I - As decisões “cuja impugnação com o recurso da decisão final é absolutamente inútil”, de acordo com o disposto na al.h) do nº2 do artº 644º CPCiv07, são apenas as decisões cuja retenção poderia ter um efeito material irreversível sobre o conteúdo do decidido, e não aquelas que acarretem apenas mera inutilização de actos processuais. II - O recurso sobre a matéria da suspensão da instância por prejudicialidade de outra causa não é “absolutamente inútil”, se impugnado com o recurso da decisão final do processo, pois que, se a pretensão a formular obtiver vencimento, então caberá julgar sem efeito todos os actos praticados no processo e que tenham contrariado a pretensão de suspensão da instância, isto é, em potência todos os actos praticados no processo a contar da denegação da pretensão de suspensão da instância.
● Rec.710/14.5TBSTS-B.P1. Relator – Vieira e Cunha. Decisão de 1ª Instância de 2/12/2014. Adjuntos – Des. Maria Eiró e Des. João Proença Costa. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto Súmula do Processo Recurso de apelação interpostos na acção com processo comum de declaração nº710/14.5TBSTS-B, da Instância Central da comarca do Porto (2ª Secção Cível – Póvoa de Varzim). Autora – B…, Ldª. Ré – C…, Ldª. Pedido: a) Que a Ré seja condenada a pagar à Autora a quantia de € 581.512,28 (fornecimentos de combustível), acrescida de juros de mora, à taxa legal para as obrigações comerciais, contados desde a data de vencimento das facturas e até integral pagamento. b) Que a Ré seja condenada a pagar à Autora a quantia de € 40.884,86, (combustível à consignação), acrescida de juros de mora, à taxa legal para as obrigações comerciais, contados desde a data de vencimento das facturas e até integral pagamento. Requer mais a apensação aos autos de um procedimento preliminar de arresto, que a Autora intentou contra a Ré. Pedido Reconvencional Que seja reconhecido o direito de crédito da Reconvinte sobre a Reconvinda, de € 984.000,00, com fundamento no incumprimento das condições contratuais de fornecimento. Que a Reconvinda seja condenada a pagar à Reconvinte a quantia de € 396,00/mês, pelo depósito de combustível nos tanques da Reconvinte, até ao dia em que cesse o depósito, sendo que, até esta data, 30/3/2014, a quantia devida pela Reconvinda ascende a € 2.922,48, acrescida de juros de mora, à taxa legal, com fundamento na retribuição de um contrato de depósito. Que se opere a compensação, com as legais consequências, na hipótese, que não se concede, de a acção ser julgada total ou parcialmente procedente. Mais tarde, veio a Ré/Reconvinte requerer nos autos: “A presente acção deu entrada em tribunal em 11/3/2014.” “A aqui Ré/Reconvinte foi citada a 18/3/2014 e apresentou a contestação em 24/4/2014.” “Em data anterior, 31/1/2014, a Ré/Reconvinte havia intentado acção contra a aqui Autora, no 1º Juízo do Tribunal de Vila Real.” “Nessa acção, a Ré B… foi citada a 5/2/2014 e contestou a 13/3/2014.” “Nesse processo de Vila Real foi proferido despacho saneador e dispensada audiência prévia, em 20/5/2014.” “Os presentes autos só deram entrada neste tribunal em 11/3/2014, quando a aqui Autora já havia sido citada há mais de um mês.” “A causa de pedir em ambas as acções reside num contrato tripartido, em que são contraentes a D…, B… e C…, sendo que, no processo que decorre em Vila Real, a ali Autora C… atribui responsabilidades a B…, decorrentes do incumprimento de obrigações contratuais assumidas naquele contrato; o valor peticionado em Vila Real pela aqui Ré é muito superior ao valor peticionado na presente acção por B….” Conclui pedindo que os presentes autos aguardem até que a acção de Vila Real seja julgada, visto o disposto nos artºs 269º nº1 al.c) e 272º nº1 CPCiv. Despacho Recorrido: Com fundamento em a procedência da acção invocada como causa prejudicial não tirar razão de ser à presente, e ainda com fundamento em ocorrer, tão só, um dos pressupostos da apensação de acções, prevista no artº 267º nº1 CPCiv, instituto destinado a obstar à contradição de julgados, o Mmº Juiz “a quo” decidiu indeferir a suspensão da instância requerida pela Ré, por inexistência de causa prejudicial. Conclusões do Recurso: 1. Os casos de apelações autónomas, agora como tais denominadas, passam a estar regulados no art. 644.º do CPC, sendo que o despacho aqui em causa constitui precisamente uma decisão que é imediatamente recorrível, pelo que reunido, nos presentes autos, os requisitos de legitimidade, recorribilidade e tempestividade, o presente recurso é de apelação autónoma, com subida imediata (artigo 644.º n.º 2 alínea h) , em separado (artigo 645.º n.º 2 do CPC) e com efeito meramente devolutivo (artigos 645º nº 2 e 647.º, ambos do CPC) e deve ser admitido. 2. A Recorrente entende, sempre com o devido respeito, que o Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento e errou na interpretação dos factos e do direito aplicáveis (artigos 269º, 272º do CPC, 847º do CC). 3. Não foi provada, nem, no caso, se verifica qualquer das circunstâncias impeditivas previstas no artigo 272º, nº 2 do CPC. -Ainda não existia a presente acção judicial e a aqui Recorrente (Ré e Reconvinte na presente acção) já tinha intentado acção contra a aqui Recorrida (aqui autora e reconvinda). Com efeito, a aqui Recorrente a 31.01.2014 intentou no 1º juízo do Tribunal Judicial de Vila Real a 31.01.2014, acção de condenação em que é Ré a aqui autora/reconvinda/recorrida B…, Lda, a qual foi citada a 05.02.2014 e contestou a 13.03.2014. -A aqui autora/reconvinda/recorrida B… deu entrada da sua p. i. no Tribunal de Santo Tirso apenas a 11.03.2014, ou seja, cerca de 2 meses depois de já a aqui Recorrente (Ré/Reconvinte) ter demandado a B…, Lda e quando já a B…, Lda, havia sido citada na acção que a C…, Lda, lhe havia movido no Tribunal de Vila Real. Portanto, a B…, Lda, deu entrada da presente acção (a 11.03.2014), em reacção à acção que a C…, Lda, lhe moveu no Tribunal de Vila Real e, não o inverso. -A acção que corre termos no Tribunal de Vila Real contra a B…, Lda, e que a Recorrente deu entrada em primeiro lugar, está processualmente mais avançada (a 20.05.2014 foi dispensada a audiência prévia e proferido despacho saneador) do que a presente acção. -A suspensão da instância em nada prejudica o putativo direito que a Recorrida peticiona pois está garantido pelo arresto. 4. A afirmação do Meritíssimo Juiz “a quo” quando refere “abriria a porta a fáceis construções processuais de intenção meramente dilatória, sobretudo nos processos para cobrança de dívidas” não é aplicável ao caso em apreço, e, na verdade, essa afirmação não passa de uma mera conjectura ficcional desprovida de fundamento concreto e factual. 5. A acção dos presentes autos e a acção que corre termos no Tribunal de Vila Real (esta última deu entrada em primeiro lugar e está processualmente mais avançada), têm as mesmas partes, a mesma génese da causa de pedir, ou seja, o mesmo contrato e as obrigações e direitos daí decorrentes - contrato tripartido entre a D…, S.A., B…, Lda, e a aqui Recorrente. 6. A aqui Recorrente é autora no processo que corre termos no Tribunal Judicial de Vila Real e aí demanda a aqui autora/reconvinda B…, Lda., peticionando, além do mais, a condenação da B…, Lda., no pagamento de uma indemnização de mais de 900.000€, decorrente do incumprimento das obrigações contratuais , valor muito superior ao valor que a B… peticiona contra a Recorrente. 7. Nada obsta, pois, à compensação dos eventuais créditos da aqui Recorrente pois ambos são judicialmente exigíveis e são de natureza pecuniária. E, se as duas dívidas não forem de igual montante, pode dar-se a compensação na parte correspondente – artigo 847.º, n.º s 1 e 2, do Código Civil. 8. Pela Recorrente está peticionada compensação parcial (decorrente de parte do crédito que lhe advém da acção que move) bem como, a excepção de não cumprimento decorrente do incumprimento contratual objecto de apreciação na acção de Vila Real. 9. As duas lides judiciais assentam na mesma relação controvertida, ou seja, nos direitos e deveres resultantes do contrato outorgado entre as partes. No fim da acção prejudicial será possível saber qual o crédito da aqui Recorrente, podendo, só então, ser apreciada a questão da compensação suscitada. 10. Por força do art.º 272.º, n.º 1, do Cód. de Processo Civil o tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado. 11. A decisão de uma causa depende do julgamento de uma outra quando na causa prejudicial esteja a apreciar-se uma questão cuja resolução possa influir ou modificar uma situação jurídica que tem de ser considerada para a solução do outro pleito. Neste sentido, Conselheiro Rodrigues Bastos (em Notas III, pág. 42). 12. Pode considerar-se como prejudicial, em relação a outro em que se discuta a título incidental uma dada questão, o processo em que a mesma questão é discutida a título principal – Prof. Dr. Manual de Andrade, Lições de Processo Civil, pág. 491/492. 13.Pretendendo- se a compensação dos eventuais créditos, sendo até possível que a final nada tenha a pagar à aqui Recorrida, é o bastante para se considerar estarmos perante o instituto da prejudicialidade e a suspensão deste processo, à luz dos artigos 269º e 272º do CPC. 14. “Justifica-se a suspensão de uma lide para pagamento de créditos, com fundamento em que existe acção anterior pendente, entre os mesmos litigantes, da qual poderão resultar créditos da outra parte, cuja compensação foi requerida na instância a suspender” - Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17/12/2013, proc. <a href="https://acordao.pt/decisoes/195656" target="_blank">94421/12.9YIPRT.G1</a>, in www.dgsi.pt. 15.O despacho recorrido viola os artigos 269º e 272º do CPC e 847.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil e deve ser revogado, substituído por um outro que determine a suspensão da instância ao abrigo dos artigos 269º e 272º do CPC e 847.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil. Por contra-alegações, a apelada Autora sustenta a confirmação do douto despacho recorrido. Mais refere que a providência cautelar que moveu contra a Recorrente foi apresentada em 3/2/2014, ou seja, em data anterior àquela em que foi citada relativamente à acção intentada pela ora Recorrente. Factos Apurados Encontram-se provados os factos relativos, à tramitação processual, à alegação das partes e ao teor do despacho recorrido, supra resumidamente expostos. Fundamentos A questão colocada pelo presente recurso é a de saber se existe prejudicialidade de uma outra acção, proposta pela aqui Ré, contra a aqui Autora, face à configuração da causa, nos presentes autos. Todavia, existe uma questão prévia já dilucidada no processo, por despacho do relator, e que se prende com saber se o despacho recorrido admitia o recurso de apelação interposto, enquanto apelação autónoma. Vejamos pois. Apreciando a apontada questão prévia, entendemos que o recurso do despacho que se pronuncia sobre um requerimento de suspensão da instância por pendência de causa prejudicial (artº 272º nº1 CPCiv), não encontra abrigo enquanto “apelação autónoma”, no confronto das hipóteses previstas nas várias alíneas do artº 644º nos seus nºs 1 e 2 CPCiv. Após a vigência do D-L nº303/07 de 24/8, que procedeu à reforma do regime de recursos, como regra, as decisões interlocutórias apenas são impugnáveis com o recurso da decisão final, constituindo excepções os casos elencados no agora nº2 do artº 644º CPCiv. A Recorrente enquadra a autonomia do recurso no disposto na al.h) do artigo e inciso citados – recurso das “decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil”. Ora, as decisões “cuja impugnação com o recurso da decisão final é absolutamente inútil”, de acordo com o disposto na al.h) do nº2 do artº 644º CPCiv07, são apenas as decisões cuja retenção poderia ter um efeito material irreversível sobre o conteúdo do decidido, e não aquelas que acarretem apenas mera inutilização de actos processuais – cf. Prof. Lebre de Freitas e Dr. Ribeiro Mendes, Código Anotado, 3º-I, 2ª ed., pg. 81, Consº Abrantes Geraldes, Recursos, 2007, pgs. 182 e 183, e Recursos no Novo Código, 2013, pgs. 159 e 160 (este último Autor chama a atenção para diversa jurisprudência dos tribunais superiores que assinala o nível de exigência quanto à inutilização de actos posto pelo advérbio “absolutamente”; igualmente se fundamenta em jurisprudência do Tribunal Constitucional, quanto aos fundamentos desta interpretação). Ou seja, e para o caso que nos ocupa, a matéria que se prenda com a não suspensão de uma acção, pela força da pendência de uma causa prejudicial, cabe apenas ser impugnada no recurso da decisão final ou do despacho saneador, nos termos do artº 644º nºs 1 e 3 CPCiv. Como se exprime o Consº Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código, pg. 161, “o decurso do prazo normal de recurso não determina o efeito de trânsito em julgado”, quanto ao conteúdo do despacho impugnado, em qualquer das respectivas vertentes. No sentido aqui propugnado, expressamente se pronuncia o já mencionado Autor Consº Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código, pg. 161. Não resta assim à Recorrente, salvo o devido respeito, uma pronúncia inútil do recurso sobre a matéria da suspensão da instância por prejudicialidade de outra causa, pois que, na hipótese de a pretensão a formular com o recurso da decisão final lograr obter vencimento, então caberão julgar sem efeito todos os actos praticados no presente processo e que tenham contrariado a pretensão de suspensão da instância, isto é, em potência todos os actos praticados no processo a contar da denegação da pretensão de suspensão da instância. Isto se afirma ainda sem prejuízo da opinião, hoje defendida na doutrina, de que a decisão de não suspensão da instância por pendência de causa prejudicial, ao abrigo da norma do artº 272º nº1 CPCiv, se tratar de um poder discricionário, insindicável em recurso – artº 630º nº1 CPCiv (neste sentido, cf. Prof. Lebre de Freitas e Drª Isabel Alexandre, Anotado, 1º, 3ª ed., artº 272º). Resumindo a fundamentação: I - As decisões “cuja impugnação com o recurso da decisão final é absolutamente inútil”, de acordo com o disposto na al.h) do nº2 do artº 644º CPCiv07, são apenas as decisões cuja retenção poderia ter um efeito material irreversível sobre o conteúdo do decidido, e não aquelas que acarretem apenas mera inutilização de actos processuais. II - O recurso sobre a matéria da suspensão da instância por prejudicialidade de outra causa não é “absolutamente inútil”, se impugnado com o recurso da decisão final do processo, pois que, se a pretensão a formular obtiver vencimento, então caberá julgar sem efeito todos os actos praticados no processo e que tenham contrariado a pretensão de suspensão da instância, isto é, em potência todos os actos praticados no processo a contar da denegação da pretensão de suspensão da instância. Dispositivo Decide-se não conhecer do objecto do recurso, por do mesmo não caber recurso de apelação, a não ser que a decisão judicial em causa venha a ser impugnada com o recurso de uma das decisões a que alude o disposto no artº 644º nº1 CPCiv, ex vi nº3 do mesmo artigo. Porto, 10/III/2015 Vieira e Cunha Maria Eiró João Proença
● Rec.710/14.5TBSTS-B.P1. Relator – Vieira e Cunha. Decisão de 1ª Instância de 2/12/2014. Adjuntos – Des. Maria Eiró e Des. João Proença Costa. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto Súmula do Processo Recurso de apelação interpostos na acção com processo comum de declaração nº710/14.5TBSTS-B, da Instância Central da comarca do Porto (2ª Secção Cível – Póvoa de Varzim). Autora – B…, Ldª. Ré – C…, Ldª. Pedido: a) Que a Ré seja condenada a pagar à Autora a quantia de € 581.512,28 (fornecimentos de combustível), acrescida de juros de mora, à taxa legal para as obrigações comerciais, contados desde a data de vencimento das facturas e até integral pagamento. b) Que a Ré seja condenada a pagar à Autora a quantia de € 40.884,86, (combustível à consignação), acrescida de juros de mora, à taxa legal para as obrigações comerciais, contados desde a data de vencimento das facturas e até integral pagamento. Requer mais a apensação aos autos de um procedimento preliminar de arresto, que a Autora intentou contra a Ré. Pedido Reconvencional Que seja reconhecido o direito de crédito da Reconvinte sobre a Reconvinda, de € 984.000,00, com fundamento no incumprimento das condições contratuais de fornecimento. Que a Reconvinda seja condenada a pagar à Reconvinte a quantia de € 396,00/mês, pelo depósito de combustível nos tanques da Reconvinte, até ao dia em que cesse o depósito, sendo que, até esta data, 30/3/2014, a quantia devida pela Reconvinda ascende a € 2.922,48, acrescida de juros de mora, à taxa legal, com fundamento na retribuição de um contrato de depósito. Que se opere a compensação, com as legais consequências, na hipótese, que não se concede, de a acção ser julgada total ou parcialmente procedente. Mais tarde, veio a Ré/Reconvinte requerer nos autos: “A presente acção deu entrada em tribunal em 11/3/2014.” “A aqui Ré/Reconvinte foi citada a 18/3/2014 e apresentou a contestação em 24/4/2014.” “Em data anterior, 31/1/2014, a Ré/Reconvinte havia intentado acção contra a aqui Autora, no 1º Juízo do Tribunal de Vila Real.” “Nessa acção, a Ré B… foi citada a 5/2/2014 e contestou a 13/3/2014.” “Nesse processo de Vila Real foi proferido despacho saneador e dispensada audiência prévia, em 20/5/2014.” “Os presentes autos só deram entrada neste tribunal em 11/3/2014, quando a aqui Autora já havia sido citada há mais de um mês.” “A causa de pedir em ambas as acções reside num contrato tripartido, em que são contraentes a D…, B… e C…, sendo que, no processo que decorre em Vila Real, a ali Autora C… atribui responsabilidades a B…, decorrentes do incumprimento de obrigações contratuais assumidas naquele contrato; o valor peticionado em Vila Real pela aqui Ré é muito superior ao valor peticionado na presente acção por B….” Conclui pedindo que os presentes autos aguardem até que a acção de Vila Real seja julgada, visto o disposto nos artºs 269º nº1 al.c) e 272º nº1 CPCiv. Despacho Recorrido: Com fundamento em a procedência da acção invocada como causa prejudicial não tirar razão de ser à presente, e ainda com fundamento em ocorrer, tão só, um dos pressupostos da apensação de acções, prevista no artº 267º nº1 CPCiv, instituto destinado a obstar à contradição de julgados, o Mmº Juiz “a quo” decidiu indeferir a suspensão da instância requerida pela Ré, por inexistência de causa prejudicial. Conclusões do Recurso: 1. Os casos de apelações autónomas, agora como tais denominadas, passam a estar regulados no art. 644.º do CPC, sendo que o despacho aqui em causa constitui precisamente uma decisão que é imediatamente recorrível, pelo que reunido, nos presentes autos, os requisitos de legitimidade, recorribilidade e tempestividade, o presente recurso é de apelação autónoma, com subida imediata (artigo 644.º n.º 2 alínea h) , em separado (artigo 645.º n.º 2 do CPC) e com efeito meramente devolutivo (artigos 645º nº 2 e 647.º, ambos do CPC) e deve ser admitido. 2. A Recorrente entende, sempre com o devido respeito, que o Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento e errou na interpretação dos factos e do direito aplicáveis (artigos 269º, 272º do CPC, 847º do CC). 3. Não foi provada, nem, no caso, se verifica qualquer das circunstâncias impeditivas previstas no artigo 272º, nº 2 do CPC. -Ainda não existia a presente acção judicial e a aqui Recorrente (Ré e Reconvinte na presente acção) já tinha intentado acção contra a aqui Recorrida (aqui autora e reconvinda). Com efeito, a aqui Recorrente a 31.01.2014 intentou no 1º juízo do Tribunal Judicial de Vila Real a 31.01.2014, acção de condenação em que é Ré a aqui autora/reconvinda/recorrida B…, Lda, a qual foi citada a 05.02.2014 e contestou a 13.03.2014. -A aqui autora/reconvinda/recorrida B… deu entrada da sua p. i. no Tribunal de Santo Tirso apenas a 11.03.2014, ou seja, cerca de 2 meses depois de já a aqui Recorrente (Ré/Reconvinte) ter demandado a B…, Lda e quando já a B…, Lda, havia sido citada na acção que a C…, Lda, lhe havia movido no Tribunal de Vila Real. Portanto, a B…, Lda, deu entrada da presente acção (a 11.03.2014), em reacção à acção que a C…, Lda, lhe moveu no Tribunal de Vila Real e, não o inverso. -A acção que corre termos no Tribunal de Vila Real contra a B…, Lda, e que a Recorrente deu entrada em primeiro lugar, está processualmente mais avançada (a 20.05.2014 foi dispensada a audiência prévia e proferido despacho saneador) do que a presente acção. -A suspensão da instância em nada prejudica o putativo direito que a Recorrida peticiona pois está garantido pelo arresto. 4. A afirmação do Meritíssimo Juiz “a quo” quando refere “abriria a porta a fáceis construções processuais de intenção meramente dilatória, sobretudo nos processos para cobrança de dívidas” não é aplicável ao caso em apreço, e, na verdade, essa afirmação não passa de uma mera conjectura ficcional desprovida de fundamento concreto e factual. 5. A acção dos presentes autos e a acção que corre termos no Tribunal de Vila Real (esta última deu entrada em primeiro lugar e está processualmente mais avançada), têm as mesmas partes, a mesma génese da causa de pedir, ou seja, o mesmo contrato e as obrigações e direitos daí decorrentes - contrato tripartido entre a D…, S.A., B…, Lda, e a aqui Recorrente. 6. A aqui Recorrente é autora no processo que corre termos no Tribunal Judicial de Vila Real e aí demanda a aqui autora/reconvinda B…, Lda., peticionando, além do mais, a condenação da B…, Lda., no pagamento de uma indemnização de mais de 900.000€, decorrente do incumprimento das obrigações contratuais , valor muito superior ao valor que a B… peticiona contra a Recorrente. 7. Nada obsta, pois, à compensação dos eventuais créditos da aqui Recorrente pois ambos são judicialmente exigíveis e são de natureza pecuniária. E, se as duas dívidas não forem de igual montante, pode dar-se a compensação na parte correspondente – artigo 847.º, n.º s 1 e 2, do Código Civil. 8. Pela Recorrente está peticionada compensação parcial (decorrente de parte do crédito que lhe advém da acção que move) bem como, a excepção de não cumprimento decorrente do incumprimento contratual objecto de apreciação na acção de Vila Real. 9. As duas lides judiciais assentam na mesma relação controvertida, ou seja, nos direitos e deveres resultantes do contrato outorgado entre as partes. No fim da acção prejudicial será possível saber qual o crédito da aqui Recorrente, podendo, só então, ser apreciada a questão da compensação suscitada. 10. Por força do art.º 272.º, n.º 1, do Cód. de Processo Civil o tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado. 11. A decisão de uma causa depende do julgamento de uma outra quando na causa prejudicial esteja a apreciar-se uma questão cuja resolução possa influir ou modificar uma situação jurídica que tem de ser considerada para a solução do outro pleito. Neste sentido, Conselheiro Rodrigues Bastos (em Notas III, pág. 42). 12. Pode considerar-se como prejudicial, em relação a outro em que se discuta a título incidental uma dada questão, o processo em que a mesma questão é discutida a título principal – Prof. Dr. Manual de Andrade, Lições de Processo Civil, pág. 491/492. 13.Pretendendo- se a compensação dos eventuais créditos, sendo até possível que a final nada tenha a pagar à aqui Recorrida, é o bastante para se considerar estarmos perante o instituto da prejudicialidade e a suspensão deste processo, à luz dos artigos 269º e 272º do CPC. 14. “Justifica-se a suspensão de uma lide para pagamento de créditos, com fundamento em que existe acção anterior pendente, entre os mesmos litigantes, da qual poderão resultar créditos da outra parte, cuja compensação foi requerida na instância a suspender” - Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17/12/2013, proc. 94421/12.9YIPRT.G1, in www.dgsi.pt. 15.O despacho recorrido viola os artigos 269º e 272º do CPC e 847.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil e deve ser revogado, substituído por um outro que determine a suspensão da instância ao abrigo dos artigos 269º e 272º do CPC e 847.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil. Por contra-alegações, a apelada Autora sustenta a confirmação do douto despacho recorrido. Mais refere que a providência cautelar que moveu contra a Recorrente foi apresentada em 3/2/2014, ou seja, em data anterior àquela em que foi citada relativamente à acção intentada pela ora Recorrente. Factos Apurados Encontram-se provados os factos relativos, à tramitação processual, à alegação das partes e ao teor do despacho recorrido, supra resumidamente expostos. Fundamentos A questão colocada pelo presente recurso é a de saber se existe prejudicialidade de uma outra acção, proposta pela aqui Ré, contra a aqui Autora, face à configuração da causa, nos presentes autos. Todavia, existe uma questão prévia já dilucidada no processo, por despacho do relator, e que se prende com saber se o despacho recorrido admitia o recurso de apelação interposto, enquanto apelação autónoma. Vejamos pois. Apreciando a apontada questão prévia, entendemos que o recurso do despacho que se pronuncia sobre um requerimento de suspensão da instância por pendência de causa prejudicial (artº 272º nº1 CPCiv), não encontra abrigo enquanto “apelação autónoma”, no confronto das hipóteses previstas nas várias alíneas do artº 644º nos seus nºs 1 e 2 CPCiv. Após a vigência do D-L nº303/07 de 24/8, que procedeu à reforma do regime de recursos, como regra, as decisões interlocutórias apenas são impugnáveis com o recurso da decisão final, constituindo excepções os casos elencados no agora nº2 do artº 644º CPCiv. A Recorrente enquadra a autonomia do recurso no disposto na al.h) do artigo e inciso citados – recurso das “decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil”. Ora, as decisões “cuja impugnação com o recurso da decisão final é absolutamente inútil”, de acordo com o disposto na al.h) do nº2 do artº 644º CPCiv07, são apenas as decisões cuja retenção poderia ter um efeito material irreversível sobre o conteúdo do decidido, e não aquelas que acarretem apenas mera inutilização de actos processuais – cf. Prof. Lebre de Freitas e Dr. Ribeiro Mendes, Código Anotado, 3º-I, 2ª ed., pg. 81, Consº Abrantes Geraldes, Recursos, 2007, pgs. 182 e 183, e Recursos no Novo Código, 2013, pgs. 159 e 160 (este último Autor chama a atenção para diversa jurisprudência dos tribunais superiores que assinala o nível de exigência quanto à inutilização de actos posto pelo advérbio “absolutamente”; igualmente se fundamenta em jurisprudência do Tribunal Constitucional, quanto aos fundamentos desta interpretação). Ou seja, e para o caso que nos ocupa, a matéria que se prenda com a não suspensão de uma acção, pela força da pendência de uma causa prejudicial, cabe apenas ser impugnada no recurso da decisão final ou do despacho saneador, nos termos do artº 644º nºs 1 e 3 CPCiv. Como se exprime o Consº Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código, pg. 161, “o decurso do prazo normal de recurso não determina o efeito de trânsito em julgado”, quanto ao conteúdo do despacho impugnado, em qualquer das respectivas vertentes. No sentido aqui propugnado, expressamente se pronuncia o já mencionado Autor Consº Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código, pg. 161. Não resta assim à Recorrente, salvo o devido respeito, uma pronúncia inútil do recurso sobre a matéria da suspensão da instância por prejudicialidade de outra causa, pois que, na hipótese de a pretensão a formular com o recurso da decisão final lograr obter vencimento, então caberão julgar sem efeito todos os actos praticados no presente processo e que tenham contrariado a pretensão de suspensão da instância, isto é, em potência todos os actos praticados no processo a contar da denegação da pretensão de suspensão da instância. Isto se afirma ainda sem prejuízo da opinião, hoje defendida na doutrina, de que a decisão de não suspensão da instância por pendência de causa prejudicial, ao abrigo da norma do artº 272º nº1 CPCiv, se tratar de um poder discricionário, insindicável em recurso – artº 630º nº1 CPCiv (neste sentido, cf. Prof. Lebre de Freitas e Drª Isabel Alexandre, Anotado, 1º, 3ª ed., artº 272º). Resumindo a fundamentação: I - As decisões “cuja impugnação com o recurso da decisão final é absolutamente inútil”, de acordo com o disposto na al.h) do nº2 do artº 644º CPCiv07, são apenas as decisões cuja retenção poderia ter um efeito material irreversível sobre o conteúdo do decidido, e não aquelas que acarretem apenas mera inutilização de actos processuais. II - O recurso sobre a matéria da suspensão da instância por prejudicialidade de outra causa não é “absolutamente inútil”, se impugnado com o recurso da decisão final do processo, pois que, se a pretensão a formular obtiver vencimento, então caberá julgar sem efeito todos os actos praticados no processo e que tenham contrariado a pretensão de suspensão da instância, isto é, em potência todos os actos praticados no processo a contar da denegação da pretensão de suspensão da instância. Dispositivo Decide-se não conhecer do objecto do recurso, por do mesmo não caber recurso de apelação, a não ser que a decisão judicial em causa venha a ser impugnada com o recurso de uma das decisões a que alude o disposto no artº 644º nº1 CPCiv, ex vi nº3 do mesmo artigo. Porto, 10/III/2015 Vieira e Cunha Maria Eiró João Proença