1. A impossibilidade superveniente da lide constitui causa de extinção da instância (art. 277º, al. e), do Código de Processo Civil) e ocorre quando por força de circunstância superveniente não for possível manter a pretensão do autor. 2. Para se aferir sobre a ocorrência de causa determinativa da impossibilidade superveniente é, pois, necessário, antes de tudo, definir o objeto a lide, o qual é evidenciado pelo litigio tal como é configurado na petição inicial. 3. Decretada a restituição provisória da posse, legitimada em contrato de utilização de loja em centro comercial e cuja vigência é discutida à data da prolação da decisão por ser controvertida a sua extinção por resolução, a constatação em fase de oposição de que tal contrato caducou torna desnecessária a continuação da lide, por impossibilidade superveniente, por ter cessado definitivamente o contrato que legitimava a utilização da loja.
Acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa I. Relatório “C.., S.A” , (…) veio requerer, nos termos do artigo 377.º e seguintes do Código de Processo Civil, providência cautelar especificada de restituição provisória da posse contra “A…, S.A.”, (…), alegando, para tanto, e em síntese, que: - A requerente celebrou com a requerida a 17 de setembro de 2015, um contrato de utilização de loja em centro comercial, nos termos do qual aquela lhe cedeu onerosamente a utilização da loja n.º 0.104 com área de 94 m2, sita no piso 0 do centro comercial, à data, denominado (…), destinada à atividade comercial de venda ao público de pronto a vestir de homem e mulher e respetivos acessórios de moda; - O contrato foi celebrado pelo período de 6 anos, com início a 1 de outubro de 2015 e termo a 30 de setembro de 2021, conforme a cláusula 5ª do documento apresentado sob o nº 1 com o requerimento inicial; - Em 19 de abril de 2021 a requerente foi surpreendida com a oficialização, pela requerida, da resolução do contrato, tendo a mesma comunicado em 10 de maio de 2021 que iria vedar e reassumir a loja a partir das 0h30 do dia 11 de maio, o que fez, durante a noite, entaipando a loja contra a vontade e a capacidade de resistência da requerente, que, assim, impedida de utilizar o estabelecimento comercial foi ofendida na sua posse, traduzindo a atuação da requerida uma evidente ação direta proibida por lei. Termina, pedindo cumulativamente: i. Que seja julgada procedente a presente providência cautelar especificada de restituição provisória da posse, julgada e decretada, sem que haja lugar à audição da requerida, a restituição imediata da posse e a detenção da loja e do seu estabelecimento comercial, nela instalado; ii. Seja ordenado à requerida que se abstenham de praticar quaisquer atos que impeçam, dificultem ou limitem a normal utilização da loja, e exploração do estabelecimento comercial nela instalado pela requerente. iii. Seja decretada nula, pelo menos em sede de providência cautelar, a cláusula 17ª do contrato de utilização de loja em Centro Comercial (…); iv. Seja determinada aplicação de uma sanção pecuniária compulsória à requerida no valor de € 5.000,00 (cinco mil euros) por cada dia de atraso na restituição da posse e detenção da loja e/ou estabelecimento comercial nela instalado, à requerente, contados da data em que forem citadas ou notificadas da decisão judicial que ordene a providência e a mencionada restituição; v. Seja decretada a aplicação de uma sanção pecuniária compulsória à requerida por cada ato que pratiquem que impeça, dificulte ou limite a normal utilização da loja bem como a normal exploração do estabelecimento comercial pela requerente, instalada na referida loja depois de terem sido citadas ou notificadas da decisão judicial que lhe ordene que se abstenham de praticar tais atos. * Produzida a prova indicada pela requerente sem audião da requerida, foi proferida decisão final, com o seguinte dispositivo: “Em face do exposto, o Tribunal decide julgar parcialmente procedente, por provado, o procedimento cautelar de restituição provisória da posse proposto por C…, S.A. contra A…, S.A. e, em consequência: 1- Ordena a restituição provisória da posse à requerente da loja n.º 0.104 com área de 94 m2, sita no piso 0 do centro comercial atualmente denominado (…), 2- Condena a requerida a abster-se de praticar quaisquer atos que impeçam, dificultem ou limitem a normal utilização da loja e exploração do estabelecimento comercial nela instalado pela requerente. Ao cumprimento da diligência poderá aplicar-se, se necessário, o disposto no artigo 757.º, n. º2 e 3 do CPC. Após a investidura da requerente na posse, notifique o(s) requerido(s) nos termos do artigo 366.º, n. º6, 370.º e 372.º do Código de Processo Civil. Custas pela requerente – artigo 539.º do CPC. Notifique.” * “A…, S.A”, deduziu oportunamente oposição, alegando, em síntese, que: - Procedeu à resolução do contrato face ao crédito significativo que detinha sobre a requerente e que esta não revelava vontade de reduzir, extinguindo por essa via a relação contratual que tinham estabelecido; - A requerente não procedeu à entrega das chaves na sequência de solicitação que lhe foi dirigida, e a requerida apenas colocou um tapume amovível na loja, em tudo igual aos que habitualmente são colocados aquando de remodelações ou alterações, não tendo impedido a requerente de aceder ao seu interior, tendo esta vindo a deixar a loja totalmente devoluta de pessoas e bens em 22 de julho de 2021; - A decisão proferida acarreta a possibilidade de a requerente poder voltar a exercer a sua atividade, numa loja cujo direito de utilização já não dispunha (fruto da resolução contratual legitimamente operada), fazendo com que o seu proprietário se veja privado da loja, do seu rendimento e da gestão do espaço comercial de forma integrada, como é legitimo que o faça; - Podendo ainda suceder que a requerente continue a utilizar a loja ainda para além do prazo original constante do próprio contrato de utilização, que termina no dia 30 de setembro de 2021. Conclui, pedindo seja revogada a decisão proferida, ordenando-se a entrega da loja à proprietária. * Designada data para inquirição das testemunhas indicadas pela requerida, não veio a mesma a verificar-se, por ter sido proferida decisão no decorrer da audiência convidando as partes a pronunciarem-se sobre a possível ocorrência de caducidade do contrato de locação no qual foi fundada a aparência de posse da requerente, com impacto na manutenção da sua posse relativamente à loja identificada nos autos, a determinar uma eventual extinção da instância por inutilidade superveniente da lide com o levantamento da providência decretada. * As partes pronunciaram-se nos autos sobre a possibilidade de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, com oposição da requerente, após o que foi proferida a seguinte decisão: “Nos presentes autos de restituição provisória da posse foi, por decisão de fls. 191 e ss. decreta essa mesma restituição da loja 0.104, sita no piso 0 do Centro Comercial actualmente denominado (…). Esta restituição foi decretada tendo por fundamento de facto e de direito, entre outros, a existência da posse por parte da requerente baseada no contrato de instalação de lojista em centro comercial e na constatação jurídica de que nos termos do art. 1031.º, no 2, do CC “o locatário que for privado da coisa ou perturbado no exercício dos seus direitos pode usar, mesmo contra o locador, dos meios facultado ao possuidor nos art.s 1276.º e ss.”. Concluiu assim a decisão dos autos no sentido que “o lojista pode utilizar os meios de defesa da posse sobre o local onde exerça a sua actividade, mesmo contra o proprietário ou promotor do Centro Comercial. Entendeu-se também ser de conferir à requerente a tutela da posse por “a manutenção do contrato (por força da resolução operada pela requerida) ser controvertida entre as partes…”. Acontece à presente data o contrato se encontra extinto por caducidade, independentemente da licitude ou ilicitude da resolução do contrato – e consequências da mesma resultante. Dos factos provados constantes da sentença de fls. 190 dos autos resulta, no ponto 4, que “O contrato foi celebrado pelo período de 6 anos o qual teve início a 1 de Outubro de 2015 e tem termo a 30 de Setembro de 2021”. Desse mesmo contrato e da mesma cláusula de onde consta o prazo de duração do contrato consta ainda que “2. O contrato caduca no seu termo. As partes poderão, no entanto, por mútuo acordo, celebrar novo contrato nos termos e condições a acordar entre ambas”. Ou seja, está prevista a caducidade automática e afastada a renovação automática do contrato, uma vez que se prevê a necessidade de acordo para a celebração de um novo contrato e dos seus termos e condições. Quer-se com isto dizer que se, à data da decisão de restituição provisória da posse, existia um contrato cuja vigência ainda era válida (ainda que de forma controvertida atenta a resolução operada pela requerida), neste momento inexiste qualquer contrato válido que confira à requerida um direito de uso do estabelecimento e, consequentemente a sua posse. E nem se diga que o que confere a posse à requerente é a sentença, porque a sentença se limitou a reconhecer essa posse com base na vigência temporal de um contrato susceptível de conferir esta tutela possessória à requerente. Mesmo que na presente oposição ou na acção principal se viesse a reconhecer de forma provisória ou definitiva, respectivamente, a invalidade da resolução contratual operada pela requerida, ainda assim o contrato estaria extinto por caducidade à data de 30 de Setembro de 2021, deixando a requerente de ter título para reter e ocupar o referido espaço. Não está por isso em causa a licitude ou ilicitude da resolução a qual apenas relevava até à data de extinção do contrato por qualquer outra forma contratualmente prevista. Está em causa, isso sim, a extinção do contrato automática por decurso do prazo nele previsto. Não poderia nunca o Tribunal manter a restituição de uma posse, baseada num contrato extinto por motivo diverso – e não controvertido – daquele que constituiu uma das causas de pedir do presente procedimento. É assim entendimento do Tribunal que se verifica uma inutilidade superveniente da presente instância cautelar, que determina a extinção da instância. Como é óbvio não obsta esta decisão do Tribunal à eventual pertinência da acção principal e da aferição da ilicitude da resolução, na perspetiva da baliza temporal até dia 30 de Setembro de 2021. E diz-se “eventual” porque se desconhece os termos do segmento petitório dessa mesma acção, podendo os pedidos formulados com base na resolução terem perfeito cabimento legal, para o caso de ali se reconhecer que a resolução contratual com base no incumprimento foi ilícita. Mas mesmo que essa resolução contratual tenha sido ilícita, essa ilicitude não tem a virtualidade de impedir a extinção do contrato por caducidade. Como se referiu em sede de audiência de julgamento, de nada releva a apreciação da matéria da oposição apresentada pela requerida, na medida em que a mesma se refere à resolução contratual e sua licitude e, neste momento o contrato está extinto, se não pela resolução, ao menos e sempre pela sua caducidade por decurso do prazo peremptório nele previsto. Decisão: Em face do exposto, e pelos motivos supra explanados, declara-se a extinção da presente instância cautelar por inutilidade superveniente da lide. Custas pela requerente que beneficiou do presente procedimento cautelar. Notifique e registe.” * Não se conformando com esta decisão, dela vem a requerente recorrer, concluindo a motivação com as conclusões que se passam a transcrever: “1. A requerente, ora recorrente, apresentou uma providência cautelar de restituição da posse, em síntese, por considerar que a requerida, ora recorrida, agiu ilicitamente após a interpelação de resolução do contrato de utilização de loja em centro comercial celebrado entre as partes, tendo aquela esbulhado a requerente, ora recorrente, da loja e do estabelecimento comercial nela instalado pela calada da noite, fazendo uso de meios da justiça privada. 2. Decidiu o tribunal a quo, sem o contraditório da requerida, ora recorrida, que a “conduta da requerida constitui um ato, ilícito, de justiça privada. A requerente foi esbulhada da coisa, uma vez que a requerida, ao colocar um taipal na frente da loja, não permitiu a sua utilização pela requerente. (…)” 3. . A providência cautelar de restituição da posse não prevê que se alegue e demonstre a existência efetiva do direito, mas tão somente se procura proteger a aparência do direito e proteger a paz social, reconhecendo-se que o exercício dos poderes de facto através da qual a posse revela faz pressentir um verdadeiro direito real de gozo a que corresponde aquela materialidade. 4. Vem o tribunal a quo revogar a decisão anteriormente proferida, decidindo pela inutilidade superveniente da lide por considerar que o contrato se considera caducado, sem, contudo, ponderar a actuação comprovadamente ilícita da recorrida, premiando-a com a decisão de que se recorre. 5. Entre a decretação da providência cautelar e a audiência de julgamento da oposição da recorrida decorreram 4 meses, durante os quais o contrato de utilização de loja em centro comercial alegadamente caducou, não podendo a requerente considerar que a caducidade seja relevante para a presente providência cautelar especificada de restituição da posse, pois não era a causa de extinção do contrato à data dos factos, nem tão pouco releva para os factos à data em que os mesmos foram praticados. 6. É comumente aceite na doutrina e na jurisprudência que para a providência cautelar especificada de restituição provisória da posse ser decretada, no âmbito do pressuposto da posse, basta que se prove a aparência do direito, sendo a sua titularidade ou existência efetiva do mesmo discutida em sede de ação principal, o que se espera. Sendo aí relevante a causa de extinção do contrato de utilização de loja, ou ainda em sede de nova instância. 7. Salvo opinião diversa, a decisão que ora se recorre permite que os centros comerciais, e qualquer outra entidade, atuarem como bem entenderem, em desrespeito pela lei, nomeadamente lançando mão da justiça privada, sanando-se a ilicitude por no decurso da ação judicial o contrato caducar. 8. Tendo em conta que a justiça e os tribunais portugueses são morosos nas suas decisões, e atendendo que pela natureza das coisas os litígios que geram esbulho violento da loja ocorrem no fim do contrato, a probabilidade de este caducar no decurso da ação é grande. 9. Pelo exposto, perfilhar pela opinião do tribunal é permitir que os centros comerciais atuem dilatoriamente no processo de modo que este extravase o prazo de caducidade, de modo que a atuação deles fique sanada pela mesma, o que não é conducente com o fim das providências cautelares, nem tão pouco com o espírito do processo civil, que expressamente condena a justiça privada. 10. Assim, a caducidade poderia validar e sanar a ilicitude da justiça privada, nomeadamente da acção direta, o que não se coaduna com o preceituado no artigo 1.º do CPC. Acresce que, a parte que apresenta a providência cautelar, no presente caso a requerente, fica ainda mais prejudicada pela morosidade da justiça, pois a mesma, caso ultrapasse o prazo de caducidade do contrato, na opinião do tribunal, sana a actuação ilícita da requerida. 11. Pelo exposto, não deve a recorrente, ora recorrente, ser prejudicada pela morosidade dos tribunais portugueses, e em contrapartida a requerida, ora recorrente, sair beneficiada pela atuação de justiça privada, que é veementemente condenada e proibida pela lei processual portuguesa. Nestes termos e nos melhores de direito, sempre com o douto suprimento de V. Exas., Venerandos Desembargadores, requer-se que seja julgado procedente o presente recurso, sendo alterada a sentença, no sentido do prosseguimento da providência cautelar especificada de restituição da posse, só assim fazendo V. Exas., Venerandos Desembargadores, a vossa costumada justiça!!!”. * A requerida contra-alegou e formulou as seguintes conclusões: “1 – Embora a Recorrente pareça insurgir-se contra a morosidade da justiça e a estrutura do procedimento cautelar, se atrasos houve só aquela se ficam a dever, como parece decorrer dos incidentes que bafejaram o inicio do procedimento cautelar. 2 – Por outro lado, não existe qualquer atraso que tenha prejudicado a Recorrente como se constata pelo facto de continuar a utilizar a loja, com o respaldo de uma decisão cautelar, sem pagar e após ter terminado, por caducidade, o contrato que havia sido celebrado entre as partes. 3 – De um ponto de vista objetivo, e se desconsiderarmos a resolução que havia operado em data anterior, o contrato de utilização de loja em Centro Comercial sempre caducaria em 30 de Setembro de 2021, sem possibilidade de renovação, conforme resulta inequivocamente da cláusula 5ª do contrato junto pela Requerente, no seu requerimento inicial, como doc. n.º 1: 2. “O contrato de utilização será celebrado pelo prazo de 6 (seis) anos, o qual tem inicio a 1 de Outubro de 2015 e termo em 30 de Setembro de 2021. 4. O contrato caduca no seu termo. As partes poderão no entanto, por mútuo acordo, celebrar novo contrato nos termos e condições a acordar entre ambas.” 4 - Independentemente da válida resolução do contrato, nesta data de 30 de Setembro de 2021 a Requerente já não dispunha de qualquer direito de utilização da loja, não dispondo de título que legitime a sua posse das lojas em questão e inexistindo fundamento para que, contra a vontade da requerida, sua legitima proprietária, se mantenha, sem qualquer fundamento legal ou contratual, na posse da aludida loja. 5 - Constatando o tribunal que, na data agendada para a inquirição de testemunhas, -10/12/2021 (71 dias após ter ocorrido a caducidade do contrato) – o contrato, independentemente de cessação por outro motivo, em data anterior, já teria caducado, bem andou ao decidir declarar a extinção da presente instância cautelar, por inutilidade superveniente da lide. 6 – Concluindo-se, como na decisão proferida pelo tribunal a quo, que“…de nada releva a apreciação da matéria da oposição apresentada pela requerida, na medida em que a mesma se refere à resolução contratual e sua licitude e, neste momento o contrato está extinto, se não pela resolução, ao menos e sempre pela sua caducidade por decurso do prazo peremptório nele previsto.” Nestes termos e nos melhores de direito, que V. Exas. doutamente suprirão, mantendo-se a douta decisão proferida pelo tribunal a quo, nos seus exatos termos, será feita a costumada JUSTIÇA.” * Admitido o recurso e cumpridos os vistos legais, importa decidir. * II. Objeto do recurso O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das partes, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. arts. 635º, nº 4, 639º, nº 1, e 662º, nº 2, todos do Código de Processo Civil), sendo que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e é livre na interpretação e aplicação do direito (cf. art.º 5º, nº3 do mesmo Código). No caso em apreço cabe decidir se na fase de oposição a procedimento cautelar – restituição provisória de posse - existe fundamento para não prosseguir com o julgamento e determinar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide em virtude de ter ocorrido na pendência da causa a caducidade do contrato que serviu de fundamento à legitimação da posse. III. Fundamentação de Facto Os factos a atender são os que resultam do relatório supra, e bem assim, os seguintes: A decisão que decretou a providência deu como provados os seguintes factos: “1. A requerente explora a marca de artigos de vestuário de homem, mulher e acessórios (…). 2. A requerida explora um Centro Comercial sito na freguesia de (…), atualmente denominado (…), destinado ao exercício do comércio a retalho composto por lojas e espaços destinados a prestação de serviços, distribuídas de acordo com uma planificação técnica, espaços comuns de circulação e lazer, e infraestruturas de apoio necessárias ou convenientes ao exercício da atividade comercial pelos lojistas. 3. Por acordo escrito datado de 17 de Setembro de 2015, M…, S.A., na qualidade de detentora do Centro Comercial identificado em 1), então denominado de (…), e Classe e D…, S.A., legalmente representados, assinaram um documento denominado Contrato de Utilização de Loja em Centro Comercial, nos termos do qual a primeira declarou ceder à segunda e esta declarou receber a utilização da loja n.º 0.104 com área de 94 m2, sita no piso 0 do centro comercial referido em 1), destinada exclusivamente à atividade comercial de venda ao público de pronto a vestir de homem e mulher e respetivos acessórios de moda, com a designação comercial (…) a qual deveria ser exercida de forma continuada e ininterrupta durante todo o tempo de abertura ao público do centro comercial, nos termos a definir pela primeira; 4. O contrato foi celebrado pelo período de 6 anos, o qual teve início a 1 de outubro de 2015 e tem termo a 30 de setembro de 2021; 5. Ficou acordado que a requerente pagaria pela utilização uma retribuição periódica mensal resultante da soma de duas parcelas, uma fixa e outra variável, nos termos estipulados na cláusula 4.º, que aqui se dá por reproduzida; 6. O valor mensal de remuneração fixa ficou pré-determinada, não podendo em caso algum a remuneração mensal ser inferior a tal valor e sendo o mesmo de € 3.995,00, por mês, sem prejuízo das atualizações anuais, sendo aquele valor referente a 1 de abril de 2015; 7. A remuneração variável corresponde à diferença entre 7% da faturação bruta (vendas sem IVA) mensal verificado na loja, e a remuneração mínima pré-determinada, só sendo considerada para a remuneração total se exceder o valor da remuneração fixa. 8. Simultaneamente, e igualmente habitual, a requerente ficou ainda obrigada a comparticipar nas despesas e encargos com o funcionamento, utilização e promoção do centro comercial. 9. Na cláusula 17.º do contrato ficou a constar o seguinte: “1. Constitui motivo de resolução do contrato pela Primeira Contraente: a) O não pagamento à Primeira Contraente de qualquer quanta devida ao abrigo deste contrato. (…) 3. Após resolução do contrato nos termos referidos no número anterior, a PRIMEIRA CONTRAENTE entrará de imediato na detenção da loja, sem prejuízo do direito de exigir o pagamento da multa em que incorrer a SEGUNDA CONTRAENTE até ao dia da comunicação de rescisão e da perda pela SEGUNDA CONTRAENTE de todas as quantias pagas e obras efetuadas. 4. Em qualquer caso de revogação ou resolução do contrato em apreço, a SEGUNDA CONTRAENTE obriga-se a entregar as chaves da loja à PRIMEIRA CONTRAENTE a fim de esta verificar o seu estado. 5. Resolvido o contrato nos termos previstos nos números anteriores, a PRIMEIRA CONTRAENTE tem o direito de utilizar a chave, em seu poder, da porta exterior da loja para reassumir a detenção da loja ou de, não lhe tendo aquela chave sido entregue usar os meios necessários e adequados para reassumir a detenção da mesma loja. 6. A não aceitação pela SEGUNDA CONTRAENTE do fundamento invocado pela PRIMEIRA CONTRAENTE para o exercício do direito de resolução apenas confere aquela o direito de acionar judicialmente a PRIMEIRA CONTRAENTE não podendo opor-se à produção dos efeitos próprios da resolução operada que se haverá por válida e eficaz e, designadamente, não podendo impedir ou dificultar os atos que a PRIMEIRA CONTRAENTE desenvolva como meio de reassumir a detenção da loja ou, posteriormente, no âmbito do exercício dos seus direitos de proprietária. 7. Se, à data em que a PRIMEIRA CONTRAENTE reassumir a detenção da loja existirem nesta loja mercadorias, móveis, máquinas ou quaisquer outros produtos ou equipamentos que a SEGUNDA CONTRAENTE tenha o direito de levantar, a PRIMEIRA CONTRAENTE fica pelo prazo de 30 dias, investida na posição de sua fiel depositária, devendo proceder ao arrolamento daqueles bens e podendo promover, a expensas da SEGUNDA CONTRAENTE, a sua transferência para outro local. 8. No prazo de 30 dias referido no número anterior pode a SEGUNDA CONTRAENTE, mediante o pagamento das despesas e encargos em que a PRIMEIRA CONTRAENTE haja incorrido enquanto fiel depositária, designadamente com a remoção dos bens para outro local e com a armazenagem destes, proceder ao sue levantamento, salvo se a PRIMEIRA CONTRAENTE houver alegado direito de retenção dos mesmos bens, no todo ou em parte, com fundamento no não pagamento pela SEGUNDA de quaisquer quantias devidas à data em que a resolução declarada opere os seus efeitos. 8.1. O levantamento dos bens pela SEGUNDA CONTRAENTE quando a PRIMEIRA tenha exercido o direito de retenção só poderá ser feito contra pagamento de todas as quantias de que esta seja credora.” 10. No ano de 2018, a requerente passou por dificuldades financeiras o que a forçou a apresentar em tribunal um Plano Especial de Revitalização em agosto de 2019, buscando dessa forma uma solução para se reorganizar em todos os níveis. O PER foi aprovado também pela requerida, que ali reclamou créditos, tendo votado favoravelmente ao plano, tendo a decisão que a homologou transitado em julgado a 4 de agosto de 2020; 11. Considerando as dificuldades financeiras sentidas, requerente e requerida assinaram uma adenda ao contrato de utilização de loja em centro comercial, em que a primeira se confessou devedora à segunda do valor de € 72.728,60, com referência a 2 de Setembro de 2019, correspondente à remuneração fixa e encargos comuns relativos ao período compreendido entre Setembro de 2018 e Setembro de 2019, reconhecendo ainda ser devedora do valor de € 12.545,18 correspondentes à remuneração fixa e encargos comuns, incluindo o IVA, dos meses de Novembro e Dezembro de 2019, vencidos em Outubro e Novembro de 2019; 12. Além de outras condições, acordaram numa diminuição, por bonificação, de valor igual a 30% da remuneração fixa mensal, diminuindo à dívida o montante de 15.360,36 euros, ficando a requerente, com referência a setembro de 2019, a dever a importância de 54.663,96 euros, a pagar em 21 prestações mensais e sucessivas. Acordaram ainda que o montante de 12,545,18 euros seria pago com as bonificações em duas prestações mensais e sucessivas. 13. A requerente estava convencida que a bonificação de 30% se aplicaria à remuneração fixa à data, sem prejuízo das atualizações anuais, sem nunca considerar que a mesma fosse aumentada, como foi para o montante de 5.035,70 euros. 14. Devido à situação pandémica causada pela doença COVID-19, durante o ano de 2020 foi apenas devida a componente variável da remuneração, apesar de a requerida ter faturado e a requerente pago a remuneração fixa e despesas comuns dos meses de janeiro e fevereiro de 2020 no valor de € 10.983,88; 15. Devido à situação pandémica em que o mundo se encontra desde março de 2020, os centros comerciais não funcionaram o número de horas acordados nos contratos, não tendo funcionado de todo durante 4 meses em 2020 e outros 4 meses em 2021. 16. Houve restrição horária dos centros comerciais e a limitação de pessoas dentro das lojas, o que levou a uma diminuição drástica do fluxo de tesouraria da requerente, não tendo conseguindo proceder ao pagamento de todas as remunerações variáveis e despesas comuns entre os meses de março e dezembro; 17. Após a autorização de reabertura dos centros comerciais estes não funcionaram no número de horas contratadas, havendo restrições horárias e de número de pessoas dentro dos centros comerciais e das próprias lojas, impedindo que o fluxo de clientela seja reduzido ao que seria de esperar e que está na base dos contratos de utilização de loja em centro comercial; 18. A requerente abordou a requerida, manifestando discordância quanto ao aumento da remuneração fixa e assim como apelou para que fossem tidas em contas circunstâncias provocadas pela doença Covid-19, mas a requerida, por carta datada de 6 de novembro de 2020, interpelou a requerente para proceder ao pagamento da totalidade das quantias em falta, continuando a cobrar os mesmos valores das despesas comuns; 19. Por carta datada de 19 de abril de 2021, a requerida declarou à requerente que, face ao não pagamento do montante de 62.535,67 euros, liquidado a 5 de abril d2021, no prazo concedido de 10 dias, sob pena de resolução, vinham comunicar a resolução do contrato com efeitos a 18 de abril de 2021, solicitando a imediata entrega da loja e das chaves nos termos contratuais; 20. No dia 10 de maio de 2021 a requerida enviou um e-mail pelas 23 horas a informar que iriam vedar e reassumir a loja a partir das 0h30 do dia 11 de maio; 21. No dia 11 de maio, contra a vontade da requerente, a requerida entaipou a porta e montra da loja da requente, no qual colocou uma porta com fechadura, impedindo o acesso ao interior da loja dos funcionários e clientes, impedindo o funcionamento da loja.” * Está ainda evidenciado o seguinte facto: A cláusula 5ª do contrato celebrado entre as partes no seu nº 2, dispõe: “O contrato caduca no seu termo. As partes poderão no entanto, por mútuo acordo, celebrar novo contrato nos termos e condições a acordar entre ambas”. IV. Fundamentação de Direito No âmbito deste procedimento cautelar intentado por “C…, S.A” contra “A…, S.A”, foi proferida decisão que determinou a restituição provisória da posse, à requerente, da loja n.º 0.104, sita no piso 0 do centro comercial atualmente denominado (…), e condenou a requerida a abster-se de praticar quaisquer atos que impedissem, dificultassem ou limitassem a normal utilização da loja e a exploração do estabelecimento comercial nela instalado pela requerente. À requerente foi reconhecido o direito de utilizar os meios de defesa da posse sobre o local onde exercia a sua atividade, com base em contrato de utilização da loja em centro comercial, cuja vigência era controvertida à data da decisão em virtude de a requerente não aceitar a resolução do contrato que havia sido operado pela requerida, tendo-se, então, concluído pela aparência da existência do direito da requerente e pela necessidade de manter e respeitar o status quo até à prolação de decisão que resolvesse a questão de forma definitiva. A providência foi determinada sem audição da requerida. Dispõe o art. 372º, do Código de Processo Civil: “1 - Quando o requerido não tiver sido ouvido antes do decretamento da providência, é-lhe lícito, em alternativa, na sequência da notificação prevista no n.º 6 do artigo 366.º: a) Recorrer, nos termos gerais, do despacho que a decretou, quando entenda que, face aos elementos apurados, ela não devia ter sido deferida; b) Deduzir oposição, quando pretenda alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinem a sua redução, aplicando-se, com as adaptações necessárias, o disposto nos artigos 367.º e 368.º. (…) 3 - No caso a que se refere a alínea b) do n.º 1, o juiz decide da manutenção, redução ou revogação da providência anteriormente decretada, cabendo recurso desta decisão, e, se for o caso, da manutenção ou revogação da inversão do contencioso; qualquer das decisões constitui complemento e parte integrante da inicialmente proferida.” Visando prevenir os riscos de injustiça decorrentes da prolação de uma decisão cautelar não precedida de contraditório, a lei concede ao recorrido duas possibilidades de agir contra uma decisão que lhe seja desfavorável: ou recorre (al. a), do nº 2, do sobredito preceito legal), ou deduz oposição (al. b), do mesmo nº 2), devendo recorrer a este meio quanto pretenda alegar factos novos, nomeadamente, factos principais, que não foram inicialmente levados ao conhecimento do julgador (factos excecionais que visem obstar à pretensão do requerente), ou factos meramente instrumentais, que visem abalar a convicção do julgador quanto à verificação dos factos que sustentaram o decretamento da providência, cabendo ao requerido/opoente, a prova duns e doutros[1]. Ainda nos termos daquela mesma disposição legal, o requerido pode limitar-se a requerer a produção de novos meios probatórios em ordem a abalar a convicção anteriormente firmada pelo juiz. O objetivo da oposição é, como se disse, demonstrar que não se verificam os fundamentos da medida cautelar, ou determinar a sua redução. “No âmbito da oposição, o juiz deve expressar na decisão que venha a proferir a nova convicção que puder formar a partir de uma discussão mais alargada proporcionada pelo exercício do contraditório, com resultados na revogação da medida ou na sua redução aos justos limites, de acordo com o que, ainda que em termos também provisórios, resultar apurado nesta fase do procedimento”.[2] No caso dos autos, notificada da providência decretada, a requerida optou por deduzir oposição, e fê-lo, propugnando pela revogação da restituição provisória da posse da loja à requerente, alegando, para tanto, que à data em que foi tomada tal decisão a relação contratual estava extinta em consequência da resolução do contrato, e que, de todo o modo, seria previsível a extinção do mesmo contrato, mas por caducidade, por referência à data de 30 de setembro de 2021, o que significaria que a decidir-se pela manutenção da providência, a requerente poderia continuar a utilizar a loja para além do prazo original constante do próprio contrato de utilização. Indicou prova. A Mª juíza do tribunal a quo decidiu que não se justificava proceder ao julgamento da oposição, por ter concluído que em face da prova documental existente nos autos o sobredito contrato de utilização de loja em centro comercial tinha, entretanto, caducado, tendo assim concluído pela inutilidade superveniente da lide e pela consequente extinção da instância. A inutilidade superveniente da lide constitui causa de extinção da instância (art. 277º, al. e), do Código de Processo Civil). A inutilidade superveniente da lide dá-se quando por circunstâncias ocorridas na pendência da instância a pretensão do autor “(…) encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida (…)”, quando a solução do litígio deixa de interessar por o autor ter logrado atingir o resultado pretendido por outra via[3]. “A inutilidade superveniente decorre em geral dos casos em que o efeito pretendido já foi alcançado por via diversa, sendo o caso mais típico o do pagamento da quantia peticionada ou, em geral, o cumprimento espontâneo da obrigação em causa ou a entrega do bem reivindicado”.[4] “A instância extingue-se por inutilidade superveniente da lide, quando uma ocorrência processual torna a instância desnecessária. E parece claro que o exemplo mais flagrante de inutilidade superveniente ocorre quando o fim pretendido com a demanda é alcançado, na pendência da causa, independentemente ou antes da decisão judicial. A instância extingue-se sempre que se torne, supervenientemente, inútil, ou seja, sempre que por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão que o autor ou requerente actuava na acção se mostrar satisfeita. Assim, sempre que o resultado ou efeito jurídico visado com a acção se mostrar atingido e, portanto, a solução do litígio deixar de interessar é claro que o processo não deve continuar, mas antes cessar. A instância extingue-se porque se tornou inútil o prosseguimento da lide. Verificado o facto, o tribunal não conhece do mérito da causa, limitando-se a declarar aquela extinção. Face a este enunciado é apodíctico adiantar que o facto susceptível de determinar a extinção da instância por inutilidade de lide, além de dever ser superveniente, ou seja, de verificação ulterior, deve encerrar, em si, virtualidades que nos permitam concluir que o resultado ou efeito jurídico visado com a acção se mostra atingido. Para a integração do conceito em causa é, pois, necessário averiguar, antes de tudo o mais, qual é o objecto da lide, determinado em razão da pretensão ou pretensões deduzidas pelo Autor/AA na sua petição inicial.”[5] O processo tem início com a apresentação da petição inicial em juízo (art. 259º, nº 1, do Código de Processo Civil), sendo nela que o autor/demandante solicita ao tribunal a providência jurisdicional que julga adequada à satisfação do direito que reclama. É o pedido que conforma o objeto do processo. A instância torna-se estável quanto aos sujeitos e ao objeto do processo com a citação (art. 260º Código Processo Civil), sem prejuízo das alterações previstas e consentidas pela lei (alteração do pedido, da causa de pedir, intervenção de novas partes). O objeto da presente instância foi delineado pela requerente do procedimento cautelar. À luz do que se deixou exposto, a caducidade do contrato ocorrida na pendência da instância cautelar não conduz à extinção da instância por inutilidade da lide, pois ao invés de consubstanciar a satisfação do resultado visado pela requerente com a ação cautelar, constitui um obstáculo real à manutenção da medida que foi anteriormente decretada a favor daquela. Mas o prosseguimento da lide também pode deixar de interessar se em consequência de evento ocorrido na pendência da causa não for possível manter a pretensão do autor, quando se concluir que o seu pedido já não pode ter acolhimento, ocorrendo nessas circunstâncias a extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide (art. 277º, al. e), do Código de Processo Civil). Como está provado nos autos, por acordo escrito datado de 17 de setembro de 2015, M…, S.A., na qualidade de detentora do Centro Comercial identificado em 1), então denominado de (…), e C…, S.A., legalmente representados, assinaram um documento denominado Contrato de Utilização de Loja em Centro Comercial, nos termos do qual a primeira declarou ceder à segunda e esta declarou receber a utilização da loja n.º 0.104 com área de 94 m2, sita no piso 0 do centro comercial. Tal contrato foi celebrado pelo período de 6 anos, o qual teve início a 1 de outubro de 2015, com termo a 30 de setembro de 2021, e nos termos da cláusula 5ª, nº 2, do dito contrato, as partes deixaram expressamente consignado o seguinte: “O contrato caduca no seu termo. As partes poderão no entanto, por mútuo acordo, celebrar novo contrato nos termos e condições a acordar entre ambas”. A caducidade é uma das formas de extinção dos contratos. O contrato caduca quando sobrevém o prazo acordado para a sua extinção, implicando, natural e necessariamente, a extinção das obrigações dele decorrentes[6]. A caducidade ocorre “(…) quando a cessação do contrato advém de um facto jurídico não dependente de uma declaração de vontade; ou seja, o vínculo contratual não cessa por força de uma declaração de vontade emitida com essa finalidade, mas ipso facto”[7]. Ora, perante a sobredita cláusula é inequívoco que o contrato cessou no dia 30 de setembro de 2021, o que significa que se extinguiram a partir de então, de forma definitiva, as obrigações dele decorrentes para cada uma das partes. A extinção do dito contrato na pendência da providência cautelar, ao abrigo do qual foi sustentado, indiciariamente, o direito da requerente, fez cessar qualquer controvérsia possível sobre a manutenção da sua vigência, e desaparecendo do universo jurídico, de forma definitiva, a relação contratual estabelecida entre as partes, deixou de ser possível manter o direito de posse em tempo reconhecido à requerente. Embora continue a existir a loja objeto do contrato, a possibilidade de continuar a sua exploração deixou de ser possível, por ter deixado de existir o contrato que sustentava tal exploração. E deste modo, não sendo possível manter o direito anteriormente reconhecido à requerente por facto superveniente ocorrido na pendência da lide, torna-se desnecessária a sua continuação, com o julgamento da oposição (no âmbito da qual não poderia inclusivamente deixar de ser abordada a mesma questão, até porque fora suscitada pela requerida na oposição apresentada e que conduziria inevitavelmente à revogação da providência decretada e à extinção do processo), cabendo, assim, ainda que com recurso à figura jurídica da impossibilidade superveniente da lide (que tal como a inutilidade superveniente se encontra prevista na já mencionada alínea e), do art. 277º, do Código de Processo Civil) manter a decisão recorrida de extinção da instância e dela extrair a consequência necessária, qual seja, a da revogação da medida cautelar oportunamente decretada. V. Decisão Na sequência do exposto, acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso da requerente/apelante, e em manter a decisão de extinção da presente instância, ainda que por impossibilidade superveniente da lide, o que acarreta a revogação da providência decretada. Custas a cargo do apelante. Notifique. 31/3/2022 Cristina Lourenço Ferreira de Almeida Teresa Prazeres Pais _______________________________________________________ [1] José Lebre de Freitas, Montalvão Machado, Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 2001, pág. 43. [2] António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta; Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, 2ª Edição, pág. 372. [3] José Lebre de Freitas, ob. cit. pág. 512. [4] António Abrantes Geraldes, ob. cit. pág. 339. [5] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22/11/2018 (processo 4144/17.1T8LSB.L1S2), acessível em www.dgsi.pt. [6] António Menezes Cordeio, “Direito das Obrigações”, AAFDL, 1986, pág. 186. [7] Acórdão do STJ de 30/04/2019 – processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/205317" target="_blank">3271/15.4T8STR.E1</a>.S1, acessível em www.dgsi.pt
Acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa I. Relatório “C.., S.A” , (…) veio requerer, nos termos do artigo 377.º e seguintes do Código de Processo Civil, providência cautelar especificada de restituição provisória da posse contra “A…, S.A.”, (…), alegando, para tanto, e em síntese, que: - A requerente celebrou com a requerida a 17 de setembro de 2015, um contrato de utilização de loja em centro comercial, nos termos do qual aquela lhe cedeu onerosamente a utilização da loja n.º 0.104 com área de 94 m2, sita no piso 0 do centro comercial, à data, denominado (…), destinada à atividade comercial de venda ao público de pronto a vestir de homem e mulher e respetivos acessórios de moda; - O contrato foi celebrado pelo período de 6 anos, com início a 1 de outubro de 2015 e termo a 30 de setembro de 2021, conforme a cláusula 5ª do documento apresentado sob o nº 1 com o requerimento inicial; - Em 19 de abril de 2021 a requerente foi surpreendida com a oficialização, pela requerida, da resolução do contrato, tendo a mesma comunicado em 10 de maio de 2021 que iria vedar e reassumir a loja a partir das 0h30 do dia 11 de maio, o que fez, durante a noite, entaipando a loja contra a vontade e a capacidade de resistência da requerente, que, assim, impedida de utilizar o estabelecimento comercial foi ofendida na sua posse, traduzindo a atuação da requerida uma evidente ação direta proibida por lei. Termina, pedindo cumulativamente: i. Que seja julgada procedente a presente providência cautelar especificada de restituição provisória da posse, julgada e decretada, sem que haja lugar à audição da requerida, a restituição imediata da posse e a detenção da loja e do seu estabelecimento comercial, nela instalado; ii. Seja ordenado à requerida que se abstenham de praticar quaisquer atos que impeçam, dificultem ou limitem a normal utilização da loja, e exploração do estabelecimento comercial nela instalado pela requerente. iii. Seja decretada nula, pelo menos em sede de providência cautelar, a cláusula 17ª do contrato de utilização de loja em Centro Comercial (…); iv. Seja determinada aplicação de uma sanção pecuniária compulsória à requerida no valor de € 5.000,00 (cinco mil euros) por cada dia de atraso na restituição da posse e detenção da loja e/ou estabelecimento comercial nela instalado, à requerente, contados da data em que forem citadas ou notificadas da decisão judicial que ordene a providência e a mencionada restituição; v. Seja decretada a aplicação de uma sanção pecuniária compulsória à requerida por cada ato que pratiquem que impeça, dificulte ou limite a normal utilização da loja bem como a normal exploração do estabelecimento comercial pela requerente, instalada na referida loja depois de terem sido citadas ou notificadas da decisão judicial que lhe ordene que se abstenham de praticar tais atos. * Produzida a prova indicada pela requerente sem audião da requerida, foi proferida decisão final, com o seguinte dispositivo: “Em face do exposto, o Tribunal decide julgar parcialmente procedente, por provado, o procedimento cautelar de restituição provisória da posse proposto por C…, S.A. contra A…, S.A. e, em consequência: 1- Ordena a restituição provisória da posse à requerente da loja n.º 0.104 com área de 94 m2, sita no piso 0 do centro comercial atualmente denominado (…), 2- Condena a requerida a abster-se de praticar quaisquer atos que impeçam, dificultem ou limitem a normal utilização da loja e exploração do estabelecimento comercial nela instalado pela requerente. Ao cumprimento da diligência poderá aplicar-se, se necessário, o disposto no artigo 757.º, n. º2 e 3 do CPC. Após a investidura da requerente na posse, notifique o(s) requerido(s) nos termos do artigo 366.º, n. º6, 370.º e 372.º do Código de Processo Civil. Custas pela requerente – artigo 539.º do CPC. Notifique.” * “A…, S.A”, deduziu oportunamente oposição, alegando, em síntese, que: - Procedeu à resolução do contrato face ao crédito significativo que detinha sobre a requerente e que esta não revelava vontade de reduzir, extinguindo por essa via a relação contratual que tinham estabelecido; - A requerente não procedeu à entrega das chaves na sequência de solicitação que lhe foi dirigida, e a requerida apenas colocou um tapume amovível na loja, em tudo igual aos que habitualmente são colocados aquando de remodelações ou alterações, não tendo impedido a requerente de aceder ao seu interior, tendo esta vindo a deixar a loja totalmente devoluta de pessoas e bens em 22 de julho de 2021; - A decisão proferida acarreta a possibilidade de a requerente poder voltar a exercer a sua atividade, numa loja cujo direito de utilização já não dispunha (fruto da resolução contratual legitimamente operada), fazendo com que o seu proprietário se veja privado da loja, do seu rendimento e da gestão do espaço comercial de forma integrada, como é legitimo que o faça; - Podendo ainda suceder que a requerente continue a utilizar a loja ainda para além do prazo original constante do próprio contrato de utilização, que termina no dia 30 de setembro de 2021. Conclui, pedindo seja revogada a decisão proferida, ordenando-se a entrega da loja à proprietária. * Designada data para inquirição das testemunhas indicadas pela requerida, não veio a mesma a verificar-se, por ter sido proferida decisão no decorrer da audiência convidando as partes a pronunciarem-se sobre a possível ocorrência de caducidade do contrato de locação no qual foi fundada a aparência de posse da requerente, com impacto na manutenção da sua posse relativamente à loja identificada nos autos, a determinar uma eventual extinção da instância por inutilidade superveniente da lide com o levantamento da providência decretada. * As partes pronunciaram-se nos autos sobre a possibilidade de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, com oposição da requerente, após o que foi proferida a seguinte decisão: “Nos presentes autos de restituição provisória da posse foi, por decisão de fls. 191 e ss. decreta essa mesma restituição da loja 0.104, sita no piso 0 do Centro Comercial actualmente denominado (…). Esta restituição foi decretada tendo por fundamento de facto e de direito, entre outros, a existência da posse por parte da requerente baseada no contrato de instalação de lojista em centro comercial e na constatação jurídica de que nos termos do art. 1031.º, no 2, do CC “o locatário que for privado da coisa ou perturbado no exercício dos seus direitos pode usar, mesmo contra o locador, dos meios facultado ao possuidor nos art.s 1276.º e ss.”. Concluiu assim a decisão dos autos no sentido que “o lojista pode utilizar os meios de defesa da posse sobre o local onde exerça a sua actividade, mesmo contra o proprietário ou promotor do Centro Comercial. Entendeu-se também ser de conferir à requerente a tutela da posse por “a manutenção do contrato (por força da resolução operada pela requerida) ser controvertida entre as partes…”. Acontece à presente data o contrato se encontra extinto por caducidade, independentemente da licitude ou ilicitude da resolução do contrato – e consequências da mesma resultante. Dos factos provados constantes da sentença de fls. 190 dos autos resulta, no ponto 4, que “O contrato foi celebrado pelo período de 6 anos o qual teve início a 1 de Outubro de 2015 e tem termo a 30 de Setembro de 2021”. Desse mesmo contrato e da mesma cláusula de onde consta o prazo de duração do contrato consta ainda que “2. O contrato caduca no seu termo. As partes poderão, no entanto, por mútuo acordo, celebrar novo contrato nos termos e condições a acordar entre ambas”. Ou seja, está prevista a caducidade automática e afastada a renovação automática do contrato, uma vez que se prevê a necessidade de acordo para a celebração de um novo contrato e dos seus termos e condições. Quer-se com isto dizer que se, à data da decisão de restituição provisória da posse, existia um contrato cuja vigência ainda era válida (ainda que de forma controvertida atenta a resolução operada pela requerida), neste momento inexiste qualquer contrato válido que confira à requerida um direito de uso do estabelecimento e, consequentemente a sua posse. E nem se diga que o que confere a posse à requerente é a sentença, porque a sentença se limitou a reconhecer essa posse com base na vigência temporal de um contrato susceptível de conferir esta tutela possessória à requerente. Mesmo que na presente oposição ou na acção principal se viesse a reconhecer de forma provisória ou definitiva, respectivamente, a invalidade da resolução contratual operada pela requerida, ainda assim o contrato estaria extinto por caducidade à data de 30 de Setembro de 2021, deixando a requerente de ter título para reter e ocupar o referido espaço. Não está por isso em causa a licitude ou ilicitude da resolução a qual apenas relevava até à data de extinção do contrato por qualquer outra forma contratualmente prevista. Está em causa, isso sim, a extinção do contrato automática por decurso do prazo nele previsto. Não poderia nunca o Tribunal manter a restituição de uma posse, baseada num contrato extinto por motivo diverso – e não controvertido – daquele que constituiu uma das causas de pedir do presente procedimento. É assim entendimento do Tribunal que se verifica uma inutilidade superveniente da presente instância cautelar, que determina a extinção da instância. Como é óbvio não obsta esta decisão do Tribunal à eventual pertinência da acção principal e da aferição da ilicitude da resolução, na perspetiva da baliza temporal até dia 30 de Setembro de 2021. E diz-se “eventual” porque se desconhece os termos do segmento petitório dessa mesma acção, podendo os pedidos formulados com base na resolução terem perfeito cabimento legal, para o caso de ali se reconhecer que a resolução contratual com base no incumprimento foi ilícita. Mas mesmo que essa resolução contratual tenha sido ilícita, essa ilicitude não tem a virtualidade de impedir a extinção do contrato por caducidade. Como se referiu em sede de audiência de julgamento, de nada releva a apreciação da matéria da oposição apresentada pela requerida, na medida em que a mesma se refere à resolução contratual e sua licitude e, neste momento o contrato está extinto, se não pela resolução, ao menos e sempre pela sua caducidade por decurso do prazo peremptório nele previsto. Decisão: Em face do exposto, e pelos motivos supra explanados, declara-se a extinção da presente instância cautelar por inutilidade superveniente da lide. Custas pela requerente que beneficiou do presente procedimento cautelar. Notifique e registe.” * Não se conformando com esta decisão, dela vem a requerente recorrer, concluindo a motivação com as conclusões que se passam a transcrever: “1. A requerente, ora recorrente, apresentou uma providência cautelar de restituição da posse, em síntese, por considerar que a requerida, ora recorrida, agiu ilicitamente após a interpelação de resolução do contrato de utilização de loja em centro comercial celebrado entre as partes, tendo aquela esbulhado a requerente, ora recorrente, da loja e do estabelecimento comercial nela instalado pela calada da noite, fazendo uso de meios da justiça privada. 2. Decidiu o tribunal a quo, sem o contraditório da requerida, ora recorrida, que a “conduta da requerida constitui um ato, ilícito, de justiça privada. A requerente foi esbulhada da coisa, uma vez que a requerida, ao colocar um taipal na frente da loja, não permitiu a sua utilização pela requerente. (…)” 3. . A providência cautelar de restituição da posse não prevê que se alegue e demonstre a existência efetiva do direito, mas tão somente se procura proteger a aparência do direito e proteger a paz social, reconhecendo-se que o exercício dos poderes de facto através da qual a posse revela faz pressentir um verdadeiro direito real de gozo a que corresponde aquela materialidade. 4. Vem o tribunal a quo revogar a decisão anteriormente proferida, decidindo pela inutilidade superveniente da lide por considerar que o contrato se considera caducado, sem, contudo, ponderar a actuação comprovadamente ilícita da recorrida, premiando-a com a decisão de que se recorre. 5. Entre a decretação da providência cautelar e a audiência de julgamento da oposição da recorrida decorreram 4 meses, durante os quais o contrato de utilização de loja em centro comercial alegadamente caducou, não podendo a requerente considerar que a caducidade seja relevante para a presente providência cautelar especificada de restituição da posse, pois não era a causa de extinção do contrato à data dos factos, nem tão pouco releva para os factos à data em que os mesmos foram praticados. 6. É comumente aceite na doutrina e na jurisprudência que para a providência cautelar especificada de restituição provisória da posse ser decretada, no âmbito do pressuposto da posse, basta que se prove a aparência do direito, sendo a sua titularidade ou existência efetiva do mesmo discutida em sede de ação principal, o que se espera. Sendo aí relevante a causa de extinção do contrato de utilização de loja, ou ainda em sede de nova instância. 7. Salvo opinião diversa, a decisão que ora se recorre permite que os centros comerciais, e qualquer outra entidade, atuarem como bem entenderem, em desrespeito pela lei, nomeadamente lançando mão da justiça privada, sanando-se a ilicitude por no decurso da ação judicial o contrato caducar. 8. Tendo em conta que a justiça e os tribunais portugueses são morosos nas suas decisões, e atendendo que pela natureza das coisas os litígios que geram esbulho violento da loja ocorrem no fim do contrato, a probabilidade de este caducar no decurso da ação é grande. 9. Pelo exposto, perfilhar pela opinião do tribunal é permitir que os centros comerciais atuem dilatoriamente no processo de modo que este extravase o prazo de caducidade, de modo que a atuação deles fique sanada pela mesma, o que não é conducente com o fim das providências cautelares, nem tão pouco com o espírito do processo civil, que expressamente condena a justiça privada. 10. Assim, a caducidade poderia validar e sanar a ilicitude da justiça privada, nomeadamente da acção direta, o que não se coaduna com o preceituado no artigo 1.º do CPC. Acresce que, a parte que apresenta a providência cautelar, no presente caso a requerente, fica ainda mais prejudicada pela morosidade da justiça, pois a mesma, caso ultrapasse o prazo de caducidade do contrato, na opinião do tribunal, sana a actuação ilícita da requerida. 11. Pelo exposto, não deve a recorrente, ora recorrente, ser prejudicada pela morosidade dos tribunais portugueses, e em contrapartida a requerida, ora recorrente, sair beneficiada pela atuação de justiça privada, que é veementemente condenada e proibida pela lei processual portuguesa. Nestes termos e nos melhores de direito, sempre com o douto suprimento de V. Exas., Venerandos Desembargadores, requer-se que seja julgado procedente o presente recurso, sendo alterada a sentença, no sentido do prosseguimento da providência cautelar especificada de restituição da posse, só assim fazendo V. Exas., Venerandos Desembargadores, a vossa costumada justiça!!!”. * A requerida contra-alegou e formulou as seguintes conclusões: “1 – Embora a Recorrente pareça insurgir-se contra a morosidade da justiça e a estrutura do procedimento cautelar, se atrasos houve só aquela se ficam a dever, como parece decorrer dos incidentes que bafejaram o inicio do procedimento cautelar. 2 – Por outro lado, não existe qualquer atraso que tenha prejudicado a Recorrente como se constata pelo facto de continuar a utilizar a loja, com o respaldo de uma decisão cautelar, sem pagar e após ter terminado, por caducidade, o contrato que havia sido celebrado entre as partes. 3 – De um ponto de vista objetivo, e se desconsiderarmos a resolução que havia operado em data anterior, o contrato de utilização de loja em Centro Comercial sempre caducaria em 30 de Setembro de 2021, sem possibilidade de renovação, conforme resulta inequivocamente da cláusula 5ª do contrato junto pela Requerente, no seu requerimento inicial, como doc. n.º 1: 2. “O contrato de utilização será celebrado pelo prazo de 6 (seis) anos, o qual tem inicio a 1 de Outubro de 2015 e termo em 30 de Setembro de 2021. 4. O contrato caduca no seu termo. As partes poderão no entanto, por mútuo acordo, celebrar novo contrato nos termos e condições a acordar entre ambas.” 4 - Independentemente da válida resolução do contrato, nesta data de 30 de Setembro de 2021 a Requerente já não dispunha de qualquer direito de utilização da loja, não dispondo de título que legitime a sua posse das lojas em questão e inexistindo fundamento para que, contra a vontade da requerida, sua legitima proprietária, se mantenha, sem qualquer fundamento legal ou contratual, na posse da aludida loja. 5 - Constatando o tribunal que, na data agendada para a inquirição de testemunhas, -10/12/2021 (71 dias após ter ocorrido a caducidade do contrato) – o contrato, independentemente de cessação por outro motivo, em data anterior, já teria caducado, bem andou ao decidir declarar a extinção da presente instância cautelar, por inutilidade superveniente da lide. 6 – Concluindo-se, como na decisão proferida pelo tribunal a quo, que“…de nada releva a apreciação da matéria da oposição apresentada pela requerida, na medida em que a mesma se refere à resolução contratual e sua licitude e, neste momento o contrato está extinto, se não pela resolução, ao menos e sempre pela sua caducidade por decurso do prazo peremptório nele previsto.” Nestes termos e nos melhores de direito, que V. Exas. doutamente suprirão, mantendo-se a douta decisão proferida pelo tribunal a quo, nos seus exatos termos, será feita a costumada JUSTIÇA.” * Admitido o recurso e cumpridos os vistos legais, importa decidir. * II. Objeto do recurso O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das partes, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. arts. 635º, nº 4, 639º, nº 1, e 662º, nº 2, todos do Código de Processo Civil), sendo que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e é livre na interpretação e aplicação do direito (cf. art.º 5º, nº3 do mesmo Código). No caso em apreço cabe decidir se na fase de oposição a procedimento cautelar – restituição provisória de posse - existe fundamento para não prosseguir com o julgamento e determinar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide em virtude de ter ocorrido na pendência da causa a caducidade do contrato que serviu de fundamento à legitimação da posse. III. Fundamentação de Facto Os factos a atender são os que resultam do relatório supra, e bem assim, os seguintes: A decisão que decretou a providência deu como provados os seguintes factos: “1. A requerente explora a marca de artigos de vestuário de homem, mulher e acessórios (…). 2. A requerida explora um Centro Comercial sito na freguesia de (…), atualmente denominado (…), destinado ao exercício do comércio a retalho composto por lojas e espaços destinados a prestação de serviços, distribuídas de acordo com uma planificação técnica, espaços comuns de circulação e lazer, e infraestruturas de apoio necessárias ou convenientes ao exercício da atividade comercial pelos lojistas. 3. Por acordo escrito datado de 17 de Setembro de 2015, M…, S.A., na qualidade de detentora do Centro Comercial identificado em 1), então denominado de (…), e Classe e D…, S.A., legalmente representados, assinaram um documento denominado Contrato de Utilização de Loja em Centro Comercial, nos termos do qual a primeira declarou ceder à segunda e esta declarou receber a utilização da loja n.º 0.104 com área de 94 m2, sita no piso 0 do centro comercial referido em 1), destinada exclusivamente à atividade comercial de venda ao público de pronto a vestir de homem e mulher e respetivos acessórios de moda, com a designação comercial (…) a qual deveria ser exercida de forma continuada e ininterrupta durante todo o tempo de abertura ao público do centro comercial, nos termos a definir pela primeira; 4. O contrato foi celebrado pelo período de 6 anos, o qual teve início a 1 de outubro de 2015 e tem termo a 30 de setembro de 2021; 5. Ficou acordado que a requerente pagaria pela utilização uma retribuição periódica mensal resultante da soma de duas parcelas, uma fixa e outra variável, nos termos estipulados na cláusula 4.º, que aqui se dá por reproduzida; 6. O valor mensal de remuneração fixa ficou pré-determinada, não podendo em caso algum a remuneração mensal ser inferior a tal valor e sendo o mesmo de € 3.995,00, por mês, sem prejuízo das atualizações anuais, sendo aquele valor referente a 1 de abril de 2015; 7. A remuneração variável corresponde à diferença entre 7% da faturação bruta (vendas sem IVA) mensal verificado na loja, e a remuneração mínima pré-determinada, só sendo considerada para a remuneração total se exceder o valor da remuneração fixa. 8. Simultaneamente, e igualmente habitual, a requerente ficou ainda obrigada a comparticipar nas despesas e encargos com o funcionamento, utilização e promoção do centro comercial. 9. Na cláusula 17.º do contrato ficou a constar o seguinte: “1. Constitui motivo de resolução do contrato pela Primeira Contraente: a) O não pagamento à Primeira Contraente de qualquer quanta devida ao abrigo deste contrato. (…) 3. Após resolução do contrato nos termos referidos no número anterior, a PRIMEIRA CONTRAENTE entrará de imediato na detenção da loja, sem prejuízo do direito de exigir o pagamento da multa em que incorrer a SEGUNDA CONTRAENTE até ao dia da comunicação de rescisão e da perda pela SEGUNDA CONTRAENTE de todas as quantias pagas e obras efetuadas. 4. Em qualquer caso de revogação ou resolução do contrato em apreço, a SEGUNDA CONTRAENTE obriga-se a entregar as chaves da loja à PRIMEIRA CONTRAENTE a fim de esta verificar o seu estado. 5. Resolvido o contrato nos termos previstos nos números anteriores, a PRIMEIRA CONTRAENTE tem o direito de utilizar a chave, em seu poder, da porta exterior da loja para reassumir a detenção da loja ou de, não lhe tendo aquela chave sido entregue usar os meios necessários e adequados para reassumir a detenção da mesma loja. 6. A não aceitação pela SEGUNDA CONTRAENTE do fundamento invocado pela PRIMEIRA CONTRAENTE para o exercício do direito de resolução apenas confere aquela o direito de acionar judicialmente a PRIMEIRA CONTRAENTE não podendo opor-se à produção dos efeitos próprios da resolução operada que se haverá por válida e eficaz e, designadamente, não podendo impedir ou dificultar os atos que a PRIMEIRA CONTRAENTE desenvolva como meio de reassumir a detenção da loja ou, posteriormente, no âmbito do exercício dos seus direitos de proprietária. 7. Se, à data em que a PRIMEIRA CONTRAENTE reassumir a detenção da loja existirem nesta loja mercadorias, móveis, máquinas ou quaisquer outros produtos ou equipamentos que a SEGUNDA CONTRAENTE tenha o direito de levantar, a PRIMEIRA CONTRAENTE fica pelo prazo de 30 dias, investida na posição de sua fiel depositária, devendo proceder ao arrolamento daqueles bens e podendo promover, a expensas da SEGUNDA CONTRAENTE, a sua transferência para outro local. 8. No prazo de 30 dias referido no número anterior pode a SEGUNDA CONTRAENTE, mediante o pagamento das despesas e encargos em que a PRIMEIRA CONTRAENTE haja incorrido enquanto fiel depositária, designadamente com a remoção dos bens para outro local e com a armazenagem destes, proceder ao sue levantamento, salvo se a PRIMEIRA CONTRAENTE houver alegado direito de retenção dos mesmos bens, no todo ou em parte, com fundamento no não pagamento pela SEGUNDA de quaisquer quantias devidas à data em que a resolução declarada opere os seus efeitos. 8.1. O levantamento dos bens pela SEGUNDA CONTRAENTE quando a PRIMEIRA tenha exercido o direito de retenção só poderá ser feito contra pagamento de todas as quantias de que esta seja credora.” 10. No ano de 2018, a requerente passou por dificuldades financeiras o que a forçou a apresentar em tribunal um Plano Especial de Revitalização em agosto de 2019, buscando dessa forma uma solução para se reorganizar em todos os níveis. O PER foi aprovado também pela requerida, que ali reclamou créditos, tendo votado favoravelmente ao plano, tendo a decisão que a homologou transitado em julgado a 4 de agosto de 2020; 11. Considerando as dificuldades financeiras sentidas, requerente e requerida assinaram uma adenda ao contrato de utilização de loja em centro comercial, em que a primeira se confessou devedora à segunda do valor de € 72.728,60, com referência a 2 de Setembro de 2019, correspondente à remuneração fixa e encargos comuns relativos ao período compreendido entre Setembro de 2018 e Setembro de 2019, reconhecendo ainda ser devedora do valor de € 12.545,18 correspondentes à remuneração fixa e encargos comuns, incluindo o IVA, dos meses de Novembro e Dezembro de 2019, vencidos em Outubro e Novembro de 2019; 12. Além de outras condições, acordaram numa diminuição, por bonificação, de valor igual a 30% da remuneração fixa mensal, diminuindo à dívida o montante de 15.360,36 euros, ficando a requerente, com referência a setembro de 2019, a dever a importância de 54.663,96 euros, a pagar em 21 prestações mensais e sucessivas. Acordaram ainda que o montante de 12,545,18 euros seria pago com as bonificações em duas prestações mensais e sucessivas. 13. A requerente estava convencida que a bonificação de 30% se aplicaria à remuneração fixa à data, sem prejuízo das atualizações anuais, sem nunca considerar que a mesma fosse aumentada, como foi para o montante de 5.035,70 euros. 14. Devido à situação pandémica causada pela doença COVID-19, durante o ano de 2020 foi apenas devida a componente variável da remuneração, apesar de a requerida ter faturado e a requerente pago a remuneração fixa e despesas comuns dos meses de janeiro e fevereiro de 2020 no valor de € 10.983,88; 15. Devido à situação pandémica em que o mundo se encontra desde março de 2020, os centros comerciais não funcionaram o número de horas acordados nos contratos, não tendo funcionado de todo durante 4 meses em 2020 e outros 4 meses em 2021. 16. Houve restrição horária dos centros comerciais e a limitação de pessoas dentro das lojas, o que levou a uma diminuição drástica do fluxo de tesouraria da requerente, não tendo conseguindo proceder ao pagamento de todas as remunerações variáveis e despesas comuns entre os meses de março e dezembro; 17. Após a autorização de reabertura dos centros comerciais estes não funcionaram no número de horas contratadas, havendo restrições horárias e de número de pessoas dentro dos centros comerciais e das próprias lojas, impedindo que o fluxo de clientela seja reduzido ao que seria de esperar e que está na base dos contratos de utilização de loja em centro comercial; 18. A requerente abordou a requerida, manifestando discordância quanto ao aumento da remuneração fixa e assim como apelou para que fossem tidas em contas circunstâncias provocadas pela doença Covid-19, mas a requerida, por carta datada de 6 de novembro de 2020, interpelou a requerente para proceder ao pagamento da totalidade das quantias em falta, continuando a cobrar os mesmos valores das despesas comuns; 19. Por carta datada de 19 de abril de 2021, a requerida declarou à requerente que, face ao não pagamento do montante de 62.535,67 euros, liquidado a 5 de abril d2021, no prazo concedido de 10 dias, sob pena de resolução, vinham comunicar a resolução do contrato com efeitos a 18 de abril de 2021, solicitando a imediata entrega da loja e das chaves nos termos contratuais; 20. No dia 10 de maio de 2021 a requerida enviou um e-mail pelas 23 horas a informar que iriam vedar e reassumir a loja a partir das 0h30 do dia 11 de maio; 21. No dia 11 de maio, contra a vontade da requerente, a requerida entaipou a porta e montra da loja da requente, no qual colocou uma porta com fechadura, impedindo o acesso ao interior da loja dos funcionários e clientes, impedindo o funcionamento da loja.” * Está ainda evidenciado o seguinte facto: A cláusula 5ª do contrato celebrado entre as partes no seu nº 2, dispõe: “O contrato caduca no seu termo. As partes poderão no entanto, por mútuo acordo, celebrar novo contrato nos termos e condições a acordar entre ambas”. IV. Fundamentação de Direito No âmbito deste procedimento cautelar intentado por “C…, S.A” contra “A…, S.A”, foi proferida decisão que determinou a restituição provisória da posse, à requerente, da loja n.º 0.104, sita no piso 0 do centro comercial atualmente denominado (…), e condenou a requerida a abster-se de praticar quaisquer atos que impedissem, dificultassem ou limitassem a normal utilização da loja e a exploração do estabelecimento comercial nela instalado pela requerente. À requerente foi reconhecido o direito de utilizar os meios de defesa da posse sobre o local onde exercia a sua atividade, com base em contrato de utilização da loja em centro comercial, cuja vigência era controvertida à data da decisão em virtude de a requerente não aceitar a resolução do contrato que havia sido operado pela requerida, tendo-se, então, concluído pela aparência da existência do direito da requerente e pela necessidade de manter e respeitar o status quo até à prolação de decisão que resolvesse a questão de forma definitiva. A providência foi determinada sem audição da requerida. Dispõe o art. 372º, do Código de Processo Civil: “1 - Quando o requerido não tiver sido ouvido antes do decretamento da providência, é-lhe lícito, em alternativa, na sequência da notificação prevista no n.º 6 do artigo 366.º: a) Recorrer, nos termos gerais, do despacho que a decretou, quando entenda que, face aos elementos apurados, ela não devia ter sido deferida; b) Deduzir oposição, quando pretenda alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinem a sua redução, aplicando-se, com as adaptações necessárias, o disposto nos artigos 367.º e 368.º. (…) 3 - No caso a que se refere a alínea b) do n.º 1, o juiz decide da manutenção, redução ou revogação da providência anteriormente decretada, cabendo recurso desta decisão, e, se for o caso, da manutenção ou revogação da inversão do contencioso; qualquer das decisões constitui complemento e parte integrante da inicialmente proferida.” Visando prevenir os riscos de injustiça decorrentes da prolação de uma decisão cautelar não precedida de contraditório, a lei concede ao recorrido duas possibilidades de agir contra uma decisão que lhe seja desfavorável: ou recorre (al. a), do nº 2, do sobredito preceito legal), ou deduz oposição (al. b), do mesmo nº 2), devendo recorrer a este meio quanto pretenda alegar factos novos, nomeadamente, factos principais, que não foram inicialmente levados ao conhecimento do julgador (factos excecionais que visem obstar à pretensão do requerente), ou factos meramente instrumentais, que visem abalar a convicção do julgador quanto à verificação dos factos que sustentaram o decretamento da providência, cabendo ao requerido/opoente, a prova duns e doutros[1]. Ainda nos termos daquela mesma disposição legal, o requerido pode limitar-se a requerer a produção de novos meios probatórios em ordem a abalar a convicção anteriormente firmada pelo juiz. O objetivo da oposição é, como se disse, demonstrar que não se verificam os fundamentos da medida cautelar, ou determinar a sua redução. “No âmbito da oposição, o juiz deve expressar na decisão que venha a proferir a nova convicção que puder formar a partir de uma discussão mais alargada proporcionada pelo exercício do contraditório, com resultados na revogação da medida ou na sua redução aos justos limites, de acordo com o que, ainda que em termos também provisórios, resultar apurado nesta fase do procedimento”.[2] No caso dos autos, notificada da providência decretada, a requerida optou por deduzir oposição, e fê-lo, propugnando pela revogação da restituição provisória da posse da loja à requerente, alegando, para tanto, que à data em que foi tomada tal decisão a relação contratual estava extinta em consequência da resolução do contrato, e que, de todo o modo, seria previsível a extinção do mesmo contrato, mas por caducidade, por referência à data de 30 de setembro de 2021, o que significaria que a decidir-se pela manutenção da providência, a requerente poderia continuar a utilizar a loja para além do prazo original constante do próprio contrato de utilização. Indicou prova. A Mª juíza do tribunal a quo decidiu que não se justificava proceder ao julgamento da oposição, por ter concluído que em face da prova documental existente nos autos o sobredito contrato de utilização de loja em centro comercial tinha, entretanto, caducado, tendo assim concluído pela inutilidade superveniente da lide e pela consequente extinção da instância. A inutilidade superveniente da lide constitui causa de extinção da instância (art. 277º, al. e), do Código de Processo Civil). A inutilidade superveniente da lide dá-se quando por circunstâncias ocorridas na pendência da instância a pretensão do autor “(…) encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida (…)”, quando a solução do litígio deixa de interessar por o autor ter logrado atingir o resultado pretendido por outra via[3]. “A inutilidade superveniente decorre em geral dos casos em que o efeito pretendido já foi alcançado por via diversa, sendo o caso mais típico o do pagamento da quantia peticionada ou, em geral, o cumprimento espontâneo da obrigação em causa ou a entrega do bem reivindicado”.[4] “A instância extingue-se por inutilidade superveniente da lide, quando uma ocorrência processual torna a instância desnecessária. E parece claro que o exemplo mais flagrante de inutilidade superveniente ocorre quando o fim pretendido com a demanda é alcançado, na pendência da causa, independentemente ou antes da decisão judicial. A instância extingue-se sempre que se torne, supervenientemente, inútil, ou seja, sempre que por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão que o autor ou requerente actuava na acção se mostrar satisfeita. Assim, sempre que o resultado ou efeito jurídico visado com a acção se mostrar atingido e, portanto, a solução do litígio deixar de interessar é claro que o processo não deve continuar, mas antes cessar. A instância extingue-se porque se tornou inútil o prosseguimento da lide. Verificado o facto, o tribunal não conhece do mérito da causa, limitando-se a declarar aquela extinção. Face a este enunciado é apodíctico adiantar que o facto susceptível de determinar a extinção da instância por inutilidade de lide, além de dever ser superveniente, ou seja, de verificação ulterior, deve encerrar, em si, virtualidades que nos permitam concluir que o resultado ou efeito jurídico visado com a acção se mostra atingido. Para a integração do conceito em causa é, pois, necessário averiguar, antes de tudo o mais, qual é o objecto da lide, determinado em razão da pretensão ou pretensões deduzidas pelo Autor/AA na sua petição inicial.”[5] O processo tem início com a apresentação da petição inicial em juízo (art. 259º, nº 1, do Código de Processo Civil), sendo nela que o autor/demandante solicita ao tribunal a providência jurisdicional que julga adequada à satisfação do direito que reclama. É o pedido que conforma o objeto do processo. A instância torna-se estável quanto aos sujeitos e ao objeto do processo com a citação (art. 260º Código Processo Civil), sem prejuízo das alterações previstas e consentidas pela lei (alteração do pedido, da causa de pedir, intervenção de novas partes). O objeto da presente instância foi delineado pela requerente do procedimento cautelar. À luz do que se deixou exposto, a caducidade do contrato ocorrida na pendência da instância cautelar não conduz à extinção da instância por inutilidade da lide, pois ao invés de consubstanciar a satisfação do resultado visado pela requerente com a ação cautelar, constitui um obstáculo real à manutenção da medida que foi anteriormente decretada a favor daquela. Mas o prosseguimento da lide também pode deixar de interessar se em consequência de evento ocorrido na pendência da causa não for possível manter a pretensão do autor, quando se concluir que o seu pedido já não pode ter acolhimento, ocorrendo nessas circunstâncias a extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide (art. 277º, al. e), do Código de Processo Civil). Como está provado nos autos, por acordo escrito datado de 17 de setembro de 2015, M…, S.A., na qualidade de detentora do Centro Comercial identificado em 1), então denominado de (…), e C…, S.A., legalmente representados, assinaram um documento denominado Contrato de Utilização de Loja em Centro Comercial, nos termos do qual a primeira declarou ceder à segunda e esta declarou receber a utilização da loja n.º 0.104 com área de 94 m2, sita no piso 0 do centro comercial. Tal contrato foi celebrado pelo período de 6 anos, o qual teve início a 1 de outubro de 2015, com termo a 30 de setembro de 2021, e nos termos da cláusula 5ª, nº 2, do dito contrato, as partes deixaram expressamente consignado o seguinte: “O contrato caduca no seu termo. As partes poderão no entanto, por mútuo acordo, celebrar novo contrato nos termos e condições a acordar entre ambas”. A caducidade é uma das formas de extinção dos contratos. O contrato caduca quando sobrevém o prazo acordado para a sua extinção, implicando, natural e necessariamente, a extinção das obrigações dele decorrentes[6]. A caducidade ocorre “(…) quando a cessação do contrato advém de um facto jurídico não dependente de uma declaração de vontade; ou seja, o vínculo contratual não cessa por força de uma declaração de vontade emitida com essa finalidade, mas ipso facto”[7]. Ora, perante a sobredita cláusula é inequívoco que o contrato cessou no dia 30 de setembro de 2021, o que significa que se extinguiram a partir de então, de forma definitiva, as obrigações dele decorrentes para cada uma das partes. A extinção do dito contrato na pendência da providência cautelar, ao abrigo do qual foi sustentado, indiciariamente, o direito da requerente, fez cessar qualquer controvérsia possível sobre a manutenção da sua vigência, e desaparecendo do universo jurídico, de forma definitiva, a relação contratual estabelecida entre as partes, deixou de ser possível manter o direito de posse em tempo reconhecido à requerente. Embora continue a existir a loja objeto do contrato, a possibilidade de continuar a sua exploração deixou de ser possível, por ter deixado de existir o contrato que sustentava tal exploração. E deste modo, não sendo possível manter o direito anteriormente reconhecido à requerente por facto superveniente ocorrido na pendência da lide, torna-se desnecessária a sua continuação, com o julgamento da oposição (no âmbito da qual não poderia inclusivamente deixar de ser abordada a mesma questão, até porque fora suscitada pela requerida na oposição apresentada e que conduziria inevitavelmente à revogação da providência decretada e à extinção do processo), cabendo, assim, ainda que com recurso à figura jurídica da impossibilidade superveniente da lide (que tal como a inutilidade superveniente se encontra prevista na já mencionada alínea e), do art. 277º, do Código de Processo Civil) manter a decisão recorrida de extinção da instância e dela extrair a consequência necessária, qual seja, a da revogação da medida cautelar oportunamente decretada. V. Decisão Na sequência do exposto, acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso da requerente/apelante, e em manter a decisão de extinção da presente instância, ainda que por impossibilidade superveniente da lide, o que acarreta a revogação da providência decretada. Custas a cargo do apelante. Notifique. 31/3/2022 Cristina Lourenço Ferreira de Almeida Teresa Prazeres Pais _______________________________________________________ [1] José Lebre de Freitas, Montalvão Machado, Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 2001, pág. 43. [2] António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta; Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, 2ª Edição, pág. 372. [3] José Lebre de Freitas, ob. cit. pág. 512. [4] António Abrantes Geraldes, ob. cit. pág. 339. [5] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22/11/2018 (processo 4144/17.1T8LSB.L1S2), acessível em www.dgsi.pt. [6] António Menezes Cordeio, “Direito das Obrigações”, AAFDL, 1986, pág. 186. [7] Acórdão do STJ de 30/04/2019 – processo 3271/15.4T8STR.E1.S1, acessível em www.dgsi.pt