Processo:0613234
Data do Acordão: 13/06/2006Relator: ÂNGELO MORAISTribunal:trp
Decisão: Meio processual:

No processo penal não pode ser deduzido pedido de indemnização civil com base em facto não constante da acusação.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Processo
0613234
Relator
ÂNGELO MORAIS
Descritores
PRINCÍPIO DA ADESÃO
No do documento
Data do Acordão
06/14/2006
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
REC PENAL.
Decisão
REJEITADO O RECURSO.
Sumário
No processo penal não pode ser deduzido pedido de indemnização civil com base em facto não constante da acusação.
Decisão integral
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto:

Nos autos de processo comum singular n°…/04..GDSTS, que correm termos no .º juízo criminal de Santo Tirso e aquando do seu saneamento, foi na oportunidade proferido o seguinte despacho:  

“I - O processo é próprio.
Inexistem nulidades, excepções, questões prévias ou incidentais que obstem ao conhecimento do mérito da acção penal.

II - Registe e autue como processo comum para julgamento com intervenção do tribunal singular.
III – Recebo a acusação deduzida pelo Ministério Público contra o(a)(s) arguido(a)(s) B………., pelos factos descritos a fls. 189 e segs. dos autos, subsumíveis ao(s) tipo(s) legal(ais) de crime mencionado(s) naquela peça processual, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido nos termos e para os efeitos do disposto no art. 313.º, nº1, al. a) do Código de Processo Penal.

VI – Pedidos cíveis:

1. Pedido formulado por C………. a fls. 250 e segs.:
Veio C………. deduzir pedido de indemnização civil contra a Companhia de Seguros X………. e B………., pelos fundamentos constantes de fls. 250 a 253.
O artº71.º do Código de Processo Penal estabelece que o direito à indemnização pelas perdas e danos ocasionados com a prática de um crime pode ser exercido no processo penal, pela adesão da acção civil à acção penal.
Pressuposto da formulação do pedido de indemnização, no processo penal, é, portanto, que quem o deduz seja um lesado, entendendo-se como tal a pessoa que tenha sofrido, por efeito de crime objecto da acusação, danos patrimoniais ou não patrimoniais que mereçam a tutela do direito (cfr. art. 74º do Código de Processo Penal).
Ora, a acusação proferida nos presentes autos consubstancia apenas actuação criminosa do arguido B………. relativa a outras pessoas que não o supra referido demandante, não sendo àquele imputado qualquer crime que tenha por lesado tal demandante.
Inexiste, assim, atento o teor da acusação, um nexo de causalidade entre os factos ilícitos criminosos objecto dos presentes autos e aqueles que fundamentam o pedido do demandante C………. contra o aludido arguido e a Companhia de Seguros X………. .
Pelo exposto, ao abrigo do disposto pelo art. 71.º do Código de Processo Penal, indefere-se liminarmente o pedido de indemnização civil deduzido por C………. .
Notifique”.

*

Inconformado, interpõe o requerente C………. o presente recurso, concluindo:

1- A Lei é clara quando define o lesado como a pessoa que sofreu danos ocasionados pelo crime, mesmo que não possa constituir-se assistente (n°1 do artº74°do CPP). 
2- E, ao contrário do que defende o Mmo Juiz “a quo”, não faz depender, expressa ou implicitamente, que a lesão conste do texto da acusação mas tão só que decorra do crime pelo qual é acusado o arguido. 
3- De outra forma, o demandante civil sempre ficaria dependente de o Ministério Público ter conhecimento, no decurso do inquérito, da totalidade das lesões causadas e de todos os sujeitos afectados pela prática do crime. 
4- Não é a interpretação plasmada no Douto Despacho recorrido que decorre da leitura dos preceitos legais que regulamentam o instituto em apreço.  
5- Os requisitos para a formulação do pedido de indemnização civil por parte do recorrente encontram-se devidamente preenchidos: As lesões sofridas pelo demandante e devidamente alegadas e a prática de um crime pelo arguido que as provocou. 
6- Independentemente e salvo melhor opinião de tais lesões serem referidas na acusação. 
7- Como defende o Prof. Figueiredo Dias, como lesado deve ser considerada toda a pessoa que, segundo as normas do Direito Civil, tenha sido prejudicada em interesses seus juridicamente protegidos, desta perspectiva se alcançando um conceito lato ou extensivo de ofendido, que abrangerá todas as pessoas civilmente lesadas pela infracção penal (Direito Processual Penal, volº1º, 508-509). 
8- Lesado, para efeitos da formulação do pedido de indemnização civil, será aquele que, perante o Direito Processual Civil, tiver legitimidade para formular tal pedido. 
9- Tal não poderá deixar de ser o caso do demandante recorrente. 
10- A legitimidade do recorrente advém do disposto na al c) do n°1 do artº401°do CPP. 
11- O Douto Despacho recorrido violou entre outras as disposições dos art°s71 ° e 74°, ambos do CPP. 
12- Porquanto, a sua interpretação deveria ter sido no sentido da admissão do pedido formulado».

*
 
Não houve resposta.


*
 
O tribunal sustentou a decisão.


*

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir, sendo determinado o âmbito do recurso pelas questões suscitadas, pelo recorrente, nas respectivas conclusões, no caso restritas à matéria de direito. 

O presente recurso é manifestamente improcedente, nos rigorosos e precisos termos e pelos fundamentos de facto e de direito vertidos no despacho recorrido que, inquestionavelmente não merece o ínfimo reparo.

Na verdade e como nele se diz, “pressuposto da formulação do pedido de indemnização, no processo penal, é, portanto, que quem o deduz seja um lesado, entendendo-se como tal a pessoa que tenha sofrido, por efeito de crime objecto da acusação, danos patrimoniais ou não patrimoniais que mereçam a tutela do direito (cfr. art. 74° do Código de Processo Penal). Ora, a acusação proferida nos presentes autos consubstancia apenas actuação criminosa do arguido Jorge Pinto relativa a outras pessoas que não o supra referido demandante, não sendo àquele imputado qualquer crime que tenha por lesado tal demandante”. 

Ora, compulsados os autos e concretamente a acusação deduzida pelo Ministério Público contra o arguido B………., nesta não lhe é imputada qualquer crime por ofensas à integridade física na pessoa do recorrente, nem ao menos qualquer lesão por este sofrida em consequência do acidente de viação em que este esteve envolvido.

Daí que nos termos do artº71º do Cód. Proc. Penal, sendo a prática de uma infracção criminal possível fundamento de duas pretensões contra os seus agentes, objectivadas na aplicação de uma pena e no pagamento de uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais conexos àquela e por ela causados, é inequívoca a sua íntima conexão e fundamento, necessariamente na prática de um crime, sem o que sucumbe a referida pretensão civilista.
 
Como conclui o recorrente, «a lei é clara quando define o lesado como a pessoa que sofreu danos ocasionados pelo crime, mesmo que não possa constituir-se assistente (nº1 do artº74º do CPP)».

Possivelmente o recorrente confunde a sua eventual legitimidade processual civil activa, com a legitimidade processual civil passiva plasmada no artº73º do Cód. Proc. Penal e quanto à intervenção voluntária no processo penal de pessoas com responsabilidade meramente civil, só assim se compreendendo o presente recurso e a sua manifesta e espelhada passividade ante a acusação deduzida nos autos…        

A manifesta improcedência do presente recurso conduz inevitavelmente á sua rejeição, nos escorreitos termos do artº420º nº1 e nº3 do Cód. Proc. Penal.

Decisão:

Acordam os Juízes, desta Relação, em rejeitar o presente recurso, por sua manifesta improcedência.

Vai o recorrente condenado no mínimo de taxa de justiça, sem prejuízo do apoio judiciário eventualmente concedido e ainda no pagamento da importância de três UCs – ut artº420º nº4 do CPP.

Porto, 14 de Junho de 2006
Ângelo Augusto Brandão Morais
José Carlos Borges Martins
João Inácio Monteiro

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto: Nos autos de processo comum singular n°…/04..GDSTS, que correm termos no .º juízo criminal de Santo Tirso e aquando do seu saneamento, foi na oportunidade proferido o seguinte despacho: “I - O processo é próprio. Inexistem nulidades, excepções, questões prévias ou incidentais que obstem ao conhecimento do mérito da acção penal. II - Registe e autue como processo comum para julgamento com intervenção do tribunal singular. III – Recebo a acusação deduzida pelo Ministério Público contra o(a)(s) arguido(a)(s) B………., pelos factos descritos a fls. 189 e segs. dos autos, subsumíveis ao(s) tipo(s) legal(ais) de crime mencionado(s) naquela peça processual, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido nos termos e para os efeitos do disposto no art. 313.º, nº1, al. a) do Código de Processo Penal. VI – Pedidos cíveis: 1. Pedido formulado por C………. a fls. 250 e segs.: Veio C………. deduzir pedido de indemnização civil contra a Companhia de Seguros X………. e B………., pelos fundamentos constantes de fls. 250 a 253. O artº71.º do Código de Processo Penal estabelece que o direito à indemnização pelas perdas e danos ocasionados com a prática de um crime pode ser exercido no processo penal, pela adesão da acção civil à acção penal. Pressuposto da formulação do pedido de indemnização, no processo penal, é, portanto, que quem o deduz seja um lesado, entendendo-se como tal a pessoa que tenha sofrido, por efeito de crime objecto da acusação, danos patrimoniais ou não patrimoniais que mereçam a tutela do direito (cfr. art. 74º do Código de Processo Penal). Ora, a acusação proferida nos presentes autos consubstancia apenas actuação criminosa do arguido B………. relativa a outras pessoas que não o supra referido demandante, não sendo àquele imputado qualquer crime que tenha por lesado tal demandante. Inexiste, assim, atento o teor da acusação, um nexo de causalidade entre os factos ilícitos criminosos objecto dos presentes autos e aqueles que fundamentam o pedido do demandante C………. contra o aludido arguido e a Companhia de Seguros X………. . Pelo exposto, ao abrigo do disposto pelo art. 71.º do Código de Processo Penal, indefere-se liminarmente o pedido de indemnização civil deduzido por C………. . Notifique”. * Inconformado, interpõe o requerente C………. o presente recurso, concluindo: 1- A Lei é clara quando define o lesado como a pessoa que sofreu danos ocasionados pelo crime, mesmo que não possa constituir-se assistente (n°1 do artº74°do CPP). 2- E, ao contrário do que defende o Mmo Juiz “a quo”, não faz depender, expressa ou implicitamente, que a lesão conste do texto da acusação mas tão só que decorra do crime pelo qual é acusado o arguido. 3- De outra forma, o demandante civil sempre ficaria dependente de o Ministério Público ter conhecimento, no decurso do inquérito, da totalidade das lesões causadas e de todos os sujeitos afectados pela prática do crime. 4- Não é a interpretação plasmada no Douto Despacho recorrido que decorre da leitura dos preceitos legais que regulamentam o instituto em apreço. 5- Os requisitos para a formulação do pedido de indemnização civil por parte do recorrente encontram-se devidamente preenchidos: As lesões sofridas pelo demandante e devidamente alegadas e a prática de um crime pelo arguido que as provocou. 6- Independentemente e salvo melhor opinião de tais lesões serem referidas na acusação. 7- Como defende o Prof. Figueiredo Dias, como lesado deve ser considerada toda a pessoa que, segundo as normas do Direito Civil, tenha sido prejudicada em interesses seus juridicamente protegidos, desta perspectiva se alcançando um conceito lato ou extensivo de ofendido, que abrangerá todas as pessoas civilmente lesadas pela infracção penal (Direito Processual Penal, volº1º, 508-509). 8- Lesado, para efeitos da formulação do pedido de indemnização civil, será aquele que, perante o Direito Processual Civil, tiver legitimidade para formular tal pedido. 9- Tal não poderá deixar de ser o caso do demandante recorrente. 10- A legitimidade do recorrente advém do disposto na al c) do n°1 do artº401°do CPP. 11- O Douto Despacho recorrido violou entre outras as disposições dos art°s71 ° e 74°, ambos do CPP. 12- Porquanto, a sua interpretação deveria ter sido no sentido da admissão do pedido formulado». * Não houve resposta. * O tribunal sustentou a decisão. * Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir, sendo determinado o âmbito do recurso pelas questões suscitadas, pelo recorrente, nas respectivas conclusões, no caso restritas à matéria de direito. O presente recurso é manifestamente improcedente, nos rigorosos e precisos termos e pelos fundamentos de facto e de direito vertidos no despacho recorrido que, inquestionavelmente não merece o ínfimo reparo. Na verdade e como nele se diz, “pressuposto da formulação do pedido de indemnização, no processo penal, é, portanto, que quem o deduz seja um lesado, entendendo-se como tal a pessoa que tenha sofrido, por efeito de crime objecto da acusação, danos patrimoniais ou não patrimoniais que mereçam a tutela do direito (cfr. art. 74° do Código de Processo Penal). Ora, a acusação proferida nos presentes autos consubstancia apenas actuação criminosa do arguido Jorge Pinto relativa a outras pessoas que não o supra referido demandante, não sendo àquele imputado qualquer crime que tenha por lesado tal demandante”. Ora, compulsados os autos e concretamente a acusação deduzida pelo Ministério Público contra o arguido B………., nesta não lhe é imputada qualquer crime por ofensas à integridade física na pessoa do recorrente, nem ao menos qualquer lesão por este sofrida em consequência do acidente de viação em que este esteve envolvido. Daí que nos termos do artº71º do Cód. Proc. Penal, sendo a prática de uma infracção criminal possível fundamento de duas pretensões contra os seus agentes, objectivadas na aplicação de uma pena e no pagamento de uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais conexos àquela e por ela causados, é inequívoca a sua íntima conexão e fundamento, necessariamente na prática de um crime, sem o que sucumbe a referida pretensão civilista. Como conclui o recorrente, «a lei é clara quando define o lesado como a pessoa que sofreu danos ocasionados pelo crime, mesmo que não possa constituir-se assistente (nº1 do artº74º do CPP)». Possivelmente o recorrente confunde a sua eventual legitimidade processual civil activa, com a legitimidade processual civil passiva plasmada no artº73º do Cód. Proc. Penal e quanto à intervenção voluntária no processo penal de pessoas com responsabilidade meramente civil, só assim se compreendendo o presente recurso e a sua manifesta e espelhada passividade ante a acusação deduzida nos autos… A manifesta improcedência do presente recurso conduz inevitavelmente á sua rejeição, nos escorreitos termos do artº420º nº1 e nº3 do Cód. Proc. Penal. Decisão: Acordam os Juízes, desta Relação, em rejeitar o presente recurso, por sua manifesta improcedência. Vai o recorrente condenado no mínimo de taxa de justiça, sem prejuízo do apoio judiciário eventualmente concedido e ainda no pagamento da importância de três UCs – ut artº420º nº4 do CPP. Porto, 14 de Junho de 2006 Ângelo Augusto Brandão Morais José Carlos Borges Martins João Inácio Monteiro