Processo:126/09.5TBVPA-A.P1
Data do Acordão: 21/11/2011Relator: FERNANDO SAMÕESTribunal:trp
Decisão: Meio processual:

I- O convite ao aperfeiçoamento de peças processuais tem lugar quando a lei assim dispuser. II- Não se vislumbrando qualquer norma que o permita, muito menos que o imponha, é por demais evidente que jamais poderia formular-se o convite aos requeridos para apresentarem o requerimento de interposição de recurso, em falta, não podendo configurar-se um aperfeiçoamento daquilo que não existe no processo.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
FERNANDO SAMÕES
Descritores
APERFEIÇOAMENTO DE PEÇAS PROCESSUAIS PEÃO ATROPELADO NA PASSADEIRA INTERPOSIÇÃO DE RECURSO APERFEIÇOAMENTO DO REQUERIMENTO DE INTERPOSIÇÃO
No do documento
Data do Acordão
11/22/2011
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO.
Decisão
MANTER O DESPACHO RECLAMADO.
Sumário
I- O convite ao aperfeiçoamento de peças processuais tem lugar quando a lei assim dispuser. II- Não se vislumbrando qualquer norma que o permita, muito menos que o imponha, é por demais evidente que jamais poderia formular-se o convite aos requeridos para apresentarem o requerimento de interposição de recurso, em falta, não podendo configurar-se um aperfeiçoamento daquilo que não existe no processo.
Decisão integral
Processo n.º 126/09.5TBVPA-A.P1
Relator: Fernando Samões
1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha
2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto - 2.ª Secção
*I. Relatório

Pelo ora relator, foi proferido, de fls. 1217 a 1219 destes autos, o despacho com o seguinte teor:
“B….. requereu, em 30/1/2009, no Tribunal Judicial da Comarca de Chaves, onde foi distribuído ao 1.º Juízo, procedimento cautelar de arrolamento contra C….. e D….., E….., F…… e G……, H….. e I….., todos melhor identificados nos autos, com base nos fundamentos invocados no seu requerimento inicial, como preliminar da acção de inventário a instaurar por óbito de seu irmão J…….
O arrolamento foi decretado nos termos e com os fundamentos constantes do despacho de fls. 45 a 49 dos autos, sem prévia audição dos requeridos.
Ordenada a sua citação, por despacho de 12/3/2009, e efectuada esta por carta registada com A/R para recorrer ou deduzir oposição, nos termos dos art.ºs 385.º, n.º 6 e 388.º, n.º 1, ambos do CPC, (cfr. fls. 258 a 266), vieram os requeridos deduzir oposição, em 6/4/2009, conforme consta de fls. 531 a 568.
Já no Tribunal da Comarca de Vila Pouca de Aguiar, para onde os autos foram remetidos em 3/4/2009, em virtude de aí ter sido, entretanto, instaurado o processo de inventário, procedeu-se à audiência final a que alude o art.º 386.º do CPC, a qual decorreu nos dias 19 de Junho e 14 de Julho de 2009, 26 de Março e 16 de Abril de 2010 (cfr. fls. 700 e 701, 773 a 775, 895 a 898 e 911), a que se seguiu o despacho de fls. 914 a 938, datado de 10 de Maio de 2010, que decidiu “manter o arrolamento decretado por decisão de 43 a 49 dos autos, sem prejuízo do decidido nos despachos proferidos a fls. 696, e a fls. 773 a 775, dos autos”.
Após confiança do processo e requerimento do ilustre mandatário dos requeridos, foi proferido o despacho de fls. 949, onde se afirmou ter-se constatado que o CD áudio, com a gravação da prova, inicialmente entregue, não era totalmente audível, pelo que deferiu tal requerimento, procedendo à entrega de novo CD com os depoimentos das testemunhas e concedendo o prazo de dez dias para a apresentação das alegações, contado a partir do dia 7/6/2010.
Por requerimento de 11/6/2010, os requeridos arguiram a nulidade processual consistente na deficiente gravação de três depoimentos, por não serem totalmente audíveis através do último CD entregue, requerendo a fixação de novo prazo para interporem recurso e produzirem as respectivas alegações (cfr. fls. 954 a 962).
Pronunciando-se sobre esse requerimento, a requerente Aurora, em 23 de Junho de 2010, afirmou que lhe parecia um expediente dilatório, pelo que se impunha averiguar se tais depoimentos eram ou não inaudíveis.
Em 25 de Junho de 2010, foi proferido o despacho de fls. 975 com o seguinte teor:
“Requerimento de 23/6/2010: A anomalia invocada pelos recorrentes dizia respeito ao específico CD que lhes foi inicialmente entregue. 
Assim, nada mais há a decidir a esse respeito. 
Notifique com cópia de fls. 948 para melhor esclarecimento. 
VPA, ds.” 
Em 30/6/2010, os requeridos/oponentes requereram a rectificação do lapso e a revogação do anterior despacho com a substituição por outro que tome em consideração o facto de a arguição da nulidade assentar e decorrer da entrega do segundo CD, efectuada no dia 7 desse mês. 
Em 16/7/2010, os requeridos/oponentes interpuseram recurso do despacho de fls. 975, o qual foi decidido por acórdão desta Relação, de 11/1/2011, que revogou aquele despacho e mandou substituí-lo por outro que apreciasse a “questão suscitada”, ou seja, da arguida, e ali qualificada, nulidade processual secundária decorrente da alegada deficiente gravação do 2.º CD, disponibilizado no dia 7/6/2010.
Em obediência a esse acórdão, foi proferido o despacho de 28/2/2011 que apreciou tal questão e anulou os actos de produção de prova com gravação deficiente (os depoimentos das testemunhas K….., L….. e M…..), bem como da “sentença”, determinando a sua “subsequente repetição”.
Nessa sequência, foi repetida a inquirição das referidas testemunhas, no dia 29/4/2011 (cfr. fls. 1015 e 1016).
E, no dia 24 de Maio de 2011, foi proferido novo despacho que decidiu nos mesmos termos do que havia sido proferido em 10 de Maio de 2010, mantendo o arrolamento anteriormente decretado (cfr. fls. 1022 a 1045).
Esse despacho foi notificado aos requeridos/oponentes em 31 de Maio de 2011.
E, em 29 de Junho de 2011, os requeridos vieram requerer a “junção aos autos das alegações de recurso” que anexaram, sendo que nestas fazem referência ao “recurso de apelação interposto da douta sentença de fls. 914 e ss”.
Por despacho de 29/7/2011, o Ex.mo Juiz da 1.ª instância admitiu o “recurso interposto através do requerimento que antecede” (cfr. fls. 1192).
Remetidos os autos a este Tribunal, entendeu-se que não era possível conhecer do objecto do recurso assim “interposto” e admitido, pelo que foi dado cumprimento ao disposto no art.º 704.º, n.º 1 do CPC, tendo os “apelantes” respondido no sentido da tempestividade do recurso, enquanto a requerente/recorrida se pronunciou pela sua extemporaneidade. 
Cumpre, pois, decidir esta questão prévia suscitada.
Tendo o procedimento sido instaurado depois de 1/1/2008, mais exactamente em 30/1/2009, são-lhe aplicáveis as disposições do Código de Processo Civil na redacção dada pelo DL n.º 303/2007, de 24/8 (cfr. art.ºs 11.º e 12.º deste diploma).
Preceitua o art.º 684.º-B daquele Código, no n.º 1, que os recursos se interpõem por meio de requerimento dirigido ao tribunal que proferiu a decisão recorrida, no qual se indica a espécie, o efeito e o modo de subida do recurso interposto, acrescentando, no n.º 2, que esse requerimento deve incluir a alegação do recorrente.
Por sua vez, dispõe o n.º 2 do art.º 388.º do mesmo Código que cabe recurso da decisão que mantenha, reduza ou revogue a providência anteriormente decretada, no caso de ter sido deduzida oposição nos termos da alínea b) do número anterior, sendo que o n.º 5 do art.º 691.º fixa o prazo para a interposição do recurso e apresentação das alegações em 15 dias, a que acrescem 10 dias se o recurso tiver por objecto a reapreciação da prova gravada (cfr. n.º 7 do art.º 685.º do aludido Código).
Apesar de a omissão da indicação pela parte da espécie, do modo de subida e do efeito do recurso poderem ser supridas pelo tribunal a quo, afigura-se-nos indispensável a apresentação do requerimento de interposição de recurso, no prazo legal, o qual deve incluir ou ser acompanhado da correspondente alegação.
Tal requerimento integra a manifestação de vontade da parte inconformada com a decisão proferida e constitui um pressuposto legal da prolação do despacho a que alude o art.º 685.º-C do CPC sobre a admissibilidade ou inadmissibilidade do recurso.
Acontece, porém, que não foi apresentado qualquer requerimento de interposição de recurso da decisão que versou sobre a oposição deduzida pelos requeridos.
Lendo e relendo os autos do processo físico que nos foi apresentado, não se vislumbra tal requerimento.
E, tendo sido mandado averiguar se o mesmo requerimento tinha sido junto ao processo principal ou aos autos apensos que ficaram no Tribunal da Comarca de Vila Pouca de Aguiar ou ali se encontrava, bem como se constava do histórico do processo electrónico do citius, a que não temos acesso, fomos informados que jamais fora apresentado o requerimento em falta.
Por isso, estranha-se que no despacho de fls. 1192, que admitiu o recurso, tenha sido feita referência ao “requerimento que antecede”.
Por outro lado, nas alegações apresentadas pelos pretensos recorrentes, em 29/6/2011, constantes de fls. 1053 a 1126, refere-se que as mesmas se reportam aos “autos de recurso de apelação interposto da douta sentença de fls. 914 e ss”.
Ora, não só é manifesta a extemporaneidade de tais alegações reportadas ao recurso da decisão nelas referida, tanto mais que, por despacho de fls. 949, havia sido concedido o prazo para alegar a partir de 7/6/2010, como são inúteis, visto que aquela decisão foi anulada pelo despacho de 28/2/2011, proferido na sequência do acórdão desta Relação de 11/1/2011, que declarou a nulidade arguida pelos requeridos, mandando repetir quer os actos que apresentavam deficiente gravação, quer a subsequente sentença. 
Tendo tal decisão sido anulada e substituída pelo despacho exarado de fls. 1022 a 1045, datado de 24/5/2011, e não tendo sido interposto recurso dele, é evidente que jamais podia ter sido admitido o recurso, agora em causa, como foi, através do despacho de fls. 1192.
Assim sendo, e uma vez que esse despacho não vincula este Tribunal superior (art.º 685.º-C, n.º 5 do CPC), impõe-se agora a sua rejeição, com fundamento na falta de objecto e impossibilidade de apreciação da alegação apresentada.
Nestes termos e visto o preceituado no art.º 700.º, n.º 1, als. b) e h) do CPC, decide-se rejeitar o recurso “interposto” pelos requeridos e admitido por despacho de fls. 1192.”

Inconformados com este despacho, vieram os requeridos, pretensos recorrentes, requerer que sobre ele recaísse acórdão “julgando no sentido de se conhecer do objecto do recurso”, com os fundamentos que invocaram na sua reclamação de fls. 1226 a 1289, que se resumem à inobservância do contraditório dada a divergência entre o anunciado e o decidido, à formação de caso julgado pelo despacho que admitiu o recurso e à falta de esclarecimento sobre o alcance do requerimento que acompanhou as alegações que entendem valer como interposição de recurso. 

A parte contrária nada disse.

Tudo visto, cumpre apreciar e decidir a presente reclamação, por forma a saber se deve ou não ser admitido o recurso pretensamente interposto pelos requeridos, ora reclamantes.

II. Fundamentação

Os factos a considerar na resolução desta questão são os que constam do relatório acabado de elaborar mais os seguintes:
A) Em 29/8/2011, pelo mesmo relator, foi proferido o seguinte despacho:
“Afigura-se-nos que não pode conhecer-se do objecto do recurso, face à sua extemporaneidade, atento o disposto no art.º 691.º, n.º 5 do CPC.
Assim sendo, notifique as partes para dizerem o que se lhes oferecer sobre esta questão prévia, querendo, no prazo de 10 dias, nos termos do art.º 704.º, n.º 1 do CPC” (cfr. fls. 1203).
B) Na sequência dessa notificação, os requeridos pronunciaram-se pela tempestividade do recurso, considerando-o interposto em 29/6/2011 (cfr. fls. 1210 a 1212).
C) Nessa data, foram apresentadas as referidas alegações, acompanhadas de um requerimento com o seguinte teor: “C....... e outros, oponentes nos autos à margem identificados, vem requerer a junção aos autos das alegações que vão junto em anexo, as quais, entre o mais visam a impugnação da matéria de facto com recurso à prova gravada” (cfr. fls. 1052).

Passando à apreciação jurídica da reclamação, importa referir:

1. Quanto à violação do princípio do contraditório, afigura-se-nos que inexiste.
Expliquemo-nos:
Sabe-se que o n.º 3 do art.º 3.º do CPC impõe, salvo caso de manifesta desnecessidade, a audição das partes antes da decisão de questões de direito ou de facto, ainda que sejam de conhecimento oficioso. Proíbe-se, assim, a decisão-supresa, isto é, a decisão baseada em fundamento que não tenha sido previamente anunciado e considerado pelas partes, vertente daquele princípio que tem fundamentalmente aplicação às questões de conhecimento oficioso, como é o presente caso.
Só que, aqui, foram ouvidas ambas as partes sobre a questão prévia, oficiosamente suscitada, acerca da impossibilidade do conhecimento do objecto do recurso, nos termos e para os efeitos previstos no art.º 704.º, n.º 1 do CPC.
É certo que os fundamentos anunciados no despacho de 29/8/20011 e os mencionados no despacho reclamado não são inteiramente coincidentes, nem isso é imposto pela lei.
No entanto, em ambos foi considerada a extemporaneidade do recurso, como facilmente se alcança através da sua leitura.
Com efeito, a extemporaneidade foi indicada como fundamento da impossibilidade de conhecimento do objecto do recurso no primeiro despacho e a mesma foi também considerada como fundamento de rejeição na parte relativa às alegações apresentadas, face à sua intempestividade, aliás manifesta, atento o recurso a que as mesmas se reportavam, conforme consta do segundo despacho.
Neste, foi ainda mencionado o fundamento decorrente da falta de requerimento de interposição de recurso, o que se nos afigura irrelevante para a questão agora em apreciação. 
Essencial, para a sua decisão, é a audição das partes sobre a impossibilidade do conhecimento do recurso. E sobre isso, foram as mesmas ouvidas, tendo-se pronunciado, incluindo os requeridos, nos termos supra referidos.
Afigura-se-nos que esta falta de coincidência não viola o princípio do contraditório.
E, ainda que se entendesse que houve omissão de audição prévia das partes sobre este fundamento, estaríamos perante uma nulidade secundária, dependente de arguição pelo interessado que lhe não tenha dado causa, o que não se verifica neste caso, sendo que não afectaria a outra parte da decisão e daria lugar à notificação dos requeridos para se pronunciarem sobre um assunto que acabaram por tratar na presente reclamação, o que redundaria na prática de um acto inútil que a lei proíbe (cfr. art.ºs 137.º, 201.º e 203.º, todos do CPC). 

2. Relativamente ao caso julgado do despacho que admitiu o recurso na 1.ª instância, é evidente que ele não se formou.
É sabido que o caso julgado, no caso o formal, pressupõe o trânsito em julgado da correspondente decisão, sendo que este ocorre quando a mesma não é susceptível de recurso ordinário ou de reclamação (cfr. art.ºs 672.º, n.º 1 e 677.º, ambos do CPC).
A decisão que admite o recurso não forma caso julgado – positivo ou negativo –, nunca se podendo tornar definitiva, na medida em que não vincula o tribunal superior nem pode ser impugnada pelas partes (cfr. art.º 685.º-C, n.º 5 do CPC). Daí que o relator deste tribunal possa e deva, no exame preliminar, averiguar se alguma circunstância obsta ao conhecimento do objecto do recurso (cfr. art.º 700.º, n.º 1, al. b) do CPC).
E foi em rigorosa observância deste poder/dever que foi proferido o despacho, alvo da presente reclamação.
Por isso, não se vislumbra onde possa existir caso julgado.

3. No que respeita à interposição/inadmissibilidade do recurso, importa dizer:
Tal como já se afirmou no despacho reclamado, o art.º 684.º-B do CPC, dispõe no n.º 1, na parte que aqui interessa considerar: “Os recursos interpõem-se por meio de requerimento dirigido ao tribunal que proferiu a decisão recorrida, no qual se indica a espécie, o efeito e o modo de subida do recurso interposto”.
O n.º 1 deste artigo corresponde ao n.º 1 do art.º 687.º, que o DL n.º 303/2007 revogou, o qual, por sua vez, correspondia ao art.º 687.º do CPC de 1939.
Em anotação a este artigo e ao subsequente relativo ao despacho sobre o requerimento pressuposto naquele, escreveu o Prof. Alberto dos Reis: “Qual é a essência do acto de interposição dum recurso?
Reduzido à última expressão, o acto define-se assim: declaração de vontade do vencido. O que há de típico e de característico no acto da interposição é simplesmente isto: a parte vencida significa que não se conforma com a decisão e que a impugna por meio de recurso.
Trata-se, pois, de um acto da parte, destinado a dar determinado impulso processual; o impulso, na espécie, consiste em submeter a tribunal superior a apreciação da decisão impugnada. Ora os actos das partes revestem três modalidades: requerimentos, articulados, alegações …. É evidente que a modalidade que se ajusta ao caso é o requerimento; é o acto idóneo para o impulso processual das partes” (cfr. Código de Processo Civil anotado, vol. V, reimpressão de 1981, págs. 326 e 327).
O Prof. Castro Mendes também ensinava que o requerimento de interposição de recurso deve conter, além do mais que aqui não releva, “manifestação da vontade de recorrer, sem o que o requerimento é inepto e não deve ser atendido (não se sabe o que o requerente quer)” – cfr. Recursos, edição da AAFDL, 1980, pág. 135.
Cremos não haver dúvidas acerca da indispensabilidade de apresentação do requerimento de interposição de recurso, porquanto é através dele que a parte vencida manifesta a sua vontade de recorrer.
Tal requerimento constitui um pressuposto legal da prolação do despacho a que alude o art.º 685.º-C do CPC sobre a admissibilidade ou inadmissibilidade do recurso.
Basta atentar na epígrafe desse mesmo artigo “Despacho sobre o requerimento”.
Parece-nos evidente que, na falta de requerimento a manifestar a vontade de recorrer, não pode ser proferido despacho a admitir um recurso que nem sequer foi interposto.
É certo que naquele normativo não consta como fundamento de indeferimento a falta de requerimento, por razões óbvias, já que não pode ser indeferido o que não foi requerido.
Todavia, na alínea b) do seu n.º 2 prevê-se o indeferimento do requerimento quando “Não contenha ou junte a alegação do recorrente ou quando esta não contenha conclusões”.
Estes fundamentos são, sem dúvida alguma, menos gravosos do que a ausência absoluta do requerimento de interposição de recurso, através do qual a parte vencida declara que não se conforma com a decisão e que a impugna por meio de recurso.
Ora, no caso em análise, esse requerimento não existe, tal como revelam os autos, foi dito no despacho reclamado e acaba de ser confessado pelos reclamantes.
Estes invocam o requerimento de 29/6/2011, que apresentaram aquando do oferecimento das alegações, supra referido na alínea C).
Mas ali não foi manifestada a vontade de recorrer, nem identificada a decisão que se pretendia impugnar.
Nesse requerimento, foi requerida, apenas, a junção aos autos das alegações a ele anexas, embora referindo que as mesmas visavam a impugnação da matéria de facto.
Todavia, esta referência não supre a falta de manifestação da vontade de recorrer de determinada decisão, tanto mais que não está identificada e as alegações apresentadas reportavam-se a outro recurso interposto da sentença, anteriormente proferida, a qual havia sido anulada e substituída por outra. Acresce que o requerimento de interposição de recurso e a correspondente alegação são peças distintas, dirigidas a tribunais diferentes, ainda que esta esteja incluída naquele, não podendo nem devendo ser confundidas (cfr. citado art.º 684.º-B, n.ºs1 e 2).
Daí que se tenha considerado extemporâneas e inúteis tais alegações e inexistente qualquer requerimento de interposição de recurso da decisão que versou sobre a oposição deduzida pelos requeridos, com a consequente rejeição do “recurso” admitido pela 1.ª instância, dada a falta do respectivo objecto.
Com o devido respeito por opinião contrária, afigura-se-nos que o aludido requerimento, de 29/6/2011, é inepto, pelo que não deve ser atendido como manifestação de vontade de recorrer.
Como tal, a sua apresentação também não demandava qualquer despacho de aperfeiçoamento, por não estar previsto na lei para a presente situação, nem resultar de algum princípio processual, nomeadamente dos, agora invocados, deveres de esclarecimento e de prevenção.
Nem a referência à primeira sentença, feita nas alegações, dá direito a qualquer rectificação nos termos do art.º 249.º do Código Civil, dada a ausência dos pressupostos da sua aplicação. É que, para haver lugar à rectificação ao abrigo deste normativo, é necessário que o erro de escrita seja de tal modo ostensivo que resulte do próprio contexto do documento, o que não é o caso. Apesar de ser aplicável a todos os actos jurídicos, nomeadamente aos praticados no processo civil, para poderem ser rectificados nos termos e condições daquele artigo, teria de ocorrer um “erro manifesto” ou “erro ostensivo” (cfr. acórdão desta Relação de 10/1/95, CJ, ano XX, tomo 1, pág. 193). Além disso, por esta via, não é possível “complementar as puras e simples omissões ou corrigir peças processuais” (cfr. Prof. Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, vol. I, tomo I, 2.ª ed., pág. 612, e acórdãos da Relação de Lisboa de 18/3/1992, CJ, ano XVII, tomo 2, pág. 194 e de 14/5/1998, CJ, XXIII, 3, 98).
Não se trata de erro de escrita, manifesta ou ostensivamente, revelado no próprio contexto da alegação, nem o mesmo permite suprir a falta do requerimento de interposição de recurso, pela simples razão de que não existe erro, mas ausência de declaração.
Não se olvida que o n.º 2 do art.º 266.º do CPC consagra o poder do juiz, em qualquer momento, ouvir as partes ou seus mandatários para lhe prestarem esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito da causa.
Traduz o mesmo um afloramento do princípio geral da cooperação a permitir que o juiz interpele as partes sobre determinados pontos do processo, em termos de clarificar a sua vontade processual. 
Diferente deste é o propósito dos n.ºs 2 e 3 do art.º 508.º do CPC. Este normativo tem aplicação na fase do pré-saneamento e, segundo ele, para que o juiz fique habilitado a expurgar o não essencial e a só condensar o pertinente, deve convidar as partes a suprirem irregularidades dos articulados ou a juntarem documento essencial (n.º 2) – dever vinculado – e pode endereçar convite para suprimento de imprecisões discursivas ou concretização de matéria de facto já alegada (n.º 3) – dever não vinculado ou mera faculdade (cfr. Ac. do STJ, de 21/112006, CJ- STJ –  ano XIV, tomo III, pág. 127).
Tal como dele resulta, em especial do n.º 1, al. a), destina-se apenas ao aperfeiçoamento dos articulados, na fase do pré-saneamento. E não de outros requerimentos ou peças apresentadas noutra fase processual.
Efectivamente, o art.º 508.º reporta-se à fase posterior aos articulados, que não aos recursos (cfr. Ac. do STJ de 15/11/2007, processo n.º 07B3036, acessível em www.dgsi.pt).
Logo, não tem aplicação ao caso sub judice.
E também não tem a norma invocada do art.º 508.º-A, n.º 1, al. c), por respeitar à discussão das posições das partes e ao suprimento de insuficiências ou imprecisões na exposição da matéria de facto que ainda subsistam ou se tornem patentes na sequência do debate, tudo em sede da audiência preliminar.
Aos recursos aplica-se o art.º 685.º-A, n.º 3, mas tão só nos termos nele exarados, ou seja, “quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior”, que são as concernentes à matéria de direito. 
Este artigo não permite o convite ao aperfeiçoamento de peça recursória (cfr. Ac. do STJ, de 27/5/2010, proferido no processo n.º 1122/07.2TYLSB.L1-A.S1, referindo-se ao art.º 690.º, n.º 4, revogado pelo art.º 9 do citado DL n.º 303/2007, mas substituído por aquele, de teor idêntico, cujo sumário está acessível em www.dgsi.pt).
Por maioria de razão, não permite o aperfeiçoamento de um requerimento que se limitou a requerer a junção de alegações.
O presente caso não se subsume, manifestamente, a nenhuma das situações previstas no n.º 3 do art.º 685.º-A.
O convite ao aperfeiçoamento de peças processuais tem lugar quando a lei assim dispuser.
Não se vislumbrando qualquer norma que o permita, muito menos que o imponha, é por demais evidente que jamais poderia formular-se o convite aos requeridos para apresentarem o requerimento de interposição de recurso, em falta.
Aliás, dificilmente se pode configurar um aperfeiçoamento daquilo que não existe no processo.
Por outro lado, temos como certo e seguro que o primeiro princípio deve ser aplicado com cautela para não subverter as restantes regras e normas processuais e pôr em causa a segurança jurídica.
Pela sua pertinência, não podemos deixar de trazer à colação um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, onde se afirma que as normas da cooperação terão sempre de “conter-se nos limites da garantia de igual tratamento das partes, não podendo o Tribunal privilegiar uma delas, indicando-lhe o “caminho” para o sucesso da lide, tanto mais que, havendo patrocínio judiciário obrigatório, cumpre aos Ilustres Mandatários, como especialistas e técnicos do Direito, garantir aos seus mandantes um adequado, e rigoroso, tratamento da causa. 
Aliás, e nesta linha, o relatório preambular do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, limitou-se a enfatizar “um poder mais interventor do juiz, compensado pela previsão do princípio da cooperação, por uma participação mais activa das partes no processo de formação da decisão.” 
O poder “interventor do juiz” destina-se a uma função disciplinadora do processo, tendo em vista uma justa composição do litigio, que não substituir-se às partes para sanar as suas fragilidades e deficiências, subvertendo a dialéctica processual, a imparcialidade e a equidistância, constitucionalmente exigíveis aos Tribunais” (cfr. acórdão de 14/9/2010, proferido no processo n.º 941/08.7TBCBR.C1.S1, disponível em www.dgsi.pt).  
Também não se vê onde a interpretação que aqui foi dada aos aludidos art.ºs 684.º-B, n.º 1 e 704.º, n.º 1, ambos do CPC, possa violar a Constituição da República Portuguesa (CRP), designadamente os seus art.ºs 18.º, n.º 3 e 20.º, n.ºs 1 e 4.
Embora ela não contenha, para a conformação das regras do processo civil, indicações tão precisas e densas quanto as que se dirigem à conformação do processo penal (cfr. seus art.ºs 27.º, 28.º, 30.º, 31.º e 32.º), sabe-se que as normas de processo, qualquer que ele seja, representam sempre a concretização de elementos essenciais do princípio do Estado de direito, pelo que jamais podem ser constitucionalmente irrelevantes ou indiferentes. 
Sendo através do processo que os tribunais desempenham a função jurisdicional que lhes está constitucionalmente reservada (cfr. art.º 202.º da CRP) e sendo também por intermédio dele que os cidadãos têm acesso à tutela estadual dos seus direitos e interesses, não podem as normas que o conformam deixar de reflectir princípios que estruturam todo o sistema da Constituição. Isto mesmo tem sido afirmado pelo Tribunal Constitucional em jurisprudência consolidada, nomeadamente nos Acórdãos nºs 271/95, 335/95, 508/2002 e 413/2010, todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt. 
Mas isso não significa que, no caso, se verifiquem as inconstitucionalidades apontadas pelos reclamantes. 
Contrariamente ao que parece estar pressuposto na sua argumentação, não decorre do art.º 20.º da CRP um direito a um duplo grau de jurisdição em termos gerais.
Sobre o direito de acesso à justiça tem o Tribunal Constitucional firmado uma extensa jurisprudência, interpretando-o no sentindo de que ele é “um direito à solução dos conflitos por banda de um órgão independente e imparcial face ao que concerne à apresentação das respectivas perspectivas, não decorrendo desse direito (nomeadamente, no que ora releva, se em causa estiver a litigância civil obrigacional) o asseguramento às partes da garantia de recurso das decisões que lhes sejam desfavoráveis”, como se disse, por exemplo, nos acórdãos n.ºs 83/99, 359/04 e 339/2011, todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt. 
Naquele artigo 20.º está consagrado “um direito a uma solução jurídica dos conflitos, a que se deve chegar em prazo razoável e com observância de garantias de imparcialidade e independência, possibilitando-se, designadamente, um correcto funcionamento das regras do contraditório, em termos de cada uma das partes poder deduzir as suas razões (de facto e de direito), oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e discretear sobre o valor e resultado de umas e outras” (cfr., entre outros, Acórdãos do Tribunal Constitucional Acórdão n.º 444/91, em DR II, de 2 de Abril de 1992, p. 3112-(37) e n.º 540/97, disponível www.tribunalconstitucional.pt). Neste direito fundamental inclui-se, ainda, “a proibição da indefesa que consiste na privação ou limitação do direito de defesa do particular perante os órgãos judiciais, junto dos quais se discutem questões que lhes dizem respeito, mas não necessariamente uma sistemática faculdade de obter uma segunda apreciação jurisdicional da questão mediante o reconhecimento de um genérico direito de recorrer das decisões jurisdicionais.
O duplo grau de jurisdição apenas está consagrado expressamente como uma das garantias de defesa em processo penal contra decisões condenatórias ou que afectem a liberdade do arguido (artigo 32.º, n.º1, da CRP). Além dessa consagração expressa, esse direito é considerado por alguma doutrina e jurisprudência, embora com fundamentação não inteiramente coincidente, como inerente à protecção contra decisões que imponham restrições a direitos liberdades e garantias pessoais (cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, pá. 200). Fora desses domínios específicos, o legislador dispõe de uma larga margem de conformação do direito ao recurso, seja quanto à definição das decisões jurisdicionais susceptíveis de impugnação e aos condicionamentos da recorribilidade (aspecto que não está em causa), seja quanto aos demais aspectos da sua regulação, designadamente quanto ao seu modo de processamento, regime de subida e efeitos sobre a marcha do processo ou sobre a execução da decisão recorrida” (cfr. citado acórdão n.º 339/2011).
Por outro lado, importa não olvidar que, através do processo justo e equitativo, garantido no n.º 4 do citado art.º 20.º, cumprem-se também outros valores constitucionalmente relevantes, como sejam os consagrados nos art.ºs 2.º e 13.º, particularmente, quanto a este último, no que respeita à necessária “igualdade de armas”.
E, porque a garantia do processo justo implica o direito a uma solução jurídica de conflitos a que se deve chegar em prazo razoável, à disciplina do processo não pode ser alheia a necessidade de fixar os períodos de tempo durante os quais se podem praticar os actos processuais, nem a forma como estes devem ser praticados.
Por isso, a lei que fixa prazos para a prática dos actos processuais e estabelece a forma que os mesmos devem observar não restringe, prima facie, nenhum direito constitucionalmente tutelado nem lesa nenhum princípio com assento constitucional, tal como não lesam as decisões que procedem à sua interpretação em conformidade com o que se deixou dito.
A interpretação dada às normas questionadas na decisão reclamada, de modo algum, viola os invocados princípios da proporcionalidade e do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva.
Da circunstância de não se ter formulado o convite ao aperfeiçoamento do requerimento que requereu a junção das alegações e não se ter interpretado como interposição de recurso, bem como o aditamento de fundamento não anunciado expressa e previamente à sua rejeição, não resulta violação dos aludidos princípios, desde logo porque o direito ao duplo grau de jurisdição em processo civil não está garantido, nem pode ser exercido arbitrariamente. As decisões judiciais só podem ser impugnadas com observância da disciplina imposta pelas correspondentes normas processuais, por forma a poderem garantir um processo equitativo e a observância dos princípios constitucionais gerais, designadamente da igualdade e da proporcionalidade.
A adopção de posição diversa comprometeria o próprio direito a uma solução jurídica do conflito em prazo razoável e mediante um processo equitativo, tanto mais que se trata de um procedimento cautelar que, como tal, tem sempre carácter urgente (cfr. art.º 382.º, n.º 1 do CPC).
Nesta medida, a interpretação feita não afecta a garantia do processo justo, ínsita no n.º 4 do art.º 20.º da CRP, não viola o direito à tutela jurisdicional efectiva, previsto naquele normativo, nem se mostra manifestamente desrazoável ou desproporcionada de forma a afectar o princípio da proporcionalidade, aflorado no n.º 3 do art.º 18.º, também invocado pelos reclamantes.
Não têm, por conseguinte, aqui aplicação as decisões e entendimentos referenciados na jurisprudência e doutrina citadas na reclamação por respeitarem a situações diversas da presente. 
Consequentemente, não se vislumbra qualquer violação dos princípios e normas legais e constitucionais ali doutamente expostos.

Concordamos plenamente com a fundamentação e decisão objecto da presente reclamação, por corresponderem a uma interpretação correcta da lei, segundo as regras e princípios jurídicos que nos regem, sendo irrelevantes todas as considerações feitas pelos reclamantes.

Por isso, é manifesto que o despacho reclamado deve ser mantido e desatendida a reclamação, com a consequente rejeição do recurso.

III. Decisão

Por tudo o exposto, acorda-se em indeferir a reclamação apresentada e manter o despacho reclamado que rejeitou o recurso.*Custas pelos reclamantes.*Porto, 22 de Novembro de 2011
Fernando Augusto Samões
José Manuel Cabrita Vieira e Cunha
Maria das Dores Eiró de Araújo

Processo n.º 126/09.5TBVPA-A.P1 Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto - 2.ª Secção *I. Relatório Pelo ora relator, foi proferido, de fls. 1217 a 1219 destes autos, o despacho com o seguinte teor: “B….. requereu, em 30/1/2009, no Tribunal Judicial da Comarca de Chaves, onde foi distribuído ao 1.º Juízo, procedimento cautelar de arrolamento contra C….. e D….., E….., F…… e G……, H….. e I….., todos melhor identificados nos autos, com base nos fundamentos invocados no seu requerimento inicial, como preliminar da acção de inventário a instaurar por óbito de seu irmão J……. O arrolamento foi decretado nos termos e com os fundamentos constantes do despacho de fls. 45 a 49 dos autos, sem prévia audição dos requeridos. Ordenada a sua citação, por despacho de 12/3/2009, e efectuada esta por carta registada com A/R para recorrer ou deduzir oposição, nos termos dos art.ºs 385.º, n.º 6 e 388.º, n.º 1, ambos do CPC, (cfr. fls. 258 a 266), vieram os requeridos deduzir oposição, em 6/4/2009, conforme consta de fls. 531 a 568. Já no Tribunal da Comarca de Vila Pouca de Aguiar, para onde os autos foram remetidos em 3/4/2009, em virtude de aí ter sido, entretanto, instaurado o processo de inventário, procedeu-se à audiência final a que alude o art.º 386.º do CPC, a qual decorreu nos dias 19 de Junho e 14 de Julho de 2009, 26 de Março e 16 de Abril de 2010 (cfr. fls. 700 e 701, 773 a 775, 895 a 898 e 911), a que se seguiu o despacho de fls. 914 a 938, datado de 10 de Maio de 2010, que decidiu “manter o arrolamento decretado por decisão de 43 a 49 dos autos, sem prejuízo do decidido nos despachos proferidos a fls. 696, e a fls. 773 a 775, dos autos”. Após confiança do processo e requerimento do ilustre mandatário dos requeridos, foi proferido o despacho de fls. 949, onde se afirmou ter-se constatado que o CD áudio, com a gravação da prova, inicialmente entregue, não era totalmente audível, pelo que deferiu tal requerimento, procedendo à entrega de novo CD com os depoimentos das testemunhas e concedendo o prazo de dez dias para a apresentação das alegações, contado a partir do dia 7/6/2010. Por requerimento de 11/6/2010, os requeridos arguiram a nulidade processual consistente na deficiente gravação de três depoimentos, por não serem totalmente audíveis através do último CD entregue, requerendo a fixação de novo prazo para interporem recurso e produzirem as respectivas alegações (cfr. fls. 954 a 962). Pronunciando-se sobre esse requerimento, a requerente Aurora, em 23 de Junho de 2010, afirmou que lhe parecia um expediente dilatório, pelo que se impunha averiguar se tais depoimentos eram ou não inaudíveis. Em 25 de Junho de 2010, foi proferido o despacho de fls. 975 com o seguinte teor: “Requerimento de 23/6/2010: A anomalia invocada pelos recorrentes dizia respeito ao específico CD que lhes foi inicialmente entregue. Assim, nada mais há a decidir a esse respeito. Notifique com cópia de fls. 948 para melhor esclarecimento. VPA, ds.” Em 30/6/2010, os requeridos/oponentes requereram a rectificação do lapso e a revogação do anterior despacho com a substituição por outro que tome em consideração o facto de a arguição da nulidade assentar e decorrer da entrega do segundo CD, efectuada no dia 7 desse mês. Em 16/7/2010, os requeridos/oponentes interpuseram recurso do despacho de fls. 975, o qual foi decidido por acórdão desta Relação, de 11/1/2011, que revogou aquele despacho e mandou substituí-lo por outro que apreciasse a “questão suscitada”, ou seja, da arguida, e ali qualificada, nulidade processual secundária decorrente da alegada deficiente gravação do 2.º CD, disponibilizado no dia 7/6/2010. Em obediência a esse acórdão, foi proferido o despacho de 28/2/2011 que apreciou tal questão e anulou os actos de produção de prova com gravação deficiente (os depoimentos das testemunhas K….., L….. e M…..), bem como da “sentença”, determinando a sua “subsequente repetição”. Nessa sequência, foi repetida a inquirição das referidas testemunhas, no dia 29/4/2011 (cfr. fls. 1015 e 1016). E, no dia 24 de Maio de 2011, foi proferido novo despacho que decidiu nos mesmos termos do que havia sido proferido em 10 de Maio de 2010, mantendo o arrolamento anteriormente decretado (cfr. fls. 1022 a 1045). Esse despacho foi notificado aos requeridos/oponentes em 31 de Maio de 2011. E, em 29 de Junho de 2011, os requeridos vieram requerer a “junção aos autos das alegações de recurso” que anexaram, sendo que nestas fazem referência ao “recurso de apelação interposto da douta sentença de fls. 914 e ss”. Por despacho de 29/7/2011, o Ex.mo Juiz da 1.ª instância admitiu o “recurso interposto através do requerimento que antecede” (cfr. fls. 1192). Remetidos os autos a este Tribunal, entendeu-se que não era possível conhecer do objecto do recurso assim “interposto” e admitido, pelo que foi dado cumprimento ao disposto no art.º 704.º, n.º 1 do CPC, tendo os “apelantes” respondido no sentido da tempestividade do recurso, enquanto a requerente/recorrida se pronunciou pela sua extemporaneidade. Cumpre, pois, decidir esta questão prévia suscitada. Tendo o procedimento sido instaurado depois de 1/1/2008, mais exactamente em 30/1/2009, são-lhe aplicáveis as disposições do Código de Processo Civil na redacção dada pelo DL n.º 303/2007, de 24/8 (cfr. art.ºs 11.º e 12.º deste diploma). Preceitua o art.º 684.º-B daquele Código, no n.º 1, que os recursos se interpõem por meio de requerimento dirigido ao tribunal que proferiu a decisão recorrida, no qual se indica a espécie, o efeito e o modo de subida do recurso interposto, acrescentando, no n.º 2, que esse requerimento deve incluir a alegação do recorrente. Por sua vez, dispõe o n.º 2 do art.º 388.º do mesmo Código que cabe recurso da decisão que mantenha, reduza ou revogue a providência anteriormente decretada, no caso de ter sido deduzida oposição nos termos da alínea b) do número anterior, sendo que o n.º 5 do art.º 691.º fixa o prazo para a interposição do recurso e apresentação das alegações em 15 dias, a que acrescem 10 dias se o recurso tiver por objecto a reapreciação da prova gravada (cfr. n.º 7 do art.º 685.º do aludido Código). Apesar de a omissão da indicação pela parte da espécie, do modo de subida e do efeito do recurso poderem ser supridas pelo tribunal a quo, afigura-se-nos indispensável a apresentação do requerimento de interposição de recurso, no prazo legal, o qual deve incluir ou ser acompanhado da correspondente alegação. Tal requerimento integra a manifestação de vontade da parte inconformada com a decisão proferida e constitui um pressuposto legal da prolação do despacho a que alude o art.º 685.º-C do CPC sobre a admissibilidade ou inadmissibilidade do recurso. Acontece, porém, que não foi apresentado qualquer requerimento de interposição de recurso da decisão que versou sobre a oposição deduzida pelos requeridos. Lendo e relendo os autos do processo físico que nos foi apresentado, não se vislumbra tal requerimento. E, tendo sido mandado averiguar se o mesmo requerimento tinha sido junto ao processo principal ou aos autos apensos que ficaram no Tribunal da Comarca de Vila Pouca de Aguiar ou ali se encontrava, bem como se constava do histórico do processo electrónico do citius, a que não temos acesso, fomos informados que jamais fora apresentado o requerimento em falta. Por isso, estranha-se que no despacho de fls. 1192, que admitiu o recurso, tenha sido feita referência ao “requerimento que antecede”. Por outro lado, nas alegações apresentadas pelos pretensos recorrentes, em 29/6/2011, constantes de fls. 1053 a 1126, refere-se que as mesmas se reportam aos “autos de recurso de apelação interposto da douta sentença de fls. 914 e ss”. Ora, não só é manifesta a extemporaneidade de tais alegações reportadas ao recurso da decisão nelas referida, tanto mais que, por despacho de fls. 949, havia sido concedido o prazo para alegar a partir de 7/6/2010, como são inúteis, visto que aquela decisão foi anulada pelo despacho de 28/2/2011, proferido na sequência do acórdão desta Relação de 11/1/2011, que declarou a nulidade arguida pelos requeridos, mandando repetir quer os actos que apresentavam deficiente gravação, quer a subsequente sentença. Tendo tal decisão sido anulada e substituída pelo despacho exarado de fls. 1022 a 1045, datado de 24/5/2011, e não tendo sido interposto recurso dele, é evidente que jamais podia ter sido admitido o recurso, agora em causa, como foi, através do despacho de fls. 1192. Assim sendo, e uma vez que esse despacho não vincula este Tribunal superior (art.º 685.º-C, n.º 5 do CPC), impõe-se agora a sua rejeição, com fundamento na falta de objecto e impossibilidade de apreciação da alegação apresentada. Nestes termos e visto o preceituado no art.º 700.º, n.º 1, als. b) e h) do CPC, decide-se rejeitar o recurso “interposto” pelos requeridos e admitido por despacho de fls. 1192.” Inconformados com este despacho, vieram os requeridos, pretensos recorrentes, requerer que sobre ele recaísse acórdão “julgando no sentido de se conhecer do objecto do recurso”, com os fundamentos que invocaram na sua reclamação de fls. 1226 a 1289, que se resumem à inobservância do contraditório dada a divergência entre o anunciado e o decidido, à formação de caso julgado pelo despacho que admitiu o recurso e à falta de esclarecimento sobre o alcance do requerimento que acompanhou as alegações que entendem valer como interposição de recurso. A parte contrária nada disse. Tudo visto, cumpre apreciar e decidir a presente reclamação, por forma a saber se deve ou não ser admitido o recurso pretensamente interposto pelos requeridos, ora reclamantes. II. Fundamentação Os factos a considerar na resolução desta questão são os que constam do relatório acabado de elaborar mais os seguintes: A) Em 29/8/2011, pelo mesmo relator, foi proferido o seguinte despacho: “Afigura-se-nos que não pode conhecer-se do objecto do recurso, face à sua extemporaneidade, atento o disposto no art.º 691.º, n.º 5 do CPC. Assim sendo, notifique as partes para dizerem o que se lhes oferecer sobre esta questão prévia, querendo, no prazo de 10 dias, nos termos do art.º 704.º, n.º 1 do CPC” (cfr. fls. 1203). B) Na sequência dessa notificação, os requeridos pronunciaram-se pela tempestividade do recurso, considerando-o interposto em 29/6/2011 (cfr. fls. 1210 a 1212). C) Nessa data, foram apresentadas as referidas alegações, acompanhadas de um requerimento com o seguinte teor: “C....... e outros, oponentes nos autos à margem identificados, vem requerer a junção aos autos das alegações que vão junto em anexo, as quais, entre o mais visam a impugnação da matéria de facto com recurso à prova gravada” (cfr. fls. 1052). Passando à apreciação jurídica da reclamação, importa referir: 1. Quanto à violação do princípio do contraditório, afigura-se-nos que inexiste. Expliquemo-nos: Sabe-se que o n.º 3 do art.º 3.º do CPC impõe, salvo caso de manifesta desnecessidade, a audição das partes antes da decisão de questões de direito ou de facto, ainda que sejam de conhecimento oficioso. Proíbe-se, assim, a decisão-supresa, isto é, a decisão baseada em fundamento que não tenha sido previamente anunciado e considerado pelas partes, vertente daquele princípio que tem fundamentalmente aplicação às questões de conhecimento oficioso, como é o presente caso. Só que, aqui, foram ouvidas ambas as partes sobre a questão prévia, oficiosamente suscitada, acerca da impossibilidade do conhecimento do objecto do recurso, nos termos e para os efeitos previstos no art.º 704.º, n.º 1 do CPC. É certo que os fundamentos anunciados no despacho de 29/8/20011 e os mencionados no despacho reclamado não são inteiramente coincidentes, nem isso é imposto pela lei. No entanto, em ambos foi considerada a extemporaneidade do recurso, como facilmente se alcança através da sua leitura. Com efeito, a extemporaneidade foi indicada como fundamento da impossibilidade de conhecimento do objecto do recurso no primeiro despacho e a mesma foi também considerada como fundamento de rejeição na parte relativa às alegações apresentadas, face à sua intempestividade, aliás manifesta, atento o recurso a que as mesmas se reportavam, conforme consta do segundo despacho. Neste, foi ainda mencionado o fundamento decorrente da falta de requerimento de interposição de recurso, o que se nos afigura irrelevante para a questão agora em apreciação. Essencial, para a sua decisão, é a audição das partes sobre a impossibilidade do conhecimento do recurso. E sobre isso, foram as mesmas ouvidas, tendo-se pronunciado, incluindo os requeridos, nos termos supra referidos. Afigura-se-nos que esta falta de coincidência não viola o princípio do contraditório. E, ainda que se entendesse que houve omissão de audição prévia das partes sobre este fundamento, estaríamos perante uma nulidade secundária, dependente de arguição pelo interessado que lhe não tenha dado causa, o que não se verifica neste caso, sendo que não afectaria a outra parte da decisão e daria lugar à notificação dos requeridos para se pronunciarem sobre um assunto que acabaram por tratar na presente reclamação, o que redundaria na prática de um acto inútil que a lei proíbe (cfr. art.ºs 137.º, 201.º e 203.º, todos do CPC). 2. Relativamente ao caso julgado do despacho que admitiu o recurso na 1.ª instância, é evidente que ele não se formou. É sabido que o caso julgado, no caso o formal, pressupõe o trânsito em julgado da correspondente decisão, sendo que este ocorre quando a mesma não é susceptível de recurso ordinário ou de reclamação (cfr. art.ºs 672.º, n.º 1 e 677.º, ambos do CPC). A decisão que admite o recurso não forma caso julgado – positivo ou negativo –, nunca se podendo tornar definitiva, na medida em que não vincula o tribunal superior nem pode ser impugnada pelas partes (cfr. art.º 685.º-C, n.º 5 do CPC). Daí que o relator deste tribunal possa e deva, no exame preliminar, averiguar se alguma circunstância obsta ao conhecimento do objecto do recurso (cfr. art.º 700.º, n.º 1, al. b) do CPC). E foi em rigorosa observância deste poder/dever que foi proferido o despacho, alvo da presente reclamação. Por isso, não se vislumbra onde possa existir caso julgado. 3. No que respeita à interposição/inadmissibilidade do recurso, importa dizer: Tal como já se afirmou no despacho reclamado, o art.º 684.º-B do CPC, dispõe no n.º 1, na parte que aqui interessa considerar: “Os recursos interpõem-se por meio de requerimento dirigido ao tribunal que proferiu a decisão recorrida, no qual se indica a espécie, o efeito e o modo de subida do recurso interposto”. O n.º 1 deste artigo corresponde ao n.º 1 do art.º 687.º, que o DL n.º 303/2007 revogou, o qual, por sua vez, correspondia ao art.º 687.º do CPC de 1939. Em anotação a este artigo e ao subsequente relativo ao despacho sobre o requerimento pressuposto naquele, escreveu o Prof. Alberto dos Reis: “Qual é a essência do acto de interposição dum recurso? Reduzido à última expressão, o acto define-se assim: declaração de vontade do vencido. O que há de típico e de característico no acto da interposição é simplesmente isto: a parte vencida significa que não se conforma com a decisão e que a impugna por meio de recurso. Trata-se, pois, de um acto da parte, destinado a dar determinado impulso processual; o impulso, na espécie, consiste em submeter a tribunal superior a apreciação da decisão impugnada. Ora os actos das partes revestem três modalidades: requerimentos, articulados, alegações …. É evidente que a modalidade que se ajusta ao caso é o requerimento; é o acto idóneo para o impulso processual das partes” (cfr. Código de Processo Civil anotado, vol. V, reimpressão de 1981, págs. 326 e 327). O Prof. Castro Mendes também ensinava que o requerimento de interposição de recurso deve conter, além do mais que aqui não releva, “manifestação da vontade de recorrer, sem o que o requerimento é inepto e não deve ser atendido (não se sabe o que o requerente quer)” – cfr. Recursos, edição da AAFDL, 1980, pág. 135. Cremos não haver dúvidas acerca da indispensabilidade de apresentação do requerimento de interposição de recurso, porquanto é através dele que a parte vencida manifesta a sua vontade de recorrer. Tal requerimento constitui um pressuposto legal da prolação do despacho a que alude o art.º 685.º-C do CPC sobre a admissibilidade ou inadmissibilidade do recurso. Basta atentar na epígrafe desse mesmo artigo “Despacho sobre o requerimento”. Parece-nos evidente que, na falta de requerimento a manifestar a vontade de recorrer, não pode ser proferido despacho a admitir um recurso que nem sequer foi interposto. É certo que naquele normativo não consta como fundamento de indeferimento a falta de requerimento, por razões óbvias, já que não pode ser indeferido o que não foi requerido. Todavia, na alínea b) do seu n.º 2 prevê-se o indeferimento do requerimento quando “Não contenha ou junte a alegação do recorrente ou quando esta não contenha conclusões”. Estes fundamentos são, sem dúvida alguma, menos gravosos do que a ausência absoluta do requerimento de interposição de recurso, através do qual a parte vencida declara que não se conforma com a decisão e que a impugna por meio de recurso. Ora, no caso em análise, esse requerimento não existe, tal como revelam os autos, foi dito no despacho reclamado e acaba de ser confessado pelos reclamantes. Estes invocam o requerimento de 29/6/2011, que apresentaram aquando do oferecimento das alegações, supra referido na alínea C). Mas ali não foi manifestada a vontade de recorrer, nem identificada a decisão que se pretendia impugnar. Nesse requerimento, foi requerida, apenas, a junção aos autos das alegações a ele anexas, embora referindo que as mesmas visavam a impugnação da matéria de facto. Todavia, esta referência não supre a falta de manifestação da vontade de recorrer de determinada decisão, tanto mais que não está identificada e as alegações apresentadas reportavam-se a outro recurso interposto da sentença, anteriormente proferida, a qual havia sido anulada e substituída por outra. Acresce que o requerimento de interposição de recurso e a correspondente alegação são peças distintas, dirigidas a tribunais diferentes, ainda que esta esteja incluída naquele, não podendo nem devendo ser confundidas (cfr. citado art.º 684.º-B, n.ºs1 e 2). Daí que se tenha considerado extemporâneas e inúteis tais alegações e inexistente qualquer requerimento de interposição de recurso da decisão que versou sobre a oposição deduzida pelos requeridos, com a consequente rejeição do “recurso” admitido pela 1.ª instância, dada a falta do respectivo objecto. Com o devido respeito por opinião contrária, afigura-se-nos que o aludido requerimento, de 29/6/2011, é inepto, pelo que não deve ser atendido como manifestação de vontade de recorrer. Como tal, a sua apresentação também não demandava qualquer despacho de aperfeiçoamento, por não estar previsto na lei para a presente situação, nem resultar de algum princípio processual, nomeadamente dos, agora invocados, deveres de esclarecimento e de prevenção. Nem a referência à primeira sentença, feita nas alegações, dá direito a qualquer rectificação nos termos do art.º 249.º do Código Civil, dada a ausência dos pressupostos da sua aplicação. É que, para haver lugar à rectificação ao abrigo deste normativo, é necessário que o erro de escrita seja de tal modo ostensivo que resulte do próprio contexto do documento, o que não é o caso. Apesar de ser aplicável a todos os actos jurídicos, nomeadamente aos praticados no processo civil, para poderem ser rectificados nos termos e condições daquele artigo, teria de ocorrer um “erro manifesto” ou “erro ostensivo” (cfr. acórdão desta Relação de 10/1/95, CJ, ano XX, tomo 1, pág. 193). Além disso, por esta via, não é possível “complementar as puras e simples omissões ou corrigir peças processuais” (cfr. Prof. Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, vol. I, tomo I, 2.ª ed., pág. 612, e acórdãos da Relação de Lisboa de 18/3/1992, CJ, ano XVII, tomo 2, pág. 194 e de 14/5/1998, CJ, XXIII, 3, 98). Não se trata de erro de escrita, manifesta ou ostensivamente, revelado no próprio contexto da alegação, nem o mesmo permite suprir a falta do requerimento de interposição de recurso, pela simples razão de que não existe erro, mas ausência de declaração. Não se olvida que o n.º 2 do art.º 266.º do CPC consagra o poder do juiz, em qualquer momento, ouvir as partes ou seus mandatários para lhe prestarem esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito da causa. Traduz o mesmo um afloramento do princípio geral da cooperação a permitir que o juiz interpele as partes sobre determinados pontos do processo, em termos de clarificar a sua vontade processual. Diferente deste é o propósito dos n.ºs 2 e 3 do art.º 508.º do CPC. Este normativo tem aplicação na fase do pré-saneamento e, segundo ele, para que o juiz fique habilitado a expurgar o não essencial e a só condensar o pertinente, deve convidar as partes a suprirem irregularidades dos articulados ou a juntarem documento essencial (n.º 2) – dever vinculado – e pode endereçar convite para suprimento de imprecisões discursivas ou concretização de matéria de facto já alegada (n.º 3) – dever não vinculado ou mera faculdade (cfr. Ac. do STJ, de 21/112006, CJ- STJ – ano XIV, tomo III, pág. 127). Tal como dele resulta, em especial do n.º 1, al. a), destina-se apenas ao aperfeiçoamento dos articulados, na fase do pré-saneamento. E não de outros requerimentos ou peças apresentadas noutra fase processual. Efectivamente, o art.º 508.º reporta-se à fase posterior aos articulados, que não aos recursos (cfr. Ac. do STJ de 15/11/2007, processo n.º 07B3036, acessível em www.dgsi.pt). Logo, não tem aplicação ao caso sub judice. E também não tem a norma invocada do art.º 508.º-A, n.º 1, al. c), por respeitar à discussão das posições das partes e ao suprimento de insuficiências ou imprecisões na exposição da matéria de facto que ainda subsistam ou se tornem patentes na sequência do debate, tudo em sede da audiência preliminar. Aos recursos aplica-se o art.º 685.º-A, n.º 3, mas tão só nos termos nele exarados, ou seja, “quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior”, que são as concernentes à matéria de direito. Este artigo não permite o convite ao aperfeiçoamento de peça recursória (cfr. Ac. do STJ, de 27/5/2010, proferido no processo n.º 1122/07.2TYLSB.L1-A.S1, referindo-se ao art.º 690.º, n.º 4, revogado pelo art.º 9 do citado DL n.º 303/2007, mas substituído por aquele, de teor idêntico, cujo sumário está acessível em www.dgsi.pt). Por maioria de razão, não permite o aperfeiçoamento de um requerimento que se limitou a requerer a junção de alegações. O presente caso não se subsume, manifestamente, a nenhuma das situações previstas no n.º 3 do art.º 685.º-A. O convite ao aperfeiçoamento de peças processuais tem lugar quando a lei assim dispuser. Não se vislumbrando qualquer norma que o permita, muito menos que o imponha, é por demais evidente que jamais poderia formular-se o convite aos requeridos para apresentarem o requerimento de interposição de recurso, em falta. Aliás, dificilmente se pode configurar um aperfeiçoamento daquilo que não existe no processo. Por outro lado, temos como certo e seguro que o primeiro princípio deve ser aplicado com cautela para não subverter as restantes regras e normas processuais e pôr em causa a segurança jurídica. Pela sua pertinência, não podemos deixar de trazer à colação um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, onde se afirma que as normas da cooperação terão sempre de “conter-se nos limites da garantia de igual tratamento das partes, não podendo o Tribunal privilegiar uma delas, indicando-lhe o “caminho” para o sucesso da lide, tanto mais que, havendo patrocínio judiciário obrigatório, cumpre aos Ilustres Mandatários, como especialistas e técnicos do Direito, garantir aos seus mandantes um adequado, e rigoroso, tratamento da causa. Aliás, e nesta linha, o relatório preambular do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, limitou-se a enfatizar “um poder mais interventor do juiz, compensado pela previsão do princípio da cooperação, por uma participação mais activa das partes no processo de formação da decisão.” O poder “interventor do juiz” destina-se a uma função disciplinadora do processo, tendo em vista uma justa composição do litigio, que não substituir-se às partes para sanar as suas fragilidades e deficiências, subvertendo a dialéctica processual, a imparcialidade e a equidistância, constitucionalmente exigíveis aos Tribunais” (cfr. acórdão de 14/9/2010, proferido no processo n.º 941/08.7TBCBR.C1.S1, disponível em www.dgsi.pt). Também não se vê onde a interpretação que aqui foi dada aos aludidos art.ºs 684.º-B, n.º 1 e 704.º, n.º 1, ambos do CPC, possa violar a Constituição da República Portuguesa (CRP), designadamente os seus art.ºs 18.º, n.º 3 e 20.º, n.ºs 1 e 4. Embora ela não contenha, para a conformação das regras do processo civil, indicações tão precisas e densas quanto as que se dirigem à conformação do processo penal (cfr. seus art.ºs 27.º, 28.º, 30.º, 31.º e 32.º), sabe-se que as normas de processo, qualquer que ele seja, representam sempre a concretização de elementos essenciais do princípio do Estado de direito, pelo que jamais podem ser constitucionalmente irrelevantes ou indiferentes. Sendo através do processo que os tribunais desempenham a função jurisdicional que lhes está constitucionalmente reservada (cfr. art.º 202.º da CRP) e sendo também por intermédio dele que os cidadãos têm acesso à tutela estadual dos seus direitos e interesses, não podem as normas que o conformam deixar de reflectir princípios que estruturam todo o sistema da Constituição. Isto mesmo tem sido afirmado pelo Tribunal Constitucional em jurisprudência consolidada, nomeadamente nos Acórdãos nºs 271/95, 335/95, 508/2002 e 413/2010, todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt. Mas isso não significa que, no caso, se verifiquem as inconstitucionalidades apontadas pelos reclamantes. Contrariamente ao que parece estar pressuposto na sua argumentação, não decorre do art.º 20.º da CRP um direito a um duplo grau de jurisdição em termos gerais. Sobre o direito de acesso à justiça tem o Tribunal Constitucional firmado uma extensa jurisprudência, interpretando-o no sentindo de que ele é “um direito à solução dos conflitos por banda de um órgão independente e imparcial face ao que concerne à apresentação das respectivas perspectivas, não decorrendo desse direito (nomeadamente, no que ora releva, se em causa estiver a litigância civil obrigacional) o asseguramento às partes da garantia de recurso das decisões que lhes sejam desfavoráveis”, como se disse, por exemplo, nos acórdãos n.ºs 83/99, 359/04 e 339/2011, todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt. Naquele artigo 20.º está consagrado “um direito a uma solução jurídica dos conflitos, a que se deve chegar em prazo razoável e com observância de garantias de imparcialidade e independência, possibilitando-se, designadamente, um correcto funcionamento das regras do contraditório, em termos de cada uma das partes poder deduzir as suas razões (de facto e de direito), oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e discretear sobre o valor e resultado de umas e outras” (cfr., entre outros, Acórdãos do Tribunal Constitucional Acórdão n.º 444/91, em DR II, de 2 de Abril de 1992, p. 3112-(37) e n.º 540/97, disponível www.tribunalconstitucional.pt). Neste direito fundamental inclui-se, ainda, “a proibição da indefesa que consiste na privação ou limitação do direito de defesa do particular perante os órgãos judiciais, junto dos quais se discutem questões que lhes dizem respeito, mas não necessariamente uma sistemática faculdade de obter uma segunda apreciação jurisdicional da questão mediante o reconhecimento de um genérico direito de recorrer das decisões jurisdicionais. O duplo grau de jurisdição apenas está consagrado expressamente como uma das garantias de defesa em processo penal contra decisões condenatórias ou que afectem a liberdade do arguido (artigo 32.º, n.º1, da CRP). Além dessa consagração expressa, esse direito é considerado por alguma doutrina e jurisprudência, embora com fundamentação não inteiramente coincidente, como inerente à protecção contra decisões que imponham restrições a direitos liberdades e garantias pessoais (cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, pá. 200). Fora desses domínios específicos, o legislador dispõe de uma larga margem de conformação do direito ao recurso, seja quanto à definição das decisões jurisdicionais susceptíveis de impugnação e aos condicionamentos da recorribilidade (aspecto que não está em causa), seja quanto aos demais aspectos da sua regulação, designadamente quanto ao seu modo de processamento, regime de subida e efeitos sobre a marcha do processo ou sobre a execução da decisão recorrida” (cfr. citado acórdão n.º 339/2011). Por outro lado, importa não olvidar que, através do processo justo e equitativo, garantido no n.º 4 do citado art.º 20.º, cumprem-se também outros valores constitucionalmente relevantes, como sejam os consagrados nos art.ºs 2.º e 13.º, particularmente, quanto a este último, no que respeita à necessária “igualdade de armas”. E, porque a garantia do processo justo implica o direito a uma solução jurídica de conflitos a que se deve chegar em prazo razoável, à disciplina do processo não pode ser alheia a necessidade de fixar os períodos de tempo durante os quais se podem praticar os actos processuais, nem a forma como estes devem ser praticados. Por isso, a lei que fixa prazos para a prática dos actos processuais e estabelece a forma que os mesmos devem observar não restringe, prima facie, nenhum direito constitucionalmente tutelado nem lesa nenhum princípio com assento constitucional, tal como não lesam as decisões que procedem à sua interpretação em conformidade com o que se deixou dito. A interpretação dada às normas questionadas na decisão reclamada, de modo algum, viola os invocados princípios da proporcionalidade e do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva. Da circunstância de não se ter formulado o convite ao aperfeiçoamento do requerimento que requereu a junção das alegações e não se ter interpretado como interposição de recurso, bem como o aditamento de fundamento não anunciado expressa e previamente à sua rejeição, não resulta violação dos aludidos princípios, desde logo porque o direito ao duplo grau de jurisdição em processo civil não está garantido, nem pode ser exercido arbitrariamente. As decisões judiciais só podem ser impugnadas com observância da disciplina imposta pelas correspondentes normas processuais, por forma a poderem garantir um processo equitativo e a observância dos princípios constitucionais gerais, designadamente da igualdade e da proporcionalidade. A adopção de posição diversa comprometeria o próprio direito a uma solução jurídica do conflito em prazo razoável e mediante um processo equitativo, tanto mais que se trata de um procedimento cautelar que, como tal, tem sempre carácter urgente (cfr. art.º 382.º, n.º 1 do CPC). Nesta medida, a interpretação feita não afecta a garantia do processo justo, ínsita no n.º 4 do art.º 20.º da CRP, não viola o direito à tutela jurisdicional efectiva, previsto naquele normativo, nem se mostra manifestamente desrazoável ou desproporcionada de forma a afectar o princípio da proporcionalidade, aflorado no n.º 3 do art.º 18.º, também invocado pelos reclamantes. Não têm, por conseguinte, aqui aplicação as decisões e entendimentos referenciados na jurisprudência e doutrina citadas na reclamação por respeitarem a situações diversas da presente. Consequentemente, não se vislumbra qualquer violação dos princípios e normas legais e constitucionais ali doutamente expostos. Concordamos plenamente com a fundamentação e decisão objecto da presente reclamação, por corresponderem a uma interpretação correcta da lei, segundo as regras e princípios jurídicos que nos regem, sendo irrelevantes todas as considerações feitas pelos reclamantes. Por isso, é manifesto que o despacho reclamado deve ser mantido e desatendida a reclamação, com a consequente rejeição do recurso. III. Decisão Por tudo o exposto, acorda-se em indeferir a reclamação apresentada e manter o despacho reclamado que rejeitou o recurso.*Custas pelos reclamantes.*Porto, 22 de Novembro de 2011 Fernando Augusto Samões José Manuel Cabrita Vieira e Cunha Maria das Dores Eiró de Araújo