credor reclamante -- ora agravante-- para, querendo, no prazo de dez dias, requerer o prosseguimento da execução para satisfação do seu crédito, ao abrigo do disposto no artº 885º do CPC, tudo nos termos e em conformidade com o sustentado supra - designadamente, para que seja ultrapassado o apelidado no despacho recorrido de “obstáculo incontornável ao prosseguimento do apenso de reclamação de créditos”, permitindo-se, oportunamente, além do mais, proceder à citação dos credores desconhecidos. Sem custas do agravo. Porto, 11 de Maio de 2006 Fernando Baptista Oliveira José Manuel Carvalho Ferraz Nuno Ângelo Rainho Ataíde das Neves