Processo:0636729
Data do Acordão: 20/12/2006Relator: JOSÉ FERRAZTribunal:trp
Decisão: Meio processual:

I- O cabeça de casal, a quem cabe a administração da herança indivisa, tem poderes para exercer todos os direitos sociais, no tocante à participação social indivisa (fora os casos previstos no artigo 223º/6, para os quais necessita, como qualquer outro representante comum, que lhe sejam conferidos poderes de disposição). II- Fora esses casos, participar nas assembleias-gerais, nas deliberações sociais, exercer o inerente direito de voto, ou o direito a informação, são actos de mera administração, que se não vê excluídos das atribuições do cabeça de casal. III- Não se vê justificação para se obstar á sua intervenção individual quando, em relação às mesmas questões, pretenda impugnar as deliberações ou, prévia e cautelarmente, requerer a suspensão das deliberações ilegais.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Processo
0636729
Relator
JOSÉ FERRAZ
Descritores
CABEÇA DE CASAL HERANÇA INDIVISA SOCIEDADE DIREITOS DOS SÓCIOS
No do documento
Data do Acordão
12/21/2006
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
AGRAVO.
Decisão
PROVIDO.
Sumário
I- O cabeça de casal, a quem cabe a administração da herança indivisa, tem poderes para exercer todos os direitos sociais, no tocante à participação social indivisa (fora os casos previstos no artigo 223º/6, para os quais necessita, como qualquer outro representante comum, que lhe sejam conferidos poderes de disposição). II- Fora esses casos, participar nas assembleias-gerais, nas deliberações sociais, exercer o inerente direito de voto, ou o direito a informação, são actos de mera administração, que se não vê excluídos das atribuições do cabeça de casal. III- Não se vê justificação para se obstar á sua intervenção individual quando, em relação às mesmas questões, pretenda impugnar as deliberações ou, prévia e cautelarmente, requerer a suspensão das deliberações ilegais.
Decisão integral
Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I – B………….. e filha, C……………., residentes na Rua ………., ….., …..º Dto. ….., Porto, instauram PROCEDIMENTO CAUTELAR DE SUSPENSÃO DE DELIBERAÇÕES SOCIAIS contra a sociedade “D……………., S.A.”, com sede na Rua …………, …., …. Piso, sala ….., ….. Porto, requerendo que se decrete a suspensão das deliberações sociais tomadas em assembleia-geral da sociedade requerida realizada em 24 de Março de 2006 e se ordene que sejam suspensos todos os seus efeitos e todos os seus actos praticados em resultado dessas deliberações.

Para justificar a sua legitimidade, afirmam que a primeira requerente é viúva, e segunda é filha, de E………….., falecido em 2001 e sócio fundador e accionista da sociedade Requerida, pelo que a primeira é cabeça de casal, o que também acontece no processo de inventário que corre termos sob o nº …../2002, do …º Juízo Cível do Porto, por óbito do mesmo, e na dupla qualidade de cônjuge meeira e de cabeça de casal tem vindo a participar em todas as Assembleias-Gerais anuais da sociedade Requerida, desde o falecimento do seu marido Dr. E………….., para o que tem vindo a ser convocada pela requerida e a ser admitida a sua participação e votado nas ditas assembleias-gerais, exercendo os direitos inerentes às acções do falecido accionista como cônjuge meeira e representante comum dos contitulares das referidas acções indivisas.

Mais alega que são ainda herdeiros do Dr. E……………, três filhos nascidos do primeiro casamento deste – F………….., G…………… e H…………… – com os quais, desde o falecimento do Dr. E……………, as Requerentes permanecem desavindas, mantendo diversos processos judiciais em que ocupam posições processuais antagónicas, entre os quais avulta o mencionado processo de inventário, o que não poderia impedir qualquer herdeiro e a cabeça de casal de deitar mão de um procedimento cautelar que vise evitar um prejuízo maior.
Nem o carácter urgente de um procedimento cautelar a intentar no prazo de 10 dias se compadece com a reunião de todos os contitulares que podem estar ausentes e se encontram desavindos.

Citada, na sua oposição, a requerida excepciona a ilegitimidade das requerentes pois que a herança do Dr. E………… permanece indivisa e, além das requerentes, são interessados na herança e herdeiros os restantes filhos do de cuius, pelo que o direito que a autora pretende fazer valer só pode ser exercido conjuntamente por todos os herdeiros que concorrem à herança, em litisconsórcio necessário.
Termina a pedir, além do mais, que as requerentes sejam julgadas parte ilegítima por preterição das regras do litisconsórcio necessário e que a requerida seja absolvida da instância.

II - Seguidamente, o Mmo Juiz, em douto despacho, pronunciando-se sobre a suscitada excepção de ilegitimidade e julgando-a procedente, absolveu a requerida da instância.

III - Inconformadas com essa decisão, dela agravam as requerentes, tendo apresentado doutas alegações e, em conclusão, pedido a revogação de despacho recorrido, por entenderem que têm legitimidade para o procedimento cautelar, como requerentes.
Em contra-alegações, a agravada pede a confirmação do decidido.
Colhidos os vistos leais, cumpre decidir.

IV - É a seguinte a factualidade a atender (não impugnada) para a decisão:
1. A requerida D……………, S.A., foi constituída por escritura de 27.07.98, outorgada no Cartório Notarial do Centro de Formalidades de Empresas e encontra-se matriculada na 1ª secção da Conservatória do Registo Comercial do Porto, sob o n.º 6895/980729.
2. Foi accionista fundador da requerida o marido da 1ª requerente E………….., falecido em 14.10.2001.
3. Na sequência do óbito foi requerido inventário a correr termos sob o n.º ……/2002, da …ª secção do …º Juízo Cível do Porto, tendo a 1ª requerente sido nomeada cabeça-de-casal e nessa qualidade tem participado nas assembleias-gerais da requerida, para que por esta tem sido convocada.
4. A 2ª requerente C…………. é filha e herdeira do falecido, conjuntamente com mais três filhos nascidos do 1º casamento daquele – F…………, G………….. e H…………...
5. A herança aberta por óbito de E…………. ainda não foi objecto de partilha judicial ou extrajudicial.
6. O falecido, que foi casado com a requerente B…………, era titular, à data do óbito, de, pelo menos, 300 acções no capital social da requerida.
7. No dia 24 de Março do corrente ano de 2006 realizou-se a Assembleia-Geral Anual da sociedade requerida.
8. A assembleia-geral foi convocada com a seguinte ordem do dia:
A) Aprovação do relatório de gestão e das contas referentes ao exercício de 2005;
B) Aprovação de proposta de aplicação de resultados;
C) Eleição dos órgãos sociais para o quadriénio de 2006-2009;
D) Aprovação de proposta de remuneração dos órgãos sociais;
E) Informações do conselho de administração sobre os negócios sociais. 
9. A requerente B………… participou na referida assembleia-geral, “na qualidade de representante da herança indivisa por óbito do accionista Sr. Dr. E…………….”, tendo votado contra as deliberações adoptadas pela assembleia-geral.

V - Perante as conclusões formuladas pelas agravantes, que delimitam o objecto do recurso (arts. 684º/3 e 690º/1 do CPC), está em causa decidir se as requerentes, nomeadamente a B………….., como cabeça de casal da herança aberta por óbito do accionista da requerida, E……………, têm legitimidade para requerer a suspensão das deliberações sociais tomadas em assembleia geral da requerida, desacompanhadas dos demais herdeiros.

VI – Na decisão recorrida conclui-se pela ilegitimidade das requerentes, chamando-se em apoio da solução vária jurisprudência, essencialmente porque se entendeu que os direitos que se querem exercer na acção demandam a presença de todos os herdeiros.
Fundamenta-se a decisão - “as requerentes carecem de legitimidade para intentar a presente acção por duas ordens de razões:
A primeira, derivada da natureza jurídica da herança indivisa que, conforme sublinha P. de Lima e A. Varela, “é um dos casos de comunhão que não cabe na figura de compropriedade, distinguindo-se desta pelo facto de o direito dos contitulares não incidir directamente sobre cada um dos elementos (coisa ou crédito) que constituem o património, mas sobre todo ele, concebido como um todo unitário. Significa isto que, aos membros da comunhão, individualmente considerados, não pertencem direitos específicos (designadamente uma quota) sobre cada um dos bens que integram o património global…” (…).
Em consonância com a natureza jurídica da herança indivisa, dispõe ao artº 2091º do CCivil, que os direitos relativos à herança só podem ser exercidos conjuntamente por todos os herdeiros”.
“A segunda, derivada do facto de ao cabeça-de-casal competir poderes de administração ordinária, ou seja, de acordo com os ensinamentos de Manuel de Andrade, poderes para a prática de actos e negócios jurídicos, de conservação e frutificação normal dos bens administrados” (…).
“Ora, o pedido de anulação de deliberações sociais não cabe no âmbito de administração ordinária, consequentemente, não cabe na competência do cabeça-de-casal, na medida em que as deliberações sociais podem ser contrárias á lei ou ao pacto social de sorte a afectar o direito do sócio, que não é um direito único, mas antes um feixe de direitos vários, de vária natureza e conteúdo. É esse conteúdo que exprime a sua posição ou participação na sociedade – a sua quota. Trata-se de direitos do sócio em face da sociedade e não de direitos sobre os bens sociais” (…)
Assim sendo, uma vez que a lei exige a intervenção dos vários interessados na relação controvertida, a falta de qualquer deles é motivo de ilegitimidade”. 
E, “atenta a especificidade do procedimento em causa, não há lugar ao recurso ao disposto no artº 265º, n.º 2 do CPC”.

Entendeu-se, assim, que o direito em causa era de exercício conjunto (em litisconsórcio necessário) de todos os herdeiros, porque inaplicáveis as regras da compropriedade e não se enquadrar esse exercício no âmbito da administração ordinária da cabeça de casal (a requerente B……………).

VII – O autor/requerente é parte legítima quando tem interesse directo em demandar, expresso pela utilidade que deriva da procedência da acção e são titulares do interesse relevante (para efeitos de legitimidade) os sujeitos da relação material controvertida (na configuração apresentada pelo autor) – conforme estabelece o artigo 26º do CPC. Face a essa norma qualquer contitular de uma quota social tem interesse directo em demandar (e é também sujeito da relação controvertida). Assim, nos termos do artigo 396º/1 do CPC, justificando o requerente a qualidade de sócio (e não votando ou opondo-se à deliberação tomada), tem legitimidade activa para o procedimento de suspensão das deliberações sociais.
A legitimidade afere-se pela posição da parte em relação ao objecto da acção, de modo que à legitimidade importa que a parte (autor/requerente) tenha um interesse directo em demandar, interesse esse que assenta em ser titular da relação material controvertida, salvo diversa prescrição legal. Como regra, é parte legítima o titular do direito em discussão, pelo que, se esse direito respeita a diversos sujeitos e a lei ou a natureza do negócio exigirem uma intervenção conjunta para o seu exercício, a falta de algum deles na acção determina a ilegitimidade dos restantes (arts. 27º e 28º do CPC).
Assim sucede com o exercício dos direitos relativos a uma herança indivisa, que não caiba no âmbito da administração do cabeça de casal (artigo 2091º/1 do CC, que dispõe “fora dos casos declarados nos artigos anteriores, e sem prejuízo do disposto no artigo 2078º, os direitos relativos herança só podem ser exercidos conjuntamente por todos por herdeiros ou contra todos os herdeiros”).
Se a espécie se enquadra nessa previsão (de litisconsórcio necessário legal) e se exige a presença de todos os interessados na acção, não se vê razão para obstar a intervenção provocada de todos os interessados, com vista a assegurar a legitimidade activa (ao contrário do que se afirma na douta decisão recorrida).
Da necessidade do exercício conjunto dos direitos relativos à herança indivisa, estão excluídos, além dos casos previstos nas normas dos arts. 2087º/2090º, aqueles que estão implicados nos poderes da administração ordinária que cabe ao cabeça de casal, nos termos do arts. 2079º e 2087º/1 (todos do CC). Não significa obstáculo a que outra norma legal atribua ao cabeça de casal ou a outro herdeiro o exercício de algum direito que respeite á herança indivisa não incluído no âmbito dessas normas.

Face ao disposto no artigo 396º/1 do CPC, apenas tem legitimidade para peticionar a suspensão das deliberações sociais de determinada sociedade (seja qual for a espécie) quem da mesma for sócio (e desde que preenchidos os demais requisitos previstos na norma, que aqui não compete apreciar), e tenha ou não direito de voto. Norma essa que atribui ao sócio (“qualquer sócio”, exigindo a lei a justificação dessa qualidade), individualmente considerado, titular de quota ou acção, legitimidade para impugnar as deliberações sociais.
A legitimidade é indissociável da qualidade de sócio da sociedade de cujas deliberações se pede a suspensão. Por outro lado, só o sócio que não tenha votado (favoravelmente) a deliberação tomada pela assembleia, e desde que tenha essa qualidade, à data da deliberação, e a mantenha na altura da impugnação, a pode impugnar.

Os herdeiros sucedem em todos os direitos e obrigações do autor da herança, que não estejam excluídos por lei ou sejam puramente pessoais, - arts. 2024º e 2025º do CC - e nessa sucessão se incluem as participações sociais (quotas ou acções).
Os herdeiros do sócio falecido adquirem a qualidade sócios (o que não significa que todos eles – em caso de contitularidade do direito - possam intervir directa e individualmente nos destinos sociais, pois essa intervenção deve, como regra, ter uma voz única, isto é, ser exercida através de um representante comum – considerando, por um lado, unidade/indivisibilidade da participação social e, por outro, a necessidade de obstar à perturbação que geraria a intervenção individual de cada contitular da quota). 
É jurisprudência comum. ‘A quota social de sócio falecido transmite-se ipso iure aos seus herdeiros, que adquirem desde logo a qualidade de sócios’, ficando a quota ‘a pertencer em contitularidade aos herdeiros, enquanto não for partilhada’ (cfr. Pinto Furtado, em Deliberações dos Sócios, 499, Acs. STJ, de 01.02.77, 17/07/86, 04/10/94, 26/10/99, sumariados em www.degsi.pt, procs. 066165, 073994, 086048 e 99A715 e RL, de 02/12/81, proc. 0014903). 
Cabe ao cabeça de casal a administração da herança, até á liquidação ou partilha (arts. 2079º e 2087º/1 do CC).

É direito dos sócios, além de outros, participar nas deliberações sociais (artigo 21º/1/b, do CSC), que pode incluir o direito de voto, de que nenhum sócio pode ser privado, salvo nos casos previstos na lei.  
E, no exercício dos direitos sociais, também o sócio tem o direito de se opor às deliberações que sejam ilegais, quer porque violam a lei geral, quer porque contrariam as cláusulas do contrato de sociedade.
Enquanto requer a providência cautelar de suspensão das deliberações sociais ou as impugna, pedindo a sua anulação ou declaração de nulidade, o sócio exerce um direito social.

Face a essas considerações, vejamos se o exercício do direito (social) de requerer a suspensão implica a necessidade da intervenção conjunta de todos os herdeiros ou se se basta com a intervenção do cabeça de casal (ou até de um dos contitulares da participação social).
Nas relações com a sociedade, para o exercício dos direitos sociais dos contitulares de uma participação social (quota ou acção), situação em que existe uma igualdade qualitativa das situações jurídicas dos vários contitulares, prevê a lei esse exercício através de um representante comum e não um exercício conjunto de todos eles, em litisconsórcio necessário (arts. 222º e 303º do CSC). Não são admitidos a participar (ou não se impõe á sociedade a admissão dessa participação conjunta) nas deliberações sociais todos os contitulares, individualmente considerados, sob pena de grande embaraço na tomada de decisões e na gestão do ente colectivo.
À semelhança do que estatui o artigo 222º para as sociedades por quotas, para as sociedades anónimas, estabelece o artigo 303º do CSC:
“1. Os contitulares de uma acção devem exercer os direitos a ela inerentes por meio de um representante comum.
2. As comunicações e declarações da sociedade devem ser dirigidas ao representante comum e, na falta deste, a um dos contitulares.
(…)
4. A esta contitularidade aplicam-se os artigos 223º e 224º”.
Por sua vez, prescreve o artigo 223º do mesmo diploma que:
1. O representante comum, quando não for designado por lei ou disposição testamentária, é nomeado e pode ser destituído pelos contitulares. A respectiva deliberação é tomada por maioria, nos termos do artigo 1407º, nº 1, do Código Civil, salvo se outra regra se convencionar e foi comunicada à sociedade.
(…)
5. O representante comum pode exercer perante a sociedade todos os poderes inerentes à quota indivisa, salvo o disposto no número seguinte; qualquer redução desses poderes só é oponível à sociedade se lhe for comunicada por escrito.
6. Excepto quando a lei, o testamento, todos os contitulares ou o tribunal atribuírem ao representante comum poderes de disposição, não lhe é lícito praticar actos que importem a extinção, alienação ou oneração da quota, aumento de obrigações e renúncia ou redução dos direitos dos sócios (…).
Destas normas, decorre que, apesar do disposto no artigo 2091º/1 do CC,
o exercício dos direitos sociais pelos  sócios contitulares de uma participação social (nomeadamente acções no capital de uma sociedade anónima) não são exercidos, por regra, conjuntamente por todos, mas por um representante comum (solução decorrente da indivisibilidade da acção “a repelir soluções relacionadas com a partilha dos direitos inerentes à acção redundando num possível encabeçamento do voto em um dos titulares, e a tornar praticamente inconveniente o exercício exclusivo desse direito, turno a turno, por todos eles” como escreve E. Lucas Coelho, em Direito de Voto dos Accionistas, 1987, págs. 78, a propósito do exercício do direito de voto).
Esse representante comum pode ser designado por lei, por disposição testamentária ou, não havendo essa designação, por nomeação dos contitulares da quota/acção, nomeação essa que é tomada por maioria (nos termos do artigo 1407º/1 do CC), se outra regra não for convencionada e comunicada à sociedade – arts. 223º/1 e 303º/4 do CSC -, devendo a nomeação (como a destituição que pode ser deliberada nos mesmos termos) ser comunicada por escrito à sociedade. Não podendo obter-se a nomeação nesses termos, qualquer dos contitulares pode requerer ao tribunal a nomeação de representante comum (artigo 223º/3 do CSC).
Como escreve Raú Ventura (em Sociedades por Quotas, I, 2ª edição, págs. 516) “o artigo 223º/1 e 3, prevê quatro modos de designação do representante comum dos contitulares de quota: por lei, por disposição testamentária, por nomeação dos contitulares, por nomeação do tribunal.
“Um caso de designação por lei é o cabeça de casal” (itálico nosso). E que a fls. 518, escreve “representante comum dos contitulares da quota, herdeiros de sócio, pode ser o testamenteiro, quer quando lhe compita exercer as funções de cabeça de casal, quer quando essa função lhe seja atribuída pelo testador”.
Conforme Pinto Furtado (em Deliberações dos Sócios, pág. 431/432) “o cabeça de casal será o caso mais corrente de designação legal do representante comum, que, como administrador dos bens da herança, (artigo 2087-1 CC) pode intentar, sozinho, a acção de anulação de deliberação dos sócios”.
“Sendo ele um representante comum legal, não faz sentido, em semelhante hipótese, exigir-se o litisconsórcio necessário activo de todos os herdeiros para o efeito – o que estaria em contradição, aliás, com o disposto no art. 2078-1 CC mas, sobretudo, com a norma do nº 4 do art. 222 do presente Código, que cristalinamente legitima a relação que se estabeleça entre qualquer dos titulares e a sociedade”.
E, como escreve o mesmo o mesmo autor (ob. cit., a fls. 500) “requerer a suspensão da execução de uma deliberação, como impugnar a sua validade, existência ou eficácia, integrará, pelo menos na generalidade dos casos, um puro acto de administração, perfeitamente enquadrável na competência do cabeça de casal”.
Como decorre dos arts. 223º/5 e 303º/4 do CSC, o representante comum pode exercer todos os direitos, todos os poderes, quanto á quota indivisa (salvo os que importem qualquer dos actos mencionado no artigo 223º/6, sem atribuição expressa de poderes de disposição), tal como qualquer sócio que seja único titular da quota ou da acção, nomeadamente impugnar as deliberações sociais ou requerer cautelarmente a sua suspensão. 
Como representante comum, por força da lei (arts. 2079º e 2087º/1 do CC), o cabeça de casal, a quem cabe a administração da herança indivisa, tem poderes para exercer todos os direitos sociais, no tocante à participação social indivisa (fora os casos previstos no artigo 223º/6, para os quais necessita, como qualquer outro representante comum, que lhe sejam conferidos poderes de disposição). Fora esses casos, participar nas assembleias-gerais, nas deliberações sociais, exercer o inerente direito de voto, ou o direito a informação, são actos de mera administração, que se não vê excluídos das atribuições do cabeça de casal. Não se vê justificação para se obstar á sua intervenção individual quando, em relação às mesmas questões, pretenda impugnar as deliberações ou, prévia e cautelarmente, requerer a suspensão das deliberações ilegais.

Na espécie, a cabeça de casal (B………….) era convocada pela recorrida para as assembleias-gerais, nas quais participava, pediu informações (que não terão sido prestadas) e exerceu o direito de voto contra a tomada das deliberação que quer suspensas. A sociedade tinha-a como representante da herança para o exercício dos direitos inerentes às acções de que era titular o falecido Dr. E…………..
Considerava legítima a sua intervenção no exercício desses direitos. Ou que, pelos demais herdeiros, existisse actuação contrária a essa intervenção.
Não vemos justificação para se lhe negar legitimidade para intervir judicialmente, nessa qualidade (e também sócia), sem a companhia dos demais herdeiros, em procedimento cautelar de suspensão das deliberações. 
E, na situação de inexistência de um representante comum nomeado, de comum acordo, por todos os herdeiros, nem vemos que estes, mesmo individualmente, estejam impedidos de atacar as deliberações ilegais.
Para se aferir da legitimidade do requerente deve também ter-se presente o disposto no artigo 396º/1 do CPC. E tem legitimidade para requerer a suspensão “qualquer sócio”, justificando a qualidade de sócio e mostrando que a execução da deliberação pode causar dano apreciável, pelo que, na situação de inexistência de um representante comum nomeado, de comum acordo, por todos os herdeiros, nem vemos que estes, mesmo individualmente, estejam impedidos de impugnar as deliberações ilegais (de algum modo, neste sentido, Acs. do STJ, de 20/05/97, e da RC, de 27/04/2004, o primeiro sumariado, em www.dgsi.pt, procs. 97A254 e 4176/03).

As requerentes, sobretudo a requerente B…………….., como cabeça de casal, têm legitimidade para requerer a suspensão das deliberações em causa.
Motivo porque o recurso deve procede.

VIII. Pelo exposto, acorda-se neste tribunal da Relação do Porto em dar provimento ao agravo, revogando-se o douto despacho recorrido, devendo o processo prosseguir por não ocorrer ilegitimidade das requerentes.
Custas pela agravada.

Porto, 21 de Dezembro de 2006
José Manuel Carvalho Ferraz
Nuno Ângelo Rainho Ataíde das Neves
António do Amaral Ferreira

Acordam no Tribunal da Relação do Porto I – B………….. e filha, C……………., residentes na Rua ………., ….., …..º Dto. ….., Porto, instauram PROCEDIMENTO CAUTELAR DE SUSPENSÃO DE DELIBERAÇÕES SOCIAIS contra a sociedade “D……………., S.A.”, com sede na Rua …………, …., …. Piso, sala ….., ….. Porto, requerendo que se decrete a suspensão das deliberações sociais tomadas em assembleia-geral da sociedade requerida realizada em 24 de Março de 2006 e se ordene que sejam suspensos todos os seus efeitos e todos os seus actos praticados em resultado dessas deliberações. Para justificar a sua legitimidade, afirmam que a primeira requerente é viúva, e segunda é filha, de E………….., falecido em 2001 e sócio fundador e accionista da sociedade Requerida, pelo que a primeira é cabeça de casal, o que também acontece no processo de inventário que corre termos sob o nº …../2002, do …º Juízo Cível do Porto, por óbito do mesmo, e na dupla qualidade de cônjuge meeira e de cabeça de casal tem vindo a participar em todas as Assembleias-Gerais anuais da sociedade Requerida, desde o falecimento do seu marido Dr. E………….., para o que tem vindo a ser convocada pela requerida e a ser admitida a sua participação e votado nas ditas assembleias-gerais, exercendo os direitos inerentes às acções do falecido accionista como cônjuge meeira e representante comum dos contitulares das referidas acções indivisas. Mais alega que são ainda herdeiros do Dr. E……………, três filhos nascidos do primeiro casamento deste – F………….., G…………… e H…………… – com os quais, desde o falecimento do Dr. E……………, as Requerentes permanecem desavindas, mantendo diversos processos judiciais em que ocupam posições processuais antagónicas, entre os quais avulta o mencionado processo de inventário, o que não poderia impedir qualquer herdeiro e a cabeça de casal de deitar mão de um procedimento cautelar que vise evitar um prejuízo maior. Nem o carácter urgente de um procedimento cautelar a intentar no prazo de 10 dias se compadece com a reunião de todos os contitulares que podem estar ausentes e se encontram desavindos. Citada, na sua oposição, a requerida excepciona a ilegitimidade das requerentes pois que a herança do Dr. E………… permanece indivisa e, além das requerentes, são interessados na herança e herdeiros os restantes filhos do de cuius, pelo que o direito que a autora pretende fazer valer só pode ser exercido conjuntamente por todos os herdeiros que concorrem à herança, em litisconsórcio necessário. Termina a pedir, além do mais, que as requerentes sejam julgadas parte ilegítima por preterição das regras do litisconsórcio necessário e que a requerida seja absolvida da instância. II - Seguidamente, o Mmo Juiz, em douto despacho, pronunciando-se sobre a suscitada excepção de ilegitimidade e julgando-a procedente, absolveu a requerida da instância. III - Inconformadas com essa decisão, dela agravam as requerentes, tendo apresentado doutas alegações e, em conclusão, pedido a revogação de despacho recorrido, por entenderem que têm legitimidade para o procedimento cautelar, como requerentes. Em contra-alegações, a agravada pede a confirmação do decidido. Colhidos os vistos leais, cumpre decidir. IV - É a seguinte a factualidade a atender (não impugnada) para a decisão: 1. A requerida D……………, S.A., foi constituída por escritura de 27.07.98, outorgada no Cartório Notarial do Centro de Formalidades de Empresas e encontra-se matriculada na 1ª secção da Conservatória do Registo Comercial do Porto, sob o n.º 6895/980729. 2. Foi accionista fundador da requerida o marido da 1ª requerente E………….., falecido em 14.10.2001. 3. Na sequência do óbito foi requerido inventário a correr termos sob o n.º ……/2002, da …ª secção do …º Juízo Cível do Porto, tendo a 1ª requerente sido nomeada cabeça-de-casal e nessa qualidade tem participado nas assembleias-gerais da requerida, para que por esta tem sido convocada. 4. A 2ª requerente C…………. é filha e herdeira do falecido, conjuntamente com mais três filhos nascidos do 1º casamento daquele – F…………, G………….. e H…………... 5. A herança aberta por óbito de E…………. ainda não foi objecto de partilha judicial ou extrajudicial. 6. O falecido, que foi casado com a requerente B…………, era titular, à data do óbito, de, pelo menos, 300 acções no capital social da requerida. 7. No dia 24 de Março do corrente ano de 2006 realizou-se a Assembleia-Geral Anual da sociedade requerida. 8. A assembleia-geral foi convocada com a seguinte ordem do dia: A) Aprovação do relatório de gestão e das contas referentes ao exercício de 2005; B) Aprovação de proposta de aplicação de resultados; C) Eleição dos órgãos sociais para o quadriénio de 2006-2009; D) Aprovação de proposta de remuneração dos órgãos sociais; E) Informações do conselho de administração sobre os negócios sociais. 9. A requerente B………… participou na referida assembleia-geral, “na qualidade de representante da herança indivisa por óbito do accionista Sr. Dr. E…………….”, tendo votado contra as deliberações adoptadas pela assembleia-geral. V - Perante as conclusões formuladas pelas agravantes, que delimitam o objecto do recurso (arts. 684º/3 e 690º/1 do CPC), está em causa decidir se as requerentes, nomeadamente a B………….., como cabeça de casal da herança aberta por óbito do accionista da requerida, E……………, têm legitimidade para requerer a suspensão das deliberações sociais tomadas em assembleia geral da requerida, desacompanhadas dos demais herdeiros. VI – Na decisão recorrida conclui-se pela ilegitimidade das requerentes, chamando-se em apoio da solução vária jurisprudência, essencialmente porque se entendeu que os direitos que se querem exercer na acção demandam a presença de todos os herdeiros. Fundamenta-se a decisão - “as requerentes carecem de legitimidade para intentar a presente acção por duas ordens de razões: A primeira, derivada da natureza jurídica da herança indivisa que, conforme sublinha P. de Lima e A. Varela, “é um dos casos de comunhão que não cabe na figura de compropriedade, distinguindo-se desta pelo facto de o direito dos contitulares não incidir directamente sobre cada um dos elementos (coisa ou crédito) que constituem o património, mas sobre todo ele, concebido como um todo unitário. Significa isto que, aos membros da comunhão, individualmente considerados, não pertencem direitos específicos (designadamente uma quota) sobre cada um dos bens que integram o património global…” (…). Em consonância com a natureza jurídica da herança indivisa, dispõe ao artº 2091º do CCivil, que os direitos relativos à herança só podem ser exercidos conjuntamente por todos os herdeiros”. “A segunda, derivada do facto de ao cabeça-de-casal competir poderes de administração ordinária, ou seja, de acordo com os ensinamentos de Manuel de Andrade, poderes para a prática de actos e negócios jurídicos, de conservação e frutificação normal dos bens administrados” (…). “Ora, o pedido de anulação de deliberações sociais não cabe no âmbito de administração ordinária, consequentemente, não cabe na competência do cabeça-de-casal, na medida em que as deliberações sociais podem ser contrárias á lei ou ao pacto social de sorte a afectar o direito do sócio, que não é um direito único, mas antes um feixe de direitos vários, de vária natureza e conteúdo. É esse conteúdo que exprime a sua posição ou participação na sociedade – a sua quota. Trata-se de direitos do sócio em face da sociedade e não de direitos sobre os bens sociais” (…) Assim sendo, uma vez que a lei exige a intervenção dos vários interessados na relação controvertida, a falta de qualquer deles é motivo de ilegitimidade”. E, “atenta a especificidade do procedimento em causa, não há lugar ao recurso ao disposto no artº 265º, n.º 2 do CPC”. Entendeu-se, assim, que o direito em causa era de exercício conjunto (em litisconsórcio necessário) de todos os herdeiros, porque inaplicáveis as regras da compropriedade e não se enquadrar esse exercício no âmbito da administração ordinária da cabeça de casal (a requerente B……………). VII – O autor/requerente é parte legítima quando tem interesse directo em demandar, expresso pela utilidade que deriva da procedência da acção e são titulares do interesse relevante (para efeitos de legitimidade) os sujeitos da relação material controvertida (na configuração apresentada pelo autor) – conforme estabelece o artigo 26º do CPC. Face a essa norma qualquer contitular de uma quota social tem interesse directo em demandar (e é também sujeito da relação controvertida). Assim, nos termos do artigo 396º/1 do CPC, justificando o requerente a qualidade de sócio (e não votando ou opondo-se à deliberação tomada), tem legitimidade activa para o procedimento de suspensão das deliberações sociais. A legitimidade afere-se pela posição da parte em relação ao objecto da acção, de modo que à legitimidade importa que a parte (autor/requerente) tenha um interesse directo em demandar, interesse esse que assenta em ser titular da relação material controvertida, salvo diversa prescrição legal. Como regra, é parte legítima o titular do direito em discussão, pelo que, se esse direito respeita a diversos sujeitos e a lei ou a natureza do negócio exigirem uma intervenção conjunta para o seu exercício, a falta de algum deles na acção determina a ilegitimidade dos restantes (arts. 27º e 28º do CPC). Assim sucede com o exercício dos direitos relativos a uma herança indivisa, que não caiba no âmbito da administração do cabeça de casal (artigo 2091º/1 do CC, que dispõe “fora dos casos declarados nos artigos anteriores, e sem prejuízo do disposto no artigo 2078º, os direitos relativos herança só podem ser exercidos conjuntamente por todos por herdeiros ou contra todos os herdeiros”). Se a espécie se enquadra nessa previsão (de litisconsórcio necessário legal) e se exige a presença de todos os interessados na acção, não se vê razão para obstar a intervenção provocada de todos os interessados, com vista a assegurar a legitimidade activa (ao contrário do que se afirma na douta decisão recorrida). Da necessidade do exercício conjunto dos direitos relativos à herança indivisa, estão excluídos, além dos casos previstos nas normas dos arts. 2087º/2090º, aqueles que estão implicados nos poderes da administração ordinária que cabe ao cabeça de casal, nos termos do arts. 2079º e 2087º/1 (todos do CC). Não significa obstáculo a que outra norma legal atribua ao cabeça de casal ou a outro herdeiro o exercício de algum direito que respeite á herança indivisa não incluído no âmbito dessas normas. Face ao disposto no artigo 396º/1 do CPC, apenas tem legitimidade para peticionar a suspensão das deliberações sociais de determinada sociedade (seja qual for a espécie) quem da mesma for sócio (e desde que preenchidos os demais requisitos previstos na norma, que aqui não compete apreciar), e tenha ou não direito de voto. Norma essa que atribui ao sócio (“qualquer sócio”, exigindo a lei a justificação dessa qualidade), individualmente considerado, titular de quota ou acção, legitimidade para impugnar as deliberações sociais. A legitimidade é indissociável da qualidade de sócio da sociedade de cujas deliberações se pede a suspensão. Por outro lado, só o sócio que não tenha votado (favoravelmente) a deliberação tomada pela assembleia, e desde que tenha essa qualidade, à data da deliberação, e a mantenha na altura da impugnação, a pode impugnar. Os herdeiros sucedem em todos os direitos e obrigações do autor da herança, que não estejam excluídos por lei ou sejam puramente pessoais, - arts. 2024º e 2025º do CC - e nessa sucessão se incluem as participações sociais (quotas ou acções). Os herdeiros do sócio falecido adquirem a qualidade sócios (o que não significa que todos eles – em caso de contitularidade do direito - possam intervir directa e individualmente nos destinos sociais, pois essa intervenção deve, como regra, ter uma voz única, isto é, ser exercida através de um representante comum – considerando, por um lado, unidade/indivisibilidade da participação social e, por outro, a necessidade de obstar à perturbação que geraria a intervenção individual de cada contitular da quota). É jurisprudência comum. ‘A quota social de sócio falecido transmite-se ipso iure aos seus herdeiros, que adquirem desde logo a qualidade de sócios’, ficando a quota ‘a pertencer em contitularidade aos herdeiros, enquanto não for partilhada’ (cfr. Pinto Furtado, em Deliberações dos Sócios, 499, Acs. STJ, de 01.02.77, 17/07/86, 04/10/94, 26/10/99, sumariados em www.degsi.pt, procs. 066165, 073994, 086048 e 99A715 e RL, de 02/12/81, proc. 0014903). Cabe ao cabeça de casal a administração da herança, até á liquidação ou partilha (arts. 2079º e 2087º/1 do CC). É direito dos sócios, além de outros, participar nas deliberações sociais (artigo 21º/1/b, do CSC), que pode incluir o direito de voto, de que nenhum sócio pode ser privado, salvo nos casos previstos na lei. E, no exercício dos direitos sociais, também o sócio tem o direito de se opor às deliberações que sejam ilegais, quer porque violam a lei geral, quer porque contrariam as cláusulas do contrato de sociedade. Enquanto requer a providência cautelar de suspensão das deliberações sociais ou as impugna, pedindo a sua anulação ou declaração de nulidade, o sócio exerce um direito social. Face a essas considerações, vejamos se o exercício do direito (social) de requerer a suspensão implica a necessidade da intervenção conjunta de todos os herdeiros ou se se basta com a intervenção do cabeça de casal (ou até de um dos contitulares da participação social). Nas relações com a sociedade, para o exercício dos direitos sociais dos contitulares de uma participação social (quota ou acção), situação em que existe uma igualdade qualitativa das situações jurídicas dos vários contitulares, prevê a lei esse exercício através de um representante comum e não um exercício conjunto de todos eles, em litisconsórcio necessário (arts. 222º e 303º do CSC). Não são admitidos a participar (ou não se impõe á sociedade a admissão dessa participação conjunta) nas deliberações sociais todos os contitulares, individualmente considerados, sob pena de grande embaraço na tomada de decisões e na gestão do ente colectivo. À semelhança do que estatui o artigo 222º para as sociedades por quotas, para as sociedades anónimas, estabelece o artigo 303º do CSC: “1. Os contitulares de uma acção devem exercer os direitos a ela inerentes por meio de um representante comum. 2. As comunicações e declarações da sociedade devem ser dirigidas ao representante comum e, na falta deste, a um dos contitulares. (…) 4. A esta contitularidade aplicam-se os artigos 223º e 224º”. Por sua vez, prescreve o artigo 223º do mesmo diploma que: 1. O representante comum, quando não for designado por lei ou disposição testamentária, é nomeado e pode ser destituído pelos contitulares. A respectiva deliberação é tomada por maioria, nos termos do artigo 1407º, nº 1, do Código Civil, salvo se outra regra se convencionar e foi comunicada à sociedade. (…) 5. O representante comum pode exercer perante a sociedade todos os poderes inerentes à quota indivisa, salvo o disposto no número seguinte; qualquer redução desses poderes só é oponível à sociedade se lhe for comunicada por escrito. 6. Excepto quando a lei, o testamento, todos os contitulares ou o tribunal atribuírem ao representante comum poderes de disposição, não lhe é lícito praticar actos que importem a extinção, alienação ou oneração da quota, aumento de obrigações e renúncia ou redução dos direitos dos sócios (…). Destas normas, decorre que, apesar do disposto no artigo 2091º/1 do CC, o exercício dos direitos sociais pelos sócios contitulares de uma participação social (nomeadamente acções no capital de uma sociedade anónima) não são exercidos, por regra, conjuntamente por todos, mas por um representante comum (solução decorrente da indivisibilidade da acção “a repelir soluções relacionadas com a partilha dos direitos inerentes à acção redundando num possível encabeçamento do voto em um dos titulares, e a tornar praticamente inconveniente o exercício exclusivo desse direito, turno a turno, por todos eles” como escreve E. Lucas Coelho, em Direito de Voto dos Accionistas, 1987, págs. 78, a propósito do exercício do direito de voto). Esse representante comum pode ser designado por lei, por disposição testamentária ou, não havendo essa designação, por nomeação dos contitulares da quota/acção, nomeação essa que é tomada por maioria (nos termos do artigo 1407º/1 do CC), se outra regra não for convencionada e comunicada à sociedade – arts. 223º/1 e 303º/4 do CSC -, devendo a nomeação (como a destituição que pode ser deliberada nos mesmos termos) ser comunicada por escrito à sociedade. Não podendo obter-se a nomeação nesses termos, qualquer dos contitulares pode requerer ao tribunal a nomeação de representante comum (artigo 223º/3 do CSC). Como escreve Raú Ventura (em Sociedades por Quotas, I, 2ª edição, págs. 516) “o artigo 223º/1 e 3, prevê quatro modos de designação do representante comum dos contitulares de quota: por lei, por disposição testamentária, por nomeação dos contitulares, por nomeação do tribunal. “Um caso de designação por lei é o cabeça de casal” (itálico nosso). E que a fls. 518, escreve “representante comum dos contitulares da quota, herdeiros de sócio, pode ser o testamenteiro, quer quando lhe compita exercer as funções de cabeça de casal, quer quando essa função lhe seja atribuída pelo testador”. Conforme Pinto Furtado (em Deliberações dos Sócios, pág. 431/432) “o cabeça de casal será o caso mais corrente de designação legal do representante comum, que, como administrador dos bens da herança, (artigo 2087-1 CC) pode intentar, sozinho, a acção de anulação de deliberação dos sócios”. “Sendo ele um representante comum legal, não faz sentido, em semelhante hipótese, exigir-se o litisconsórcio necessário activo de todos os herdeiros para o efeito – o que estaria em contradição, aliás, com o disposto no art. 2078-1 CC mas, sobretudo, com a norma do nº 4 do art. 222 do presente Código, que cristalinamente legitima a relação que se estabeleça entre qualquer dos titulares e a sociedade”. E, como escreve o mesmo o mesmo autor (ob. cit., a fls. 500) “requerer a suspensão da execução de uma deliberação, como impugnar a sua validade, existência ou eficácia, integrará, pelo menos na generalidade dos casos, um puro acto de administração, perfeitamente enquadrável na competência do cabeça de casal”. Como decorre dos arts. 223º/5 e 303º/4 do CSC, o representante comum pode exercer todos os direitos, todos os poderes, quanto á quota indivisa (salvo os que importem qualquer dos actos mencionado no artigo 223º/6, sem atribuição expressa de poderes de disposição), tal como qualquer sócio que seja único titular da quota ou da acção, nomeadamente impugnar as deliberações sociais ou requerer cautelarmente a sua suspensão. Como representante comum, por força da lei (arts. 2079º e 2087º/1 do CC), o cabeça de casal, a quem cabe a administração da herança indivisa, tem poderes para exercer todos os direitos sociais, no tocante à participação social indivisa (fora os casos previstos no artigo 223º/6, para os quais necessita, como qualquer outro representante comum, que lhe sejam conferidos poderes de disposição). Fora esses casos, participar nas assembleias-gerais, nas deliberações sociais, exercer o inerente direito de voto, ou o direito a informação, são actos de mera administração, que se não vê excluídos das atribuições do cabeça de casal. Não se vê justificação para se obstar á sua intervenção individual quando, em relação às mesmas questões, pretenda impugnar as deliberações ou, prévia e cautelarmente, requerer a suspensão das deliberações ilegais. Na espécie, a cabeça de casal (B………….) era convocada pela recorrida para as assembleias-gerais, nas quais participava, pediu informações (que não terão sido prestadas) e exerceu o direito de voto contra a tomada das deliberação que quer suspensas. A sociedade tinha-a como representante da herança para o exercício dos direitos inerentes às acções de que era titular o falecido Dr. E………….. Considerava legítima a sua intervenção no exercício desses direitos. Ou que, pelos demais herdeiros, existisse actuação contrária a essa intervenção. Não vemos justificação para se lhe negar legitimidade para intervir judicialmente, nessa qualidade (e também sócia), sem a companhia dos demais herdeiros, em procedimento cautelar de suspensão das deliberações. E, na situação de inexistência de um representante comum nomeado, de comum acordo, por todos os herdeiros, nem vemos que estes, mesmo individualmente, estejam impedidos de atacar as deliberações ilegais. Para se aferir da legitimidade do requerente deve também ter-se presente o disposto no artigo 396º/1 do CPC. E tem legitimidade para requerer a suspensão “qualquer sócio”, justificando a qualidade de sócio e mostrando que a execução da deliberação pode causar dano apreciável, pelo que, na situação de inexistência de um representante comum nomeado, de comum acordo, por todos os herdeiros, nem vemos que estes, mesmo individualmente, estejam impedidos de impugnar as deliberações ilegais (de algum modo, neste sentido, Acs. do STJ, de 20/05/97, e da RC, de 27/04/2004, o primeiro sumariado, em www.dgsi.pt, procs. 97A254 e 4176/03). As requerentes, sobretudo a requerente B…………….., como cabeça de casal, têm legitimidade para requerer a suspensão das deliberações em causa. Motivo porque o recurso deve procede. VIII. Pelo exposto, acorda-se neste tribunal da Relação do Porto em dar provimento ao agravo, revogando-se o douto despacho recorrido, devendo o processo prosseguir por não ocorrer ilegitimidade das requerentes. Custas pela agravada. Porto, 21 de Dezembro de 2006 José Manuel Carvalho Ferraz Nuno Ângelo Rainho Ataíde das Neves António do Amaral Ferreira