I - Na fase de instrução, a apreciação e declaração de uma nulidade ocorrida na fase de inquérito, não tem como consequência a prolação de despacho de não pronúncia, mas sim o regime dos efeitos da declaração de nulidade previstos no artigo 122.º do Código de Processo Penal. II - Ao declarar uma nulidade, está o juiz obrigado a tomar uma decisão que passa pela identificação dos atos que julga nulos ou afetados pela declaração da nulidade e a ordenar, sempre que necessário e possível, a sua repetição, aproveitando todos os atos que ainda puderem ser salvos do efeito daquela. III - Não afeta o princípio do acusatório a repercussão dos efeitos da declaração de uma nulidade ocorrida em fase de inquérito, sendo a ordem de repetição dos atos inválidos ou a ordem de execução dos atos omitidos decorrentes do regime próprio da declaração de nulidade. IV - O despacho de não pronúncia apenas deverá ser proferido sempre que os autos não contiverem indícios suficientes da prática pelo arguido dos factos que lhe são imputados, ou seja, e no rigor da expressão da lei, sempre que a decisão de deduzir acusação não possa ser comprovada judicialmente em ordem a submeter a causa a julgamento e nunca porque foi omitido pelo Ministério Público ato obrigatório que afeta a acusação formulada pelo assistente ou pelo próprio Magistrado do Ministério Público
Proc. n.º 6669/21.5T9PRT.P1 Sumário ………………………………. ………………………………. ………………………………. Acordam em Conferência na 1ª secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto 1- Relatório Nos autos nº 6669/21.5TPRT.P1 que correm os seus termos na Comarca do Porto, Juízo de Instrução Criminal do Porto, Juiz 5, foi proferido o seguinte despacho: “Da nulidade da acusação particular. Na sequência da acusação particular de fls.114 e s.s. deduzida pelo assistente que lhe imputa a prática como autor material de um crime de difamação p.p. pelo artº 180º nº1 do Cod. Penal, reagiu o arguido AA invocando a nulidade daquela acusação já que os factos que lhe são imputados correspondem na íntegra à factualidade vertida no aditamento de fls. 41 a 45 dos autos apresentados pelo assistente em complemento à queixa crime. Sucede que a queixa crime inicialmente apresentada pelo assistente fazia alusão a factos distintos, relacionados unicamente com o envio de uma missiva a BB datada de 26/01/2021 com teor, alegadamente injurioso nada sendo referido quanto aos acontecimentos ocorridos durante a assembleia geral de 18/09/2021 constantes da acusação particular de fls. 114 e s., tanto assim, que o próprio enquadramento legal era distinto, sendo inicialmente imputado ao arguido a prática de um crime de injúrias p.p. pelo artº 181º do Cod. Penal. Mais alega o requerente que, quando foi interrogado em sede de inquérito, não foi confrontado com os factos vertidos na acusação mas apenas com os constantes da queixa que deu origem aos presentes autos, pelo que não tomou conhecimento dos factos referentes ao aditamento de fls. 41 a 45 dos autos, constituindo uma nulidade prevista no artº 120 nº2 al.d) do C.P.P., nulidade esta que acarreta a consequente nulidade da acusação e a sua não pronúncia. O M.P. pronunciou-se no sentido de ser procedente a nulidade invocada. Cumpre apreciar: A nossa lei processual penal impõe como obrigatório o interrogatório do arguido, de forma a que ele nesta fase seja confrontado com os factos e com os elementos colhidos na investigação, de forma a serem observadas todas as garantias de defesa que a Constituição proclama no art. 32º nº 1. O exercício da garantia de defesa – no caso o interrogatório- não exige uma comunicação exaustiva de todos os factos que constituem o pedaço de vida em causa, mas impõe que se comuniquem ao arguido os factos concretamente imputados, as circunstâncias de tempo e lugar e modo se forem conhecidas e os elementos do processo que sustentam a imputação, caso não existam razões para vedar o conhecimento de algum meio de prova. Haverá uma violação da garantia de defesa do arguido nos casos em que são aditados outros factos na acusação suscetíveis de integrarem outros crimes, sejam ou não da mesma natureza, em relação aos quais ele não foi confrontado, uma vez que ninguém deve ser surpreendido com uma acusação, sem que antes lhe seja dada possibilidades de se defender da mesma. Como se refere no acórdão do Tribunal Constitucional nº 72/2012, a Constituição não exige que o arguido tenha conhecimento em momento anterior à acusação de todos os factos que venham a constar desta, “mas no pleno respeito das garantias de defesa consagradas na Constituição, tal conhecimento não poderá nunca ficar aquém dos factos essenciais a verter ou vertidos (…) na acusação” sob pena de violação das garantias de defesa. No caso em apreço, não obstante o despacho do Ministério Público de fls. 49 e 50 no sentido de, aquando do seu interrogatório o arguido fosse confrontado com a factualidade constante do aditamento de fls. 41 a 45, verifica-se de fls. 74 a 77 que o arguido foi apenas confrontado com os factos que constituem a queixa de fls. 5 a 12. O arguido não foi deste modo sujeito a interrogatório relativamente a todos os factos denunciados tendo sido “surpreendido” com uma acusação onde constam factos e respetiva incriminação que lhe são totalmente desconhecidos e sobre os quais não pode exercer o seu direito de defesa. O arguido podia e devia ter sido interrogado sobre os factos que integram a acusação de fls. 114 e s.s. e não foi, o que constitui a nulidade prevista no art. 120º al. d), por não ter sido praticado ato legalmente obrigatório. Assim sendo, julgo procedente a arguição da nulidade invocada, a qual acarreta a nulidade total do despacho de acusação. Impõe-se, em consequência e a final, proferir despacho de não pronúncia relativamente ao arguido AA. Pelo exposto, determino, NÃO PRONUNCIAR: AA. Custas pelo assistente que se fixam em 2 UCs” Inconformado, veio o assistente interpor recurso, tendo concluído o mesmo nos seguintes termos: I - Vem o presente recurso interposto da decisão instrutória proferida nos autos por se discordar da decisão de arquivamento dos autos e condenação do assistente em custas, por verificação da nulidade do despacho de acusação. II – O assistente, ora recorrente, deduziu acusação particular contra o arguido, pela prática de um crime de difamação, p. e p. pelo art.º 180.º, n.º 1 do C Penal. III – O arguido, aquando do seu interrogatório em fase de inquérito, o qual teve lugar em data posterior à da apresentação pelo assistente do complemento de queixa, nunca foi confrontado com esses factos, mas apenas com aqueles que constavam da queixa inicial. IV- O arguido arguiu a nulidade da acusação, na medida em que nunca tinha sido confrontado em fase de inquérito, ao contrário do que a lei impõe, com os factos que, posteriormente, vieram a constar da acusação particular. V - Ora, essa omissão, constituiu uma nulidade sanável, prevista no art.º 120.º, al. d) do C. P. Penal. VI – Bem andou o tribunal “a quo” ao decretar essa nulidade e, em consequência, ao proferir o Despacho de Não Pronúncia. VII - Contudo, a decisão recorrida é censurável na parte em que ordena o arquivamento dos autos, sem antes ordenar a remessa dos mesmos à fase de inquérito, a fim de poder sanar-se a aludida nulidade. VIII - A decisão ora recorrida peca, por um lado, por ordenar o arquivamento dos autos, em vez de determinar que, após trânsito fosse extraída certidão da decisão instrutória, e do complemento de queixa, afim de ser remetida ao competente DIAP para os fins tidos por conveniente, nomeadamente a sanação da nulidade apontada, e, por outro lado, peca por condenar o assistente em custa. IX - Se algum interveniente processual tem de ser condenado em custas, esse interveniente é certamente o M.º P.º e não o assitente. X - A decisão recorrida violou claramente o disposto nos n.ºs 2 e 3 do art. 122.º do C.P Penal Responderam ao recurso o arguido e o Digno Magistrado do Ministério Publico, junto do Tribunal da 1ª Instância, tendo ambos pugnado pelo não provimento do recurso. Neste Tribunal o Digno Procurador Geral Adjunto teve vista nos autos tendo emitido parecer no sentido do provimento do recurso. Deu-se cumprimento ao disposto no artigo 417º nº 2 do CPP, foram os autos aos vistos e procedeu-se à Conferência. Cumpre assim apreciar e decidir. Atentas as conclusões do recurso, sendo estas que balizam o seu objeto, são duas as questões que importa apreciar e decidir, a primeira se declarada nulidade de inquérito pelo Juiz de Instrução e na fase processual de instrução deverá ser proferido despacho de não pronuncia ou remetidos os autos ao MP, e a segunda se cabe ao assistente pagar as custas da decisão de não pronuncia pela verificação da nulidade. 2 - Fundamentação. Em sede de Instrução, por iniciativa do arguido que não se conformou com a acusação particular formulada pelo o assistente, veio o M. Juiz a conhecer da existência de uma nulidade ocorrida em fase de inquérito, e declarando-a, decidiu em consequência, proferir despacho de não pronuncia do arguido. Inconformado, veio agora o assistente interpor o presente recurso, aceitando a verificação da nulidade reconhecida pelo M. Juiz de Instrução, mas não aceitando que dai tivesse decorrido forçosamente a decisão de não pronuncia do arguido, pugnando pelo reconhecimento da nulidade e pela remessa dos autos ao Ministério Público para, em sede de inquérito, sanar tal nulidade. Insurge-se ainda pela sua condenação em custas, entendendo que, em bom rigor o responsável pelas custas seria sempre o MP, embora isento como é sabido. Ora, a primeira questão colocada pelo recorrente, não é a verificação ou não da nulidade ocorrida em sede de inquérito, é pacifico para todos os intervenientes processuais e para este Tribunal também, que não tendo o arguido sido ouvido a matéria que veio a integrar a acusação contra si formulada, estamos perante a nulidade prevista no artigo 120º nº 2 al. d) do CPP. O que não é aceite pelo recorrente são os efeitos que o M. Juiz de Instrução retirou dessa declaração de nulidade, entendendo, no despacho proferido e agora sob recurso que tal declaração de nulidade determinaria a não pronuncia do arguido. Defende o recorrente que haveria de ser dado cumprimento ao disposto no artigo 122º do CPP, o que não foi feito. Na sua resposta ao recurso, o magistrado do ministério público junto do Tribunal de primeira instância defendeu que e transcreve-se: “No nosso entender, a decisão da Exma. JIC não merece reparo por ser a que melhor respeita o princípio constitucional do acusatório consagrado no artigo 32° n° 5 do Constituição da República Portuguesa. Entendemos que não teria a Exma. Juíza de Instrução o poder de ordenar o aperfeiçoamento de diligencias de investigação em sede de instrução e muito menos o de reabrir a fase de inquérito, sob pena de violação deste princípio estruturante do processo penal. A estrutura acusatória do nosso processo penal impunha, como impôs à Exma. JIC, uma posição de isenção, objectividade e imparcialidade, cujos poderes de cognição estão rigorosamente limitados ao objecto do processo, previamente definido pelo conteúdo da acusação, não podendo dirigir recomendações ou convites para aperfeiçoamento da investigação, muito menos ordenar, ao Ministério Publico que este rectifique diligencias numa atitude processual de "tentativa/erro''. A Exma. JIC, chegado o momento de decidir em fase de Instrução, ou considerava que a Acusação continha todos os elementos essenciais - sem a existência de nulidades - e que haveria "indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ..." e proferia despacho de pronúncia, ou fazia como fez - um juízo negativo e proferia despacho de não pronúncia. Não poderia ordenar, que os autos regressassem ao Ministério Público para que fosse completada alguma diligencia. No caso, tendo sido a nulidade da acusação sido arguida em Instrução, bem andou a Exma. Juíza de Instrução ao proferir despacho nos termos do art° 308° do CPP de não pronúncia e ao não devolver o processo ao Ministério Público para sanar o vício sob pena de atropelo à estrutura acusatória do processo penal, respeitando essa separação que nos diz que cabe exclusivamente ao Ministério Publico a investigação criminal, não podendo o juiz interferir no inquérito, salvo nos termos estritamente previstos na lei.” Cita, a propósito, o recente acórdão do TRC, relatado pela Exma. Juiz Desembargadora Isabel Valongo, de 2/3/2022, disponível em www.dgsi.pt, onde se referiu: "A pretendida sanação da nulidade na instrução exorbita os fins assinalados no art 286° n° 1 do CPP. E atento o princípio acusatório do processo penal, inviável se torna a pretensão de que por força da 2." parte do artigo 122º, nº 2 do CPP, a M. JIC ordene a prática do acto em sede de instrução ou que para o efeito devolva o processo ao MP para repristinar o inquérito.” Ora, com o devido respeito, não se nos afigura assistir razão ao Exmo. Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal de 1ª Instância, tal qual, também não se afigurou ao Exmo. Sr. Procurador Geral Adjunto junto deste Tribunal da Relação. Só aparentemente a questão colocada pode ser resolvida com recurso ao princípio do acusatório, não sendo, no caso, fator decisivo na apreciação e na decisão a tomar. Conforme é sabido, o modelo acusatório exige uma separação entre quem investiga e acusa e a entidade que julga, sendo elementar que quem acusa não julga e que quem julga não tem intervenção na acusação. A fase de instrução, presidida por um juiz, apenas tem lugar quando requerida pelo arguido, que pretenda invalidar a decisão de acusação, de iniciativa do ministério público ou de iniciativa do assistente, ou por este quando pretenda contrariar a decisão de não acusação, cabendo a este sujeito processual no próprio Requerimento de abertura da Instrução (RAI) formular a sua própria acusação, de molde a ser esta o objeto da instrução. O objeto da instrução é assim o de confirmação ou não de uma daquelas decisões, culminando com um despacho de pronúncia ou de não pronúncia. Não cabe no objeto da instrução qualquer convite ao aperfeiçoamento de uma acusação, seja ela de iniciativa do MP ou do assistente, e nisto, claro está, fica salvaguardado o modelo acusatório do nosso sistema penal. Tal modelo, com consagração constitucional, não fica afetado quando – ainda que em sede de instrução – é o juiz chamado a apreciar a verificação de uma nulidade. O regime de apreciação das nulidades tem o seu recorte nos artigos 118º e seguintes do CPP, sendo que as nulidades sanáveis– dependentes de arguição – e referentes ao inquérito são invocáveis até ao encerramento do debate instrutório, ou não havendo lugar a instrução, até cindo dias após a notificação do despacho que tiver encerrado o inquérito – cfr- artigo 120º nº 3 al. c) do CPP. Pode assim o Juiz de Instrução ser chamado a apreciar e conhecer uma nulidade ocorrida em fase de inquérito, sendo a mesma arguida em sede de instrução, haverá que ser decidida nessa fase processual. Sendo conhecida em sede de instrução, e sendo verificada a sua existência, então que consequências dai decorrerão? Entendeu o M. Juiz de Instrução que as consequências daquela concreta nulidade seria a prolação de um despacho de não pronúncia. Ou seja, a acusação formulada pelo assistente não podia ser confirmada por si, juiz de instrução, pois o arguido não teve conhecimento de toda a matéria que foi carreada para o inquérito e como tal de toda a matéria que consta da acusação, assentando a sua base legal no disposto no artigo 120º nº 2 al. d) do CPP. Em termos práticos, e de molde a ser entendido o “direito” do despacho, negou-se justiça ao assistente porque o titular do inquérito, o MP, esqueceu-se de notificar o arguido de parte da matéria objeto da queixa. Tem isto qualquer sentido? É claro que não tem sentido, e mais, não tem qualquer enquadramento legal, e estamos muito longe de ser afetado o modelo acusatório do nosso sistema penal. Em não tem enquadramento legal por duas ordens de razões. Primeiro, não é possível ignorar – independentemente da fase processual em que os autos se encontrem – o regime dos efeitos da declaração de nulidade previstos no artigo 122º do CPP, sendo de elementar entendimento que ao declarar uma nulidade está o juiz obrigado a tomar uma decisão que passa pela identificação dos atos que passam a considerar-se inválidos e ordena sempre que necessário e possível, a sua repetição, aproveitando todos os atos que ainda puderem ser salvos do efeito daquela. Em segundo lugar, o despacho de não pronúncia, apenas deverá ser proferido sempre que os autos não contiverem indícios suficientes da prática pelo arguido dos factos que lhe são imputados, ou seja, e no rigor da expressão da lei, sempre que a decisão de deduzir acusação não possa ser comprovada judicialmente em ordem a submeter a causa a julgamento. A decisão de deduzir acusação, será o objeto da instrução, e é sobre a mesma que será proferido despacho de pronúncia ou não pronúncia. No caso destes autos não foi apreciada a decisão de deduzir acusação pelo assistente, o que foi apreciado foi a verificação de uma nulidade que, não influiu na decisão de deduzir acusação, mas que impede que esta fosse formulada nos termos em que o foi, e mais, tal nulidade não pode ser apontada a qualquer omissão por parte do assistente. Temos assim como evidente que o despacho de não pronúncia proferido, não tem base legal, tendo sido fundamentado não na inexistência de indícios relativamente ao comportamento do arguido, e consequentemente na infirmação dos pressupostos da decisão de deduzir acusação, mas sim na insusceptibilidade de aquela acusação em concreto poder sustentar a submissão do arguido a julgamento por ter ocorrido anteriormente à sua formulação a omissão de um ato obrigatório que afeta o processado posterior. Caberia tão somente ao M. Juiz de Instrução, ao reconhecer aquela nulidade em concreto, dar despacho de confirmação da sua ocorrência e ordenar a remessa dos autos ao MP para proceder à notificação do arguido relativamente à matéria da queixa em falta, sendo todos os atos posterior anulados, com a obrigação de serem repetidos, repetição essa onde se inseria, a possível futura decisão de o assistente formular nova acusação. Só assim se dá cumprimento ao regime traçado no artigo 122º do CPP, que, e pelo facto de os autos estarem em sede de instrução, não desaparece da ordem jurídica. Por último, uma só palavra relativamente ao acórdão proferido pela Relação do Coimbra e citado em sede de resposta ao recurso pelo MP junto do Tribunal de 1ª Instância. Conforme resulta do texto do acórdão proferido pelo Tribunal de Relação de Coimbra, nos autos nº 168/18.0GAACB-A.C1, datado de 2 de março de 2022, e sobre o tema, apenas se retiram as seguintes afirmações: “A pretendida sanação da nulidade na instrução exorbita os fins assinalados no art 286º nº 1 do CPP. E atento o princípio acusatório do processo penal, inviável se torna a pretensão de que por força da 2.ª parte do artigo 122.º, n.º 2 do CPP, a Mm.ª JIC ordene a prática do acto em sede de instrução ou que para o efeito devolva o processo ao MP para repristinar o inquérito. De todo o modo, como lhe competia, o tribunal recorrido determinou que após trânsito fosse extraída “certidão da presente decisão e de fls.170, 179, 180, 192, 206, 207, 222 a 230, 245 a 251, 252, 259 a 263” e remetida ao DIAP competente, para os fins tidos por convenientes, acompanhada do inquérito apenso 34/19.1 PECSC.” Como vimos, não perfilhamos tal tese, e da leitura do acórdão citado pelo MP junto do Tribunal da 1ª Instância, não retiramos a profundidade da decisão, contudo assinala-se que ainda assim, viu esse Tribunal de Recurso como satisfatória a decisão do Tribunal Recorrido em remeter ao DIAP certidão da sua decisão, para os fins tidos por convenientes, o que nos permite entender que, também esse Tribunal de Recurso alimentou a esperança que ainda fosse possível assegurar os direitos de quem pretende justiça. Quanto às custas a fixar a final, teremos que dizer que não é possível assacar ao assistente qualquer responsabilidade pela ocorrência da nulidade em causa, sendo violador do princípio da confiança exigir ao assistente que, antes da dedução da acusação, confirmasse nos autos a sua validade processual, e que auditasse os atos e as omissões dos senhores funcionários judiciais ou dos senhores magistrados do Ministério Público, pelo que não podem ser tributadas custas a cargo do assistente. 3 - Decisão Pelo exposto, julga-se o recurso provido e consequentemente; A) Revoga-se o despacho recorrido, devendo ser substituído por outro que, reconhecendo a nulidade invocada, ordene a remessa dos autos ao DIAP para aí ser sanada, sendo anulados todos os actos posterior, nomeadamente a acusação proferida pelo assistente, prosseguindo os autos de inquérito o seu curso normal desde aquele ponto. B) O assistente não é responsável a título de custas pela declaração da nulidade acima referida, sendo responsável o Ministério Público que está isento de custas. Sem custas Porto, 5 de julho de 2023 Raul Esteves Maria Joana Grácio Paulo Costa
Proc. n.º 6669/21.5T9PRT.P1 Sumário ………………………………. ………………………………. ………………………………. Acordam em Conferência na 1ª secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto 1- Relatório Nos autos nº 6669/21.5TPRT.P1 que correm os seus termos na Comarca do Porto, Juízo de Instrução Criminal do Porto, Juiz 5, foi proferido o seguinte despacho: “Da nulidade da acusação particular. Na sequência da acusação particular de fls.114 e s.s. deduzida pelo assistente que lhe imputa a prática como autor material de um crime de difamação p.p. pelo artº 180º nº1 do Cod. Penal, reagiu o arguido AA invocando a nulidade daquela acusação já que os factos que lhe são imputados correspondem na íntegra à factualidade vertida no aditamento de fls. 41 a 45 dos autos apresentados pelo assistente em complemento à queixa crime. Sucede que a queixa crime inicialmente apresentada pelo assistente fazia alusão a factos distintos, relacionados unicamente com o envio de uma missiva a BB datada de 26/01/2021 com teor, alegadamente injurioso nada sendo referido quanto aos acontecimentos ocorridos durante a assembleia geral de 18/09/2021 constantes da acusação particular de fls. 114 e s., tanto assim, que o próprio enquadramento legal era distinto, sendo inicialmente imputado ao arguido a prática de um crime de injúrias p.p. pelo artº 181º do Cod. Penal. Mais alega o requerente que, quando foi interrogado em sede de inquérito, não foi confrontado com os factos vertidos na acusação mas apenas com os constantes da queixa que deu origem aos presentes autos, pelo que não tomou conhecimento dos factos referentes ao aditamento de fls. 41 a 45 dos autos, constituindo uma nulidade prevista no artº 120 nº2 al.d) do C.P.P., nulidade esta que acarreta a consequente nulidade da acusação e a sua não pronúncia. O M.P. pronunciou-se no sentido de ser procedente a nulidade invocada. Cumpre apreciar: A nossa lei processual penal impõe como obrigatório o interrogatório do arguido, de forma a que ele nesta fase seja confrontado com os factos e com os elementos colhidos na investigação, de forma a serem observadas todas as garantias de defesa que a Constituição proclama no art. 32º nº 1. O exercício da garantia de defesa – no caso o interrogatório- não exige uma comunicação exaustiva de todos os factos que constituem o pedaço de vida em causa, mas impõe que se comuniquem ao arguido os factos concretamente imputados, as circunstâncias de tempo e lugar e modo se forem conhecidas e os elementos do processo que sustentam a imputação, caso não existam razões para vedar o conhecimento de algum meio de prova. Haverá uma violação da garantia de defesa do arguido nos casos em que são aditados outros factos na acusação suscetíveis de integrarem outros crimes, sejam ou não da mesma natureza, em relação aos quais ele não foi confrontado, uma vez que ninguém deve ser surpreendido com uma acusação, sem que antes lhe seja dada possibilidades de se defender da mesma. Como se refere no acórdão do Tribunal Constitucional nº 72/2012, a Constituição não exige que o arguido tenha conhecimento em momento anterior à acusação de todos os factos que venham a constar desta, “mas no pleno respeito das garantias de defesa consagradas na Constituição, tal conhecimento não poderá nunca ficar aquém dos factos essenciais a verter ou vertidos (…) na acusação” sob pena de violação das garantias de defesa. No caso em apreço, não obstante o despacho do Ministério Público de fls. 49 e 50 no sentido de, aquando do seu interrogatório o arguido fosse confrontado com a factualidade constante do aditamento de fls. 41 a 45, verifica-se de fls. 74 a 77 que o arguido foi apenas confrontado com os factos que constituem a queixa de fls. 5 a 12. O arguido não foi deste modo sujeito a interrogatório relativamente a todos os factos denunciados tendo sido “surpreendido” com uma acusação onde constam factos e respetiva incriminação que lhe são totalmente desconhecidos e sobre os quais não pode exercer o seu direito de defesa. O arguido podia e devia ter sido interrogado sobre os factos que integram a acusação de fls. 114 e s.s. e não foi, o que constitui a nulidade prevista no art. 120º al. d), por não ter sido praticado ato legalmente obrigatório. Assim sendo, julgo procedente a arguição da nulidade invocada, a qual acarreta a nulidade total do despacho de acusação. Impõe-se, em consequência e a final, proferir despacho de não pronúncia relativamente ao arguido AA. Pelo exposto, determino, NÃO PRONUNCIAR: AA. Custas pelo assistente que se fixam em 2 UCs” Inconformado, veio o assistente interpor recurso, tendo concluído o mesmo nos seguintes termos: I - Vem o presente recurso interposto da decisão instrutória proferida nos autos por se discordar da decisão de arquivamento dos autos e condenação do assistente em custas, por verificação da nulidade do despacho de acusação. II – O assistente, ora recorrente, deduziu acusação particular contra o arguido, pela prática de um crime de difamação, p. e p. pelo art.º 180.º, n.º 1 do C Penal. III – O arguido, aquando do seu interrogatório em fase de inquérito, o qual teve lugar em data posterior à da apresentação pelo assistente do complemento de queixa, nunca foi confrontado com esses factos, mas apenas com aqueles que constavam da queixa inicial. IV- O arguido arguiu a nulidade da acusação, na medida em que nunca tinha sido confrontado em fase de inquérito, ao contrário do que a lei impõe, com os factos que, posteriormente, vieram a constar da acusação particular. V - Ora, essa omissão, constituiu uma nulidade sanável, prevista no art.º 120.º, al. d) do C. P. Penal. VI – Bem andou o tribunal “a quo” ao decretar essa nulidade e, em consequência, ao proferir o Despacho de Não Pronúncia. VII - Contudo, a decisão recorrida é censurável na parte em que ordena o arquivamento dos autos, sem antes ordenar a remessa dos mesmos à fase de inquérito, a fim de poder sanar-se a aludida nulidade. VIII - A decisão ora recorrida peca, por um lado, por ordenar o arquivamento dos autos, em vez de determinar que, após trânsito fosse extraída certidão da decisão instrutória, e do complemento de queixa, afim de ser remetida ao competente DIAP para os fins tidos por conveniente, nomeadamente a sanação da nulidade apontada, e, por outro lado, peca por condenar o assistente em custa. IX - Se algum interveniente processual tem de ser condenado em custas, esse interveniente é certamente o M.º P.º e não o assitente. X - A decisão recorrida violou claramente o disposto nos n.ºs 2 e 3 do art. 122.º do C.P Penal Responderam ao recurso o arguido e o Digno Magistrado do Ministério Publico, junto do Tribunal da 1ª Instância, tendo ambos pugnado pelo não provimento do recurso. Neste Tribunal o Digno Procurador Geral Adjunto teve vista nos autos tendo emitido parecer no sentido do provimento do recurso. Deu-se cumprimento ao disposto no artigo 417º nº 2 do CPP, foram os autos aos vistos e procedeu-se à Conferência. Cumpre assim apreciar e decidir. Atentas as conclusões do recurso, sendo estas que balizam o seu objeto, são duas as questões que importa apreciar e decidir, a primeira se declarada nulidade de inquérito pelo Juiz de Instrução e na fase processual de instrução deverá ser proferido despacho de não pronuncia ou remetidos os autos ao MP, e a segunda se cabe ao assistente pagar as custas da decisão de não pronuncia pela verificação da nulidade. 2 - Fundamentação. Em sede de Instrução, por iniciativa do arguido que não se conformou com a acusação particular formulada pelo o assistente, veio o M. Juiz a conhecer da existência de uma nulidade ocorrida em fase de inquérito, e declarando-a, decidiu em consequência, proferir despacho de não pronuncia do arguido. Inconformado, veio agora o assistente interpor o presente recurso, aceitando a verificação da nulidade reconhecida pelo M. Juiz de Instrução, mas não aceitando que dai tivesse decorrido forçosamente a decisão de não pronuncia do arguido, pugnando pelo reconhecimento da nulidade e pela remessa dos autos ao Ministério Público para, em sede de inquérito, sanar tal nulidade. Insurge-se ainda pela sua condenação em custas, entendendo que, em bom rigor o responsável pelas custas seria sempre o MP, embora isento como é sabido. Ora, a primeira questão colocada pelo recorrente, não é a verificação ou não da nulidade ocorrida em sede de inquérito, é pacifico para todos os intervenientes processuais e para este Tribunal também, que não tendo o arguido sido ouvido a matéria que veio a integrar a acusação contra si formulada, estamos perante a nulidade prevista no artigo 120º nº 2 al. d) do CPP. O que não é aceite pelo recorrente são os efeitos que o M. Juiz de Instrução retirou dessa declaração de nulidade, entendendo, no despacho proferido e agora sob recurso que tal declaração de nulidade determinaria a não pronuncia do arguido. Defende o recorrente que haveria de ser dado cumprimento ao disposto no artigo 122º do CPP, o que não foi feito. Na sua resposta ao recurso, o magistrado do ministério público junto do Tribunal de primeira instância defendeu que e transcreve-se: “No nosso entender, a decisão da Exma. JIC não merece reparo por ser a que melhor respeita o princípio constitucional do acusatório consagrado no artigo 32° n° 5 do Constituição da República Portuguesa. Entendemos que não teria a Exma. Juíza de Instrução o poder de ordenar o aperfeiçoamento de diligencias de investigação em sede de instrução e muito menos o de reabrir a fase de inquérito, sob pena de violação deste princípio estruturante do processo penal. A estrutura acusatória do nosso processo penal impunha, como impôs à Exma. JIC, uma posição de isenção, objectividade e imparcialidade, cujos poderes de cognição estão rigorosamente limitados ao objecto do processo, previamente definido pelo conteúdo da acusação, não podendo dirigir recomendações ou convites para aperfeiçoamento da investigação, muito menos ordenar, ao Ministério Publico que este rectifique diligencias numa atitude processual de "tentativa/erro''. A Exma. JIC, chegado o momento de decidir em fase de Instrução, ou considerava que a Acusação continha todos os elementos essenciais - sem a existência de nulidades - e que haveria "indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ..." e proferia despacho de pronúncia, ou fazia como fez - um juízo negativo e proferia despacho de não pronúncia. Não poderia ordenar, que os autos regressassem ao Ministério Público para que fosse completada alguma diligencia. No caso, tendo sido a nulidade da acusação sido arguida em Instrução, bem andou a Exma. Juíza de Instrução ao proferir despacho nos termos do art° 308° do CPP de não pronúncia e ao não devolver o processo ao Ministério Público para sanar o vício sob pena de atropelo à estrutura acusatória do processo penal, respeitando essa separação que nos diz que cabe exclusivamente ao Ministério Publico a investigação criminal, não podendo o juiz interferir no inquérito, salvo nos termos estritamente previstos na lei.” Cita, a propósito, o recente acórdão do TRC, relatado pela Exma. Juiz Desembargadora Isabel Valongo, de 2/3/2022, disponível em www.dgsi.pt, onde se referiu: "A pretendida sanação da nulidade na instrução exorbita os fins assinalados no art 286° n° 1 do CPP. E atento o princípio acusatório do processo penal, inviável se torna a pretensão de que por força da 2." parte do artigo 122º, nº 2 do CPP, a M. JIC ordene a prática do acto em sede de instrução ou que para o efeito devolva o processo ao MP para repristinar o inquérito.” Ora, com o devido respeito, não se nos afigura assistir razão ao Exmo. Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal de 1ª Instância, tal qual, também não se afigurou ao Exmo. Sr. Procurador Geral Adjunto junto deste Tribunal da Relação. Só aparentemente a questão colocada pode ser resolvida com recurso ao princípio do acusatório, não sendo, no caso, fator decisivo na apreciação e na decisão a tomar. Conforme é sabido, o modelo acusatório exige uma separação entre quem investiga e acusa e a entidade que julga, sendo elementar que quem acusa não julga e que quem julga não tem intervenção na acusação. A fase de instrução, presidida por um juiz, apenas tem lugar quando requerida pelo arguido, que pretenda invalidar a decisão de acusação, de iniciativa do ministério público ou de iniciativa do assistente, ou por este quando pretenda contrariar a decisão de não acusação, cabendo a este sujeito processual no próprio Requerimento de abertura da Instrução (RAI) formular a sua própria acusação, de molde a ser esta o objeto da instrução. O objeto da instrução é assim o de confirmação ou não de uma daquelas decisões, culminando com um despacho de pronúncia ou de não pronúncia. Não cabe no objeto da instrução qualquer convite ao aperfeiçoamento de uma acusação, seja ela de iniciativa do MP ou do assistente, e nisto, claro está, fica salvaguardado o modelo acusatório do nosso sistema penal. Tal modelo, com consagração constitucional, não fica afetado quando – ainda que em sede de instrução – é o juiz chamado a apreciar a verificação de uma nulidade. O regime de apreciação das nulidades tem o seu recorte nos artigos 118º e seguintes do CPP, sendo que as nulidades sanáveis– dependentes de arguição – e referentes ao inquérito são invocáveis até ao encerramento do debate instrutório, ou não havendo lugar a instrução, até cindo dias após a notificação do despacho que tiver encerrado o inquérito – cfr- artigo 120º nº 3 al. c) do CPP. Pode assim o Juiz de Instrução ser chamado a apreciar e conhecer uma nulidade ocorrida em fase de inquérito, sendo a mesma arguida em sede de instrução, haverá que ser decidida nessa fase processual. Sendo conhecida em sede de instrução, e sendo verificada a sua existência, então que consequências dai decorrerão? Entendeu o M. Juiz de Instrução que as consequências daquela concreta nulidade seria a prolação de um despacho de não pronúncia. Ou seja, a acusação formulada pelo assistente não podia ser confirmada por si, juiz de instrução, pois o arguido não teve conhecimento de toda a matéria que foi carreada para o inquérito e como tal de toda a matéria que consta da acusação, assentando a sua base legal no disposto no artigo 120º nº 2 al. d) do CPP. Em termos práticos, e de molde a ser entendido o “direito” do despacho, negou-se justiça ao assistente porque o titular do inquérito, o MP, esqueceu-se de notificar o arguido de parte da matéria objeto da queixa. Tem isto qualquer sentido? É claro que não tem sentido, e mais, não tem qualquer enquadramento legal, e estamos muito longe de ser afetado o modelo acusatório do nosso sistema penal. Em não tem enquadramento legal por duas ordens de razões. Primeiro, não é possível ignorar – independentemente da fase processual em que os autos se encontrem – o regime dos efeitos da declaração de nulidade previstos no artigo 122º do CPP, sendo de elementar entendimento que ao declarar uma nulidade está o juiz obrigado a tomar uma decisão que passa pela identificação dos atos que passam a considerar-se inválidos e ordena sempre que necessário e possível, a sua repetição, aproveitando todos os atos que ainda puderem ser salvos do efeito daquela. Em segundo lugar, o despacho de não pronúncia, apenas deverá ser proferido sempre que os autos não contiverem indícios suficientes da prática pelo arguido dos factos que lhe são imputados, ou seja, e no rigor da expressão da lei, sempre que a decisão de deduzir acusação não possa ser comprovada judicialmente em ordem a submeter a causa a julgamento. A decisão de deduzir acusação, será o objeto da instrução, e é sobre a mesma que será proferido despacho de pronúncia ou não pronúncia. No caso destes autos não foi apreciada a decisão de deduzir acusação pelo assistente, o que foi apreciado foi a verificação de uma nulidade que, não influiu na decisão de deduzir acusação, mas que impede que esta fosse formulada nos termos em que o foi, e mais, tal nulidade não pode ser apontada a qualquer omissão por parte do assistente. Temos assim como evidente que o despacho de não pronúncia proferido, não tem base legal, tendo sido fundamentado não na inexistência de indícios relativamente ao comportamento do arguido, e consequentemente na infirmação dos pressupostos da decisão de deduzir acusação, mas sim na insusceptibilidade de aquela acusação em concreto poder sustentar a submissão do arguido a julgamento por ter ocorrido anteriormente à sua formulação a omissão de um ato obrigatório que afeta o processado posterior. Caberia tão somente ao M. Juiz de Instrução, ao reconhecer aquela nulidade em concreto, dar despacho de confirmação da sua ocorrência e ordenar a remessa dos autos ao MP para proceder à notificação do arguido relativamente à matéria da queixa em falta, sendo todos os atos posterior anulados, com a obrigação de serem repetidos, repetição essa onde se inseria, a possível futura decisão de o assistente formular nova acusação. Só assim se dá cumprimento ao regime traçado no artigo 122º do CPP, que, e pelo facto de os autos estarem em sede de instrução, não desaparece da ordem jurídica. Por último, uma só palavra relativamente ao acórdão proferido pela Relação do Coimbra e citado em sede de resposta ao recurso pelo MP junto do Tribunal de 1ª Instância. Conforme resulta do texto do acórdão proferido pelo Tribunal de Relação de Coimbra, nos autos nº 168/18.0GAACB-A.C1, datado de 2 de março de 2022, e sobre o tema, apenas se retiram as seguintes afirmações: “A pretendida sanação da nulidade na instrução exorbita os fins assinalados no art 286º nº 1 do CPP. E atento o princípio acusatório do processo penal, inviável se torna a pretensão de que por força da 2.ª parte do artigo 122.º, n.º 2 do CPP, a Mm.ª JIC ordene a prática do acto em sede de instrução ou que para o efeito devolva o processo ao MP para repristinar o inquérito. De todo o modo, como lhe competia, o tribunal recorrido determinou que após trânsito fosse extraída “certidão da presente decisão e de fls.170, 179, 180, 192, 206, 207, 222 a 230, 245 a 251, 252, 259 a 263” e remetida ao DIAP competente, para os fins tidos por convenientes, acompanhada do inquérito apenso 34/19.1 PECSC.” Como vimos, não perfilhamos tal tese, e da leitura do acórdão citado pelo MP junto do Tribunal da 1ª Instância, não retiramos a profundidade da decisão, contudo assinala-se que ainda assim, viu esse Tribunal de Recurso como satisfatória a decisão do Tribunal Recorrido em remeter ao DIAP certidão da sua decisão, para os fins tidos por convenientes, o que nos permite entender que, também esse Tribunal de Recurso alimentou a esperança que ainda fosse possível assegurar os direitos de quem pretende justiça. Quanto às custas a fixar a final, teremos que dizer que não é possível assacar ao assistente qualquer responsabilidade pela ocorrência da nulidade em causa, sendo violador do princípio da confiança exigir ao assistente que, antes da dedução da acusação, confirmasse nos autos a sua validade processual, e que auditasse os atos e as omissões dos senhores funcionários judiciais ou dos senhores magistrados do Ministério Público, pelo que não podem ser tributadas custas a cargo do assistente. 3 - Decisão Pelo exposto, julga-se o recurso provido e consequentemente; A) Revoga-se o despacho recorrido, devendo ser substituído por outro que, reconhecendo a nulidade invocada, ordene a remessa dos autos ao DIAP para aí ser sanada, sendo anulados todos os actos posterior, nomeadamente a acusação proferida pelo assistente, prosseguindo os autos de inquérito o seu curso normal desde aquele ponto. B) O assistente não é responsável a título de custas pela declaração da nulidade acima referida, sendo responsável o Ministério Público que está isento de custas. Sem custas Porto, 5 de julho de 2023 Raul Esteves Maria Joana Grácio Paulo Costa