I - Constitui título executivo a ata da assembleia de condóminos em que se deliberou fixar o montante de quotas de condomínio e de obras em dívida pela executada, relativas a determinados períodos temporais, com indicação do seu valor mensal e prazo de pagamento. II - É exigível a obrigação exequenda quando o exequente se limita a pedir as mensalidades vencidas à data da instauração da execução, não obstante ainda se não ter esgotado o prazo para pagamento da totalidade das mensalidades devidas pela executada.
Processo nº 13.190/18.7T8PRT-A.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Execução do Porto - Juiz 9 Acórdão Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório1. O condomínio do prédio sito na Rua …, …/…, em …, Matosinhos instaurou esta ação executiva contra B…, residente no … desse mesmo prédio, reclamando o pagamento da quantia de €2.061,31, sendo €1.126,30 respeitantes a quotas ordinárias vencidas no período compreendido entre julho de 2015 e maio de 2018, €142,76 de obras de reparação do telhado, €715,90 de obras de recuperação geral do edifício e €76,35 de juros de mora. Juntou as atas das assembleias de condóminos realizadas em 30 de julho de 2017 e 8 de janeiro de 2018. Foi proferido despacho de indeferimento liminar “na parte em que excede a quantia de €160,90 acrescida dos juros vencidos e vincendos calculados desde a data de vencimento de cada uma das quotas que integram aquela quantia”. Irresignado, recorreu o exequente, cuja alegação assim rematou: “A) Nos termos do disposto no artigo 703.º, n.º 1, alínea d) do CPC, podem servir de base a uma execução os documentos a que por disposição especial lhes seja atribuída força executiva, pelo que, nos termos do artigo 6.º do DL nº 268/94, de 25/10, as atas de assembleia de condóminos podem constituir título executivo, o que sucede na presente lide. B) Contudo, a força executiva da ata da assembleia não depende nem da assinatura de todos os condóminos nem tão pouco do valor determinado e exato da dívida de cada condómino. C) Na realidade, desde que através da ata se possa determinar, de forma simples e aritmética, o montante em dívida, esta poderá constituir título executivo. D) Relativamente à ausência da aprovação do respetivo orçamento dos anos de 2015, 2016 e 2017, bem como à ausência da aprovação do orçamento para obras de reparação do telhado, salvo o devido respeito, a sentença recorrida interpretou erroneamente a ratio legis do artigo 724.º do CPC, fazendo do mesmo uma interpretação restritiva. E) Têm força executiva as atas da assembleia de condóminos que importem deliberação onde sejam quantificados os valores em dívida pelo condómino devedor. F) Bastará, assim, a ata que retrate a deliberação do condomínio onde procedeu à liquidação dos montantes em dívida para cada condómino, podendo a mesma configurar a descrição dos factos tal como o previsto no artigo 724.º, n.º 1, al. e) do CPC, sendo, desse modo, passível de contraditório ou oposição por parte do devedor. G) Cotejando o teor das atas juntas e do próprio requerimento executivo, parece-nos evidente que estas constituem título executivo, uma vez que especificam os montantes em dívida por cada fração e sua origem, podendo a executada, em toda a plenitude, exercer o contraditório a que tem direito. H) Tanto que a executada já fora interpelada para o pagamento, tendo admitido ser devedora das quantias em dívida e proposto plano de pagamento que nunca iniciou. I) De facto, não poderá vingar o entendimento de que as atas n.os 59 e 60 não são idóneas pois não comportam a deliberação de aprovação das contribuições devidas pelos condóminos. J) Para existir título executivo válido, basta que o montante de contribuição correspondente à fracção conste expressamente da ata. K) Tão pouco poderá proceder a argumentação que, a existir tal falta, a mesma determina sem mais o indeferimento liminar da ação executiva, como considerou o tribunal “a quo”. L) No caso em apreço, deveria o tribunal “a quo” ter convidado o Recorrente a juntar todas as atas anteriores, das quais resultasse evidenciado e clarificado todos esses pontos. M) Assim seria facultada ao Recorrente a possibilidade de sanar uma eventual irregularidade, sob pena de, não o fazendo, ver indeferido liminarmente o requerimento executivo. Pelo que, N) As atas dadas à execução são titulo executivo válido e suficiente, não podendo proceder a decisão de indeferimento liminar. O) Razão pela qual deverá o presente recurso ser julgado integralmente procedente, mais se ordenando o prosseguimento dos autos com as legais consequências. P) O douto despacho recorrido violou o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 703.º do CPC e no artigo 6.º do DL n.º 268/94, de 25 de outubro. Nos termos do disposto no art. 646.º, n.os 1, 2 e 3 do CPC, indica-se para instrução do presente recurso as seguintes peças processuais disponibilizadas por via eletrónica: - requerimento executivo e todos os documentos que o acompanham (ref.ª 28782906); - despacho (ref.ª 394559150). Termos em que se requer a V. Ex.ªs se dignem a julgar procedente o presente recurso e, em consequência, a revogar o douto despacho de que recorre: a) Julgando as atas juntas com o requerimento inicial como título executivo quanto ao valor peticionado a título de quotas ordinárias vencidas no período entre julho de 2015 e dezembro de 2017 e quanto às obras de reparação do telhado, com as legais consequências; Subsidiariamente, caso assim não se entenda, b) Ordenando o tribunal que convide o Recorrente a juntar todas as atas anteriores, de forma a suprir uma eventual irregularidade e a dar cumprimento ao disposto no artigo 724.º do CPC.”. Citada a executada para os termos do recurso e da execução, a mesma não respondeu à alegação do exequente.II. Objeto do recursoO âmbito recursivo é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo se forem de conhecimento oficioso (artigos 635º/4, 637º/2 e 639º/1 e 2, do Código de Processo Civil, doravante designado por “CPC”). Assim, atendendo às conclusões da alegação do apelante, cabe indagar se as atas das reuniões das assembleias de condóminos apresentadas com o requerimento executivo reúnem as condições de exequibilidade legalmente impostas quanto às quotas ordinárias vencidas entre julho de 2015 e maio de 2018 e quanto às obras de reparação do telhado e, subsidiariamente, da omissão de convite ao aperfeiçoamento.III. Fundamentação de factoCom relevância para a matéria recursiva, à luz dos documentos constantes dos autos, julgamos apurados os seguintes factos: 1. Em 30/05/2018, o exequente instaurou contra B… execução para pagamento da quantia de € 2.061,31, sendo €1.126,30 respeitante a quotas ordinárias vencidas no período compreendido entre julho de 2015 e maio de 2018, €142,76 de obras de reparação do telhado, €715,90 de obras de recuperação geral do edifício e €76,35 de juros de mora. 2. Alegou, para tanto, ser o condomínio do “Prédio sito na Rua …, Lote ../...”, sito na Rua …, …, … e …, …. - … …. 3. A executada é proprietária das frações BF e Q daquele prédio, a que corresponde a quota mensal de condomínio no valor de €32,18 (trinta e dois euros e dezoito cêntimos). 4. A executada não procedeu ao pagamento integral das quotas de condomínio vencidas em julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2015, janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2016, janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2017, janeiro, fevereiro, março, abril e maio de 2018. 5. Mais alegou que a executada é, ainda, devedora da quantia de €142,76, a título de obras de recuperação do telhado da entrada 376, pois teve lugar, em 30 de junho de 2017, uma assembleia de condóminos que aprovou um orçamento para intervenção geral de obra no prédio, devido ao estado de degradação geral das fachadas exteriores, tendo ficado determinado o pagamento do preço à entidade adjudicatária seria suportado na totalidade pelos comproprietários de acordo com a permilagem da sua área habitacional, cabendo à executada o pagamento da quantia mensal de € 71,59, segundo o plano de pagamentos iniciado em agosto de 2017 e prolongado até 31/12/2018. 6. Vencidos à presente data 10 mensalidades, a executada não as pagou. 7. Nessa assembleia foi aprovada a seguinte deliberação: “A assembleia deu autorização à administração sequente para proceder à cobrança por via judicial de todas as importâncias em dívida se assim for necessário.” 7. Interpelada ao pagamento, a executada nunca o fez. 8. Em 27/10/2017, o exequente, através das suas mandatárias, interpelou-a para proceder à quantia em dívida àquela data, que ascendia a €1.290,69, tendo a mesma, em resposta, aceitado a dívida e propondo pagá-la em prestações no valor de €50,00 cada. 9. Por carta datada de 11/12/2017, o exequente comunicou à executada que aceitava o plano de pagamento proposto, mas esta nada pagou. 10. O exequente concluiu o requerimento executivo, alegando que as quantias em dívida totalizam €1.984,96 e vencem juros de mora à taxa legal de 4% a contar da data de vencimento de cada uma das quantias em dívida, sendo os juros vencidos do valor de €76,35. 11. Juntou as atas da Assembleia de Condóminos n.os 59 e 60, três cartas interpelatórias da executada e uma sua carta de resposta. 12. A ata n.º 59, relativa à assembleia de condóminos de 30/06/207, exara que a administração de condomínio deu a conhecer aos presentes os condóminos devedores, indicando, além do mais, que B…, como proprietária das frações BF e Q, com uma quota mensal de 32,18€, deve as quotas de julho a dezembro de 2015, no total de 175,20€, bem como a sua quota parte relativa às obras de reparação do telhado da entrada 376, no total de 196,76€, as quotas do ano de 2016, no total de 386,16€, e as quotas de janeiro a junho de 2017, no total de 193,08 €. A assembleia autorizou a administração a proceder, se necessário, à cobrança judicial de todas as importâncias em dívida (doc. de fls. 20 a 24). 13. A ata n.º 60, respeitante à assembleia de condóminos realizada em 08/01/2018, revela que a administração identificou os condóminos com valores em dívida, dentre os quais consta a executada B…, como proprietária das frações BF e Q, com uma quota mensal de 32,18€, com a menção de que deve as quotas de julho a dezembro de 2015, no total de 175,20€, bem como a sua quota parte relativa às obras de reparação do telhado da entrada 376, no total de 142,76€, as quotas do ano de 2016, no total de 386,16€, e as quotas de 2017, no total de 386,16€. A assembleia autorizou a administração a proceder, se necessário, à cobrança judicial de todas as importâncias em dívida (doc. de fls. 25 a 30). 14. Em 27/10/2017, os advogados da administração do condomínio remeteram à executada carta em que solicitavam a regularização da quantia em dívida, no total de 1.290,69€, no prazo de oito dias, sob pena de cobrança por via judicial. A executada respondeu, propondo o pagamento em prestações mensais de 50,00€, plano que foi aceito pela administração do condomínio (doc. fls. 29 a 32). 15. Em 15/03/2018, os advogados da administração do condomínio remeteram à executada carta em que solicitavam contacto para acertar os termos do acordo de pagamento da quantia em dívida, no valor de 1.660,72€, e informavam estar na iminência de cobrança judicial (fls. 33). 16. A executada não esteve presente nem representada em qualquer das identificadas assembleias de condóminos. 17. Em 06/09/2018 foi pronunciado o seguinte despacho: “Como decorre do disposto no artº. 10º. nº. 5 do CPC a execução tem por base um título, pelo qual se determinam os fins e os limites da ação executiva. Os títulos executivos são os enumerados no artº. 703º. nº. 1 do referido diploma legal, entre eles os “documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva" (al. d). Dispõe ainda o artº. 724º. do C.P.C. que no requerimento executivo o exequente, para além do mais: expõe sucintamente os factos que fundamentam o pedido, quando não constem do título executivo (al. e)); formula o pedido (al. f)) e liquida a obrigação ...( al. h)). Depois, deve o mesmo vir acompanhado do título executivo e dos demais documentos complementares dos quais resulte que a obrigação é certa, líquida e exigível - cfr. artº.713º. do C.P.C. Dispõe o artº. 6º. nº. 1 do D.L. 268/94 que é título executivo a “ata da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento dos serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio” e cujo pagamento, nos termos do artº. 1424º. nº. 1 do C.C., impende sobre os condóminos, ou seja, a ata da deliberação que aprovou o orçamento das despesas necessárias à conservação e fruição das partes e não a ata da deliberação que aprovou as contas da administração ou quaisquer outras informações prestadas pela administração do condomínio. Do exposto resulta que as atas juntas ao requerimento executivo valem como título executivo apenas e tão só na parte em que aprovam o orçamento para recuperação geral do edifício (ata nº. 59 de 30/6/2017) e o orçamento ordinário para o ano de 2018 (ata nº. 60 de 8 de janeiro de 2018) e não na parte em que referem estar em dívida pelas diversas frações os valores nelas referidos. Relativamente ao valor reclamado com base na primeira das referidas atas há, porém, que referir que a obrigação dali resultante para a executada não se mostra vencida, uma vez que da referida ata consta que o valor devido por cada um dos condóminos “deve estar pago até ao último dia de dezembro de 2018”. E não se mostrando vencida a obrigação não é a mesma exequível. Por todas estas razões, e ao abrigo do disposto nos artº. 726º. nº. 2 al. a) e nº. 5 do CPC, rejeito a execução na parte em que excede a quantia de € 160,90 acrescida dos juros vencidos e vincendo calculados desde a data de vencimento de cada uma das quotas que integram aquela quantia. Custas, nesta parte, pelo exequente”.IV. Fundamentação de direitoComo antecipámos, a questão recursória restringe-se a saber se constituem título executivo as atas de deliberação da assembleia de condóminos. Na verdade, o despacho recorrido considerou “que as atas juntas ao requerimento executivo valem como título executivo apenas e tão só na parte em que aprovam o orçamento para recuperação geral do edifício (ata nº. 59 de 30/6/2017) e o orçamento ordinário para o ano de 2018 (ata nº. 60 de 8 de janeiro de 2018) e não na parte em que referem estar em dívida pelas diversas frações os valores nelas referidos”. Preceitua o artigo 6º/1, do decreto-lei n.º 268/94, de 25 de outubro que “[A] acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.” Como o artigo 703.º/1, d), e 2, do CPC, preceitua que constituem títulos executivos os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva e neles se consideram abrangidos os juros de mora, à taxa legal, cabe indagar se as atas apresentadas pelo exequente reúnem as necessárias condições de exequibilidade. A ação executiva impõe que o exequente se apresente em juízo munido de um título executivo, poisa “toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva” (artigo 10º/5 do CPC). E é o título executivo que define os limites subjetivos e objetivos da ação executiva, dele emergindo o seu fundamento, embora se controverta se a causa de pedir é o título executivo per se ou se é constituída pelos factos alegados no âmbito da obrigação subjacente, havendo ainda quem defenda que a causa de pedir é a conjunção do título e da alegação dos factos da obrigação subjacente[1]. Efetivamente, o título executivo constitui um requisito essencial da ação executiva, corporizando um instrumento probatório suficiente da obrigação exequenda, por forma a que, por si só, revele, com um mínimo de segurança, a existência do crédito que consubstancia o pedido exequendo. Esta exigência visa preservar o interesse público da segurança do património do executado, que não pode ser atingido sem um mínimo de garantia sobre a existência do direito do exequente. É neste âmbito que se insere a excecionalidade das normas avulsas que preveem títulos executivos, porque aquele artigo 703.º do CPC inscreve que à execução apenas podem servir de base os títulos que enumera[2]. Nessa medida, aderimos à posição da decisão recorrida quando afirma que a integração da previsão legal do predito artigo 6.º/1 do decreto-lei n.º 268/94, no que tange às “contribuições devidas ao condomínio” deverá ser feita com referência ao artigo 1424.º do Código Civil. E este preceito define como encargos de condomínio os respeitantes à “conservação e fruição das partes comuns do edifício”, bem como os que respeitam aos “serviços de interesse comum”, tudo suportado pelos condóminos em função do valor das suas frações. Donde se afirme que em tais despesas se devem incluir todas as que sejam indispensáveis para manterem as partes comuns em condições de poderem servir o uso a que se destinam, como pequenas despesas de manutenção ordinária ou despesas impostas por qualquer evento que tenha provocado danos extensos. Trata-se de uma responsabilidade ex lege para a qual vale o critério da proporcionalidade, ressalvada eventual convenção em contrário[3]. Donde se venha aceitando que a ata da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportados pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte[4]. De facto, à luz daquele normativo, a ata constituirá título executivo contra o condómino que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte, desde que dela conste a deliberação sobre o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio. O mesmo corresponde a afirmar que a ata da reunião da assembleia de condóminos tem força executiva se exibir o montante das contribuições devidas ao condomínio, o seu prazo de pagamento e a quota-parte do condómino devedor[5]. A decisão recorrida entendeu que as atas não constituem título executivo “na parte em que referem estar em dívida pelas diversas frações os valores nelas referidos”. Ora, as atas documentam as deliberações tomadas na reunião da assembleia de condóminos quanto à comparticipação nas contribuições e nas despesas comuns e exaram, designadamente quanto à condómina executada, os valores em dívida, concretizando os seus montantes e os respetivos períodos temporais, bem como os prazos de pagamento e a autorização para cobrança judicial. Logo, não obstante a ausência da executada nessas assembleias, são-lhe impostas tais deliberações, independentemente da sua notificação, contanto que as deliberações não tenham sido alvo de tempestiva impugnação. Nesse sentido se tem sustentado que “uma vez aprovadas e exaradas em ata, as deliberações da assembleia representam a vontade colegial e são vinculativas para os condóminos, mesmo para os que não tenham participado na reunião”[6]. Propugnamos que o mencionado artigo 6º/1 do decreto-lei 268/94 não faz depender a força executiva da ata da assembleia de condóminos da liquidação do montante concreto, certo, da dívida de cada condómino, bastando que os dados da ata e dos demais documentos que a completam permitam determinar esse valor. Cremos até bastar a menção do valor global devido ao condomínio por contribuições correntes, pela realização de despesas de conservação ou fruição das partes comuns ou para pagamento de serviços de interesse comum, se os demais dados permitirem que cada condómino, pela aplicação da permilagem da sua fração ao valor global, conheça o montante que lhe diz respeito. De todo o modo, as atas em causa exibem os valores em dívida pela executada, quer no que respeita às obras quer no que se refere às contribuições ordinárias para as despesas de condomínio. Na verdade, identificam a sua quota-parte mensal nas despesas de condomínio em função da permilagem da sua área, os períodos temporais em causa e os valores parciais e totais em jogo, assim conferindo à obrigação exequenda certeza, exigibilidade e liquidez (artigo 713º do CPC)[7]. A decisão apelada reputou de inexequível, por falta de vencimento, a obrigação relativa ao valor reclamado com base na primeira ata, o qual “deve estar pago até ao último dia de dezembro de 2018”. Com efeito, a obrigação só é exigível quando está vencida. Porém, a propósito, referencia essa ata que, a título de obras de recuperação do telhado da entrada 376, a assembleia de condóminos de 30/06/2017 aprovou um orçamento para intervenção geral de obra no prédio e determinou que o pagamento do respetivo preço seria suportado na totalidade pelos comproprietários de acordo com a permilagem da sua área habitacional. Menção que bastaria para a executada saber o valor que lhe cabe, mas a ata vai mais longe e clarifica que a ela cabe o pagamento da quantia mensal de € 71,59, segundo o plano de pagamentos iniciado em agosto de 2017 e prolongado até 31/12/2018. A execução foi instaurada em 31/05/2018 e, portanto, nessa data, ainda não estavam vencidas todas as mensalidades, já que a última se venceria em 31/12/2018. Contudo, àquela data estavam já vencidas 10 mensalidades, que a executada não pagou, e só essas foram peticionadas pelo exequente, pelo que não intuímos fundamento para a invocada inexigibilidade dessa obrigação. Uma obrigação diz-se exigível quando se encontra vencida e/ou depende da mera interpelação do devedor (777º/1 do Código Civil), pelo que sendo inquestionável que a prestação tem de ser exigível e, portanto, o seu vencimento há de ter-se por verificado à data da formulação do pedido, a verdade é que, tal como o enunciou o exequente, só estão pedidas as mensalidades já vencidas, ou seja, as que deveriam ser mensalmente pagas entre agosto de 2017 e maio de 2018. Ainda assim, mesmo que pedisse a totalidade das mensalidades, só haveria justificação para o indeferimento liminar parcial do valor relativo às mensalidades não vencidas. Tudo a significar que a impugnação recursória merece acolhimento e que, procedendo a apelação, ocorre a revogação do despacho recorrido, devendo a execução prosseguir os seus legais termos quanto à integralidade da obrigação exequenda. Esta solução torna inútil a indagação da eventual necessidade da prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento (artigo 608º/2 do CPC).* V. DispositivoAnte o exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em dar procedência à apelação e, por conseguinte, em revogar o despacho recorrido e determinar o prosseguimento da execução quando à totalidade da obrigação exequenda. Custas em função da condenação final (artigo 527º/1 do CPC).*Porto, 15 de janeiro de 2019. Maria Cecília Agante José Carvalho Rodrigues Pires ________________ [1] José Lebre de Freitas, A acção executiva: à luz do Código revisto, Almedina, 2.ª edição¸ pág. 64. [2] Rui Pinto, Novos Estudos de Processo Civil, A Execução de Dívidas de Condomínio, Petrony, 2017, pág. 196; in www.dgsi.pt: Ac. RP de 07/05/2018, processo 9990/17.3T8PRT-B.P1. [3] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume III, Coimbra Editora, 2.ª ed. revista e atualizada, pág. 431. [4] In www.dgsi.pt: Ac. RC de 20/06/2012, processo 157/10.2TBCVL-A.C1. [5] In www.dgsi.pt: Ac. RP de 04/12/2017, processo 26113/15.6T8PRT-A.P1. [6] Pires de Lima e Antunes Varela, ibidem, pág. 446. [7] In www.dgsi.pt: Ac. RC de 20/6/2012, processo 157/10.2TBCVL-A.C1; Ac. RP de 27/05/2014, processo 4393/11.6TBVLG-A.P1.
Processo nº 13.190/18.7T8PRT-A.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Execução do Porto - Juiz 9 Acórdão Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório1. O condomínio do prédio sito na Rua …, …/…, em …, Matosinhos instaurou esta ação executiva contra B…, residente no … desse mesmo prédio, reclamando o pagamento da quantia de €2.061,31, sendo €1.126,30 respeitantes a quotas ordinárias vencidas no período compreendido entre julho de 2015 e maio de 2018, €142,76 de obras de reparação do telhado, €715,90 de obras de recuperação geral do edifício e €76,35 de juros de mora. Juntou as atas das assembleias de condóminos realizadas em 30 de julho de 2017 e 8 de janeiro de 2018. Foi proferido despacho de indeferimento liminar “na parte em que excede a quantia de €160,90 acrescida dos juros vencidos e vincendos calculados desde a data de vencimento de cada uma das quotas que integram aquela quantia”. Irresignado, recorreu o exequente, cuja alegação assim rematou: “A) Nos termos do disposto no artigo 703.º, n.º 1, alínea d) do CPC, podem servir de base a uma execução os documentos a que por disposição especial lhes seja atribuída força executiva, pelo que, nos termos do artigo 6.º do DL nº 268/94, de 25/10, as atas de assembleia de condóminos podem constituir título executivo, o que sucede na presente lide. B) Contudo, a força executiva da ata da assembleia não depende nem da assinatura de todos os condóminos nem tão pouco do valor determinado e exato da dívida de cada condómino. C) Na realidade, desde que através da ata se possa determinar, de forma simples e aritmética, o montante em dívida, esta poderá constituir título executivo. D) Relativamente à ausência da aprovação do respetivo orçamento dos anos de 2015, 2016 e 2017, bem como à ausência da aprovação do orçamento para obras de reparação do telhado, salvo o devido respeito, a sentença recorrida interpretou erroneamente a ratio legis do artigo 724.º do CPC, fazendo do mesmo uma interpretação restritiva. E) Têm força executiva as atas da assembleia de condóminos que importem deliberação onde sejam quantificados os valores em dívida pelo condómino devedor. F) Bastará, assim, a ata que retrate a deliberação do condomínio onde procedeu à liquidação dos montantes em dívida para cada condómino, podendo a mesma configurar a descrição dos factos tal como o previsto no artigo 724.º, n.º 1, al. e) do CPC, sendo, desse modo, passível de contraditório ou oposição por parte do devedor. G) Cotejando o teor das atas juntas e do próprio requerimento executivo, parece-nos evidente que estas constituem título executivo, uma vez que especificam os montantes em dívida por cada fração e sua origem, podendo a executada, em toda a plenitude, exercer o contraditório a que tem direito. H) Tanto que a executada já fora interpelada para o pagamento, tendo admitido ser devedora das quantias em dívida e proposto plano de pagamento que nunca iniciou. I) De facto, não poderá vingar o entendimento de que as atas n.os 59 e 60 não são idóneas pois não comportam a deliberação de aprovação das contribuições devidas pelos condóminos. J) Para existir título executivo válido, basta que o montante de contribuição correspondente à fracção conste expressamente da ata. K) Tão pouco poderá proceder a argumentação que, a existir tal falta, a mesma determina sem mais o indeferimento liminar da ação executiva, como considerou o tribunal “a quo”. L) No caso em apreço, deveria o tribunal “a quo” ter convidado o Recorrente a juntar todas as atas anteriores, das quais resultasse evidenciado e clarificado todos esses pontos. M) Assim seria facultada ao Recorrente a possibilidade de sanar uma eventual irregularidade, sob pena de, não o fazendo, ver indeferido liminarmente o requerimento executivo. Pelo que, N) As atas dadas à execução são titulo executivo válido e suficiente, não podendo proceder a decisão de indeferimento liminar. O) Razão pela qual deverá o presente recurso ser julgado integralmente procedente, mais se ordenando o prosseguimento dos autos com as legais consequências. P) O douto despacho recorrido violou o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 703.º do CPC e no artigo 6.º do DL n.º 268/94, de 25 de outubro. Nos termos do disposto no art. 646.º, n.os 1, 2 e 3 do CPC, indica-se para instrução do presente recurso as seguintes peças processuais disponibilizadas por via eletrónica: - requerimento executivo e todos os documentos que o acompanham (ref.ª 28782906); - despacho (ref.ª 394559150). Termos em que se requer a V. Ex.ªs se dignem a julgar procedente o presente recurso e, em consequência, a revogar o douto despacho de que recorre: a) Julgando as atas juntas com o requerimento inicial como título executivo quanto ao valor peticionado a título de quotas ordinárias vencidas no período entre julho de 2015 e dezembro de 2017 e quanto às obras de reparação do telhado, com as legais consequências; Subsidiariamente, caso assim não se entenda, b) Ordenando o tribunal que convide o Recorrente a juntar todas as atas anteriores, de forma a suprir uma eventual irregularidade e a dar cumprimento ao disposto no artigo 724.º do CPC.”. Citada a executada para os termos do recurso e da execução, a mesma não respondeu à alegação do exequente.II. Objeto do recursoO âmbito recursivo é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo se forem de conhecimento oficioso (artigos 635º/4, 637º/2 e 639º/1 e 2, do Código de Processo Civil, doravante designado por “CPC”). Assim, atendendo às conclusões da alegação do apelante, cabe indagar se as atas das reuniões das assembleias de condóminos apresentadas com o requerimento executivo reúnem as condições de exequibilidade legalmente impostas quanto às quotas ordinárias vencidas entre julho de 2015 e maio de 2018 e quanto às obras de reparação do telhado e, subsidiariamente, da omissão de convite ao aperfeiçoamento.III. Fundamentação de factoCom relevância para a matéria recursiva, à luz dos documentos constantes dos autos, julgamos apurados os seguintes factos: 1. Em 30/05/2018, o exequente instaurou contra B… execução para pagamento da quantia de € 2.061,31, sendo €1.126,30 respeitante a quotas ordinárias vencidas no período compreendido entre julho de 2015 e maio de 2018, €142,76 de obras de reparação do telhado, €715,90 de obras de recuperação geral do edifício e €76,35 de juros de mora. 2. Alegou, para tanto, ser o condomínio do “Prédio sito na Rua …, Lote ../...”, sito na Rua …, …, … e …, …. - … …. 3. A executada é proprietária das frações BF e Q daquele prédio, a que corresponde a quota mensal de condomínio no valor de €32,18 (trinta e dois euros e dezoito cêntimos). 4. A executada não procedeu ao pagamento integral das quotas de condomínio vencidas em julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2015, janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2016, janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2017, janeiro, fevereiro, março, abril e maio de 2018. 5. Mais alegou que a executada é, ainda, devedora da quantia de €142,76, a título de obras de recuperação do telhado da entrada 376, pois teve lugar, em 30 de junho de 2017, uma assembleia de condóminos que aprovou um orçamento para intervenção geral de obra no prédio, devido ao estado de degradação geral das fachadas exteriores, tendo ficado determinado o pagamento do preço à entidade adjudicatária seria suportado na totalidade pelos comproprietários de acordo com a permilagem da sua área habitacional, cabendo à executada o pagamento da quantia mensal de € 71,59, segundo o plano de pagamentos iniciado em agosto de 2017 e prolongado até 31/12/2018. 6. Vencidos à presente data 10 mensalidades, a executada não as pagou. 7. Nessa assembleia foi aprovada a seguinte deliberação: “A assembleia deu autorização à administração sequente para proceder à cobrança por via judicial de todas as importâncias em dívida se assim for necessário.” 7. Interpelada ao pagamento, a executada nunca o fez. 8. Em 27/10/2017, o exequente, através das suas mandatárias, interpelou-a para proceder à quantia em dívida àquela data, que ascendia a €1.290,69, tendo a mesma, em resposta, aceitado a dívida e propondo pagá-la em prestações no valor de €50,00 cada. 9. Por carta datada de 11/12/2017, o exequente comunicou à executada que aceitava o plano de pagamento proposto, mas esta nada pagou. 10. O exequente concluiu o requerimento executivo, alegando que as quantias em dívida totalizam €1.984,96 e vencem juros de mora à taxa legal de 4% a contar da data de vencimento de cada uma das quantias em dívida, sendo os juros vencidos do valor de €76,35. 11. Juntou as atas da Assembleia de Condóminos n.os 59 e 60, três cartas interpelatórias da executada e uma sua carta de resposta. 12. A ata n.º 59, relativa à assembleia de condóminos de 30/06/207, exara que a administração de condomínio deu a conhecer aos presentes os condóminos devedores, indicando, além do mais, que B…, como proprietária das frações BF e Q, com uma quota mensal de 32,18€, deve as quotas de julho a dezembro de 2015, no total de 175,20€, bem como a sua quota parte relativa às obras de reparação do telhado da entrada 376, no total de 196,76€, as quotas do ano de 2016, no total de 386,16€, e as quotas de janeiro a junho de 2017, no total de 193,08 €. A assembleia autorizou a administração a proceder, se necessário, à cobrança judicial de todas as importâncias em dívida (doc. de fls. 20 a 24). 13. A ata n.º 60, respeitante à assembleia de condóminos realizada em 08/01/2018, revela que a administração identificou os condóminos com valores em dívida, dentre os quais consta a executada B…, como proprietária das frações BF e Q, com uma quota mensal de 32,18€, com a menção de que deve as quotas de julho a dezembro de 2015, no total de 175,20€, bem como a sua quota parte relativa às obras de reparação do telhado da entrada 376, no total de 142,76€, as quotas do ano de 2016, no total de 386,16€, e as quotas de 2017, no total de 386,16€. A assembleia autorizou a administração a proceder, se necessário, à cobrança judicial de todas as importâncias em dívida (doc. de fls. 25 a 30). 14. Em 27/10/2017, os advogados da administração do condomínio remeteram à executada carta em que solicitavam a regularização da quantia em dívida, no total de 1.290,69€, no prazo de oito dias, sob pena de cobrança por via judicial. A executada respondeu, propondo o pagamento em prestações mensais de 50,00€, plano que foi aceito pela administração do condomínio (doc. fls. 29 a 32). 15. Em 15/03/2018, os advogados da administração do condomínio remeteram à executada carta em que solicitavam contacto para acertar os termos do acordo de pagamento da quantia em dívida, no valor de 1.660,72€, e informavam estar na iminência de cobrança judicial (fls. 33). 16. A executada não esteve presente nem representada em qualquer das identificadas assembleias de condóminos. 17. Em 06/09/2018 foi pronunciado o seguinte despacho: “Como decorre do disposto no artº. 10º. nº. 5 do CPC a execução tem por base um título, pelo qual se determinam os fins e os limites da ação executiva. Os títulos executivos são os enumerados no artº. 703º. nº. 1 do referido diploma legal, entre eles os “documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva" (al. d). Dispõe ainda o artº. 724º. do C.P.C. que no requerimento executivo o exequente, para além do mais: expõe sucintamente os factos que fundamentam o pedido, quando não constem do título executivo (al. e)); formula o pedido (al. f)) e liquida a obrigação ...( al. h)). Depois, deve o mesmo vir acompanhado do título executivo e dos demais documentos complementares dos quais resulte que a obrigação é certa, líquida e exigível - cfr. artº.713º. do C.P.C. Dispõe o artº. 6º. nº. 1 do D.L. 268/94 que é título executivo a “ata da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento dos serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio” e cujo pagamento, nos termos do artº. 1424º. nº. 1 do C.C., impende sobre os condóminos, ou seja, a ata da deliberação que aprovou o orçamento das despesas necessárias à conservação e fruição das partes e não a ata da deliberação que aprovou as contas da administração ou quaisquer outras informações prestadas pela administração do condomínio. Do exposto resulta que as atas juntas ao requerimento executivo valem como título executivo apenas e tão só na parte em que aprovam o orçamento para recuperação geral do edifício (ata nº. 59 de 30/6/2017) e o orçamento ordinário para o ano de 2018 (ata nº. 60 de 8 de janeiro de 2018) e não na parte em que referem estar em dívida pelas diversas frações os valores nelas referidos. Relativamente ao valor reclamado com base na primeira das referidas atas há, porém, que referir que a obrigação dali resultante para a executada não se mostra vencida, uma vez que da referida ata consta que o valor devido por cada um dos condóminos “deve estar pago até ao último dia de dezembro de 2018”. E não se mostrando vencida a obrigação não é a mesma exequível. Por todas estas razões, e ao abrigo do disposto nos artº. 726º. nº. 2 al. a) e nº. 5 do CPC, rejeito a execução na parte em que excede a quantia de € 160,90 acrescida dos juros vencidos e vincendo calculados desde a data de vencimento de cada uma das quotas que integram aquela quantia. Custas, nesta parte, pelo exequente”.IV. Fundamentação de direitoComo antecipámos, a questão recursória restringe-se a saber se constituem título executivo as atas de deliberação da assembleia de condóminos. Na verdade, o despacho recorrido considerou “que as atas juntas ao requerimento executivo valem como título executivo apenas e tão só na parte em que aprovam o orçamento para recuperação geral do edifício (ata nº. 59 de 30/6/2017) e o orçamento ordinário para o ano de 2018 (ata nº. 60 de 8 de janeiro de 2018) e não na parte em que referem estar em dívida pelas diversas frações os valores nelas referidos”. Preceitua o artigo 6º/1, do decreto-lei n.º 268/94, de 25 de outubro que “[A] acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.” Como o artigo 703.º/1, d), e 2, do CPC, preceitua que constituem títulos executivos os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva e neles se consideram abrangidos os juros de mora, à taxa legal, cabe indagar se as atas apresentadas pelo exequente reúnem as necessárias condições de exequibilidade. A ação executiva impõe que o exequente se apresente em juízo munido de um título executivo, poisa “toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva” (artigo 10º/5 do CPC). E é o título executivo que define os limites subjetivos e objetivos da ação executiva, dele emergindo o seu fundamento, embora se controverta se a causa de pedir é o título executivo per se ou se é constituída pelos factos alegados no âmbito da obrigação subjacente, havendo ainda quem defenda que a causa de pedir é a conjunção do título e da alegação dos factos da obrigação subjacente[1]. Efetivamente, o título executivo constitui um requisito essencial da ação executiva, corporizando um instrumento probatório suficiente da obrigação exequenda, por forma a que, por si só, revele, com um mínimo de segurança, a existência do crédito que consubstancia o pedido exequendo. Esta exigência visa preservar o interesse público da segurança do património do executado, que não pode ser atingido sem um mínimo de garantia sobre a existência do direito do exequente. É neste âmbito que se insere a excecionalidade das normas avulsas que preveem títulos executivos, porque aquele artigo 703.º do CPC inscreve que à execução apenas podem servir de base os títulos que enumera[2]. Nessa medida, aderimos à posição da decisão recorrida quando afirma que a integração da previsão legal do predito artigo 6.º/1 do decreto-lei n.º 268/94, no que tange às “contribuições devidas ao condomínio” deverá ser feita com referência ao artigo 1424.º do Código Civil. E este preceito define como encargos de condomínio os respeitantes à “conservação e fruição das partes comuns do edifício”, bem como os que respeitam aos “serviços de interesse comum”, tudo suportado pelos condóminos em função do valor das suas frações. Donde se afirme que em tais despesas se devem incluir todas as que sejam indispensáveis para manterem as partes comuns em condições de poderem servir o uso a que se destinam, como pequenas despesas de manutenção ordinária ou despesas impostas por qualquer evento que tenha provocado danos extensos. Trata-se de uma responsabilidade ex lege para a qual vale o critério da proporcionalidade, ressalvada eventual convenção em contrário[3]. Donde se venha aceitando que a ata da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportados pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte[4]. De facto, à luz daquele normativo, a ata constituirá título executivo contra o condómino que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte, desde que dela conste a deliberação sobre o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio. O mesmo corresponde a afirmar que a ata da reunião da assembleia de condóminos tem força executiva se exibir o montante das contribuições devidas ao condomínio, o seu prazo de pagamento e a quota-parte do condómino devedor[5]. A decisão recorrida entendeu que as atas não constituem título executivo “na parte em que referem estar em dívida pelas diversas frações os valores nelas referidos”. Ora, as atas documentam as deliberações tomadas na reunião da assembleia de condóminos quanto à comparticipação nas contribuições e nas despesas comuns e exaram, designadamente quanto à condómina executada, os valores em dívida, concretizando os seus montantes e os respetivos períodos temporais, bem como os prazos de pagamento e a autorização para cobrança judicial. Logo, não obstante a ausência da executada nessas assembleias, são-lhe impostas tais deliberações, independentemente da sua notificação, contanto que as deliberações não tenham sido alvo de tempestiva impugnação. Nesse sentido se tem sustentado que “uma vez aprovadas e exaradas em ata, as deliberações da assembleia representam a vontade colegial e são vinculativas para os condóminos, mesmo para os que não tenham participado na reunião”[6]. Propugnamos que o mencionado artigo 6º/1 do decreto-lei 268/94 não faz depender a força executiva da ata da assembleia de condóminos da liquidação do montante concreto, certo, da dívida de cada condómino, bastando que os dados da ata e dos demais documentos que a completam permitam determinar esse valor. Cremos até bastar a menção do valor global devido ao condomínio por contribuições correntes, pela realização de despesas de conservação ou fruição das partes comuns ou para pagamento de serviços de interesse comum, se os demais dados permitirem que cada condómino, pela aplicação da permilagem da sua fração ao valor global, conheça o montante que lhe diz respeito. De todo o modo, as atas em causa exibem os valores em dívida pela executada, quer no que respeita às obras quer no que se refere às contribuições ordinárias para as despesas de condomínio. Na verdade, identificam a sua quota-parte mensal nas despesas de condomínio em função da permilagem da sua área, os períodos temporais em causa e os valores parciais e totais em jogo, assim conferindo à obrigação exequenda certeza, exigibilidade e liquidez (artigo 713º do CPC)[7]. A decisão apelada reputou de inexequível, por falta de vencimento, a obrigação relativa ao valor reclamado com base na primeira ata, o qual “deve estar pago até ao último dia de dezembro de 2018”. Com efeito, a obrigação só é exigível quando está vencida. Porém, a propósito, referencia essa ata que, a título de obras de recuperação do telhado da entrada 376, a assembleia de condóminos de 30/06/2017 aprovou um orçamento para intervenção geral de obra no prédio e determinou que o pagamento do respetivo preço seria suportado na totalidade pelos comproprietários de acordo com a permilagem da sua área habitacional. Menção que bastaria para a executada saber o valor que lhe cabe, mas a ata vai mais longe e clarifica que a ela cabe o pagamento da quantia mensal de € 71,59, segundo o plano de pagamentos iniciado em agosto de 2017 e prolongado até 31/12/2018. A execução foi instaurada em 31/05/2018 e, portanto, nessa data, ainda não estavam vencidas todas as mensalidades, já que a última se venceria em 31/12/2018. Contudo, àquela data estavam já vencidas 10 mensalidades, que a executada não pagou, e só essas foram peticionadas pelo exequente, pelo que não intuímos fundamento para a invocada inexigibilidade dessa obrigação. Uma obrigação diz-se exigível quando se encontra vencida e/ou depende da mera interpelação do devedor (777º/1 do Código Civil), pelo que sendo inquestionável que a prestação tem de ser exigível e, portanto, o seu vencimento há de ter-se por verificado à data da formulação do pedido, a verdade é que, tal como o enunciou o exequente, só estão pedidas as mensalidades já vencidas, ou seja, as que deveriam ser mensalmente pagas entre agosto de 2017 e maio de 2018. Ainda assim, mesmo que pedisse a totalidade das mensalidades, só haveria justificação para o indeferimento liminar parcial do valor relativo às mensalidades não vencidas. Tudo a significar que a impugnação recursória merece acolhimento e que, procedendo a apelação, ocorre a revogação do despacho recorrido, devendo a execução prosseguir os seus legais termos quanto à integralidade da obrigação exequenda. Esta solução torna inútil a indagação da eventual necessidade da prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento (artigo 608º/2 do CPC).* V. DispositivoAnte o exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em dar procedência à apelação e, por conseguinte, em revogar o despacho recorrido e determinar o prosseguimento da execução quando à totalidade da obrigação exequenda. Custas em função da condenação final (artigo 527º/1 do CPC).*Porto, 15 de janeiro de 2019. Maria Cecília Agante José Carvalho Rodrigues Pires ________________ [1] José Lebre de Freitas, A acção executiva: à luz do Código revisto, Almedina, 2.ª edição¸ pág. 64. [2] Rui Pinto, Novos Estudos de Processo Civil, A Execução de Dívidas de Condomínio, Petrony, 2017, pág. 196; in www.dgsi.pt: Ac. RP de 07/05/2018, processo 9990/17.3T8PRT-B.P1. [3] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume III, Coimbra Editora, 2.ª ed. revista e atualizada, pág. 431. [4] In www.dgsi.pt: Ac. RC de 20/06/2012, processo 157/10.2TBCVL-A.C1. [5] In www.dgsi.pt: Ac. RP de 04/12/2017, processo 26113/15.6T8PRT-A.P1. [6] Pires de Lima e Antunes Varela, ibidem, pág. 446. [7] In www.dgsi.pt: Ac. RC de 20/6/2012, processo 157/10.2TBCVL-A.C1; Ac. RP de 27/05/2014, processo 4393/11.6TBVLG-A.P1.