I - A análise grafológica comporta uma vertente essencialmente técnica fazendo apelo a conhecimentos especiais, sendo o meio particularmente idóneo para o estabelecimento da autoria de assinaturas. II - Não tendo sido requerido tal exame pericial, não cabe ao tribunal, empiricamente, proceder ao confronto das assinaturas, dada a margem de erro que tal actividade comporta. III - Sendo o título que suporta a execução a que a oposição se reporta um documento particular, o executado pode, nos termos do artigo 816.° CPC, para além dos fundamentos de oposição especificados no artigo 814.° CPC, invocar qualquer fundamento que pudesse deduzir como defesa no processo declarativo.
Apelação 6322/08.5YYPRT-A Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1. Relatório B… deduziu oposição à execução comum que lhe moveu C…, S.A., pedindo a sua absolvição do pedido. Alegou para tanto, e em síntese, que desconhece por completo a existência da livrança dada à execução, não tendo procedido à sua assinatura da mesma. Contestou a exequente, alegando que, tendo em vista a concessão de financiamento o executado forneceu-lhe todos os elementos necessários, incluindo os seus elementos de identificação pessoal, e que aceitou o contrato de financiamento, bem como também, na mesma data, uma livrança em branco, tendo autorizado o respectivo preenchimento no caso de incumprimento contratual. Foi proferido despacho saneador, e seleccionada matéria de facto relevante. Procedeu-se a julgamento, tendo sido proferida decisão que julgou a oposição improcedente. Inconformado, recorreu o opoente, apresentando as seguintes conclusões: «1- Vem o presente recurso interposto da sentença (tanto da matéria de facto como da de direito), na qual o tribunal a quo julgou improcedente a oposição a execução. 2- Pretende o recorrente ver alterada a matéria de facto dada como assente no ponto 1 da base instrutória, que menciona: "A assinatura constante do documento referido em A), com os dizeres "B…", foi efectuada pelo punho do aqui opoente", decorrente do que infra se exporá quanto à prova documental junta com o processo e as declarações da única testemunha ouvida em sede de audiência de discussão e julgamento. 3- Citado da acção executiva intentada pela recorrida, veio o recorrente oferecer a sua oposição, sendo que uma das questões mais importantes, o verdadeiro thema decidendum, é o facto do executado não ter assinado a livrança que serve de título à execução, pelo que se impugnou a assinatura constante da mesma, requerendo-se a suspensão da execução. 4- No entanto, na contestação apresentada pela recorrida, veio a mesma negar tal facto, alegando que tendo em vista o financiamento, o recorrente forneceu todos os elementos necessários, nomeadamente, os elementos de identificação pessoal, bem como aceitou o contrato de financiamento e uma letra em branco, tendo autorizado o seu preenchimento em caso de incumprimento contratual. 5- Da sentença aqui recorrida, na sua motivação, resultou coma factos provados, que assinatura aposta na letra é do punho do recorrente, que entre a exequente e executado foi celebrado o acordo escrito constante de fls. 31 e 32 dos autos. 6- No que se refere à base instrutória resultou provado, que foi fornecido pelo recorrente, com vista ao financiamento, fotocópias do seu bilhete de identidade, cartão de contribuinte, dados da sua conta bancária, declaração de IRS de 2005. 7- Citando-se a sentença recorrida pode ler-se: "No caso dos autos, tendo sido a exequente quem deu a livrança posta em crise à execução, é a ela, enquanto sua apresentante, que compete o ónus da prova da autenticidade das assinaturas em jogo". 8- Mais ainda: "Ora, tendo presente tal ónus da prova e a circunstância da aqui exequente ter feito a prova respectiva – veja-se a resposta positiva que mereceu o n.° 9 da base instrutória -, temos de concluir que a exequente fez a prova da genuidade da assinatura em causa, o que, associado ao princípio basilar da literalidade que rege os títulos de crédito, resulta na improcedência da tese do oponente". 9- Tal prova, resulta por um lado, que o recorrente, na sua oposição apenas invocou a falta de genuidade da assinatura da livrança, não tendo impugnado o contrato de mútuo, após tal documento ser junto aos autos; por outro que, do documento junto com a petição de oposição, a título de princípio de prova (cópia do Cartão do Cidadão) não resulta qualquer discrepância com as assinaturas da letra e contrato. 10- Não se impugnou o contrato de mútuo, por se entender que seria contrário a toda a defesa apresentada em sede de oposição, uma vez que, foi alegado que a assinatura da letra – título executivo – não era do punho do recorrente, pelo que não teria o mesmo qualquer relação contratual com a recorrida. 11- Mesmo que assim não se entenda, só se pode dar como provado que tal contrato foi assinado pelo executado baseado numa presunção, que é assente nas regras da experiência, senão leia-se a resposta à matéria de facto fls. 65 e ss: "...bem como nas regras da experiência que presidem na outorga deste tipo de contrato, o qual normalmente é assinado conjuntamente e num mesmo momento temporal com a livrança em branco que serve de garantia ao cumprimento desse mesmo contrato". 12- Não devia o Tribunal a quo basear-se apenas nas regras da experiência comum, mas também nas concretas circunstâncias do caso, nomeadamente, e ao contrário do que é entendido pelo Tribunal recorrido, nenhuma semelhança existe entre as assinaturas apostas na livrança, no contrato e no cartão de cidadão. 13- De uma simples observação óptica verifica-se as discrepâncias entre as variadas assinaturas dos documentos juntos aos autos (nomeadamente cartão do cidadão e procuração forense assinados pelo recorrente e livrança, contrato de mútuo, declaração de IRS, cujas assinaturas não são do seu punho). 14- Nas assinaturas efectuadas pelo punho do executado, no nome "B…", verifica-se que coloca sempre acento na letra "e", enquanto nas outras assinaturas não têm as mesmas acento. 15- A letra "s" é sempre diferente nas assinaturas que não foram feitas pelo recorrente, bem coma, entre outras, as letras "u", "n" e "r". 16- Só estes factos seriam suficientes para abalar a convicção do Tribunal a quo, quanto à veracidade das assinaturas, no entanto, existem outros factos, que colocam em causa tal veracidade, nomeadamente, tanto o contrato de mútuo como a livrança, não terem sido assinados perante o consultor da exequente, testemunha ouvida na audiência de discussão e julgamento. 17- Foi afirmado pela testemunha, que os documentos foram recepcionados via postal, ou seja, nunca viu de facto quem os assinou. 18- Mas mesmo assim para o Tribunal recorrido "...serviu ainda corno auxiliar da formação da convicção, o depoimento da testemunha D…, consultor da exequente, que corroborou que normalmente a assinatura do contrato de mútuo e da livrança em branco são feitas num mesmo momento temporal'. 19- Não é por ser habitual em situações idênticas, assinar ao mesmo tempo a livrança e contrato, que se pode dar como provado que, no caso dos autos, a assinatura dos mesmos é verdadeira, quando existem fortes indícios em contrário. 20- E é exemplo disso, não só as discrepâncias em relação às assinaturas, mas também o facto da declaração de rendimentos junta, para obtenção de crédito, não ter folha de rosto, a assinatura constante da mesma não ser do punho do recorrente, uma vez que apresenta diferenças visíveis a olho nu, com as assinaturas da procuração forense e cartão de cidadão, por outro lado, a declaração não se encontra assinada, e está carimbada na segunda página, sendo que, os serviços de finanças não aceitariam uma declaração não datada e nem carimbariam nessa página, outrossim na folha de rosto. 21- Mais ainda, o executado no ano de 2005, data da declaração, encontrava-se desempregado e não obtinha quaisquer rendimentos, muito menos a título de trabalhador independente. 22- Tanto a declaração é falsa, que a retenção na fonte nunca seria de 10%, mas sim de 20%. 23- Outro facto que importa não descuidar, é que o recorrente residia na Maia, mas o contrato foi celebrado em Braga, destinando-se á compra de um purificador de ar no valor de 6.054,60 €, quando o recorrente se encontrava desempregado. 24- Como será possível, obter financiamento com uma declaração de rendimentos falsa, sendo a exequente uma entidade muito experiente neste tipo de situações? 25- Pelo que após tudo o que fica dito, só uma pode ser a conclusão, nunca o recorrente assinou qualquer contrato de mútuo ou qualquer livrança, devendo colocar-se a hipótese de alguém se ter apropriado dos documentos para conseguir tais fins. 26- A tese do Tribunal recorrido é completamente abalada ao dar como provado que as assinaturas constantes dos mesmos são verídicas, baseando-se na experiência comum e no princípio da livre apreciação da prova, sendo que se associa a este principio a obrigatoriedade da sua fundamentação, com elementos objectivos que a tornam crível e livre de qualquer dúvida. 27- No entanto, existem dúvidas, há discrepâncias entre as várias assinaturas, os factos do caso concreto demonstram que não há qualquer relação contratual entre o recorrente e recorrida. 28- Foi impugnada a autoria da assinatura da letra apresentada, pelo que nunca deveria ter sido valorada, na formação da convicção do julgador de forma a julgar que a assinatura pertencia ao recorrente. 29- No tocante à força probatória dos documentos particulares dispõe o artigo 376° do CC que "o documento particular cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes faz prova plena quanto às declarações nele atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento" (n° 1), sendo que "os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante" (n°2). 30- Nas palavras de Lebre de Freitas, A Falsidade no Direito Probatório, Livraria Almedina, Coimbra, 1984, pág. 55: "A força probatória do documento particular circunscreve-se, assim, no âmbito das declarações (de ciência e de vontade) que nele constam como feitas pelo respectivo subscritor". 31- No entanto, e de acordo com o Ac. da RL de 17-09-2009, processo 785/06.OYXLSB.L1-6, refere: "Ao invés dos documentos autênticos, que fazem prova por si mesmos da proveniência que ostentam, os documentos particulares não provam, só por si, a sua procedência da pessoa que aparentemente assume a sua autoria ou paternidade". 32- No acórdão citado, pode ler-se: "A parte contra a qual o documento particular é apresentado pode impugnar a veracidade da letra ou da assinatura ou declarar que não sabe se aquelas são verdadeiras, não lhe sendo imputadas, caso em que cabe à parte que o ofereceu fazer prova da veracidade da subscrição pela pessoa a cuja autoria é atribuído". 33- O mesmo decorre do art. 374° do CC, no entanto, não se poderá admitir que a parte contrária, recorrida, tenha feito prova que as assinaturas em causa sejam da autoria do recorrente. 34- Uma vez que, a testemunha ouvida não viu quem assinou os documentos, não viu os originais dos restantes documentos que compuseram o crédito, sendo que estes foram-lhe remetidos por telecópia, nenhuma prova se fez quanto à veracidade de tais assinaturas, pelo que deveria ter sido requerida a prova pericial à letra, o que competia à recorrida. 35- Assim, a dar-se como provado que o contrato de mútuo e a livrança foram assinados pelo recorrente e, consequentemente, o prosseguimento da execução, estará a ser condenado por uma dívida que nunca contraiu. 36- Mais ainda, é incompreensível que financeiras como a recorrida aprovem créditos sem que os contratos sejam assinados perante os seus consultores, ou sem verem os originais dos documentos. 37- Deve ser alterada a matéria de facto constante do ponto 1 da base instrutória, não se podendo dar como provado que foi o recorrente quem assinou o livrança e contrato de mútuo, concluindo-se que desta forma que não é devedor de qualquer quantia à recorrida. Nestes termos, e nos melhores de direito, deverá o presente recurso proceder sendo revogada, nos termos alegados, a sentença que julgou improcedente a oposição apresentada, fazendo-se JUSTIÇA» Contra-alegou a exequente assim concluindo: 1.ª - A decisão de improcedência da oposição proferida pelo Tribunal “a quo” não merece qualquer censura ou reparo. 2.ª - O Recorrente vem alegar em sede de Recurso, factos novos, que em momento algum trouxe ao processo e que por conseguinte, não puderam ser apreciados pelo tribunal “a quo”, razão pela qual, não poderão ser apreciados em sede de recurso. 3.ª - Ao longo dos treze artigos que compõem a oposição à execução, o Recorrente limitou-se a alegar que a assinatura da livrança dada à execução não foi feita pelo seu punho, que em momento algum a assinou e que por conseguinte a mesma foi forjada. 4.ª - A celebração do contrato de mútuo entre o Recorrente e a Recorrida deverá necessariamente que manter-se como provada e assente (na alínea B) da base instrutória, pelo facto de o Recorrente não o ter impugnado, nem sequer a assinatura nele aposta. 5.ª Nos termos do n.º 2, do artigo 490.º do Código de Processo Civil, os factos que não tenham sido impugnados e que não estejam em contradição com a defesa considerada no seu conjunto, consideram-se admitidos por acordo. 6.ª – O Recorrente também não lançou mão do expediente legal de reclamação da matéria de facto em tempo próprio, como legalmente lhe era exigível. 7.ª - A celebração do contrato de mútuo foi admitida por acordo. 8.ª – São evidentes as semelhanças entre os caracteres das assinaturas apostas na livrança dada à execução e no bilhete de identidade do Recorrente (cuja cópia foi fornecida aquando da celebração do contrato de mútuo). 9.ª – Considerando o teor do referido contrato de mútuo e ainda as regras da experiência foi claramente criada a convicção, do Tribunal “a quo”, que, à semelhança do contrato de mútuo, também a livrança exequenda foi assinada pelo punho do Recorrente. 10.ª - A comparação entre os caracteres das assinaturas foi feita, como não podia deixar de ser, entre a assinatura aposta no contrato de mútuo n.º ……, a assinatura aposta no bilhete de identidade que o Recorrente forneceu aquando da celebração do contrato e a assinatura aposta na livrança exequenda. 11.ª - Nunca a comparação poderia ser feita entre as assinaturas apostas cartão do cidadão e o contrato de mútuo e a livrança. 12.ª - O cartão de cidadão referido pelo Recorrente não foi sequer junto aos autos, nem aquando da oposição à penhora, nem em qualquer outro momento, pelo que não poderia, como não foi, ter sido tido em consideração para qualquer comparação. 13.ª - Do contrato de mútuo junto aos autos, cuja assinatura o Recorrente não impugnou consta, no ponto 10, sob a epígrafe “Garantias – Livrança” a obrigação de o Mutuário entregar a título de garantia uma livrança não integralmente preenchida mas assinada e ainda cópia do pacto de preenchimento. 14.ª - Resulta da resposta ao quesito n.º 1 da base instrutória que, neste tipo de contratação, a assinatura e entrega da livrança ocorre em simultâneo com a assinatura do contrato de mútuo. 15.ª - Resulta, ainda, das regras da experiência do homem comum, regras de que o Mmo. Juiz “a quo” também se socorreu, que a assinatura de tais documentos ocorre num mesmo momento temporal. 16.ª - Tendo o Recorrente optado por não impugnar os documentos juntos pela Recorrida, dentro do prazo legalmente previsto, não pode fazê-lo agora, em sede de recurso, atendendo a que os mesmos se têm agora por confessados. 17.ª – Não pode o Recorrente trazer à colação factos novos, nunca antes mencionados quer em sede de oposição à execução, quer em sede de Audiência de Discussão e Julgamento. 18.ª - O Mmo. Juiz do Tribunal “a quo” cumpriu escrupulosamente o previsto nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 659.º do Código de Processo Civil, nenhuma censura merecendo quer o despacho saneador, quer a resposta à base instrutória, quer a sentença em crise. Nestes termos e nos melhores de direito, que V/ Exas., Doutamente suprirão, deve ser negado provimento ao recurso interposto, mantendo-se a douta sentença recorrida, fazendo-se a costumada JUSTIÇA» 2. Fundamentos de facto A 1.ª instância considerou provados os seguintes factos: Da Matéria de Facto Assente A) Foi apresentada á execução de que estes autos constituem um apenso, o documento junto a fls. 7 dos mesmos, denominado “livrança”, contendo, além do mais, os seguintes dizeres: - Importância – 7.112.72 €; - Vencimento – 2008/03/23; - Local e Data de Emissão – Porto – 2008.02.12; - Valor: Relativo ao Contrato de Mútuo nº ……; - Assinatura(s) do(s) Subscritor(es): contém aposta uma assinatura com os seguintes dizeres: “ B…” (cfr. doc. de fls. 7 dos autos de execução, cujo teor, no mais, se dá aqui por integralmente reproduzido). B) Entre a exequente e o aqui opoente foi celebrado o acordo escrito constante do escrito junto a fls. 31 e 32 dos autos, denominado “CONTRATO DE MÚTUO nº ……”, através do qual a exequente concedeu ao opoente o empréstimo de € 3.580,00 para aquisição do bem aí assinalado, comprometendo-se o opoente a liquidar tal montante em 60 prestações mensais, iguais e sucessivas, no montante de € 100,91, cada (cfr. doc. de fls. 31 e 32 destes autos, cujo teor, no mais, se dá aqui por integralmente reproduzido). C) A aqui exequente remeteu ao aqui opoente a carta registada com aviso de recepção, datada de 22-02-2008, cuja cópia consta de fls. 34 a 38, nos termos da qual lhe comunicou, para além do mais, o seguinte: “(…) na sequência do não cumprimento das obrigações estabelecidas no contrato acima identificado…informamos V.Exa(s) que o consideramos resolvido por incumprimento. Face ao exposto, toda a dívida resultante das obrigações estipuladas encontra-se automaticamente vencida. Nos termos e ao abrigo do disposto nas Condições Gerais do contrato, cumpre-nos referir que iremos proceder ao preenchimento da livrança…” (cfr. doc. de fls. 34 a 38 dos autos, cujo teor, no mais, se dá aqui por integralmente reproduzido). D) A carta referida em C) foi devolvida à exequente com a seguinte menção:” Não Atendeu” (cfr. doc. de fls. 34 a 38 dos autos, cujo teor, no mais, se dá aqui por integralmente reproduzido). Da Base Instrutória: 1) A assinatura constante do documento referido em A), com os dizeres “B… ”, foi efectuada pelo punho do aqui opoente. 2) Com vista ao financiamento referido em B), foram fornecidas à exequente as seguintes fotocópias dos documentos do aqui opoente: do seu bilhete de identidade; do seu cartão de contribuinte; dados da sua conta bancária de que era titular no “E…”, agência de …; e da sua declaração de I.R.S., relativa ao ano de 2005. 3. Do mérito do recurso O objecto do recurso, delimitado pelas conclusões das alegações (artigo 684.º, n.º 3, e 685.º A, n.º 1 CPC), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 660.º, n.º 2, in fine), consubstancia-se em saber se a assinatura aposta no título de crédito dado à execução no local destinado ao aceite foi aposta pelo punho do opoente, o que passa pela impugnação da resposta ao artigo 1.º da base instrutória e pela problemática do ónus da prova. 3.1. Da impugnação da matéria de facto Nos termos do artigo 712.º, n.º 1, alínea a), CPC, a decisão do tribunal de 1.ª instância sobre matéria de facto pode ser alterada pela Relação se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa, ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 690.ºA, CPC, a decisão com base neles proferida. E, de acordo com o n.º 2 do mesmo artigo, no caso a que se refere a segunda parte da alínea a) do número anterior, a Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados. O artigo 690.º A CPC, na redacção do Decreto-Lei 183/2000, de 10 de Agosto, estabelece os ónus que impendem sobre o impugnante, sob pena de rejeição do recurso: - especificar quais os concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados (n.º 1, alínea a); - especificar quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida (n.º 1, alínea b); - indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta, nos termos do disposto no n.º 2, do artigo 522.º C, quando tenham sido gravados (n.º 2). Importa, pois, em primeiro lugar, verificar se o recorrente deu cumprimento aos ónus que sobre si impendiam. O único requisito cujo cumprimento não foi observado respeita ao ónus previsto no nº 2 do artigo em causa. E se é certo que o recorrente não indicou os depoimentos por referência à acta de julgamento, nos termos do artigo 522.º-C CPC, não é menos verdade que não o poderia ter feito, pois tais indicações não constam da acta de julgamento, omissão que nunca poderia funcionar em seu prejuízo. Consideramos que seria violento e injustificado obrigar o recorrente a arguir a nulidade da acta, com eventual recurso em caso de indeferimento, o que acabaria por redundar na imposição de um ónus suplementar — o de fiscalizar a regularidade da acta da audiência de julgamento —, sem qualquer benefício nos casos em que a gravação consta de suporte digital. Acresce que a utilidade que poderia existir no caso das gravações em cassete áudio ficaria inutilizada pela circunstância de não serem disponibilizados neste tribunal equipamentos com contadores de rotação, sendo certo que quando são utilizados equipamentos pessoais as voltas normalmente não coincidem com as da gravação original. Recorde-se que na redacção anterior ao Decreto-Lei 183/2000, de 10 de Agosto, impunha-se ao recorrente a transcrição dos depoimentos na parte invocada, compreendendo-se a imposição do pesado ónus da rejeição, pois era a partir dessa transcrição que a prova era reapreciada, sem prejuízo da transcrição que a parte contrária fizesse de depoimentos que infirmassem as conclusões do recorrente e dos poderes de indagação oficiosa do tribunal. Ora, por força do disposto no n.º 5 do artigo 690.º A, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei 183/2000, citado, o tribunal procede à audição ou visualização dos depoimentos indicados pelas partes, excepto se o juiz relator considerar necessária a sua transcrição. Entendemos, pois, que o recurso apenas deve ser rejeitado se tal omissão tiver algum relevo, ou seja, se por força dessa omissão o tribunal se vir impedido de identificar, de forma fácil e segura, o depoimento visado. Nessa medida, e na linha do acórdão da Relação de Lisboa, de 07.05.24, Farinha Alves, www.dgsi.pt.jtrl, proc. 10.601/2006-2, consideramos que a rejeição do recurso por falta de indicação do depoimento por referência ao assinalado na acta se configuraria como uma sanção desproporcionada, uma vez que os depoimentos estejam devidamente identificados no suporte digital. A este propósito vejam-se ainda os acórdãos do STJ, de 2009.06.18, Maria dos Prazeres Beleza, de 2009.04.21, Salazar Casanova, www.dgsi.pt.jstj, proc. 08B2998 e 09A0680, respectivamente (não houve indicação dos depoimentos por referência ao assinalado em acta, mas tinha havido transcrição, num dos casos parcial), e o acórdão de 2009.01.14, Mário Pereira, www.dgsi.pt.jstj, proc. 08S934 (uns depoimentos constavam do lado A da cassete e outros do lado B, com transcrição parcial). Passemos então à apreciação da impugnação da matéria de facto deduzida pelo apelante. É o seguinte o teor do artigo 1.º da base instrutória: A assinatura constante do documento referido em A), com os dizeres “B…”, foi efectuada pelo punho do aqui opoente? Este artigo mereceu resposta negativa com a seguinte fundamentação: «A resposta positiva dada ao nº 1 desta base instrutória baseou-se na conjugação entre o teor do contrato de mútuo dado como assente nos autos (e não impugnado pelo opoente, nem sequer por eventual contradição entre o alegado na petição inicial, uma vez que nesta peça processual apenas impugnou expressamente a livrança dada à execução). As semelhanças entre os caracteres das assinaturas apostas na livrança exequenda, nesse contrato e no seu bilhete de identidade, bem como nas regras da experiência que presidem na outorga deste tipo de contrato, o qual normalmente é assinado conjuntamente e num mesmo momento temporal com a livrança em branco que serve de garantia ao cumprimento desse mesmo contrato. Na verdade, atento o teor do referido contrato de mútuo, não impugnado nos autos pelo opoente, a par da existência no mesmo de uma cláusula contratual que prevê expressamente o pacto de preenchimento da livrança em branco que o opoente (mutuário) se obrigou a entregar, sendo certo que tal contrato tem exactamente o número que consta do preenchimento efectuado na livrança dada à execução, no espaço destinado ao “VALOR”, a convicção do tribunal caminhou no sentido da resposta positiva. Da conjugação destes factos, entre si e com as regras da experiência supra aludidas, resultou a formação da convicção do tribunal acerca do facto do opoente ter assinado, pelo seu punho, a livrança exequenda, sendo certo que não há elementos nos autos que façam afastar tais regras da experiência neste caso, a ponto de podermos concluir ou meramente colocar em dúvida que a referida livrança tenha sido assinada na mesma altura em que o opoente assinou o contrato de mútuo dado como assente nos autos – por força da falta de impugnação por banda do opoente, no prazo legalmente previsto para o efeito ( vide art. 544º, do C.P.Civil ). Tal realidade factual, conjugada com as semelhanças, a olho nu, entre os caracteres das assinaturas em comparação caminharam decisivamente para a formação da convicção do tribunal no sentido da resposta positiva dada ao nº 1 da peça processual a que ora se responde. Aliás, serviu ainda como auxiliar da formação dessa convicção, o depoimento da testemunha D…, consultor da exequente, que corroborou que normalmente a assinatura do contrato de mútuo e da livrança em branco são feitas num mesmo momento temporal. Ou seja, por força das referidas regras da experiência e da normalidade da vida, não nos parece crível que tendo o opoente subscrito o pacto de preenchimento incluído no contrato dado como assente nos autos não tenha assinado a livrança dada à execução (precisamente a livrança em branco prevista nesse mesmo contrato para servir como garantia ao no cumprimento desse mesmo contrato por parte do mutuário e aqui opoente), tendo presente as regras da experiência que nos ensinam que normalmente a outorga de tal contrato e a livrança em branco a ele associada se processam em simultâneo». Insurge-se o apelante contra a resposta afirmativa ao artigo 1.º da base instrutória, e com razão, adianta-se. Com efeito, não basta, para provar que a assinatura aposta na livrança foi feita pelo punho do embargante, demonstrar que, normalmente, quando é assinado um contrato de mútuo é igualmente assinada uma livrança em branco. Trata-se de documentos distintos, não se podendo da subscrição de um inferir-se a assinatura do outro. Não interessa aqui saber qual a prática das entidades financeiras na concessão de um mútuo, mas sim se naquele concreto caso aqui em discussão se pode afirmar que foi o apelante o subscritor da livrança dada à execução. Assim, não basta para que se possa afirmar a autoria da assinatura impugnada demonstrar que a livrança terá sido subscrita conjuntamente com o contrato de mútuo, sendo certo que a testemunha arrolada não presenciou a assinatura dos documentos. Assim, e porque a análise grafológica comporta uma vertente essencialmente técnica, fazendo apelo a conhecimentos especiais, deveria ter sido requerida prova pericial, meio particularmente idóneo para o estabelecimento da autoria de assinaturas. Não tendo sido requerido tal exame, não cabe ao tribunal, empiricamente, proceder ao confronto das assinaturas, pela margem de erro que tal actividade comporta. À falta de qualquer prova minimamente consistente de que a assinatura em causa foi aposta na livrança pelo opoente, importa alterar a resposta ao artigo 1.º da base instrutória para «Não Provado». 3.2. Do ónus da prova Não se tendo logrado provar a autoria da assinatura, importa determinar a quem cabe o ónus da prova. Porque o título que suporta a execução a que a oposição se reporta é um documento particular, o executado pode, nos termos do artigo 816.º CPC, para além dos fundamentos de oposição especificados no artigo 814.º CPC, invocar qualquer fundamento que pudesse deduzir como defesa no processo declarativo. Significa isto que, nas palavras do acórdão do STJ, de 2009.07.14, Hélder Roque, www.dgsi.pt.jstj, proc. 379/09YFLSB, «Tratando-se de oposição à execução baseada em título executivo extrajudicial, pode o oponente invocar, sem qualquer limite temporal, todas as causas impeditivas, modificativas ou extintivas do direito do exequente, e até, por vezes, negar os factos constitutivos do mesmo direito, achando-se na mesma posição em que se encontraria perante a petição inicial de uma acção declarativa». Dispõe o artigo 374.º, n.º 2, CC., que se a parte contra quem o documento é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ou declarar que não sabe se são verdadeiras, não lhe sendo elas imputadas, incumbe à parte que apresentar o documento a prova da sua veracidade. Como referem Pires de Lima e Antunes Varela, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, vol. I, pg. 4ª ed., pg. 331: «Ao contrário do que sucede com os documentos autênticos, os documentos particulares não provam, por si sós, a genuinidade da sua (aparente) proveniência. A letra e assinatura, ou a assinatura, só se consideram, neste caso, como verdadeiras, se forem expressa ou tacitamente reconhecidas pela parte contra quem o documento é exibido ou se legal ou judicialmente forem havidas como tais. Havendo impugnação, é ao apresentante do documento que incumbe provar a autoria contestada; e terá de fazê-lo, mesmo que o impugnante tenha arguido a falsidade do texto e assinatura, ou só da assinatura». Segundo estes autores, op. cit., pg. 306, «O significado essencial do ónus da prova não está tanto em saber a quem incumbe fazer a prova do facto como em determinar como deve o tribunal decidir no caso de se não fazer prova do facto.» Trata-se, pois, de saber quem suportará as consequências negativas da falta de prova de determinando facto. Assim, se o executado impugnar a autoria da assinatura que lhe é imputada, constante do título executivo, cabe ao exequente provar que aquela é efectivamente da sua autoria. A este propósito veja-se, a título meramente exemplificativo os acórdãos do STJ, de 2011.02.09, Lopes do Rego, e de 2005.06.16, Lucas Coelho, wwww.dgsi.pt.jstj, proc. 2971/07.7TBAGD e 04B660, respectivamente; e da Relação do Porto, de 2006.09.28, Fernando Batista, www.dgsi.pt.jtrl, proc. 0634730, e da Relação de Lisboa, de 2004.06.29, Roque Nogueira, www.dgsi.pt.jtrl, proc. 2205/2003. Não tendo o exequente logrado provar que a assinatura aposta na livrança dada à execução é da autoria do executado, não se pode afirmar a subscrição do título por este, deixando a execução de ter título executivo que a suporte. A apelação tem, pois, de proceder. 4. Decisão Termos em que, julgando a apelação procedente, revoga-se a decisão recorrida, e, em consequência, determina-se a extinção da execução. Custas pela apelada. Porto, 15 de Novembro de 2011. Márcia Portela Manuel Pinto dos Santos Ondina de Oliveira Carmo Alves _____________ Sumário 1. Sendo o título que suporta a execução a que a oposição se reporta um documento particular, o executado pode, nos termos do artigo 816.º CPC, para além dos fundamentos de oposição especificados no artigo 814.º CPC, invocar qualquer fundamento que pudesse deduzir como defesa no processo declarativo. 2. Se o executado impugnar a autoria da assinatura que lhe é imputada, constante do título executivo, cabe ao exequente provar que aquela é efectivamente da sua autoria. Márcia Portela
Apelação 6322/08.5YYPRT-A Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1. Relatório B… deduziu oposição à execução comum que lhe moveu C…, S.A., pedindo a sua absolvição do pedido. Alegou para tanto, e em síntese, que desconhece por completo a existência da livrança dada à execução, não tendo procedido à sua assinatura da mesma. Contestou a exequente, alegando que, tendo em vista a concessão de financiamento o executado forneceu-lhe todos os elementos necessários, incluindo os seus elementos de identificação pessoal, e que aceitou o contrato de financiamento, bem como também, na mesma data, uma livrança em branco, tendo autorizado o respectivo preenchimento no caso de incumprimento contratual. Foi proferido despacho saneador, e seleccionada matéria de facto relevante. Procedeu-se a julgamento, tendo sido proferida decisão que julgou a oposição improcedente. Inconformado, recorreu o opoente, apresentando as seguintes conclusões: «1- Vem o presente recurso interposto da sentença (tanto da matéria de facto como da de direito), na qual o tribunal a quo julgou improcedente a oposição a execução. 2- Pretende o recorrente ver alterada a matéria de facto dada como assente no ponto 1 da base instrutória, que menciona: "A assinatura constante do documento referido em A), com os dizeres "B…", foi efectuada pelo punho do aqui opoente", decorrente do que infra se exporá quanto à prova documental junta com o processo e as declarações da única testemunha ouvida em sede de audiência de discussão e julgamento. 3- Citado da acção executiva intentada pela recorrida, veio o recorrente oferecer a sua oposição, sendo que uma das questões mais importantes, o verdadeiro thema decidendum, é o facto do executado não ter assinado a livrança que serve de título à execução, pelo que se impugnou a assinatura constante da mesma, requerendo-se a suspensão da execução. 4- No entanto, na contestação apresentada pela recorrida, veio a mesma negar tal facto, alegando que tendo em vista o financiamento, o recorrente forneceu todos os elementos necessários, nomeadamente, os elementos de identificação pessoal, bem como aceitou o contrato de financiamento e uma letra em branco, tendo autorizado o seu preenchimento em caso de incumprimento contratual. 5- Da sentença aqui recorrida, na sua motivação, resultou coma factos provados, que assinatura aposta na letra é do punho do recorrente, que entre a exequente e executado foi celebrado o acordo escrito constante de fls. 31 e 32 dos autos. 6- No que se refere à base instrutória resultou provado, que foi fornecido pelo recorrente, com vista ao financiamento, fotocópias do seu bilhete de identidade, cartão de contribuinte, dados da sua conta bancária, declaração de IRS de 2005. 7- Citando-se a sentença recorrida pode ler-se: "No caso dos autos, tendo sido a exequente quem deu a livrança posta em crise à execução, é a ela, enquanto sua apresentante, que compete o ónus da prova da autenticidade das assinaturas em jogo". 8- Mais ainda: "Ora, tendo presente tal ónus da prova e a circunstância da aqui exequente ter feito a prova respectiva – veja-se a resposta positiva que mereceu o n.° 9 da base instrutória -, temos de concluir que a exequente fez a prova da genuidade da assinatura em causa, o que, associado ao princípio basilar da literalidade que rege os títulos de crédito, resulta na improcedência da tese do oponente". 9- Tal prova, resulta por um lado, que o recorrente, na sua oposição apenas invocou a falta de genuidade da assinatura da livrança, não tendo impugnado o contrato de mútuo, após tal documento ser junto aos autos; por outro que, do documento junto com a petição de oposição, a título de princípio de prova (cópia do Cartão do Cidadão) não resulta qualquer discrepância com as assinaturas da letra e contrato. 10- Não se impugnou o contrato de mútuo, por se entender que seria contrário a toda a defesa apresentada em sede de oposição, uma vez que, foi alegado que a assinatura da letra – título executivo – não era do punho do recorrente, pelo que não teria o mesmo qualquer relação contratual com a recorrida. 11- Mesmo que assim não se entenda, só se pode dar como provado que tal contrato foi assinado pelo executado baseado numa presunção, que é assente nas regras da experiência, senão leia-se a resposta à matéria de facto fls. 65 e ss: "...bem como nas regras da experiência que presidem na outorga deste tipo de contrato, o qual normalmente é assinado conjuntamente e num mesmo momento temporal com a livrança em branco que serve de garantia ao cumprimento desse mesmo contrato". 12- Não devia o Tribunal a quo basear-se apenas nas regras da experiência comum, mas também nas concretas circunstâncias do caso, nomeadamente, e ao contrário do que é entendido pelo Tribunal recorrido, nenhuma semelhança existe entre as assinaturas apostas na livrança, no contrato e no cartão de cidadão. 13- De uma simples observação óptica verifica-se as discrepâncias entre as variadas assinaturas dos documentos juntos aos autos (nomeadamente cartão do cidadão e procuração forense assinados pelo recorrente e livrança, contrato de mútuo, declaração de IRS, cujas assinaturas não são do seu punho). 14- Nas assinaturas efectuadas pelo punho do executado, no nome "B…", verifica-se que coloca sempre acento na letra "e", enquanto nas outras assinaturas não têm as mesmas acento. 15- A letra "s" é sempre diferente nas assinaturas que não foram feitas pelo recorrente, bem coma, entre outras, as letras "u", "n" e "r". 16- Só estes factos seriam suficientes para abalar a convicção do Tribunal a quo, quanto à veracidade das assinaturas, no entanto, existem outros factos, que colocam em causa tal veracidade, nomeadamente, tanto o contrato de mútuo como a livrança, não terem sido assinados perante o consultor da exequente, testemunha ouvida na audiência de discussão e julgamento. 17- Foi afirmado pela testemunha, que os documentos foram recepcionados via postal, ou seja, nunca viu de facto quem os assinou. 18- Mas mesmo assim para o Tribunal recorrido "...serviu ainda corno auxiliar da formação da convicção, o depoimento da testemunha D…, consultor da exequente, que corroborou que normalmente a assinatura do contrato de mútuo e da livrança em branco são feitas num mesmo momento temporal'. 19- Não é por ser habitual em situações idênticas, assinar ao mesmo tempo a livrança e contrato, que se pode dar como provado que, no caso dos autos, a assinatura dos mesmos é verdadeira, quando existem fortes indícios em contrário. 20- E é exemplo disso, não só as discrepâncias em relação às assinaturas, mas também o facto da declaração de rendimentos junta, para obtenção de crédito, não ter folha de rosto, a assinatura constante da mesma não ser do punho do recorrente, uma vez que apresenta diferenças visíveis a olho nu, com as assinaturas da procuração forense e cartão de cidadão, por outro lado, a declaração não se encontra assinada, e está carimbada na segunda página, sendo que, os serviços de finanças não aceitariam uma declaração não datada e nem carimbariam nessa página, outrossim na folha de rosto. 21- Mais ainda, o executado no ano de 2005, data da declaração, encontrava-se desempregado e não obtinha quaisquer rendimentos, muito menos a título de trabalhador independente. 22- Tanto a declaração é falsa, que a retenção na fonte nunca seria de 10%, mas sim de 20%. 23- Outro facto que importa não descuidar, é que o recorrente residia na Maia, mas o contrato foi celebrado em Braga, destinando-se á compra de um purificador de ar no valor de 6.054,60 €, quando o recorrente se encontrava desempregado. 24- Como será possível, obter financiamento com uma declaração de rendimentos falsa, sendo a exequente uma entidade muito experiente neste tipo de situações? 25- Pelo que após tudo o que fica dito, só uma pode ser a conclusão, nunca o recorrente assinou qualquer contrato de mútuo ou qualquer livrança, devendo colocar-se a hipótese de alguém se ter apropriado dos documentos para conseguir tais fins. 26- A tese do Tribunal recorrido é completamente abalada ao dar como provado que as assinaturas constantes dos mesmos são verídicas, baseando-se na experiência comum e no princípio da livre apreciação da prova, sendo que se associa a este principio a obrigatoriedade da sua fundamentação, com elementos objectivos que a tornam crível e livre de qualquer dúvida. 27- No entanto, existem dúvidas, há discrepâncias entre as várias assinaturas, os factos do caso concreto demonstram que não há qualquer relação contratual entre o recorrente e recorrida. 28- Foi impugnada a autoria da assinatura da letra apresentada, pelo que nunca deveria ter sido valorada, na formação da convicção do julgador de forma a julgar que a assinatura pertencia ao recorrente. 29- No tocante à força probatória dos documentos particulares dispõe o artigo 376° do CC que "o documento particular cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes faz prova plena quanto às declarações nele atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento" (n° 1), sendo que "os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante" (n°2). 30- Nas palavras de Lebre de Freitas, A Falsidade no Direito Probatório, Livraria Almedina, Coimbra, 1984, pág. 55: "A força probatória do documento particular circunscreve-se, assim, no âmbito das declarações (de ciência e de vontade) que nele constam como feitas pelo respectivo subscritor". 31- No entanto, e de acordo com o Ac. da RL de 17-09-2009, processo 785/06.OYXLSB.L1-6, refere: "Ao invés dos documentos autênticos, que fazem prova por si mesmos da proveniência que ostentam, os documentos particulares não provam, só por si, a sua procedência da pessoa que aparentemente assume a sua autoria ou paternidade". 32- No acórdão citado, pode ler-se: "A parte contra a qual o documento particular é apresentado pode impugnar a veracidade da letra ou da assinatura ou declarar que não sabe se aquelas são verdadeiras, não lhe sendo imputadas, caso em que cabe à parte que o ofereceu fazer prova da veracidade da subscrição pela pessoa a cuja autoria é atribuído". 33- O mesmo decorre do art. 374° do CC, no entanto, não se poderá admitir que a parte contrária, recorrida, tenha feito prova que as assinaturas em causa sejam da autoria do recorrente. 34- Uma vez que, a testemunha ouvida não viu quem assinou os documentos, não viu os originais dos restantes documentos que compuseram o crédito, sendo que estes foram-lhe remetidos por telecópia, nenhuma prova se fez quanto à veracidade de tais assinaturas, pelo que deveria ter sido requerida a prova pericial à letra, o que competia à recorrida. 35- Assim, a dar-se como provado que o contrato de mútuo e a livrança foram assinados pelo recorrente e, consequentemente, o prosseguimento da execução, estará a ser condenado por uma dívida que nunca contraiu. 36- Mais ainda, é incompreensível que financeiras como a recorrida aprovem créditos sem que os contratos sejam assinados perante os seus consultores, ou sem verem os originais dos documentos. 37- Deve ser alterada a matéria de facto constante do ponto 1 da base instrutória, não se podendo dar como provado que foi o recorrente quem assinou o livrança e contrato de mútuo, concluindo-se que desta forma que não é devedor de qualquer quantia à recorrida. Nestes termos, e nos melhores de direito, deverá o presente recurso proceder sendo revogada, nos termos alegados, a sentença que julgou improcedente a oposição apresentada, fazendo-se JUSTIÇA» Contra-alegou a exequente assim concluindo: 1.ª - A decisão de improcedência da oposição proferida pelo Tribunal “a quo” não merece qualquer censura ou reparo. 2.ª - O Recorrente vem alegar em sede de Recurso, factos novos, que em momento algum trouxe ao processo e que por conseguinte, não puderam ser apreciados pelo tribunal “a quo”, razão pela qual, não poderão ser apreciados em sede de recurso. 3.ª - Ao longo dos treze artigos que compõem a oposição à execução, o Recorrente limitou-se a alegar que a assinatura da livrança dada à execução não foi feita pelo seu punho, que em momento algum a assinou e que por conseguinte a mesma foi forjada. 4.ª - A celebração do contrato de mútuo entre o Recorrente e a Recorrida deverá necessariamente que manter-se como provada e assente (na alínea B) da base instrutória, pelo facto de o Recorrente não o ter impugnado, nem sequer a assinatura nele aposta. 5.ª Nos termos do n.º 2, do artigo 490.º do Código de Processo Civil, os factos que não tenham sido impugnados e que não estejam em contradição com a defesa considerada no seu conjunto, consideram-se admitidos por acordo. 6.ª – O Recorrente também não lançou mão do expediente legal de reclamação da matéria de facto em tempo próprio, como legalmente lhe era exigível. 7.ª - A celebração do contrato de mútuo foi admitida por acordo. 8.ª – São evidentes as semelhanças entre os caracteres das assinaturas apostas na livrança dada à execução e no bilhete de identidade do Recorrente (cuja cópia foi fornecida aquando da celebração do contrato de mútuo). 9.ª – Considerando o teor do referido contrato de mútuo e ainda as regras da experiência foi claramente criada a convicção, do Tribunal “a quo”, que, à semelhança do contrato de mútuo, também a livrança exequenda foi assinada pelo punho do Recorrente. 10.ª - A comparação entre os caracteres das assinaturas foi feita, como não podia deixar de ser, entre a assinatura aposta no contrato de mútuo n.º ……, a assinatura aposta no bilhete de identidade que o Recorrente forneceu aquando da celebração do contrato e a assinatura aposta na livrança exequenda. 11.ª - Nunca a comparação poderia ser feita entre as assinaturas apostas cartão do cidadão e o contrato de mútuo e a livrança. 12.ª - O cartão de cidadão referido pelo Recorrente não foi sequer junto aos autos, nem aquando da oposição à penhora, nem em qualquer outro momento, pelo que não poderia, como não foi, ter sido tido em consideração para qualquer comparação. 13.ª - Do contrato de mútuo junto aos autos, cuja assinatura o Recorrente não impugnou consta, no ponto 10, sob a epígrafe “Garantias – Livrança” a obrigação de o Mutuário entregar a título de garantia uma livrança não integralmente preenchida mas assinada e ainda cópia do pacto de preenchimento. 14.ª - Resulta da resposta ao quesito n.º 1 da base instrutória que, neste tipo de contratação, a assinatura e entrega da livrança ocorre em simultâneo com a assinatura do contrato de mútuo. 15.ª - Resulta, ainda, das regras da experiência do homem comum, regras de que o Mmo. Juiz “a quo” também se socorreu, que a assinatura de tais documentos ocorre num mesmo momento temporal. 16.ª - Tendo o Recorrente optado por não impugnar os documentos juntos pela Recorrida, dentro do prazo legalmente previsto, não pode fazê-lo agora, em sede de recurso, atendendo a que os mesmos se têm agora por confessados. 17.ª – Não pode o Recorrente trazer à colação factos novos, nunca antes mencionados quer em sede de oposição à execução, quer em sede de Audiência de Discussão e Julgamento. 18.ª - O Mmo. Juiz do Tribunal “a quo” cumpriu escrupulosamente o previsto nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 659.º do Código de Processo Civil, nenhuma censura merecendo quer o despacho saneador, quer a resposta à base instrutória, quer a sentença em crise. Nestes termos e nos melhores de direito, que V/ Exas., Doutamente suprirão, deve ser negado provimento ao recurso interposto, mantendo-se a douta sentença recorrida, fazendo-se a costumada JUSTIÇA» 2. Fundamentos de facto A 1.ª instância considerou provados os seguintes factos: Da Matéria de Facto Assente A) Foi apresentada á execução de que estes autos constituem um apenso, o documento junto a fls. 7 dos mesmos, denominado “livrança”, contendo, além do mais, os seguintes dizeres: - Importância – 7.112.72 €; - Vencimento – 2008/03/23; - Local e Data de Emissão – Porto – 2008.02.12; - Valor: Relativo ao Contrato de Mútuo nº ……; - Assinatura(s) do(s) Subscritor(es): contém aposta uma assinatura com os seguintes dizeres: “ B…” (cfr. doc. de fls. 7 dos autos de execução, cujo teor, no mais, se dá aqui por integralmente reproduzido). B) Entre a exequente e o aqui opoente foi celebrado o acordo escrito constante do escrito junto a fls. 31 e 32 dos autos, denominado “CONTRATO DE MÚTUO nº ……”, através do qual a exequente concedeu ao opoente o empréstimo de € 3.580,00 para aquisição do bem aí assinalado, comprometendo-se o opoente a liquidar tal montante em 60 prestações mensais, iguais e sucessivas, no montante de € 100,91, cada (cfr. doc. de fls. 31 e 32 destes autos, cujo teor, no mais, se dá aqui por integralmente reproduzido). C) A aqui exequente remeteu ao aqui opoente a carta registada com aviso de recepção, datada de 22-02-2008, cuja cópia consta de fls. 34 a 38, nos termos da qual lhe comunicou, para além do mais, o seguinte: “(…) na sequência do não cumprimento das obrigações estabelecidas no contrato acima identificado…informamos V.Exa(s) que o consideramos resolvido por incumprimento. Face ao exposto, toda a dívida resultante das obrigações estipuladas encontra-se automaticamente vencida. Nos termos e ao abrigo do disposto nas Condições Gerais do contrato, cumpre-nos referir que iremos proceder ao preenchimento da livrança…” (cfr. doc. de fls. 34 a 38 dos autos, cujo teor, no mais, se dá aqui por integralmente reproduzido). D) A carta referida em C) foi devolvida à exequente com a seguinte menção:” Não Atendeu” (cfr. doc. de fls. 34 a 38 dos autos, cujo teor, no mais, se dá aqui por integralmente reproduzido). Da Base Instrutória: 1) A assinatura constante do documento referido em A), com os dizeres “B… ”, foi efectuada pelo punho do aqui opoente. 2) Com vista ao financiamento referido em B), foram fornecidas à exequente as seguintes fotocópias dos documentos do aqui opoente: do seu bilhete de identidade; do seu cartão de contribuinte; dados da sua conta bancária de que era titular no “E…”, agência de …; e da sua declaração de I.R.S., relativa ao ano de 2005. 3. Do mérito do recurso O objecto do recurso, delimitado pelas conclusões das alegações (artigo 684.º, n.º 3, e 685.º A, n.º 1 CPC), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 660.º, n.º 2, in fine), consubstancia-se em saber se a assinatura aposta no título de crédito dado à execução no local destinado ao aceite foi aposta pelo punho do opoente, o que passa pela impugnação da resposta ao artigo 1.º da base instrutória e pela problemática do ónus da prova. 3.1. Da impugnação da matéria de facto Nos termos do artigo 712.º, n.º 1, alínea a), CPC, a decisão do tribunal de 1.ª instância sobre matéria de facto pode ser alterada pela Relação se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa, ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 690.ºA, CPC, a decisão com base neles proferida. E, de acordo com o n.º 2 do mesmo artigo, no caso a que se refere a segunda parte da alínea a) do número anterior, a Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados. O artigo 690.º A CPC, na redacção do Decreto-Lei 183/2000, de 10 de Agosto, estabelece os ónus que impendem sobre o impugnante, sob pena de rejeição do recurso: - especificar quais os concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados (n.º 1, alínea a); - especificar quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida (n.º 1, alínea b); - indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta, nos termos do disposto no n.º 2, do artigo 522.º C, quando tenham sido gravados (n.º 2). Importa, pois, em primeiro lugar, verificar se o recorrente deu cumprimento aos ónus que sobre si impendiam. O único requisito cujo cumprimento não foi observado respeita ao ónus previsto no nº 2 do artigo em causa. E se é certo que o recorrente não indicou os depoimentos por referência à acta de julgamento, nos termos do artigo 522.º-C CPC, não é menos verdade que não o poderia ter feito, pois tais indicações não constam da acta de julgamento, omissão que nunca poderia funcionar em seu prejuízo. Consideramos que seria violento e injustificado obrigar o recorrente a arguir a nulidade da acta, com eventual recurso em caso de indeferimento, o que acabaria por redundar na imposição de um ónus suplementar — o de fiscalizar a regularidade da acta da audiência de julgamento —, sem qualquer benefício nos casos em que a gravação consta de suporte digital. Acresce que a utilidade que poderia existir no caso das gravações em cassete áudio ficaria inutilizada pela circunstância de não serem disponibilizados neste tribunal equipamentos com contadores de rotação, sendo certo que quando são utilizados equipamentos pessoais as voltas normalmente não coincidem com as da gravação original. Recorde-se que na redacção anterior ao Decreto-Lei 183/2000, de 10 de Agosto, impunha-se ao recorrente a transcrição dos depoimentos na parte invocada, compreendendo-se a imposição do pesado ónus da rejeição, pois era a partir dessa transcrição que a prova era reapreciada, sem prejuízo da transcrição que a parte contrária fizesse de depoimentos que infirmassem as conclusões do recorrente e dos poderes de indagação oficiosa do tribunal. Ora, por força do disposto no n.º 5 do artigo 690.º A, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei 183/2000, citado, o tribunal procede à audição ou visualização dos depoimentos indicados pelas partes, excepto se o juiz relator considerar necessária a sua transcrição. Entendemos, pois, que o recurso apenas deve ser rejeitado se tal omissão tiver algum relevo, ou seja, se por força dessa omissão o tribunal se vir impedido de identificar, de forma fácil e segura, o depoimento visado. Nessa medida, e na linha do acórdão da Relação de Lisboa, de 07.05.24, Farinha Alves, www.dgsi.pt.jtrl, proc. 10.601/2006-2, consideramos que a rejeição do recurso por falta de indicação do depoimento por referência ao assinalado na acta se configuraria como uma sanção desproporcionada, uma vez que os depoimentos estejam devidamente identificados no suporte digital. A este propósito vejam-se ainda os acórdãos do STJ, de 2009.06.18, Maria dos Prazeres Beleza, de 2009.04.21, Salazar Casanova, www.dgsi.pt.jstj, proc. 08B2998 e 09A0680, respectivamente (não houve indicação dos depoimentos por referência ao assinalado em acta, mas tinha havido transcrição, num dos casos parcial), e o acórdão de 2009.01.14, Mário Pereira, www.dgsi.pt.jstj, proc. 08S934 (uns depoimentos constavam do lado A da cassete e outros do lado B, com transcrição parcial). Passemos então à apreciação da impugnação da matéria de facto deduzida pelo apelante. É o seguinte o teor do artigo 1.º da base instrutória: A assinatura constante do documento referido em A), com os dizeres “B…”, foi efectuada pelo punho do aqui opoente? Este artigo mereceu resposta negativa com a seguinte fundamentação: «A resposta positiva dada ao nº 1 desta base instrutória baseou-se na conjugação entre o teor do contrato de mútuo dado como assente nos autos (e não impugnado pelo opoente, nem sequer por eventual contradição entre o alegado na petição inicial, uma vez que nesta peça processual apenas impugnou expressamente a livrança dada à execução). As semelhanças entre os caracteres das assinaturas apostas na livrança exequenda, nesse contrato e no seu bilhete de identidade, bem como nas regras da experiência que presidem na outorga deste tipo de contrato, o qual normalmente é assinado conjuntamente e num mesmo momento temporal com a livrança em branco que serve de garantia ao cumprimento desse mesmo contrato. Na verdade, atento o teor do referido contrato de mútuo, não impugnado nos autos pelo opoente, a par da existência no mesmo de uma cláusula contratual que prevê expressamente o pacto de preenchimento da livrança em branco que o opoente (mutuário) se obrigou a entregar, sendo certo que tal contrato tem exactamente o número que consta do preenchimento efectuado na livrança dada à execução, no espaço destinado ao “VALOR”, a convicção do tribunal caminhou no sentido da resposta positiva. Da conjugação destes factos, entre si e com as regras da experiência supra aludidas, resultou a formação da convicção do tribunal acerca do facto do opoente ter assinado, pelo seu punho, a livrança exequenda, sendo certo que não há elementos nos autos que façam afastar tais regras da experiência neste caso, a ponto de podermos concluir ou meramente colocar em dúvida que a referida livrança tenha sido assinada na mesma altura em que o opoente assinou o contrato de mútuo dado como assente nos autos – por força da falta de impugnação por banda do opoente, no prazo legalmente previsto para o efeito ( vide art. 544º, do C.P.Civil ). Tal realidade factual, conjugada com as semelhanças, a olho nu, entre os caracteres das assinaturas em comparação caminharam decisivamente para a formação da convicção do tribunal no sentido da resposta positiva dada ao nº 1 da peça processual a que ora se responde. Aliás, serviu ainda como auxiliar da formação dessa convicção, o depoimento da testemunha D…, consultor da exequente, que corroborou que normalmente a assinatura do contrato de mútuo e da livrança em branco são feitas num mesmo momento temporal. Ou seja, por força das referidas regras da experiência e da normalidade da vida, não nos parece crível que tendo o opoente subscrito o pacto de preenchimento incluído no contrato dado como assente nos autos não tenha assinado a livrança dada à execução (precisamente a livrança em branco prevista nesse mesmo contrato para servir como garantia ao no cumprimento desse mesmo contrato por parte do mutuário e aqui opoente), tendo presente as regras da experiência que nos ensinam que normalmente a outorga de tal contrato e a livrança em branco a ele associada se processam em simultâneo». Insurge-se o apelante contra a resposta afirmativa ao artigo 1.º da base instrutória, e com razão, adianta-se. Com efeito, não basta, para provar que a assinatura aposta na livrança foi feita pelo punho do embargante, demonstrar que, normalmente, quando é assinado um contrato de mútuo é igualmente assinada uma livrança em branco. Trata-se de documentos distintos, não se podendo da subscrição de um inferir-se a assinatura do outro. Não interessa aqui saber qual a prática das entidades financeiras na concessão de um mútuo, mas sim se naquele concreto caso aqui em discussão se pode afirmar que foi o apelante o subscritor da livrança dada à execução. Assim, não basta para que se possa afirmar a autoria da assinatura impugnada demonstrar que a livrança terá sido subscrita conjuntamente com o contrato de mútuo, sendo certo que a testemunha arrolada não presenciou a assinatura dos documentos. Assim, e porque a análise grafológica comporta uma vertente essencialmente técnica, fazendo apelo a conhecimentos especiais, deveria ter sido requerida prova pericial, meio particularmente idóneo para o estabelecimento da autoria de assinaturas. Não tendo sido requerido tal exame, não cabe ao tribunal, empiricamente, proceder ao confronto das assinaturas, pela margem de erro que tal actividade comporta. À falta de qualquer prova minimamente consistente de que a assinatura em causa foi aposta na livrança pelo opoente, importa alterar a resposta ao artigo 1.º da base instrutória para «Não Provado». 3.2. Do ónus da prova Não se tendo logrado provar a autoria da assinatura, importa determinar a quem cabe o ónus da prova. Porque o título que suporta a execução a que a oposição se reporta é um documento particular, o executado pode, nos termos do artigo 816.º CPC, para além dos fundamentos de oposição especificados no artigo 814.º CPC, invocar qualquer fundamento que pudesse deduzir como defesa no processo declarativo. Significa isto que, nas palavras do acórdão do STJ, de 2009.07.14, Hélder Roque, www.dgsi.pt.jstj, proc. 379/09YFLSB, «Tratando-se de oposição à execução baseada em título executivo extrajudicial, pode o oponente invocar, sem qualquer limite temporal, todas as causas impeditivas, modificativas ou extintivas do direito do exequente, e até, por vezes, negar os factos constitutivos do mesmo direito, achando-se na mesma posição em que se encontraria perante a petição inicial de uma acção declarativa». Dispõe o artigo 374.º, n.º 2, CC., que se a parte contra quem o documento é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ou declarar que não sabe se são verdadeiras, não lhe sendo elas imputadas, incumbe à parte que apresentar o documento a prova da sua veracidade. Como referem Pires de Lima e Antunes Varela, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, vol. I, pg. 4ª ed., pg. 331: «Ao contrário do que sucede com os documentos autênticos, os documentos particulares não provam, por si sós, a genuinidade da sua (aparente) proveniência. A letra e assinatura, ou a assinatura, só se consideram, neste caso, como verdadeiras, se forem expressa ou tacitamente reconhecidas pela parte contra quem o documento é exibido ou se legal ou judicialmente forem havidas como tais. Havendo impugnação, é ao apresentante do documento que incumbe provar a autoria contestada; e terá de fazê-lo, mesmo que o impugnante tenha arguido a falsidade do texto e assinatura, ou só da assinatura». Segundo estes autores, op. cit., pg. 306, «O significado essencial do ónus da prova não está tanto em saber a quem incumbe fazer a prova do facto como em determinar como deve o tribunal decidir no caso de se não fazer prova do facto.» Trata-se, pois, de saber quem suportará as consequências negativas da falta de prova de determinando facto. Assim, se o executado impugnar a autoria da assinatura que lhe é imputada, constante do título executivo, cabe ao exequente provar que aquela é efectivamente da sua autoria. A este propósito veja-se, a título meramente exemplificativo os acórdãos do STJ, de 2011.02.09, Lopes do Rego, e de 2005.06.16, Lucas Coelho, wwww.dgsi.pt.jstj, proc. 2971/07.7TBAGD e 04B660, respectivamente; e da Relação do Porto, de 2006.09.28, Fernando Batista, www.dgsi.pt.jtrl, proc. 0634730, e da Relação de Lisboa, de 2004.06.29, Roque Nogueira, www.dgsi.pt.jtrl, proc. 2205/2003. Não tendo o exequente logrado provar que a assinatura aposta na livrança dada à execução é da autoria do executado, não se pode afirmar a subscrição do título por este, deixando a execução de ter título executivo que a suporte. A apelação tem, pois, de proceder. 4. Decisão Termos em que, julgando a apelação procedente, revoga-se a decisão recorrida, e, em consequência, determina-se a extinção da execução. Custas pela apelada. Porto, 15 de Novembro de 2011. Márcia Portela Manuel Pinto dos Santos Ondina de Oliveira Carmo Alves _____________ Sumário 1. Sendo o título que suporta a execução a que a oposição se reporta um documento particular, o executado pode, nos termos do artigo 816.º CPC, para além dos fundamentos de oposição especificados no artigo 814.º CPC, invocar qualquer fundamento que pudesse deduzir como defesa no processo declarativo. 2. Se o executado impugnar a autoria da assinatura que lhe é imputada, constante do título executivo, cabe ao exequente provar que aquela é efectivamente da sua autoria. Márcia Portela