Processo:3324/16.1T8MTS.P1
Data do Acordão: 11/09/2017Relator: RODRIGUES PIRESTribunal:trp
Decisão: Meio processual:

I - O administrador, enquanto representante do condomínio e desde que não lhe seja imputada qualquer atuação ilícita no exercício da sua atividade, tem legitimidade passiva para as ações propostas por um condómino relativamente a danos causados por infiltrações provenientes de partes comuns do edifício. II - Essa legitimidade passiva não se verifica quando a ação é proposta contra o administrador, não como representante do condomínio, mas sim em nome próprio, embora com referência às funções que exerce - de administração do condomínio - e à forma como o vem fazendo.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
RODRIGUES PIRES
Descritores
PROPRIEDADE HORIZONTAL ADMINISTRADOR DO CONDOMÍNIO LEGITIMIDADE PASSIVA
No do documento
Data do Acordão
09/12/2017
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO
Decisão
CONFIRMADA
Sumário
I - O administrador, enquanto representante do condomínio e desde que não lhe seja imputada qualquer atuação ilícita no exercício da sua atividade, tem legitimidade passiva para as ações propostas por um condómino relativamente a danos causados por infiltrações provenientes de partes comuns do edifício. II - Essa legitimidade passiva não se verifica quando a ação é proposta contra o administrador, não como representante do condomínio, mas sim em nome próprio, embora com referência às funções que exerce - de administração do condomínio - e à forma como o vem fazendo.
Decisão integral
Proc. nº 3324/16.1 T8MTS.P1
Comarca do Porto – Matosinhos – Instância Local – Secção Cível – J3
Apelação
Recorrente: B...
Recorrido: “C..., Lda.”
Relator: Eduardo Rodrigues Pires
Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Maria de Jesus Pereira

Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto:
RELATÓRIO
O autor B..., residente na Rua ..., ..., 3º esquerdo traseiras, Matosinhos intentou ação de condenação contra a ré “C..., Lda.”, com sede na Rua ..., ..., Matosinhos, na qualidade de representante do Condomínio ..., ... a ..., Matosinhos, tendo pedido:
- a condenação da ré na realização de obras de impermeabilização da fachada do edifício que afeta a fração “C3”, no prazo máximo de seis meses, sob pena de não o fazendo responder por incumprimento, pagando por cada mês de atraso a quantia de 25,00€;
- a redução do seu crédito para o valor devido pelas quotas em atraso, sem as multas, penalizações, despesas judiciais e honorários de mandatário, atendendo a que estas despesas se devem, única e exclusivamente, a inércia da ré;
- a compensação do seu crédito com o crédito do autor ainda a determinar, pelas reparações dos danos no interior da sua fração e no seu veículo automóvel;
- o pagamento de uma indemnização no valor de 2.000,00€.
A ré apresentou contestação, onde se defendeu invocando as exceções de ilegitimidade passiva e da nulidade de todo o processo por ineptidão da petição inicial. Impugnou também a matéria fáctica alegada pela autora na petição inicial e pediu a condenação desta como litigante de má-fé.
A autora apresentou réplica, onde se pronunciou no tocante às exceções alegadas pela ré e também quanto ao pedido de condenação em litigância de má-fé.
Foi depois proferido o seguinte despacho:
“(…)
Invocou a ré a sua ilegitimidade passiva para os termos da acção. 
Alega para o efeito que a acção deveria ter sido intentada contra o “Condomínio ...” e não contra si, já que o administrador do condomínio representa este último mas não se sub-roga na sua posição. 
Notificado, o autor pugnou pela improcedência da excepção em análise, referindo que demandou a ré “C...” na qualidade de administradora do condomínio.
Cumpre decidir. 
De acordo com o disposto no art.º 30 do CPC, o autor é parte legítima quando tem interesse directo em demandar e o réu também o será quando tenha interesse directo em contradizer. Este interesse em demandar e contradizer exprime-se pela utilidade e prejuízo que, respectivamente, possam advir da procedência (n.º 2). 
O n.º 3 do normativo acima citado esclarece que, na ausência da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para efeitos de legitimidade os sujeitos da relação material controvertida, tal como é configurada pelo autor. Este interesse – que redunda, afinal, nas vantagens e desvantagens que podem derivar da sorte da lide – deve ser aferido pelo pedido e causa de pedir aduzida na petição inicial, ou seja, de acordo com a relação jurídica controvertida tal como desenhada pelo autor, independentemente do mérito da sua pretensão ou da prova que se logre produzir. 
Na situação em apreço importa desde logo ter presente que, face ao teor da resposta que apresentou a fls. 63 (ref. 23885625), dúvidas não se suscitam de que o autor não pretende demandar a administração do condomínio, exercida pela “C...”, em representação do condomínio, mas sim a própria “C...”, com referência às funções por ela exercidas enquanto administradora do condomínio. 
Assim sendo e em ordem a aferir da legitimidade passiva da “C...” para os termos da presente acção, importa ter presentes os pedidos formulados pelo autor.
Peticiona o autor a condenação da ré: 
“- Na realização de obras de impermeabilização da fachada do Edifício que afecta a fracção “C3”, no prazo máximo de seis meses, sob pena de não o fazendo responder pelo incumprimento, pagando por cada mês de atraso a quantia de €25,00 (vinte e cinco euros); 
- Proceder à redução do seu crédito para o valor devido pelas quotas em atraso, sem as multas, penalizações, despesas judiciais e honorários de mandatário, atendendo que estas despesas se devem, única e exclusivamente, à inércia da Ré; 
- Proceder à compensação do seu crédito com o crédito do Autor ainda a determinar, pelas reparações dos danos no interior da sua fracção e no seu veículo automóvel; 
- No pagamento de uma indemnização ao Autor no valor de €2.000,0 (dois mil euros)”. 
No que aos três primeiros pedidos se refere, facilmente se conclui que, atenta a versão dos factos tal como configurada pelo Autor na petição inicial, a ré “C...” carece de legitimidade passiva para ser demandada. Efectivamente, a realização de obras em partes comuns do edifício terá de ser efectuada pelo próprio condomínio, já que é ele o proprietário dessas mesmas partes comuns. E é também o condomínio o titular do crédito referente às quotas de condomínio e penalizações, não sendo a entidade que o administra, ou seja, a “C...”, titular de qualquer crédito sobre o autor que possa ser reduzido ou compensado com o crédito de que este último se arroga titular. 
Já no que se refere ao último pedido, entendemos que assiste à Ré legitimidade passiva para ser demandada. Na verdade, o Autor alega que a inércia da Ré, consubstanciada no facto de não resolver os problemas que afectam a sua fracção, lhe causa danos não patrimoniais, na medida em que, sendo uma pessoa doente, o seu estado de saúde se agrava devido ao estado em que se encontra a sua habitação. 
Em face do exposto, julgo parcialmente procedente por provada a excepção dilatória de ilegitimidade passiva invocada pela ré e, em consequência, absolvo a ré da instância, no que aos três primeiros pedidos se refere – cfr. art.ºs 576, n.ºs 1 e 2 e 577, e), do CPC.
Custas pelo autor na proporção do decaimento – art.º 527, n.º 1 e 2, do CPC.
Notifique. * Peticiona o autor, B..., como vimos, a condenação da ré, C..., Lda, no pagamento de uma indemnização no valor de 2.000,00 €. 
Alega para o efeito que é proprietário da fracção “C3” do edifício sito na Rua ..., n.º ... e que no quarto e na sala da sua fracção existem infiltrações, as quais têm origem na fachada do prédio e causam danos nas paredes das referidas divisões que apresentam bolor, sendo que as guarnições das janelas estão destruídas. Acrescenta que os fungos, maus cheiros e humidade prejudicam o seu estado de saúde. Alega que tais factos foram comunicados à Ré que, até ao momento, não procedeu à reparação das infiltrações. 
Válida e regularmente citada, a ré apresentou contestação, pugnando pela improcedência do pedido em análise. * Porque o estado dos autos desde já o permite, proceder-se-á de imediato ao conhecimento do mérito da causa. * A pretensão formulada pelo autor contra a aqui ré apenas poderá ter como fundamento a denominada responsabilidade extracontratual por factos ilícitos, à qual alude o art.º 483, n.º 1, do CPC. 
Como se sabe, são pressupostos da responsabilidade civil pela prática de facto ilícito, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano. 
Ora, na presente situação o autor limita-se a alegar que nas assembleias de condomínio tem vindo a apresentar as suas queixas e reclamações e que nunca a administração do condomínio procurou solucionar o seu problema, defendendo que a ré não tem cumprido com as suas obrigações. 
Em momento algum o autor refere que a ré, no exercício das suas funções como administradora do condomínio, se recusou a levar as questões por si suscitadas à assembleia de condóminos, que se recusou a fazer constar das actas referentes às assembleias de condóminos as queixas e reclamações apresentadas pelo autor, muito menos que, tendo sido aprovada em assembleia de condóminos a realização das obras necessárias a solucionar os problemas na sua fracção, a ré se tenha recusado a executá-las. Ou seja, o autor não imputa à ré a prática de qualquer facto ilícito e culposo que tenha determinado os danos cuja existência invoca. 
Em tais circunstâncias e sem necessidade de ulteriores considerações, facilmente se conclui pela manifesta improcedência do pedido. * Resta-nos analisar se o autor litigou de má-fé, como refere a ré na sua contestação. 
A condenação por litigância de má-fé tem apenas por pressuposto a violação, com dolo ou negligência grave, do dever de correcção processual ou de probidade que o art.º 8 do CPC impõe às partes. 
Se a parte, com propósito malicioso, pretende convencer o tribunal de um facto ou pretensão que sabe não ser legítima, distorcendo ou omitindo a verdade dos factos, faz do processo um uso reprovável ou deduz oposição cuja falta de fundamento não pode ignorar, actua de má-fé e, por essa razão, pode e deve ser sancionada em multa e indemnização à parte contrária, no caso desta a pedir. 
Mas só quando o processo fornece elementos seguros da conduta dolosa ou gravemente negligente deverá a parte ser censurada como litigante de má-fé. Não basta que a parte não veja acolhida a sua pretensão ou a sua versão dos factos, significando tal apenas que não logrou convencer o tribunal da sua posição. 
Ora, na situação dos autos não é possível afirmar que o autor actuou com má-fé. 
Pelo que se decide considerar não verificada a litigância de má-fé. * Face ao exposto, julgo totalmente improcedente por não provado o pedido em análise e, em consequência, absolvo a ré do mesmo. 
Custas pelo autor na proporção do decaimento – art.º 527, n.º 1, do CPC. 
Registe. 
Notifique.” 
Inconformado com o decidido, o autor interpôs recurso de apelação tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões:
1. O Meritíssimo Juiz julgou parcialmente procedente a excepção de ilegitimidade passiva da Recorrida, alegando para o efeito que esta não tinha a obrigação de realizar as obras, urgentes e necessárias, no edifício do Recorrente. 
2. O Meritíssimo Juiz “a quo” sustenta na sua fundamentação da douta sentença que “… a realização de obras em partes comuns do edifício terá de ser efectuada pelo próprio condomínio, já que é ele o proprietário dessas mesmas partes comuns”. 
3. Ora, atendendo aos factos alegados e, considerando que não houve lugar à apresentação de mais prova, para além dos documentos juntos pelas partes e que nenhum facto foi dado como não provado, os danos sofridos na fracção do Recorrente, traduzem-se num perigo para a saúde do mesmo e da sua família. 
4. Assim, considerando “a contrario” o disposto no artigo 1427.º do Código Civil, o Administrador do Condomínio, tem a obrigação de realizar as reparações indispensáveis e urgentes. 
5. Ficou amplamente demonstrado pelo Recorrente que as obras, por ele requeridas, são efectivamente indispensáveis e urgentes, não existem dúvidas que a Recorrida, para além de ter legitimidade para realizar as obras requeridas, tal obrigação é uma imposição legal. 
6. Assim sendo, a Recorrida, para além de ter legitimidade para realizar as obras requeridas, tal obrigação é uma imposição legal. 
7. Ficou provado que a Recorrida não cumpriu com os seus deveres, e tal originou os danos sofridos pelo Recorrente. 
8. A Recorrida cobrou já o valor para a realização das obras nas partes comum, como a própria aceita na sua contestação. 
9. Mais uma vez se demonstra, que os danos sofridos pelo Recorrente se devem, exclusivamente, à inércia da Recorrida. 
10. Pelo que, deve a Recorrida ser condenada no pagamento dos danos sofridos conforme peticionado e, bem assim, no pagamento da indemnização pelos danos patrimoniais sofridos pelo Recorrente. 
11. Por outro lado, a Recorrida cobrou já o valor para a realização das obras nas partes comum, como a própria aceita na sua contestação, pelo que, mais uma vez se demonstra, que os danos sofridos pelo Recorrente se devem, exclusivamente, à inércia da Recorrida. 
Foram violados:
- Os artigos 1427º, 1436º e 1437º do Código Civil; 
- Os artigos 2.º, 3.º, 30.º e 615.º do Código de Processo Civil.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Cumpre então apreciar e decidir.*FUNDAMENTAÇÃO
O âmbito do recurso, sempre ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, encontra-se delimitado pelas conclusões que nele foram apresentadas e que atrás se transcreveram – cfr. arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do Cód. do Proc. Civil.*A questão a decidir é a seguinte:
Apurar se se verifica a exceção de ilegitimidade passiva da ré/recorrida.*Os elementos factuais e processuais relevantes para o conhecimento do presente recurso constam do antecedente relatório.*Passemos à apreciação jurídica.  
O art. 30º do Cód. do Proc. Civil estabelece que o réu é parte legítima quando tem interesse direto em contradizer (nº 1), sendo que este se exprime pelo prejuízo que advenha da procedência da ação (nº 2).
Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor (nº 3).
No presente caso há ainda que ter em atenção o disposto no art. 1437º do Cód. Civil onde se preceitua o seguinte:
«1. O administrador tem legitimidade para agir em juízo, quer contra qualquer dos condóminos, quer contra terceiro, na execução das funções que lhe pertencem ou quando autorizado pela assembleia.
2. O administrador pode também ser demandado nas ações respeitantes às partes comuns do edifício.
3. Excetuam-se as ações relativas a questões de propriedade ou posse dos bens comuns, salvo se a assembleia atribuir poderes especiais ao administrador.»
Alegou o autor na petição inicial que é proprietário da fração “C3” do edifício sito na Rua ..., nº ... e que no quarto e na sala desta fração existem infiltrações com origem na fachada do prédio, tal como no seu espaço de garagem existe também uma infiltração proveniente da canalização comum do edifício.
As infiltrações na sua fração provocaram danos nas paredes que apresentam bolor e nas guarnições das janelas que estão completamente destruídas, acrescentando que os fungos, os maus cheiros e as humidades agravam o seu estado de saúde.
Por outro lado, as infiltrações no lugar de garagem causaram danos na pintura do seu carro.
Alegou ainda o autor que a ré lhe exige o pagamento da importância de 4.518,54€, correspondente não apenas a quotas de condomínio, mas igualmente a multas e penalizações que considera não serem devidas.     
Formulou depois pedido de condenação da ré na realização de obras de impermeabilização da fachada do edifício que afeta a fração “C3”, no prazo máximo de seis meses, sob pena de não o fazendo responder por incumprimento, pagando por cada mês de atraso a quantia de 25,00€.
Pediu ainda a redução do seu crédito para o valor devido pelas quotas em atraso, sem as multas, penalizações, despesas judiciais e honorários de mandatário, atendendo a que estas despesas se devem, única e exclusivamente, a inércia da ré e a compensação do seu crédito com o crédito do autor ainda a determinar, pelas reparações dos danos no interior da sua fração e no seu veículo automóvel.
Por último, peticionou a condenação da ré no pagamento de uma indemnização, por danos não patrimoniais, no valor de 2.000,00€.
No art. 1437º, nº 2 do Cód. Civil, acima transcrito, preceitua-se que o administrador pode ser demandado nas ações respeitantes às partes comuns do edifício.
A consagração desta disciplina, conforme afirma Sandra Passinhas (in “A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal”, 2ª ed., pág. 343), “encontra a sua ratio na realização de uma evidente exigência de simplificação nas relações entre o condomínio e terceiros, ou algum dos condóminos que pretenda fazer valer em juízo pretensões respeitantes a bens ou interesses comuns.”
Por isso, ao abrigo do art. 223º, nº 1 do Cód. do Proc. Civil, o condomínio é citado na pessoa do seu legal representante.
Contudo, o legislador não deixou de ser prudente ao ter distinguido as situações que se reconduzem a mera gestão e conservação do condomínio das que se relacionam com a propriedade e posse de bens comuns, regendo para estas últimas o nº 3 do art. 1437º do Cód. Civil.
Com efeito, quando esteja em causa a propriedade ou a posse de bens comuns ou o direito de algum ou alguns dos condóminos a essas mesmas coisas, o administrador é parte ilegítima, salvo se se verificar a hipótese prevista no nº 3 do art. 1437º, ou seja, se a assembleia conferir ao administrador poderes especiais de representação.[1]  
Prosseguindo, referir-se-á que casos paradigmáticos de legitimidade do administrador nos termos do art. 1437º, nº 2 do Cód. Civil são aqueles em que o administrador é demandado numa ação em que um terceiro pretenda o pagamento de serviços prestados ou de bens fornecidos ao condomínio ou o das ações propostas por condóminos, para obter o ressarcimento de danos causados por partes comuns do edifício, como, por exemplo, infiltrações de águas provenientes do terraço de cobertura.[2]
Consequentemente, impõe-se concluir que o administrador, enquanto representante do condomínio, tem legitimidade passiva para as ações propostas por um condómino com vista ao ressarcimento de danos causados por partes comuns do edifício.[3] 
Ora, a ação proposta pelo autor, que é condómino, radica em infiltrações surgidas na sua fração e no seu espaço de garagem que têm a sua origem na fachada do prédio e na sua canalização, que constituem partes comuns – cfr. art. 1421º, nº 1, als. a) e d) do Cód. Civil.
Daí resultaria, numa primeira abordagem, a legitimidade da ré “C..., Lda.” para ser demandada enquanto representante do Condomínio ..., ... a ....
Há, porém, que indagar se, face ao que se mostra alegado na petição inicial, o autor efetivamente demandou a ré nessa qualidade, o que lhe conferiria legitimidade passiva para a ação, de acordo com o disposto no art. 1437º, nº 2 do Cód. Civil.
Sucede que o resultado desta indagação será negativo, muito embora o autor tenha escrito no cabeçalho da petição inicial que demandava a ré na qualidade de representante do condomínio.
Com efeito, o que alega em seguida, e depois reitera em sede de resposta à contestação, desmente esta afirmação.
É que o autor põe em causa a forma como a ré, administradora do condomínio, vem exercendo as suas funções. Alega que a ré tem vindo a realizar obras que trazem prejuízos para o autor, que a ré não procura solucionar esses problemas e insiste no pagamento de valores e multas que sabe não serem devidos, enviando notas de cobrança que incluem sempre despesas de advogado, sem que haja uma resposta aos pedidos de acordo. Sublinha, inclusive, que a última carta que enviou aguarda ainda resposta da ré – cfr. arts. 1º a 7º da petição inicial.
E na resposta à contestação, a propósito da exceção de ilegitimidade passiva invocada pela ré, o autor, embora afirme que intentou a ação contra a ré na qualidade de representante do Condomínio ..., ... a ..., escreve a seguir:
“2º - A Ré enquanto administradora do Condomínio tem vários deveres que deve respeitar e cumprir, nomeadamente as deliberações tomadas em sede de Assembleia Geral de Condóminos.
3º Ora, tendo em consideração que o Autor, reiteradamente, nas diversas Assembleias de Condomínio apresentou as suas queixas e reclamações e a Administração do Condomínio nunca procurou solucionar estes problemas.
4º Pelo contrário, sempre insistiu no pagamento de valores exorbitantes e multas que sabe não serem devidas.
5º Fica demonstrado que a Ré se demitiu das suas obrigações enquanto Administradora e, nesses termos, órgão executivo do Condomínio ..., ... a ..., Matosinhos.
6º A Ré ignora o que é referido nas Assembleias e age de acordo com a sua conveniência, administrando (ou não) o Condomínio nessa conformidade.
(…)
8º É a Ré que ignora os pedidos de contacto e todas as tentativas de resolução do conflito em análise.
9º É a Ré que envia as cartas de cobrança e ignora as cartas remetidas pelo Autor.
10º É a Ré que deixa de fazer as obras e é com a Ré que se devem celebrar os acordos de pagamento.
11º A Ré ao administrar o condomínio age por ele, mas neste caso, não age em conformidade com o imposto em sede de Assembleia Geral de Condóminos, nem da lei.
(…)”.
Constata-se pois, perante o que se mostra alegado pelo autor na petição inicial e na resposta à contestação e à semelhança do que se entendeu na decisão recorrida, que o autor não pretende demandar a ré “C..., Lda.” enquanto representante do condomínio, mas sim a própria ré, com referência à forma como vem exercendo as suas funções de administradora do condomínio, o que faz toda a diferença.
É que se a ré tivesse sido demandada enquanto representante do condomínio a sua legitimidade passiva para a presente ação não seria de questionar, face ao que se acha estatuído no nº 2 do art. 1437º do Cód. Civil.
Mas, como já se salientou, não é isso que ocorre.
A ré foi demandada em nome próprio, embora com referência às funções que exerce de administradora do condomínio e à forma como o vem fazendo, o que, tal como considerou a 1ª instância, lhe retira legitimidade passiva no tocante aos três primeiros pedidos formulados de realização de obras de impermeabilização na fachada do edifício, de redução do crédito do condomínio e da sua compensação com o crédito do autor.
A legitimidade passiva da ré subsistirá apenas quanto ao quarto pedido formulado, referente à atribuição de uma indemnização por danos não patrimoniais no montante de 2.000,00€, fundando-se esta na inércia da própria ré que, ao não resolver os problemas da fração, agrava o estado de saúde do autor.
Mas no que concerne a este último pedido, muito embora se reconheça a legitimidade passiva da ré, a sua improcedência é evidente, conforme se entendeu na decisão recorrida.
Aí se escreveu o seguinte:
“(…) na presente situação o autor limita-se a alegar que nas assembleias de condomínio tem vindo a apresentar as suas queixas e reclamações e que nunca a administração do condomínio procurou solucionar o seu problema, defendendo que a ré não tem cumprido com as suas obrigações. 
Em momento algum o autor refere que a ré, no exercício das suas funções como administradora do condomínio, se recusou a levar as questões por si suscitadas à assembleia de condóminos, que se recusou a fazer constar das actas referentes às assembleias de condóminos as queixas e reclamações apresentadas pelo autor, muito menos que, tendo sido aprovada em assembleia de condóminos a realização das obras necessárias a solucionar os problemas na sua fracção, a ré se tenha recusado a executá-las. Ou seja, o autor não imputa à ré a prática de qualquer facto ilícito e culposo que tenha determinado os danos cuja existência invoca.
(…)” 
Assim, em inteira consonância com a posição assumida pela Mmª Juíza “a quo”, há que concluir pela manifesta improcedência do quarto pedido formulado pelo autor no sentido de lhe ser atribuída indemnização por danos não patrimoniais.
Deste modo, o recurso interposto está votado ao insucesso, impondo-se a integral confirmação da decisão recorrida.*Sumário (da responsabilidade do relator – art. 663º, nº 7 do Cód. do Proc. Civil): 
- O administrador, enquanto representante do condomínio e desde que não lhe seja imputada qualquer atuação ilícita no exercício da sua atividade, tem legitimidade passiva para as ações propostas por um condómino relativamente a danos causados por infiltrações provenientes de partes comuns do edifício. 
- Essa legitimidade passiva não se verifica quando a ação é proposta contra o administrador, não como representante do condomínio, mas sim em nome próprio, embora com referência às funções que exerce - de administração do condomínio - e à forma como o vem fazendo.* DECISÃO
Nos termos expostos, acordam os juízes que constituem este tribunal em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pelo autor B... e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida. 
Custas a cargo do autor/recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário que lhe foi concedido.

Porto, 12.9.2017
Rodrigues Pires
Márcia Portela
Maria de Jesus Pereira
_____________
[1] Cfr. Abílio Neto, “Manual da Propriedade Horizontal”, 3ª ed., pág. 376. [2] Cfr. Sandra Passinhas, ob. e loc. cit. 
[3] Cfr. Acórdãos da Relação do Porto de 1.6.2000, proc. 0030753, de 2.2.2006, proc. 0620640 e de 10.11.2015, proc. 1246/14.0 T8MTS.P1 e Acórdão da Relação de Lisboa de 25.9.1997, proc. 0037042, todos disponíveis in www.dgsi.pt.

Proc. nº 3324/16.1 T8MTS.P1 Comarca do Porto – Matosinhos – Instância Local – Secção Cível – J3 Apelação Recorrente: B... Recorrido: “C..., Lda.” Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Maria de Jesus Pereira Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO O autor B..., residente na Rua ..., ..., 3º esquerdo traseiras, Matosinhos intentou ação de condenação contra a ré “C..., Lda.”, com sede na Rua ..., ..., Matosinhos, na qualidade de representante do Condomínio ..., ... a ..., Matosinhos, tendo pedido: - a condenação da ré na realização de obras de impermeabilização da fachada do edifício que afeta a fração “C3”, no prazo máximo de seis meses, sob pena de não o fazendo responder por incumprimento, pagando por cada mês de atraso a quantia de 25,00€; - a redução do seu crédito para o valor devido pelas quotas em atraso, sem as multas, penalizações, despesas judiciais e honorários de mandatário, atendendo a que estas despesas se devem, única e exclusivamente, a inércia da ré; - a compensação do seu crédito com o crédito do autor ainda a determinar, pelas reparações dos danos no interior da sua fração e no seu veículo automóvel; - o pagamento de uma indemnização no valor de 2.000,00€. A ré apresentou contestação, onde se defendeu invocando as exceções de ilegitimidade passiva e da nulidade de todo o processo por ineptidão da petição inicial. Impugnou também a matéria fáctica alegada pela autora na petição inicial e pediu a condenação desta como litigante de má-fé. A autora apresentou réplica, onde se pronunciou no tocante às exceções alegadas pela ré e também quanto ao pedido de condenação em litigância de má-fé. Foi depois proferido o seguinte despacho: “(…) Invocou a ré a sua ilegitimidade passiva para os termos da acção. Alega para o efeito que a acção deveria ter sido intentada contra o “Condomínio ...” e não contra si, já que o administrador do condomínio representa este último mas não se sub-roga na sua posição. Notificado, o autor pugnou pela improcedência da excepção em análise, referindo que demandou a ré “C...” na qualidade de administradora do condomínio. Cumpre decidir. De acordo com o disposto no art.º 30 do CPC, o autor é parte legítima quando tem interesse directo em demandar e o réu também o será quando tenha interesse directo em contradizer. Este interesse em demandar e contradizer exprime-se pela utilidade e prejuízo que, respectivamente, possam advir da procedência (n.º 2). O n.º 3 do normativo acima citado esclarece que, na ausência da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para efeitos de legitimidade os sujeitos da relação material controvertida, tal como é configurada pelo autor. Este interesse – que redunda, afinal, nas vantagens e desvantagens que podem derivar da sorte da lide – deve ser aferido pelo pedido e causa de pedir aduzida na petição inicial, ou seja, de acordo com a relação jurídica controvertida tal como desenhada pelo autor, independentemente do mérito da sua pretensão ou da prova que se logre produzir. Na situação em apreço importa desde logo ter presente que, face ao teor da resposta que apresentou a fls. 63 (ref. 23885625), dúvidas não se suscitam de que o autor não pretende demandar a administração do condomínio, exercida pela “C...”, em representação do condomínio, mas sim a própria “C...”, com referência às funções por ela exercidas enquanto administradora do condomínio. Assim sendo e em ordem a aferir da legitimidade passiva da “C...” para os termos da presente acção, importa ter presentes os pedidos formulados pelo autor. Peticiona o autor a condenação da ré: “- Na realização de obras de impermeabilização da fachada do Edifício que afecta a fracção “C3”, no prazo máximo de seis meses, sob pena de não o fazendo responder pelo incumprimento, pagando por cada mês de atraso a quantia de €25,00 (vinte e cinco euros); - Proceder à redução do seu crédito para o valor devido pelas quotas em atraso, sem as multas, penalizações, despesas judiciais e honorários de mandatário, atendendo que estas despesas se devem, única e exclusivamente, à inércia da Ré; - Proceder à compensação do seu crédito com o crédito do Autor ainda a determinar, pelas reparações dos danos no interior da sua fracção e no seu veículo automóvel; - No pagamento de uma indemnização ao Autor no valor de €2.000,0 (dois mil euros)”. No que aos três primeiros pedidos se refere, facilmente se conclui que, atenta a versão dos factos tal como configurada pelo Autor na petição inicial, a ré “C...” carece de legitimidade passiva para ser demandada. Efectivamente, a realização de obras em partes comuns do edifício terá de ser efectuada pelo próprio condomínio, já que é ele o proprietário dessas mesmas partes comuns. E é também o condomínio o titular do crédito referente às quotas de condomínio e penalizações, não sendo a entidade que o administra, ou seja, a “C...”, titular de qualquer crédito sobre o autor que possa ser reduzido ou compensado com o crédito de que este último se arroga titular. Já no que se refere ao último pedido, entendemos que assiste à Ré legitimidade passiva para ser demandada. Na verdade, o Autor alega que a inércia da Ré, consubstanciada no facto de não resolver os problemas que afectam a sua fracção, lhe causa danos não patrimoniais, na medida em que, sendo uma pessoa doente, o seu estado de saúde se agrava devido ao estado em que se encontra a sua habitação. Em face do exposto, julgo parcialmente procedente por provada a excepção dilatória de ilegitimidade passiva invocada pela ré e, em consequência, absolvo a ré da instância, no que aos três primeiros pedidos se refere – cfr. art.ºs 576, n.ºs 1 e 2 e 577, e), do CPC. Custas pelo autor na proporção do decaimento – art.º 527, n.º 1 e 2, do CPC. Notifique. * Peticiona o autor, B..., como vimos, a condenação da ré, C..., Lda, no pagamento de uma indemnização no valor de 2.000,00 €. Alega para o efeito que é proprietário da fracção “C3” do edifício sito na Rua ..., n.º ... e que no quarto e na sala da sua fracção existem infiltrações, as quais têm origem na fachada do prédio e causam danos nas paredes das referidas divisões que apresentam bolor, sendo que as guarnições das janelas estão destruídas. Acrescenta que os fungos, maus cheiros e humidade prejudicam o seu estado de saúde. Alega que tais factos foram comunicados à Ré que, até ao momento, não procedeu à reparação das infiltrações. Válida e regularmente citada, a ré apresentou contestação, pugnando pela improcedência do pedido em análise. * Porque o estado dos autos desde já o permite, proceder-se-á de imediato ao conhecimento do mérito da causa. * A pretensão formulada pelo autor contra a aqui ré apenas poderá ter como fundamento a denominada responsabilidade extracontratual por factos ilícitos, à qual alude o art.º 483, n.º 1, do CPC. Como se sabe, são pressupostos da responsabilidade civil pela prática de facto ilícito, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano. Ora, na presente situação o autor limita-se a alegar que nas assembleias de condomínio tem vindo a apresentar as suas queixas e reclamações e que nunca a administração do condomínio procurou solucionar o seu problema, defendendo que a ré não tem cumprido com as suas obrigações. Em momento algum o autor refere que a ré, no exercício das suas funções como administradora do condomínio, se recusou a levar as questões por si suscitadas à assembleia de condóminos, que se recusou a fazer constar das actas referentes às assembleias de condóminos as queixas e reclamações apresentadas pelo autor, muito menos que, tendo sido aprovada em assembleia de condóminos a realização das obras necessárias a solucionar os problemas na sua fracção, a ré se tenha recusado a executá-las. Ou seja, o autor não imputa à ré a prática de qualquer facto ilícito e culposo que tenha determinado os danos cuja existência invoca. Em tais circunstâncias e sem necessidade de ulteriores considerações, facilmente se conclui pela manifesta improcedência do pedido. * Resta-nos analisar se o autor litigou de má-fé, como refere a ré na sua contestação. A condenação por litigância de má-fé tem apenas por pressuposto a violação, com dolo ou negligência grave, do dever de correcção processual ou de probidade que o art.º 8 do CPC impõe às partes. Se a parte, com propósito malicioso, pretende convencer o tribunal de um facto ou pretensão que sabe não ser legítima, distorcendo ou omitindo a verdade dos factos, faz do processo um uso reprovável ou deduz oposição cuja falta de fundamento não pode ignorar, actua de má-fé e, por essa razão, pode e deve ser sancionada em multa e indemnização à parte contrária, no caso desta a pedir. Mas só quando o processo fornece elementos seguros da conduta dolosa ou gravemente negligente deverá a parte ser censurada como litigante de má-fé. Não basta que a parte não veja acolhida a sua pretensão ou a sua versão dos factos, significando tal apenas que não logrou convencer o tribunal da sua posição. Ora, na situação dos autos não é possível afirmar que o autor actuou com má-fé. Pelo que se decide considerar não verificada a litigância de má-fé. * Face ao exposto, julgo totalmente improcedente por não provado o pedido em análise e, em consequência, absolvo a ré do mesmo. Custas pelo autor na proporção do decaimento – art.º 527, n.º 1, do CPC. Registe. Notifique.” Inconformado com o decidido, o autor interpôs recurso de apelação tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. O Meritíssimo Juiz julgou parcialmente procedente a excepção de ilegitimidade passiva da Recorrida, alegando para o efeito que esta não tinha a obrigação de realizar as obras, urgentes e necessárias, no edifício do Recorrente. 2. O Meritíssimo Juiz “a quo” sustenta na sua fundamentação da douta sentença que “… a realização de obras em partes comuns do edifício terá de ser efectuada pelo próprio condomínio, já que é ele o proprietário dessas mesmas partes comuns”. 3. Ora, atendendo aos factos alegados e, considerando que não houve lugar à apresentação de mais prova, para além dos documentos juntos pelas partes e que nenhum facto foi dado como não provado, os danos sofridos na fracção do Recorrente, traduzem-se num perigo para a saúde do mesmo e da sua família. 4. Assim, considerando “a contrario” o disposto no artigo 1427.º do Código Civil, o Administrador do Condomínio, tem a obrigação de realizar as reparações indispensáveis e urgentes. 5. Ficou amplamente demonstrado pelo Recorrente que as obras, por ele requeridas, são efectivamente indispensáveis e urgentes, não existem dúvidas que a Recorrida, para além de ter legitimidade para realizar as obras requeridas, tal obrigação é uma imposição legal. 6. Assim sendo, a Recorrida, para além de ter legitimidade para realizar as obras requeridas, tal obrigação é uma imposição legal. 7. Ficou provado que a Recorrida não cumpriu com os seus deveres, e tal originou os danos sofridos pelo Recorrente. 8. A Recorrida cobrou já o valor para a realização das obras nas partes comum, como a própria aceita na sua contestação. 9. Mais uma vez se demonstra, que os danos sofridos pelo Recorrente se devem, exclusivamente, à inércia da Recorrida. 10. Pelo que, deve a Recorrida ser condenada no pagamento dos danos sofridos conforme peticionado e, bem assim, no pagamento da indemnização pelos danos patrimoniais sofridos pelo Recorrente. 11. Por outro lado, a Recorrida cobrou já o valor para a realização das obras nas partes comum, como a própria aceita na sua contestação, pelo que, mais uma vez se demonstra, que os danos sofridos pelo Recorrente se devem, exclusivamente, à inércia da Recorrida. Foram violados: - Os artigos 1427º, 1436º e 1437º do Código Civil; - Os artigos 2.º, 3.º, 30.º e 615.º do Código de Processo Civil. Não foram apresentadas contra-alegações. Cumpre então apreciar e decidir.*FUNDAMENTAÇÃO O âmbito do recurso, sempre ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, encontra-se delimitado pelas conclusões que nele foram apresentadas e que atrás se transcreveram – cfr. arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do Cód. do Proc. Civil.*A questão a decidir é a seguinte: Apurar se se verifica a exceção de ilegitimidade passiva da ré/recorrida.*Os elementos factuais e processuais relevantes para o conhecimento do presente recurso constam do antecedente relatório.*Passemos à apreciação jurídica. O art. 30º do Cód. do Proc. Civil estabelece que o réu é parte legítima quando tem interesse direto em contradizer (nº 1), sendo que este se exprime pelo prejuízo que advenha da procedência da ação (nº 2). Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor (nº 3). No presente caso há ainda que ter em atenção o disposto no art. 1437º do Cód. Civil onde se preceitua o seguinte: «1. O administrador tem legitimidade para agir em juízo, quer contra qualquer dos condóminos, quer contra terceiro, na execução das funções que lhe pertencem ou quando autorizado pela assembleia. 2. O administrador pode também ser demandado nas ações respeitantes às partes comuns do edifício. 3. Excetuam-se as ações relativas a questões de propriedade ou posse dos bens comuns, salvo se a assembleia atribuir poderes especiais ao administrador.» Alegou o autor na petição inicial que é proprietário da fração “C3” do edifício sito na Rua ..., nº ... e que no quarto e na sala desta fração existem infiltrações com origem na fachada do prédio, tal como no seu espaço de garagem existe também uma infiltração proveniente da canalização comum do edifício. As infiltrações na sua fração provocaram danos nas paredes que apresentam bolor e nas guarnições das janelas que estão completamente destruídas, acrescentando que os fungos, os maus cheiros e as humidades agravam o seu estado de saúde. Por outro lado, as infiltrações no lugar de garagem causaram danos na pintura do seu carro. Alegou ainda o autor que a ré lhe exige o pagamento da importância de 4.518,54€, correspondente não apenas a quotas de condomínio, mas igualmente a multas e penalizações que considera não serem devidas. Formulou depois pedido de condenação da ré na realização de obras de impermeabilização da fachada do edifício que afeta a fração “C3”, no prazo máximo de seis meses, sob pena de não o fazendo responder por incumprimento, pagando por cada mês de atraso a quantia de 25,00€. Pediu ainda a redução do seu crédito para o valor devido pelas quotas em atraso, sem as multas, penalizações, despesas judiciais e honorários de mandatário, atendendo a que estas despesas se devem, única e exclusivamente, a inércia da ré e a compensação do seu crédito com o crédito do autor ainda a determinar, pelas reparações dos danos no interior da sua fração e no seu veículo automóvel. Por último, peticionou a condenação da ré no pagamento de uma indemnização, por danos não patrimoniais, no valor de 2.000,00€. No art. 1437º, nº 2 do Cód. Civil, acima transcrito, preceitua-se que o administrador pode ser demandado nas ações respeitantes às partes comuns do edifício. A consagração desta disciplina, conforme afirma Sandra Passinhas (in “A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal”, 2ª ed., pág. 343), “encontra a sua ratio na realização de uma evidente exigência de simplificação nas relações entre o condomínio e terceiros, ou algum dos condóminos que pretenda fazer valer em juízo pretensões respeitantes a bens ou interesses comuns.” Por isso, ao abrigo do art. 223º, nº 1 do Cód. do Proc. Civil, o condomínio é citado na pessoa do seu legal representante. Contudo, o legislador não deixou de ser prudente ao ter distinguido as situações que se reconduzem a mera gestão e conservação do condomínio das que se relacionam com a propriedade e posse de bens comuns, regendo para estas últimas o nº 3 do art. 1437º do Cód. Civil. Com efeito, quando esteja em causa a propriedade ou a posse de bens comuns ou o direito de algum ou alguns dos condóminos a essas mesmas coisas, o administrador é parte ilegítima, salvo se se verificar a hipótese prevista no nº 3 do art. 1437º, ou seja, se a assembleia conferir ao administrador poderes especiais de representação.[1] Prosseguindo, referir-se-á que casos paradigmáticos de legitimidade do administrador nos termos do art. 1437º, nº 2 do Cód. Civil são aqueles em que o administrador é demandado numa ação em que um terceiro pretenda o pagamento de serviços prestados ou de bens fornecidos ao condomínio ou o das ações propostas por condóminos, para obter o ressarcimento de danos causados por partes comuns do edifício, como, por exemplo, infiltrações de águas provenientes do terraço de cobertura.[2] Consequentemente, impõe-se concluir que o administrador, enquanto representante do condomínio, tem legitimidade passiva para as ações propostas por um condómino com vista ao ressarcimento de danos causados por partes comuns do edifício.[3] Ora, a ação proposta pelo autor, que é condómino, radica em infiltrações surgidas na sua fração e no seu espaço de garagem que têm a sua origem na fachada do prédio e na sua canalização, que constituem partes comuns – cfr. art. 1421º, nº 1, als. a) e d) do Cód. Civil. Daí resultaria, numa primeira abordagem, a legitimidade da ré “C..., Lda.” para ser demandada enquanto representante do Condomínio ..., ... a .... Há, porém, que indagar se, face ao que se mostra alegado na petição inicial, o autor efetivamente demandou a ré nessa qualidade, o que lhe conferiria legitimidade passiva para a ação, de acordo com o disposto no art. 1437º, nº 2 do Cód. Civil. Sucede que o resultado desta indagação será negativo, muito embora o autor tenha escrito no cabeçalho da petição inicial que demandava a ré na qualidade de representante do condomínio. Com efeito, o que alega em seguida, e depois reitera em sede de resposta à contestação, desmente esta afirmação. É que o autor põe em causa a forma como a ré, administradora do condomínio, vem exercendo as suas funções. Alega que a ré tem vindo a realizar obras que trazem prejuízos para o autor, que a ré não procura solucionar esses problemas e insiste no pagamento de valores e multas que sabe não serem devidos, enviando notas de cobrança que incluem sempre despesas de advogado, sem que haja uma resposta aos pedidos de acordo. Sublinha, inclusive, que a última carta que enviou aguarda ainda resposta da ré – cfr. arts. 1º a 7º da petição inicial. E na resposta à contestação, a propósito da exceção de ilegitimidade passiva invocada pela ré, o autor, embora afirme que intentou a ação contra a ré na qualidade de representante do Condomínio ..., ... a ..., escreve a seguir: “2º - A Ré enquanto administradora do Condomínio tem vários deveres que deve respeitar e cumprir, nomeadamente as deliberações tomadas em sede de Assembleia Geral de Condóminos. 3º Ora, tendo em consideração que o Autor, reiteradamente, nas diversas Assembleias de Condomínio apresentou as suas queixas e reclamações e a Administração do Condomínio nunca procurou solucionar estes problemas. 4º Pelo contrário, sempre insistiu no pagamento de valores exorbitantes e multas que sabe não serem devidas. 5º Fica demonstrado que a Ré se demitiu das suas obrigações enquanto Administradora e, nesses termos, órgão executivo do Condomínio ..., ... a ..., Matosinhos. 6º A Ré ignora o que é referido nas Assembleias e age de acordo com a sua conveniência, administrando (ou não) o Condomínio nessa conformidade. (…) 8º É a Ré que ignora os pedidos de contacto e todas as tentativas de resolução do conflito em análise. 9º É a Ré que envia as cartas de cobrança e ignora as cartas remetidas pelo Autor. 10º É a Ré que deixa de fazer as obras e é com a Ré que se devem celebrar os acordos de pagamento. 11º A Ré ao administrar o condomínio age por ele, mas neste caso, não age em conformidade com o imposto em sede de Assembleia Geral de Condóminos, nem da lei. (…)”. Constata-se pois, perante o que se mostra alegado pelo autor na petição inicial e na resposta à contestação e à semelhança do que se entendeu na decisão recorrida, que o autor não pretende demandar a ré “C..., Lda.” enquanto representante do condomínio, mas sim a própria ré, com referência à forma como vem exercendo as suas funções de administradora do condomínio, o que faz toda a diferença. É que se a ré tivesse sido demandada enquanto representante do condomínio a sua legitimidade passiva para a presente ação não seria de questionar, face ao que se acha estatuído no nº 2 do art. 1437º do Cód. Civil. Mas, como já se salientou, não é isso que ocorre. A ré foi demandada em nome próprio, embora com referência às funções que exerce de administradora do condomínio e à forma como o vem fazendo, o que, tal como considerou a 1ª instância, lhe retira legitimidade passiva no tocante aos três primeiros pedidos formulados de realização de obras de impermeabilização na fachada do edifício, de redução do crédito do condomínio e da sua compensação com o crédito do autor. A legitimidade passiva da ré subsistirá apenas quanto ao quarto pedido formulado, referente à atribuição de uma indemnização por danos não patrimoniais no montante de 2.000,00€, fundando-se esta na inércia da própria ré que, ao não resolver os problemas da fração, agrava o estado de saúde do autor. Mas no que concerne a este último pedido, muito embora se reconheça a legitimidade passiva da ré, a sua improcedência é evidente, conforme se entendeu na decisão recorrida. Aí se escreveu o seguinte: “(…) na presente situação o autor limita-se a alegar que nas assembleias de condomínio tem vindo a apresentar as suas queixas e reclamações e que nunca a administração do condomínio procurou solucionar o seu problema, defendendo que a ré não tem cumprido com as suas obrigações. Em momento algum o autor refere que a ré, no exercício das suas funções como administradora do condomínio, se recusou a levar as questões por si suscitadas à assembleia de condóminos, que se recusou a fazer constar das actas referentes às assembleias de condóminos as queixas e reclamações apresentadas pelo autor, muito menos que, tendo sido aprovada em assembleia de condóminos a realização das obras necessárias a solucionar os problemas na sua fracção, a ré se tenha recusado a executá-las. Ou seja, o autor não imputa à ré a prática de qualquer facto ilícito e culposo que tenha determinado os danos cuja existência invoca. (…)” Assim, em inteira consonância com a posição assumida pela Mmª Juíza “a quo”, há que concluir pela manifesta improcedência do quarto pedido formulado pelo autor no sentido de lhe ser atribuída indemnização por danos não patrimoniais. Deste modo, o recurso interposto está votado ao insucesso, impondo-se a integral confirmação da decisão recorrida.*Sumário (da responsabilidade do relator – art. 663º, nº 7 do Cód. do Proc. Civil): - O administrador, enquanto representante do condomínio e desde que não lhe seja imputada qualquer atuação ilícita no exercício da sua atividade, tem legitimidade passiva para as ações propostas por um condómino relativamente a danos causados por infiltrações provenientes de partes comuns do edifício. - Essa legitimidade passiva não se verifica quando a ação é proposta contra o administrador, não como representante do condomínio, mas sim em nome próprio, embora com referência às funções que exerce - de administração do condomínio - e à forma como o vem fazendo.* DECISÃO Nos termos expostos, acordam os juízes que constituem este tribunal em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pelo autor B... e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida. Custas a cargo do autor/recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário que lhe foi concedido. Porto, 12.9.2017 Rodrigues Pires Márcia Portela Maria de Jesus Pereira _____________ [1] Cfr. Abílio Neto, “Manual da Propriedade Horizontal”, 3ª ed., pág. 376. [2] Cfr. Sandra Passinhas, ob. e loc. cit. [3] Cfr. Acórdãos da Relação do Porto de 1.6.2000, proc. 0030753, de 2.2.2006, proc. 0620640 e de 10.11.2015, proc. 1246/14.0 T8MTS.P1 e Acórdão da Relação de Lisboa de 25.9.1997, proc. 0037042, todos disponíveis in www.dgsi.pt.