Processo:2368/10.1TXPRT-H.P1
Data do Acordão: 27/09/2011Relator: ARTUR OLIVEIRATribunal:trp
Decisão: Meio processual:

I - Cumprida que seja metade da pena, a liberdade condicional não depende apenas do desempenho do condenado na demonstração de índices favoráveis de ressocialização: exige-se, também, que a libertação do condenado não perturbe a paz social e não contrarie, de forma intolerável, as expetativas da comunidade na validade da norma e no funcionamento do sistema penal. II - A reacção intensa da comunidade relativamente ao tráfico de estupefacientes – pelo conhecimento já da sua forte disseminação na população mais jovem já da estrondosa capacidade destrutiva que lhe é intrínseca, para os toxicómanos, para as famílias, para a sociedade – obriga, no âmbito do instituto da liberdade condicional, a uma particular atenção às exigências de prevenção geral relativamente a condenado pela prática de tal crime, cumprida que se mostre apenas metade da pena.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
ARTUR OLIVEIRA
Descritores
LIBERDADE CONDICIONAL
No do documento
Data do Acordão
09/28/2011
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
REC PENAL.
Decisão
NEGADO PROVIMENTO.
Sumário
I - Cumprida que seja metade da pena, a liberdade condicional não depende apenas do desempenho do condenado na demonstração de índices favoráveis de ressocialização: exige-se, também, que a libertação do condenado não perturbe a paz social e não contrarie, de forma intolerável, as expetativas da comunidade na validade da norma e no funcionamento do sistema penal. II - A reacção intensa da comunidade relativamente ao tráfico de estupefacientes – pelo conhecimento já da sua forte disseminação na população mais jovem já da estrondosa capacidade destrutiva que lhe é intrínseca, para os toxicómanos, para as famílias, para a sociedade – obriga, no âmbito do instituto da liberdade condicional, a uma particular atenção às exigências de prevenção geral relativamente a condenado pela prática de tal crime, cumprida que se mostre apenas metade da pena.
Decisão integral
O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO – SECÇÃO CRIMINAL (QUARTA) 
- no processo n.º 2368/10.1TXPRT-H.P1
- com os juízes Artur Oliveira [relator] e José Piedade, 
- após conferência, profere, em 28 de setembro de 2011, o seguinte Acórdão I - RELATÓRIO
1. No processo gracioso de concessão de liberdade condicional n.º 2368/10.1TXPRT-H.P1, do 1º Juízo Criminal do Tribunal de Execução de Penas do Porto, referente à condenada B…, foi proferido despacho que decidiu não conceder a liberdade condicional, nos seguintes termos [fls. 109-111 dos presentes autos, que integram certidão do processo principal]:
………………………………………
………………………………………
………………………………………
2. Inconformado, a condenada recorre, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões [fls. 3 e 4]:
………………………………………
………………………………………
………………………………………
3. Na resposta, o Ministério Público, refuta todos os argumentos do recurso, pugnando pela manutenção do decidido [fls. 11-19].
4. Idêntica posição é assumida, de forma desenvolvida, neste Tribunal, emitindo Parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso [fls. 117-121].
5. Colhidos os vistos, realizou-se a conferência.
6. Dos autos retiram-se os seguintes elementos relevantes:
- a recorrente foi condenada pela prática, em autoria material, de um crime de Tráfico de estupefacientes, do artigo 21.º, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, com referencia às Tabelas I-A e I-B, do mesmo diploma, na pena de 5 anos de prisão [acórdão desta Relação de 14.7.2008, confirmado por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8.10.2008 [certidão de fls. 25-80];
- de acordo com a liquidação da pena, oportunamente homologada, o meio da pena foi atingido em 26.5.2011, os 2/3 da pena serão atingidos em 26.3.2012, os 5/6 em 26.1.2013 e o termo da pena em 26.11.2013 [fls. 60-61]; 
- O Relatório de Liberdade Condicional elaborado pela Direção-Geral dos Serviços Prisionais conclui pela seguinte “Avaliação e Parecer”: “B… tem apresentado boa adaptação às regras institucionais, assim como tem revelado competências pessoais e sociais para em meio livre gerir o seu percurso de vida de forma normativa. Trata-se de uma reclusa primária, sendo o próprio meio de residência a relacionar o actual contacto com o sistema da justiça à influência do ex-companheiro. face ao descrito e a motivação para a mudança apresentado por B…, sou de parecer favorável à concessão de liberdade condicional, nesta fase de cumprimento da pena” [fls. 93-94];
- O Relatório social para concessão de liberdade condicional, elaborado pela Direção-Geral de Reinserção Social conclui nos seguintes termos: “B… cumpre pena de prisão pela primeira vez, mostrando comportamento adequado em contexto prisional e posicionamento crítico face aos factos pêlos quais cumpre pena, evidenciando arrependimento. Apresenta factores de protecção traduzidos no enquadramento habitacional e familiar no agregado familiar de origem, junto dos pais e três filhos menores, com condições económicas suficientes para assegurar a satisfação das necessidades básicas á descendente até a sua integração laborai, que perspectiva concretizar em liberdade.
A condenada mostra competências e capacidades pessoas e sociais para a reorganização da sua vida e para a adopção de comportamentos pró-sociais e normativos. 
Face ao exposto, apresentamos parecer favorável à concessão de liberdade condicional de B…” [fls. 100].
- O Conselho Técnico emitiu, por unanimidade, parecer favorável à concessão da liberdade condicional [fls. 101];
- A condenada beneficiou de 3 licenças jurisdicionais que decorreram sem incidentes; está em regime aberto no interior desde 13.07.2010; e gozou 2 saídas de curta duração, também sem registo de incidentes [fls. 88];
- Tem desempenhado tarefas no seio do estabelecimento prisional, avaliadas de “muito bom”; inscreveu-se e tem frequentado com êxito um curso de formação; expressa motivação para a mudança de vida; mantém um bom comportamento no meio prisional, sem qualquer registo disciplinar;
- No exterior, tem o apoio dos pais e dos filhos (3, com idades compreendidas entre os 12 e os 3 anos]; projeta boa imagem ao nível da comunidade de residência, com uma representação social favorável [fls. 89-100].
- Ouvida a condenada, esta reconhece que errou e justifica a sua atuação com as dificuldades económicas que na altura atravessava e a influência do companheiro (também em cumprimento de pena); afirma que nunca foi consumidora de droga, que frequenta o 9º Ano da escolaridade e que pretende ir residir com os pais e filhos e trabalhar, a tempo inteiro, no café onde trabalhou antes da detenção [fls. 103].

II – FUNDAMENTAÇÃO
7. Está a condenada em condições de lhe ser aplicada a liberdade condicional? Por palavras da recorrente: mostram-se cumpridos os requisitos legais estabelecidos para a aplicação da liberdade condicional ao meio da pena?
8. Antecipemos que a resposta será negativa. Estabelece o n.º 2 do artigo 61.º do Código Penal:
“2 - O tribunal coloca o condenado a prisão em liberdade condicional quando se encontrar cumprida metade da pena e no mínimo seis meses se:
a) For fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da pena de prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e 
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem e da paz social. 
9. São, portanto, dois os pressupostos cumulativos da aplicação da liberdade condicional: (i) a satisfação das exigências de prevenção especial que ao caso cabem; e, (ii) a compatibilização da medida com o quadro de expetativas da sociedade quanto à tutela do ordenamento jurídico, ou seja, a satisfação das exigências de prevenção geral.
10. (i) Mediante o primeiro requisito acentuam-se razões de prevenção especial, tanto negativa – ou prevenção da reincidência –, como positiva – ou prevenção especial de socialização. Para o efeito, importa considerar as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da pena de prisão, ou seja, avaliar as repercussões que o cumprimento da pena está a ter na personalidade do arguido e poderá vir a ter na sua vida futura. Mais do que considerar a vontade subjectiva do condenado de passar a respeitar o Direito, importa avaliar a capacidade objectiva de readaptação social que este revela.
11. No caso dos autos, todos os elementos apurados apontam para a verificação deste requisito: a condenada interiorizou que agiu mal, em desconformidade com o Direito, e dá sinais de que procurará afastar-se, no futuro, da prática de novos crimes; por outro lado, assumiu uma postura disciplinada ao longo do cumprimento da pena e quis valorizar-se, desempenhando, com qualidade tarefas que lhe foram atribuídas e melhorando as suas habilitações académicas, tudo tendo em vista garantir melhores condições de trabalho quando em liberdade.
12. Temos assim que a condenada, durante o tempo de prisão já decorrido, aceitou as razões da reclusão e fez um esforço de qualificação que, associado à aproximação à família mais direta (filhos e mãe) e à extinção da relação marital que mantinha à data da prática dos factos nos permitem afirmar que apresenta, hoje, condições para a elaboração de um juízo de prognose favorável – em que as expectativas de reinserção são manifestamente superiores aos riscos decorrentes da antecipação da sua liberdade. 
13. (ii) O problema surge com o seguindo requisito: a compatibilização da libertação da condenada com a defesa da ordem e da paz social [alínea b)].
14. Como vimos, a Lei impõe que a aplicação da liberdade condicional [facultativa] respeite as exigências de prevenção geral positiva no seu grau mínimo, ou seja, que garanta a expectativa da comunidade na manutenção da validade das normas jurídicas violadas [nesse sentido, já Figueiredo Dias, in Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, 1993, pág. 540].
15. E compreende-se: cumprida que seja metade da pena, a liberdade condicional não depende apenas do desempenho [performance] do condenado na demonstração de índices favoráveis de ressocialização aferidos de acordo com as circunstâncias concretas do caso, da sua conduta anterior e posterior à condenação, da sua própria personalidade e da evolução ao longo do cumprimento da respectiva pena de prisão. Exige-se, também, que perante um tão limitado período de cumprimento da pena estipulada pelo tribunal, a libertação do condenado não perturbe, com gravidade, a paz social e, sobretudo, não contrarie, de forma intolerável, as expetativas da comunidade na validade da norma violada e no funcionamento do sistema penal.
16. Ora, no caso dos autos, a recorrente vem condenada pela prática de um crime de Tráfico de estupefacientes, do artigo 21.º, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 5 anos, portanto, em medida próxima do limite mínimo da previsão legal [4 a 12 anos].
17. A comunidade continua a reagir de forma intensa a este tipo de criminalidade. E com razão, dada a forte disseminação que conhece sobretudo na população mais jovem e na estrondosa capacidade destrutiva que tem, não só para os toxicómanos, como também para as suas famílias e em última instância para a sociedade. Como se refere no Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 426/91, de 6 de Novembro, publicado in D.R., II Série, em 2/4/92: "(…) o tráfico de estupefacientes põe em causa uma pluralidade de bens jurídicos: a vida, a integridade física e a liberdade dos virtuais consumidores de estupefacientes e a própria vida em sociedade, na medida em que dificulta a sua inserção social e possui comprovados efeitos criminógenos (…)" – sem esquecer o papel essencial que os vendedores de rua têm no grande tráfico. 
18. Também o Supremo Tribunal de Justiça tem assinalado este forte sentimento de comunitário. Veja-se, por exemplo, o Acórdão de 13.1.2011 [Henriques Gaspar], em cujo sumário se lê: “(…) VI - Os tráficos de estupefacientes são comunitariamente sentidos como actividades de largo espectro de afectação de valores sociais fundamentais, e de intensos riscos para bens jurídicos estruturantes, e cuja desconsideração perturba a própria coesão social, não só pelo enorme perigo e dano para a saúde dos consumidores de produtos estupefacientes, como por todo o cortejo de fracturas sociais que lhes anda associado, quer nas famílias, quer decorrente de infracções concomitantes, quer ainda pela corrosão das economias legais com os ganhos ilícitos resultantes das actividades de tráfico. VII - A dimensão dos riscos e das consequências faz surgir, neste domínio, uma particular saliência das finalidades de prevenção geral – prevenção de integração para recomposição dos valores afectados e para a afirmação comunitária da validade das normas – que, punindo as actividades de tráfico, protegem tais valores. (…)” [No mesmo sentido, ver tb. o Acórdão de 10.2.2010 (do mesmo Relator)].
19. Idêntica tem sido a posição assumida por esta Relação, designadamente no Acórdão de 14.7.2010 [Artur Vargues], em cujo sumário se lê: “I- Na análise dos pressupostos da aplicação da liberdade condicional quando se encontrar cumprida metade da pena, a avaliação da compatibilidade da libertação do condenado com a defesa da ordem e da paz social (al. b) do n.º 2 do art. 61.º, do CP) remete para elementos como a neutralização do efeito negativo do crime na comunidade, a dissuasão e fortalecimento do seu sentimento de justiça e de confiança na validade da norma jurídica violada e, portanto, para a natureza e gravidade do crime praticado. II- Em caso de conflito entre os vectores da prevenção geral e de prevenção especial, o primado pertence à prevenção geral.”
20. Também o Acórdão de 20.1.2010 [Joaquim Gomes] – que em muitos passos seguimos – assim sumariado: “I - A concessão de liberdade condicional quando o condenado atingir metade do cumprimento da pena de prisão a que foi sujeito, está dependente de dois requisitos cumulativos (art. 61º, 2, al. a) e b) do CP). II - O primeiro requisito acentua essencialmente razões de prevenção especial, seja negativa (de que o condenado não cometa novos crimes) seja positiva (de reinserção social). III - O segundo requisito acentua as finalidades de execução das penas que, de acordo com o art. 40º, 1 do C. Penal, consiste na protecção dos bens jurídicos e na reintegração do agente na sociedade. IV - Daí que a concessão da liberdade condicional, ao abrigo do disposto no art. 61º, n.º 2, do C. Penal, tenha sempre carácter excepcional e não automático, estando condicionada à personalidade do arguido e fortemente limitada pelas finalidades de execução das penas”.
21. Temos assim – e em conclusão –, que a aplicação da liberdade condicional à recorrente não cumpre a necessidade de compatibilização com as exigências de prevenção geral [alínea b) do artigo 61.º do CP]. Na verdade, atentas as circunstâncias do caso, a dimensão dos riscos e das consequências do crime praticado faz surgir, com particular incidência, finalidades de prevenção geral (positiva) – prevenção de integração para recomposição dos valores afectados e de afirmação comunitária da validade das normas – que se mostram incompatíveis com a libertação da recorrente quando se acha cumprida apenas metade da pena em que foi condenada.
22. Pelo que, improcede o presente recurso. 
A responsabilidade pela taxa de justiça
Uma vez que a condenada decaiu no recurso que interpôs é responsável pelo pagamento da taxa de justiça [artigo 513.º, do CPP], cujo valor é fixado entre 3 e 6 UC [artigo 8.º, n.º 5 e Tabela III, do Regulamento das Custas Processuais]. Tendo em conta a complexidade do processo, julga-se adequado fixar essa taxa em 3 [três] UC.

III – DISPOSITIVO
Pelo exposto, os Juízes acordam em:
● Negar provimento ao recurso interposto pela recorrente B…, mantendo a decisão recorrida.
Taxa de justiça: 3 UC, a cargo da recorrente.
[Elaborado e revisto pelo relator – em grafia conforme ao Acordo Ortográfico de 1990]

Porto, 28 de setembro de 2011
Artur Manuel da Silva Oliveira
José Joaquim Aniceto Piedade

O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO – SECÇÃO CRIMINAL (QUARTA) - no processo n.º 2368/10.1TXPRT-H.P1 - com os juízes Artur Oliveira [relator] e José Piedade, - após conferência, profere, em 28 de setembro de 2011, o seguinte Acórdão I - RELATÓRIO 1. No processo gracioso de concessão de liberdade condicional n.º 2368/10.1TXPRT-H.P1, do 1º Juízo Criminal do Tribunal de Execução de Penas do Porto, referente à condenada B…, foi proferido despacho que decidiu não conceder a liberdade condicional, nos seguintes termos [fls. 109-111 dos presentes autos, que integram certidão do processo principal]: ……………………………………… ……………………………………… ……………………………………… 2. Inconformado, a condenada recorre, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões [fls. 3 e 4]: ……………………………………… ……………………………………… ……………………………………… 3. Na resposta, o Ministério Público, refuta todos os argumentos do recurso, pugnando pela manutenção do decidido [fls. 11-19]. 4. Idêntica posição é assumida, de forma desenvolvida, neste Tribunal, emitindo Parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso [fls. 117-121]. 5. Colhidos os vistos, realizou-se a conferência. 6. Dos autos retiram-se os seguintes elementos relevantes: - a recorrente foi condenada pela prática, em autoria material, de um crime de Tráfico de estupefacientes, do artigo 21.º, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, com referencia às Tabelas I-A e I-B, do mesmo diploma, na pena de 5 anos de prisão [acórdão desta Relação de 14.7.2008, confirmado por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8.10.2008 [certidão de fls. 25-80]; - de acordo com a liquidação da pena, oportunamente homologada, o meio da pena foi atingido em 26.5.2011, os 2/3 da pena serão atingidos em 26.3.2012, os 5/6 em 26.1.2013 e o termo da pena em 26.11.2013 [fls. 60-61]; - O Relatório de Liberdade Condicional elaborado pela Direção-Geral dos Serviços Prisionais conclui pela seguinte “Avaliação e Parecer”: “B… tem apresentado boa adaptação às regras institucionais, assim como tem revelado competências pessoais e sociais para em meio livre gerir o seu percurso de vida de forma normativa. Trata-se de uma reclusa primária, sendo o próprio meio de residência a relacionar o actual contacto com o sistema da justiça à influência do ex-companheiro. face ao descrito e a motivação para a mudança apresentado por B…, sou de parecer favorável à concessão de liberdade condicional, nesta fase de cumprimento da pena” [fls. 93-94]; - O Relatório social para concessão de liberdade condicional, elaborado pela Direção-Geral de Reinserção Social conclui nos seguintes termos: “B… cumpre pena de prisão pela primeira vez, mostrando comportamento adequado em contexto prisional e posicionamento crítico face aos factos pêlos quais cumpre pena, evidenciando arrependimento. Apresenta factores de protecção traduzidos no enquadramento habitacional e familiar no agregado familiar de origem, junto dos pais e três filhos menores, com condições económicas suficientes para assegurar a satisfação das necessidades básicas á descendente até a sua integração laborai, que perspectiva concretizar em liberdade. A condenada mostra competências e capacidades pessoas e sociais para a reorganização da sua vida e para a adopção de comportamentos pró-sociais e normativos. Face ao exposto, apresentamos parecer favorável à concessão de liberdade condicional de B…” [fls. 100]. - O Conselho Técnico emitiu, por unanimidade, parecer favorável à concessão da liberdade condicional [fls. 101]; - A condenada beneficiou de 3 licenças jurisdicionais que decorreram sem incidentes; está em regime aberto no interior desde 13.07.2010; e gozou 2 saídas de curta duração, também sem registo de incidentes [fls. 88]; - Tem desempenhado tarefas no seio do estabelecimento prisional, avaliadas de “muito bom”; inscreveu-se e tem frequentado com êxito um curso de formação; expressa motivação para a mudança de vida; mantém um bom comportamento no meio prisional, sem qualquer registo disciplinar; - No exterior, tem o apoio dos pais e dos filhos (3, com idades compreendidas entre os 12 e os 3 anos]; projeta boa imagem ao nível da comunidade de residência, com uma representação social favorável [fls. 89-100]. - Ouvida a condenada, esta reconhece que errou e justifica a sua atuação com as dificuldades económicas que na altura atravessava e a influência do companheiro (também em cumprimento de pena); afirma que nunca foi consumidora de droga, que frequenta o 9º Ano da escolaridade e que pretende ir residir com os pais e filhos e trabalhar, a tempo inteiro, no café onde trabalhou antes da detenção [fls. 103]. II – FUNDAMENTAÇÃO 7. Está a condenada em condições de lhe ser aplicada a liberdade condicional? Por palavras da recorrente: mostram-se cumpridos os requisitos legais estabelecidos para a aplicação da liberdade condicional ao meio da pena? 8. Antecipemos que a resposta será negativa. Estabelece o n.º 2 do artigo 61.º do Código Penal: “2 - O tribunal coloca o condenado a prisão em liberdade condicional quando se encontrar cumprida metade da pena e no mínimo seis meses se: a) For fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da pena de prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem e da paz social. 9. São, portanto, dois os pressupostos cumulativos da aplicação da liberdade condicional: (i) a satisfação das exigências de prevenção especial que ao caso cabem; e, (ii) a compatibilização da medida com o quadro de expetativas da sociedade quanto à tutela do ordenamento jurídico, ou seja, a satisfação das exigências de prevenção geral. 10. (i) Mediante o primeiro requisito acentuam-se razões de prevenção especial, tanto negativa – ou prevenção da reincidência –, como positiva – ou prevenção especial de socialização. Para o efeito, importa considerar as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da pena de prisão, ou seja, avaliar as repercussões que o cumprimento da pena está a ter na personalidade do arguido e poderá vir a ter na sua vida futura. Mais do que considerar a vontade subjectiva do condenado de passar a respeitar o Direito, importa avaliar a capacidade objectiva de readaptação social que este revela. 11. No caso dos autos, todos os elementos apurados apontam para a verificação deste requisito: a condenada interiorizou que agiu mal, em desconformidade com o Direito, e dá sinais de que procurará afastar-se, no futuro, da prática de novos crimes; por outro lado, assumiu uma postura disciplinada ao longo do cumprimento da pena e quis valorizar-se, desempenhando, com qualidade tarefas que lhe foram atribuídas e melhorando as suas habilitações académicas, tudo tendo em vista garantir melhores condições de trabalho quando em liberdade. 12. Temos assim que a condenada, durante o tempo de prisão já decorrido, aceitou as razões da reclusão e fez um esforço de qualificação que, associado à aproximação à família mais direta (filhos e mãe) e à extinção da relação marital que mantinha à data da prática dos factos nos permitem afirmar que apresenta, hoje, condições para a elaboração de um juízo de prognose favorável – em que as expectativas de reinserção são manifestamente superiores aos riscos decorrentes da antecipação da sua liberdade. 13. (ii) O problema surge com o seguindo requisito: a compatibilização da libertação da condenada com a defesa da ordem e da paz social [alínea b)]. 14. Como vimos, a Lei impõe que a aplicação da liberdade condicional [facultativa] respeite as exigências de prevenção geral positiva no seu grau mínimo, ou seja, que garanta a expectativa da comunidade na manutenção da validade das normas jurídicas violadas [nesse sentido, já Figueiredo Dias, in Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, 1993, pág. 540]. 15. E compreende-se: cumprida que seja metade da pena, a liberdade condicional não depende apenas do desempenho [performance] do condenado na demonstração de índices favoráveis de ressocialização aferidos de acordo com as circunstâncias concretas do caso, da sua conduta anterior e posterior à condenação, da sua própria personalidade e da evolução ao longo do cumprimento da respectiva pena de prisão. Exige-se, também, que perante um tão limitado período de cumprimento da pena estipulada pelo tribunal, a libertação do condenado não perturbe, com gravidade, a paz social e, sobretudo, não contrarie, de forma intolerável, as expetativas da comunidade na validade da norma violada e no funcionamento do sistema penal. 16. Ora, no caso dos autos, a recorrente vem condenada pela prática de um crime de Tráfico de estupefacientes, do artigo 21.º, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 5 anos, portanto, em medida próxima do limite mínimo da previsão legal [4 a 12 anos]. 17. A comunidade continua a reagir de forma intensa a este tipo de criminalidade. E com razão, dada a forte disseminação que conhece sobretudo na população mais jovem e na estrondosa capacidade destrutiva que tem, não só para os toxicómanos, como também para as suas famílias e em última instância para a sociedade. Como se refere no Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 426/91, de 6 de Novembro, publicado in D.R., II Série, em 2/4/92: "(…) o tráfico de estupefacientes põe em causa uma pluralidade de bens jurídicos: a vida, a integridade física e a liberdade dos virtuais consumidores de estupefacientes e a própria vida em sociedade, na medida em que dificulta a sua inserção social e possui comprovados efeitos criminógenos (…)" – sem esquecer o papel essencial que os vendedores de rua têm no grande tráfico. 18. Também o Supremo Tribunal de Justiça tem assinalado este forte sentimento de comunitário. Veja-se, por exemplo, o Acórdão de 13.1.2011 [Henriques Gaspar], em cujo sumário se lê: “(…) VI - Os tráficos de estupefacientes são comunitariamente sentidos como actividades de largo espectro de afectação de valores sociais fundamentais, e de intensos riscos para bens jurídicos estruturantes, e cuja desconsideração perturba a própria coesão social, não só pelo enorme perigo e dano para a saúde dos consumidores de produtos estupefacientes, como por todo o cortejo de fracturas sociais que lhes anda associado, quer nas famílias, quer decorrente de infracções concomitantes, quer ainda pela corrosão das economias legais com os ganhos ilícitos resultantes das actividades de tráfico. VII - A dimensão dos riscos e das consequências faz surgir, neste domínio, uma particular saliência das finalidades de prevenção geral – prevenção de integração para recomposição dos valores afectados e para a afirmação comunitária da validade das normas – que, punindo as actividades de tráfico, protegem tais valores. (…)” [No mesmo sentido, ver tb. o Acórdão de 10.2.2010 (do mesmo Relator)]. 19. Idêntica tem sido a posição assumida por esta Relação, designadamente no Acórdão de 14.7.2010 [Artur Vargues], em cujo sumário se lê: “I- Na análise dos pressupostos da aplicação da liberdade condicional quando se encontrar cumprida metade da pena, a avaliação da compatibilidade da libertação do condenado com a defesa da ordem e da paz social (al. b) do n.º 2 do art. 61.º, do CP) remete para elementos como a neutralização do efeito negativo do crime na comunidade, a dissuasão e fortalecimento do seu sentimento de justiça e de confiança na validade da norma jurídica violada e, portanto, para a natureza e gravidade do crime praticado. II- Em caso de conflito entre os vectores da prevenção geral e de prevenção especial, o primado pertence à prevenção geral.” 20. Também o Acórdão de 20.1.2010 [Joaquim Gomes] – que em muitos passos seguimos – assim sumariado: “I - A concessão de liberdade condicional quando o condenado atingir metade do cumprimento da pena de prisão a que foi sujeito, está dependente de dois requisitos cumulativos (art. 61º, 2, al. a) e b) do CP). II - O primeiro requisito acentua essencialmente razões de prevenção especial, seja negativa (de que o condenado não cometa novos crimes) seja positiva (de reinserção social). III - O segundo requisito acentua as finalidades de execução das penas que, de acordo com o art. 40º, 1 do C. Penal, consiste na protecção dos bens jurídicos e na reintegração do agente na sociedade. IV - Daí que a concessão da liberdade condicional, ao abrigo do disposto no art. 61º, n.º 2, do C. Penal, tenha sempre carácter excepcional e não automático, estando condicionada à personalidade do arguido e fortemente limitada pelas finalidades de execução das penas”. 21. Temos assim – e em conclusão –, que a aplicação da liberdade condicional à recorrente não cumpre a necessidade de compatibilização com as exigências de prevenção geral [alínea b) do artigo 61.º do CP]. Na verdade, atentas as circunstâncias do caso, a dimensão dos riscos e das consequências do crime praticado faz surgir, com particular incidência, finalidades de prevenção geral (positiva) – prevenção de integração para recomposição dos valores afectados e de afirmação comunitária da validade das normas – que se mostram incompatíveis com a libertação da recorrente quando se acha cumprida apenas metade da pena em que foi condenada. 22. Pelo que, improcede o presente recurso. A responsabilidade pela taxa de justiça Uma vez que a condenada decaiu no recurso que interpôs é responsável pelo pagamento da taxa de justiça [artigo 513.º, do CPP], cujo valor é fixado entre 3 e 6 UC [artigo 8.º, n.º 5 e Tabela III, do Regulamento das Custas Processuais]. Tendo em conta a complexidade do processo, julga-se adequado fixar essa taxa em 3 [três] UC. III – DISPOSITIVO Pelo exposto, os Juízes acordam em: ● Negar provimento ao recurso interposto pela recorrente B…, mantendo a decisão recorrida. Taxa de justiça: 3 UC, a cargo da recorrente. [Elaborado e revisto pelo relator – em grafia conforme ao Acordo Ortográfico de 1990] Porto, 28 de setembro de 2011 Artur Manuel da Silva Oliveira José Joaquim Aniceto Piedade