I - O promitente comprador, mediante providência cautelar não especificada intentada contra o promitente vendedor como dependência da acção de execução específica do contrato-promessa que pretende instaurar pode pedir que este seja proibido de vender ou onerar a terceiro o prédio objecto daquela promessa II - Para que esta providência possa ser decretada é necessário que o promitente comprador alegue e prove factualidade donde decorra que o promitente vendedor tem a intenção de proceder à venda ou oneração desse prédio, o que não se verificou no presente caso.
Proc. nº 5019/08 – 2 Agravo Decisão recorrida: proc. nº …./08.7 TBVNG – A da .ª Vara de Competência Mista de Vila Nova de Gaia Recorrente: B………. Recorridos: C………. e outro Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Canelas Brás e José Carvalho Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO O requerente B………., residente na Rua ………., nº …, ………., Vila das Aves, intentou providência cautelar comum contra os requeridos C………. e D………., residentes na Rua ………., nº …., .º, Habitação .., ………., Vila Nova de Gaia, pedindo que estes se abstenham de vender ou prometer vender, onerar ou prometer onerar a fracção identificada no art. 1 do requerimento inicial e, em geral, de praticar qualquer acto, seja de que natureza for, que impeça ou modifique o direito do requerente à execução execução específica do contrato-promessa, bem como que ordene se proceda ao registo de tal decisão na competente Conservatória do Registo Predial. Os requeridos deduziram oposição, pronunciando-se no sentido do indeferimento da providência cautelar. Procedeu-se à inquirição das testemunhas arroladas e depois foi proferida decisão que julgou improcedente o procedimento cautelar. Inconformado, o requerente interpôs recurso de agravo, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões: 1) Salvo o devido respeito por opinião diversa, andou mal o Tribunal “a quo” ao não ordenar a providência requerida “que os requeridos se abstenham de vender ou prometer vender, onerar ou prometer onerar a fracção identificada em 1 deste requerimento e, em geral, de praticar qualquer acto, seja de que natureza for, que impeça ou modifique o direito do requerente à execução execução específica do contrato-promessa, bem como ordene se proceda ao registo de tal decisão na competente Conservatória do Registo Predial. 2) Resulta da fundamentação da decisão de não decretamento da providência que o Tribunal “a quo” concluiu: a) pela inexistência de justo e fundado receio que outrem cause lesão grave e de difícil reparação ao seu direito; b) pela inexistência de “periculum in mora”; c) inadmissibilidade legal; d) pelo não acolhimento pelas partes no contrato-promessa do efeito pretendido pela providência requerida; e) pelo facto de a providência não ser adequada à efectividade do direito ameaçado. 3) Na verdade, resulta inequívoco da matéria provada que as partes sujeitaram o contrato-promessa ao regime da execução específica (art. 4); o requerente tinha e tem interesse na concretização do negócio (art.14) e que os requeridos enviaram uma carta ao requerente através da qual resolveram o contrato-promessa (art. 32). 4) É, pois, apodíctico que os requeridos ao terem resolvido, ilicitamente, o contrato-promessa pretenderam extinguir o negócio. 5) Fica, pois, demonstrada a intenção e vontade dos requeridos de não cumprir o contrato que voluntariamente assumiram. 6) Assim sendo, é notório em face das regras da experiência comum que os requeridos se sentem no direito, ilícito é certo, de alienarem o imóvel a terceiros, 7) O que a acontecer torna irremediavelmente perdido o direito do requerente a cumprir o contrato por via da execução específica. 8) Nem mesmo o registo da acção pode servir de obstáculo à frustração do direito do recorrente à execução específica porquanto estando anteriormente registada provisoriamente uma aquisição do imóvel uma vez realizada a escritura e registo definitivos os efeitos deste retroagem à data daquele registo. 9) Tornando, assim, inviável ou ineficaz a eventual procedência do pedido de execução específica. 10) De igual sorte, não existe qualquer inadmissibilidade legal do fim pretendido. 11) Efectivamente, tendo as partes previsto o recurso à execução específica e sendo essa a vontade manifestada nos autos pelo recorrente, pretende-se com o decretamento da providência não fazer letra morta do que decorre da lei e do contrato. 12) Como refere o Ac. STJ de 1.6.99 (JSTJ 00037405) in www.dgsi.pt. – “As providências cautelares visam impedir que, durante a pendência de qualquer acção, a situação de facto se altere de modo a que a sentença nela proferida, sendo favorável, perca toda a sua eficácia ou parte dela”. 13) Por outro lado, é necessário frisar que tendo o representante solicitado o registo do decretamento da providência, esse mesmo registo acabará por inviabilizar qualquer transacção do imóvel a terceiros. 14) Em suma, no entender do recorrente impõe-se a revogação da decisão do tribunal e a sua substituição por outra que decrete a providência nos exactos termos em que a mesma foi formulada. 15) Nesse sentido, aponta-se vária jurisprudência em sentido favorável ao propugnado pelo recorrente: a) Ac. STJ de 11.11.1997 (JSTJ 00032488), in www.dgsi.pt – “Como providência cautelar não especificada, o promitente comprador com direito de execução específica, pode pedir que o promitente vendedor seja proibido de vender a coisa a terceiros”; b) Ac. RE de 19.2.2004 (proc. 2868/03 – 3), in www.dgsi.pt – “O promitente comprador, em providência cautelar comum não especificada, instaurada contra o promitente vendedor, pode pedir que este seja proibido de vender a terceiro o prédio objecto do contrato-promessa, cuja execução específica pretende fazer valer.” 16) Assim, e salvo o devido respeito por diferente opinião, a douta decisão ora em crise violou o disposto no art. 381 do CPCivil. Consequentemente, pretende que a decisão recorrida seja revogada e substituída por outra que ordene o decretamento da providência. Por extemporaneidade, foi ordenado o desentranhamento das contra-alegações apresentadas pelos requeridos. Colhidos os vistos legais, cumpre então apreciar e decidir.*FUNDAMENTAÇÃO O objecto dos recursos encontra-se balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso – arts. 684 nº 3 e 690 nº 1 do Cód. do Proc. Civil -, sendo ainda de referir que neles se apreciam questões e não razões, que não visam criar decisões sobre matéria nova e que o seu âmbito é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida.*A questão a decidir é a seguinte: Apurar se no presente caso o promitente comprador, através de providência cautelar não especificada intentada contra os promitentes vendedores como dependência de acção de execução específica do contrato-promessa que pretende instaurar, pode pedir que estes sejam proibidos de vender ou onerar a fracção a que aquele contrato se refere.*OS FACTOS A matéria fáctica, tal como foi dada como provada pela 1ª Instância, é a seguinte: 1. Em 24.2.2007 o requerente declarou prometer comprar aos requeridos, e estes declararam prometer vender-lhe, uma fracção autónoma designada pelas letras “CM”, correspondente a uma habitação T1, no .º andar, correspondente a um apartamento com o nº .., do bloco 2, com entrada pela Rua ………., nº …. do prédio em regime de propriedade horizontal sito na Rua ………., nºs …., …., …. e …. e Rua ………., nºs .., .., .., …, … e …, na freguesia de ………., concelho de Vila Nova de Gaia. 2. Tal prédio encontra-se descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o nº 02518/110898 e inscrito na respectiva matriz sob o art. 6069, dispondo da licença de utilização nº …/99 passada pela Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia. 3. Conforme declarado o preço da prometida compra e venda seria de €47.500,00, tendo a requerente pago aos requeridos no dia 24 de Fevereiro de 2007 a quantia de €1.000,00 a título de sinal e o restante seria pago aquando da realização da competente escritura pública de compra e venda. 4. As partes acordaram em sujeitar o contrato-promessa ao regime da execução específica. 5. Ao mesmo tempo, os requeridos iriam comprar uma outra fracção autónoma, razão pela qual só se dispunham a vender a fracção identificada em 1 na mesma ocasião em que celebrassem a escritura pública de compra e venda da nova fracção a adquirir. 6. Para aquisição da nova fracção os requeridos careciam de um empréstimo bancário, por um valor que, além do mais, lhes permitisse pagar a totalidade do empréstimo contraído para aquisição da fracção identificada em 1. 7. Ou seja, os requeridos solicitaram a uma instituição de crédito um empréstimo de €25.000,00, que lhes permitiria pagar as responsabilidades inerentes à fracção em discussão nos autos. 8. Tal aprovação de crédito só foi concedida aos requeridos em 10.4.07. 9. Os requeridos solicitaram à entidade financeira titular da hipoteca da fracção identificada em 1 – E………. (vide inscrição C-2, Ap. 80/…… do doc. 2) a emissão do distrate necessário para cancelamento da hipoteca. 10. O requerente ficou a aguardar que todo aquele processo finalizasse por forma a marcar a competente escritura pública de compra e venda da fracção identificada em 1. 11. Os requeridos enviaram ao requerente uma carta a comunicar a resolução do contrato-promessa, nos termos que constam de fls. 173 aqui integralmente reproduzida. 12. O requerente[1] marcou a escritura pública para 18.5.07 e disso notificou os requeridos, com a devida antecedência, dando-lhes conhecimento do dia, hora e local. 13. No dia 18 de Maio de 2007 os requeridos recusaram-se a outorgar a competente escritura pública. 14. O requerente tinha e tem interesse na concretização do negócio. 15. No mesmo dia referido em 1. os requeridos celebraram um outro contrato-promessa de compra e venda com “F………., SA”. 16. Assumindo, neste último, a qualidade de promitentes compradores. 17. Quiseram vender a sua própria habitação, com a tipologia T1 e adquirirem uma outra de tipologia superior. 18. Pretendiam os requeridos liquidar o empréstimo à instituição bancária de modo a poderem vender ao requerente a fracção livre de ónus e encargos de qualquer espécie. 19. Para tal, recorreram ao crédito bancário na importância de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros), o qual foi concedido. 20. No dia 29 de Março de 2007, a “G………., SA”, incumbida da efectivação das burocracias atinentes ao contrato-promessa, enviou uma carta registada com aviso de recepção aos requeridos. 21. Através de tal missiva, em representação do ora requerente, notificava e comunicava aos requeridos que a escritura pública de compra e venda se encontrava marcada para o dia 26 de Abril de 2007, pelas 10h30m, no Cartório Notarial H………., sito à ………., em Vila Nova de Gaia. 22. Nessa sequência, a requerida mulher solicitou ao balcão de ………., em Vila Nova de Gaia, da E………., que preparassem o distrate para o designado dia da escritura pública, ou seja, 26 de Abril de 2007. 23. Foram efectuados os registos provisórios de aquisição e de hipoteca. 24. Disponibilizaram os requeridos toda a documentação solicitada e necessária para instruir a escritura pública designada. 25. Na convicção de que estaria tudo acertado, começaram a empacotar os seus haveres pessoais para os mesmos serem retirados da fracção prometida. 26. Em cima da hora a referida escritura de compra e venda foi desmarcada pela “G………., SA”, não se tendo realizado. 27. Apenas na véspera, foram os requeridos avisados de que a escritura tinha ficado sem efeito. 28. No dia 26 de Abril de 2007, a “G………., SA” enviou um fax ao balcão de ………. da E………., ao cuidado da Srª Dª I………., comunicando que a escritura pública seria realizada no dia 3 de Maio de 2007, pelas 12h30m, no mesmo Cartório Notarial anteriormente identificado. 29. A data de 3 de Maio de 2007 foi marcada e comunicada à E………. sem que os requeridos concordassem com a mesma. 30. Havia necessidade que os pais da requerida mulher estivessem presentes na data da escritura pública, pois teriam que intervir na mesma na qualidade de fiadores do mútuo. 31. Nesse dia 26 de Abril, depois de muito insistir e demonstrar o desagrado com toda a situação, finalmente aos requeridos foi entregue uma cópia dos contratos-promessa celebrados no mês de Fevereiro. 32. No dia seguinte, os requeridos enviaram uma carta ao requerente e à “G………., SA” através da qual resolviam o contrato-promessa, nos termos que constam de fls. 173 dos autos aqui dada por reproduzida.*O DIREITO As providências cautelares não especificadas vêm previstas nos arts. 381 e segs. do Cód. do Proc. Civil. No primeiro destes artigos nos seus nºs 1, 2 e 3 dispõe-se o seguinte: «1. Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efectividade do direito ameaçado. 2. O interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente ou em direito emergente de decisão a proferir em acção constitutiva, já proposta ou a propor. 3. Não são aplicáveis as providências referidas no nº 1 quando se pretenda acautelar o risco de lesão especialmente prevenido por algumas das providências tipificadas na secção seguinte.» O decretamento de uma providência cautelar não especificada depende, assim, da verificação cumulativa dos seguintes requisitos: a) a probabilidade séria da existência do direito; b) o fundado receio de que outrem cause lesão grave e de difícil reparação a esse direito; c) a inaplicabilidade de qualquer dos procedimentos cautelares típicos; d) a adequação da providência requerida à remoção do “periculum in mora” concretamente verificado, assegurando a efectividade do direito ameaçado; e) e a insusceptibilidade de tal providência implicar um prejuízo superior ao dano que com ela se pretende evitar. Na decisão recorrida o Mmº Juiz “a quo” concluiu, num primeiro momento, que o requerente (promitente comprador) tem o invocado direito à execução específica do contrato-promessa, ou seja a obter do tribunal sentença que produza os efeitos da declaração negocial dos faltosos (os promitentes vendedores). Colocou depois a seguinte questão: «Será que a titularidade de tal direito lhe confere a faculdade de obter a providência requerida, maxime, a ver decretada a “proibição de os requeridos venderem ou onerarem por qualquer forma o imóvel objecto do contrato em apreço?”» Respondeu-lhe negativamente. Será que tal resposta se mostra correcta? Antes de mais, cabe referir que não nos parece oferecer dúvidas que o promitente comprador, mediante providência cautelar não especificada proposta contra o promitente vendedor como dependência da acção de execução específica do contrato-promessa que pretende instaurar, pode pedir que este seja proibido de vender ou onerar a terceiro o prédio objecto daquela promessa.[2] Porém, para que tal providência possa vir a ser decretada torna-se imprescindível a verificação “in casu” de todos os requisitos acima indicados. E se é verdade que o primeiro desses requisitos (a probabilidade séria da existência do direito) se verifica, uma vez que se reconheceu que o requerente teria direito à execução específica do contrato-promessa, já o mesmo não ocorre quanto ao segundo (o fundado receio de que outrem cause lesão grave e de difícil reparação a esse direito). Com efeito, por falta de alegação e consequente prova, não resultou demonstrado qualquer facto donde concretamente se pudesse concluir existir fundado receio de que outrem causasse ao direito do requerente lesão grave e de difícil reparação. É que o requerente não provou, nem sequer alegou, que os requeridos tinham a intenção de proceder à venda ou à oneração do prédio objecto do contrato-promessa, designadamente que estes, após o envio da carta através da qual resolviam o contrato, constante de fls. 173, iniciaram negociações com outros possíveis compradores com vista à alienação desse prédio. Ora, só provando factualidade deste teor, é que se poderia concluir pela existência de risco concreto – não meramente abstracto – de os promitentes vendedores, aqui requeridos, praticarem acto que impedisse ou dificultasse a concretização do direito do requerente à execução específica do contrato-promessa.[3] Assim, embora por razões não inteiramente coincidentes com as que foram expostas na decisão recorrida, pois nesta sustentou-se também – e aqui, a nosso ver, incorrectamente – a inadmissibilidade legal da providência cautelar não especificada quando reportada a situações de execução específica de contrato-promessa, entendemos ser a mesma de manter, negando-se provimento ao recurso de agravo interposto pelo requerente. Concluindo: - o promitente comprador, mediante providência cautelar não especificada intentada contra o promitente vendedor como dependência da acção de execução específica do contrato-promessa que pretende instaurar, pode pedir que este seja proibido de vender ou onerar a terceiro o prédio objecto daquela promessa; - porém, para que esta providência possa ser decretada é necessario que o promitente comprador alegue e prove factualidade donde decorra que o promitente vendedor tem a intenção de proceder à venda ou oneração desse prédio, o que não se verificou no presente caso.*DECISÃO Nos termos expostos, acordam os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso de agravo interposto pelo requerente B………., confirmando-se a decisão recorrida. Custas pelo agravante. Porto, 21.10.2008 Eduardo Manuel B. Martins Rodrigues Pires Mário João Canelas Brás José Bernardino de Carvalho _____________________ [1] Substituiu-se “requerido” pelo “requerente” corrigindo-se manifesto lapso de escrita. [2] Cfr. neste sentido Ac. STJ de 11.11.1997, CJ STJ, Ano V, tomo III, págs. 130/2, Ac. Rel. Lisboa de 19.5.1994, p. 0087792, sumariado in www.dgsi.pt e Ac. Rel. Évora de 19.2.2004, p. 2868/03 – 3 in www.dgsi.pt. [3] Anota-se que no Ac. STJ de 11.11.1997, invocado pelo recorrente a seu favor e em que a providência cautelar foi decretada, o requerente, bem diversamente do que sucede no presente caso, provou que o requerido, promitente vendedor, encetara negociações com outros possíveis adquirentes, no sentido da alienação do prédio objecto do contrato-promessa.
Proc. nº 5019/08 – 2 Agravo Decisão recorrida: proc. nº …./08.7 TBVNG – A da .ª Vara de Competência Mista de Vila Nova de Gaia Recorrente: B………. Recorridos: C………. e outro Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Canelas Brás e José Carvalho Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO O requerente B………., residente na Rua ………., nº …, ………., Vila das Aves, intentou providência cautelar comum contra os requeridos C………. e D………., residentes na Rua ………., nº …., .º, Habitação .., ………., Vila Nova de Gaia, pedindo que estes se abstenham de vender ou prometer vender, onerar ou prometer onerar a fracção identificada no art. 1 do requerimento inicial e, em geral, de praticar qualquer acto, seja de que natureza for, que impeça ou modifique o direito do requerente à execução execução específica do contrato-promessa, bem como que ordene se proceda ao registo de tal decisão na competente Conservatória do Registo Predial. Os requeridos deduziram oposição, pronunciando-se no sentido do indeferimento da providência cautelar. Procedeu-se à inquirição das testemunhas arroladas e depois foi proferida decisão que julgou improcedente o procedimento cautelar. Inconformado, o requerente interpôs recurso de agravo, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões: 1) Salvo o devido respeito por opinião diversa, andou mal o Tribunal “a quo” ao não ordenar a providência requerida “que os requeridos se abstenham de vender ou prometer vender, onerar ou prometer onerar a fracção identificada em 1 deste requerimento e, em geral, de praticar qualquer acto, seja de que natureza for, que impeça ou modifique o direito do requerente à execução execução específica do contrato-promessa, bem como ordene se proceda ao registo de tal decisão na competente Conservatória do Registo Predial. 2) Resulta da fundamentação da decisão de não decretamento da providência que o Tribunal “a quo” concluiu: a) pela inexistência de justo e fundado receio que outrem cause lesão grave e de difícil reparação ao seu direito; b) pela inexistência de “periculum in mora”; c) inadmissibilidade legal; d) pelo não acolhimento pelas partes no contrato-promessa do efeito pretendido pela providência requerida; e) pelo facto de a providência não ser adequada à efectividade do direito ameaçado. 3) Na verdade, resulta inequívoco da matéria provada que as partes sujeitaram o contrato-promessa ao regime da execução específica (art. 4); o requerente tinha e tem interesse na concretização do negócio (art.14) e que os requeridos enviaram uma carta ao requerente através da qual resolveram o contrato-promessa (art. 32). 4) É, pois, apodíctico que os requeridos ao terem resolvido, ilicitamente, o contrato-promessa pretenderam extinguir o negócio. 5) Fica, pois, demonstrada a intenção e vontade dos requeridos de não cumprir o contrato que voluntariamente assumiram. 6) Assim sendo, é notório em face das regras da experiência comum que os requeridos se sentem no direito, ilícito é certo, de alienarem o imóvel a terceiros, 7) O que a acontecer torna irremediavelmente perdido o direito do requerente a cumprir o contrato por via da execução específica. 8) Nem mesmo o registo da acção pode servir de obstáculo à frustração do direito do recorrente à execução específica porquanto estando anteriormente registada provisoriamente uma aquisição do imóvel uma vez realizada a escritura e registo definitivos os efeitos deste retroagem à data daquele registo. 9) Tornando, assim, inviável ou ineficaz a eventual procedência do pedido de execução específica. 10) De igual sorte, não existe qualquer inadmissibilidade legal do fim pretendido. 11) Efectivamente, tendo as partes previsto o recurso à execução específica e sendo essa a vontade manifestada nos autos pelo recorrente, pretende-se com o decretamento da providência não fazer letra morta do que decorre da lei e do contrato. 12) Como refere o Ac. STJ de 1.6.99 (JSTJ 00037405) in www.dgsi.pt. – “As providências cautelares visam impedir que, durante a pendência de qualquer acção, a situação de facto se altere de modo a que a sentença nela proferida, sendo favorável, perca toda a sua eficácia ou parte dela”. 13) Por outro lado, é necessário frisar que tendo o representante solicitado o registo do decretamento da providência, esse mesmo registo acabará por inviabilizar qualquer transacção do imóvel a terceiros. 14) Em suma, no entender do recorrente impõe-se a revogação da decisão do tribunal e a sua substituição por outra que decrete a providência nos exactos termos em que a mesma foi formulada. 15) Nesse sentido, aponta-se vária jurisprudência em sentido favorável ao propugnado pelo recorrente: a) Ac. STJ de 11.11.1997 (JSTJ 00032488), in www.dgsi.pt – “Como providência cautelar não especificada, o promitente comprador com direito de execução específica, pode pedir que o promitente vendedor seja proibido de vender a coisa a terceiros”; b) Ac. RE de 19.2.2004 (proc. 2868/03 – 3), in www.dgsi.pt – “O promitente comprador, em providência cautelar comum não especificada, instaurada contra o promitente vendedor, pode pedir que este seja proibido de vender a terceiro o prédio objecto do contrato-promessa, cuja execução específica pretende fazer valer.” 16) Assim, e salvo o devido respeito por diferente opinião, a douta decisão ora em crise violou o disposto no art. 381 do CPCivil. Consequentemente, pretende que a decisão recorrida seja revogada e substituída por outra que ordene o decretamento da providência. Por extemporaneidade, foi ordenado o desentranhamento das contra-alegações apresentadas pelos requeridos. Colhidos os vistos legais, cumpre então apreciar e decidir.*FUNDAMENTAÇÃO O objecto dos recursos encontra-se balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso – arts. 684 nº 3 e 690 nº 1 do Cód. do Proc. Civil -, sendo ainda de referir que neles se apreciam questões e não razões, que não visam criar decisões sobre matéria nova e que o seu âmbito é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida.*A questão a decidir é a seguinte: Apurar se no presente caso o promitente comprador, através de providência cautelar não especificada intentada contra os promitentes vendedores como dependência de acção de execução específica do contrato-promessa que pretende instaurar, pode pedir que estes sejam proibidos de vender ou onerar a fracção a que aquele contrato se refere.*OS FACTOS A matéria fáctica, tal como foi dada como provada pela 1ª Instância, é a seguinte: 1. Em 24.2.2007 o requerente declarou prometer comprar aos requeridos, e estes declararam prometer vender-lhe, uma fracção autónoma designada pelas letras “CM”, correspondente a uma habitação T1, no .º andar, correspondente a um apartamento com o nº .., do bloco 2, com entrada pela Rua ………., nº …. do prédio em regime de propriedade horizontal sito na Rua ………., nºs …., …., …. e …. e Rua ………., nºs .., .., .., …, … e …, na freguesia de ………., concelho de Vila Nova de Gaia. 2. Tal prédio encontra-se descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o nº 02518/110898 e inscrito na respectiva matriz sob o art. 6069, dispondo da licença de utilização nº …/99 passada pela Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia. 3. Conforme declarado o preço da prometida compra e venda seria de €47.500,00, tendo a requerente pago aos requeridos no dia 24 de Fevereiro de 2007 a quantia de €1.000,00 a título de sinal e o restante seria pago aquando da realização da competente escritura pública de compra e venda. 4. As partes acordaram em sujeitar o contrato-promessa ao regime da execução específica. 5. Ao mesmo tempo, os requeridos iriam comprar uma outra fracção autónoma, razão pela qual só se dispunham a vender a fracção identificada em 1 na mesma ocasião em que celebrassem a escritura pública de compra e venda da nova fracção a adquirir. 6. Para aquisição da nova fracção os requeridos careciam de um empréstimo bancário, por um valor que, além do mais, lhes permitisse pagar a totalidade do empréstimo contraído para aquisição da fracção identificada em 1. 7. Ou seja, os requeridos solicitaram a uma instituição de crédito um empréstimo de €25.000,00, que lhes permitiria pagar as responsabilidades inerentes à fracção em discussão nos autos. 8. Tal aprovação de crédito só foi concedida aos requeridos em 10.4.07. 9. Os requeridos solicitaram à entidade financeira titular da hipoteca da fracção identificada em 1 – E………. (vide inscrição C-2, Ap. 80/…… do doc. 2) a emissão do distrate necessário para cancelamento da hipoteca. 10. O requerente ficou a aguardar que todo aquele processo finalizasse por forma a marcar a competente escritura pública de compra e venda da fracção identificada em 1. 11. Os requeridos enviaram ao requerente uma carta a comunicar a resolução do contrato-promessa, nos termos que constam de fls. 173 aqui integralmente reproduzida. 12. O requerente[1] marcou a escritura pública para 18.5.07 e disso notificou os requeridos, com a devida antecedência, dando-lhes conhecimento do dia, hora e local. 13. No dia 18 de Maio de 2007 os requeridos recusaram-se a outorgar a competente escritura pública. 14. O requerente tinha e tem interesse na concretização do negócio. 15. No mesmo dia referido em 1. os requeridos celebraram um outro contrato-promessa de compra e venda com “F………., SA”. 16. Assumindo, neste último, a qualidade de promitentes compradores. 17. Quiseram vender a sua própria habitação, com a tipologia T1 e adquirirem uma outra de tipologia superior. 18. Pretendiam os requeridos liquidar o empréstimo à instituição bancária de modo a poderem vender ao requerente a fracção livre de ónus e encargos de qualquer espécie. 19. Para tal, recorreram ao crédito bancário na importância de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros), o qual foi concedido. 20. No dia 29 de Março de 2007, a “G………., SA”, incumbida da efectivação das burocracias atinentes ao contrato-promessa, enviou uma carta registada com aviso de recepção aos requeridos. 21. Através de tal missiva, em representação do ora requerente, notificava e comunicava aos requeridos que a escritura pública de compra e venda se encontrava marcada para o dia 26 de Abril de 2007, pelas 10h30m, no Cartório Notarial H………., sito à ………., em Vila Nova de Gaia. 22. Nessa sequência, a requerida mulher solicitou ao balcão de ………., em Vila Nova de Gaia, da E………., que preparassem o distrate para o designado dia da escritura pública, ou seja, 26 de Abril de 2007. 23. Foram efectuados os registos provisórios de aquisição e de hipoteca. 24. Disponibilizaram os requeridos toda a documentação solicitada e necessária para instruir a escritura pública designada. 25. Na convicção de que estaria tudo acertado, começaram a empacotar os seus haveres pessoais para os mesmos serem retirados da fracção prometida. 26. Em cima da hora a referida escritura de compra e venda foi desmarcada pela “G………., SA”, não se tendo realizado. 27. Apenas na véspera, foram os requeridos avisados de que a escritura tinha ficado sem efeito. 28. No dia 26 de Abril de 2007, a “G………., SA” enviou um fax ao balcão de ………. da E………., ao cuidado da Srª Dª I………., comunicando que a escritura pública seria realizada no dia 3 de Maio de 2007, pelas 12h30m, no mesmo Cartório Notarial anteriormente identificado. 29. A data de 3 de Maio de 2007 foi marcada e comunicada à E………. sem que os requeridos concordassem com a mesma. 30. Havia necessidade que os pais da requerida mulher estivessem presentes na data da escritura pública, pois teriam que intervir na mesma na qualidade de fiadores do mútuo. 31. Nesse dia 26 de Abril, depois de muito insistir e demonstrar o desagrado com toda a situação, finalmente aos requeridos foi entregue uma cópia dos contratos-promessa celebrados no mês de Fevereiro. 32. No dia seguinte, os requeridos enviaram uma carta ao requerente e à “G………., SA” através da qual resolviam o contrato-promessa, nos termos que constam de fls. 173 dos autos aqui dada por reproduzida.*O DIREITO As providências cautelares não especificadas vêm previstas nos arts. 381 e segs. do Cód. do Proc. Civil. No primeiro destes artigos nos seus nºs 1, 2 e 3 dispõe-se o seguinte: «1. Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efectividade do direito ameaçado. 2. O interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente ou em direito emergente de decisão a proferir em acção constitutiva, já proposta ou a propor. 3. Não são aplicáveis as providências referidas no nº 1 quando se pretenda acautelar o risco de lesão especialmente prevenido por algumas das providências tipificadas na secção seguinte.» O decretamento de uma providência cautelar não especificada depende, assim, da verificação cumulativa dos seguintes requisitos: a) a probabilidade séria da existência do direito; b) o fundado receio de que outrem cause lesão grave e de difícil reparação a esse direito; c) a inaplicabilidade de qualquer dos procedimentos cautelares típicos; d) a adequação da providência requerida à remoção do “periculum in mora” concretamente verificado, assegurando a efectividade do direito ameaçado; e) e a insusceptibilidade de tal providência implicar um prejuízo superior ao dano que com ela se pretende evitar. Na decisão recorrida o Mmº Juiz “a quo” concluiu, num primeiro momento, que o requerente (promitente comprador) tem o invocado direito à execução específica do contrato-promessa, ou seja a obter do tribunal sentença que produza os efeitos da declaração negocial dos faltosos (os promitentes vendedores). Colocou depois a seguinte questão: «Será que a titularidade de tal direito lhe confere a faculdade de obter a providência requerida, maxime, a ver decretada a “proibição de os requeridos venderem ou onerarem por qualquer forma o imóvel objecto do contrato em apreço?”» Respondeu-lhe negativamente. Será que tal resposta se mostra correcta? Antes de mais, cabe referir que não nos parece oferecer dúvidas que o promitente comprador, mediante providência cautelar não especificada proposta contra o promitente vendedor como dependência da acção de execução específica do contrato-promessa que pretende instaurar, pode pedir que este seja proibido de vender ou onerar a terceiro o prédio objecto daquela promessa.[2] Porém, para que tal providência possa vir a ser decretada torna-se imprescindível a verificação “in casu” de todos os requisitos acima indicados. E se é verdade que o primeiro desses requisitos (a probabilidade séria da existência do direito) se verifica, uma vez que se reconheceu que o requerente teria direito à execução específica do contrato-promessa, já o mesmo não ocorre quanto ao segundo (o fundado receio de que outrem cause lesão grave e de difícil reparação a esse direito). Com efeito, por falta de alegação e consequente prova, não resultou demonstrado qualquer facto donde concretamente se pudesse concluir existir fundado receio de que outrem causasse ao direito do requerente lesão grave e de difícil reparação. É que o requerente não provou, nem sequer alegou, que os requeridos tinham a intenção de proceder à venda ou à oneração do prédio objecto do contrato-promessa, designadamente que estes, após o envio da carta através da qual resolviam o contrato, constante de fls. 173, iniciaram negociações com outros possíveis compradores com vista à alienação desse prédio. Ora, só provando factualidade deste teor, é que se poderia concluir pela existência de risco concreto – não meramente abstracto – de os promitentes vendedores, aqui requeridos, praticarem acto que impedisse ou dificultasse a concretização do direito do requerente à execução específica do contrato-promessa.[3] Assim, embora por razões não inteiramente coincidentes com as que foram expostas na decisão recorrida, pois nesta sustentou-se também – e aqui, a nosso ver, incorrectamente – a inadmissibilidade legal da providência cautelar não especificada quando reportada a situações de execução específica de contrato-promessa, entendemos ser a mesma de manter, negando-se provimento ao recurso de agravo interposto pelo requerente. Concluindo: - o promitente comprador, mediante providência cautelar não especificada intentada contra o promitente vendedor como dependência da acção de execução específica do contrato-promessa que pretende instaurar, pode pedir que este seja proibido de vender ou onerar a terceiro o prédio objecto daquela promessa; - porém, para que esta providência possa ser decretada é necessario que o promitente comprador alegue e prove factualidade donde decorra que o promitente vendedor tem a intenção de proceder à venda ou oneração desse prédio, o que não se verificou no presente caso.*DECISÃO Nos termos expostos, acordam os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso de agravo interposto pelo requerente B………., confirmando-se a decisão recorrida. Custas pelo agravante. Porto, 21.10.2008 Eduardo Manuel B. Martins Rodrigues Pires Mário João Canelas Brás José Bernardino de Carvalho _____________________ [1] Substituiu-se “requerido” pelo “requerente” corrigindo-se manifesto lapso de escrita. [2] Cfr. neste sentido Ac. STJ de 11.11.1997, CJ STJ, Ano V, tomo III, págs. 130/2, Ac. Rel. Lisboa de 19.5.1994, p. 0087792, sumariado in www.dgsi.pt e Ac. Rel. Évora de 19.2.2004, p. 2868/03 – 3 in www.dgsi.pt. [3] Anota-se que no Ac. STJ de 11.11.1997, invocado pelo recorrente a seu favor e em que a providência cautelar foi decretada, o requerente, bem diversamente do que sucede no presente caso, provou que o requerido, promitente vendedor, encetara negociações com outros possíveis adquirentes, no sentido da alienação do prédio objecto do contrato-promessa.