Processo:856/11.1TYLSB-D.L1-6
Data do Acordão: 26/09/2018Relator: ANABELA CALAFATETribunal:trl
Decisão: Meio processual:

I - A entender-se, como pretende o recorrente, que todas as custas do apenso de reclamação e verificação de créditos ficam a cargo da massa insolvente, mesmo que algum reclamante ou impugnante fique vencido, seria uma excrescência o segmento do art. 303º do CIRE «e quaisquer outros incidentes cujas custas hajam de ficar a cargo da massa, ainda que processados em separado». II - Ora, na fixação do sentido e alcance da lei deve o intérprete presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (cfr art. 9º nº 3 do Código Civil). III - Portanto, é devida taxa de justiça pela dedução de impugnação de créditos no processo de insolvência.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
ANABELA CALAFATE
Descritores
PROCESSO DE INSOLVÊNCIA RECLAMAÇÃO VERIFICAÇÃO DE CRÉDITOS RESPONSABILIDADE RESPONSABILIDADE PELAS CUSTAS MASSA INSOLVENTE TAXA DE JUSTIÇA
No do documento
RL
Data do Acordão
09/27/2018
Votação
MAIORIA COM * VOT VENC
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO
Decisão
IMPROCEDENTE
Sumário
I - A entender-se, como pretende o recorrente, que todas as custas do apenso de reclamação e verificação de créditos ficam a cargo da massa insolvente, mesmo que algum reclamante ou impugnante fique vencido, seria uma excrescência o segmento do art. 303º do CIRE «e quaisquer outros incidentes cujas custas hajam de ficar a cargo da massa, ainda que processados em separado». II - Ora, na fixação do sentido e alcance da lei deve o intérprete presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (cfr art. 9º nº 3 do Código Civil). III - Portanto, é devida taxa de justiça pela dedução de impugnação de créditos no processo de insolvência.
Decisão integral
Acordam na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
 
I - Relatório
 
No âmbito do processo em que foi declarada a insolvência de TB… Lda, foi proferido despacho em 03/10/2017 onde se lê, além do mais:
«O Ministério Público impugna, em representação da Autoridade Tributária, a lista de credores reconhecidos, nos termos do art. 130º do CIRE.
O Impugnante junta documentação sem que entre eles consta o comprovativo da taxa de justiça ou requerimento de protecção jurídica.
Quid juris?
O processo de verificação de créditos inicia-se extrajudicialmente com a remessa das reclamações de créditos ao administrador da insolvência nos termos do art. 128º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE).
Apresentada a relação de créditos reconhecidos e não reconhecidos, os interessados podem impugnar a lista de credores reconhecidos (…)
(…)
As custas da insolvência que devam ficar a seu cargo são apenas aquelas em que a massa insolvente decaia e na medida de tal decaimento, sendo as restantes pelas partes intervenientes e na proporção da respectiva sucumbência - estas as conclusões alcançadas no acórdão do STJ, de 29/4/2014. in www.dgsi.pt.
E, prossegue o mencionado acórdão, a pedra de toque de toda esta abordagem encontra-se nas regras gerais que norteiam a condenação em custas, decorrendo a tributação do incidente em causa e respectivo pagamento da taxa de justiça das normas gerais aplicáveis dos art. 1º, 2º, 3º do Regulamento das Custas Processuais e art. 527º a 529º e 530º do NCPC, dispondo o nº 1 deste preceito legal que a taxa de justiça é paga pela parte que, nomeadamente, demande na qualidade de recorrente ou recorrido e nos termos do disposto no Regulamento das Custas Processuais.
(…)
Termos em que deve ser determinada a junção de documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça no prazo máximo de dez dias.
Em face do exposto, convido o impugnante a documentar nos autos o pagamento da taxa de justiça, no prazo máximo de 10 dias.».
                                                   *
Inconformado, apelou o Ministério Público, terminando a alegação com as seguintes conclusões:
1 - “No processo de insolvência, o impulso processual consubstanciado na apresentação de uma impugnação à lista de credores reconhecidos, nos termos do artigo 130º, nº 1 do CIRE, não gera a obrigação, para esse impugnante, de pagamento de taxa de justiça. 
2 - Com efeito, integrando-se essa impugnação no quadro do procedimento concursal, na chamada tramitação regular de verificação de créditos, regulada nos artigos 128º a 140º do CIRE (a que é desencadeada pela apresentação das reclamações dentro do prazo fixado na sentença de insolvência), é ela abrangida pela regra geral, constante do artigo 304º do CIRE, que atribui a responsabilidade pelas custas, quando a insolvência é decretada, sempre à massa insolvente. 
3 -Porque a obrigação de suportar o pagamento de taxa de justiça se refere ao impulso processual induzido por um interveniente processual que possa ser ulteriormente responsabilizado pelas custas, não é essa taxa devida quando a obrigação de custas não existe, logo à partida, para quem induz esse impulso processual.”?
4 - Ou seja, o impugnante do artigo 130º do ClRE, independentemente da circunstância e da medida em que os fundamentos da sua impugnação venham a ser atendidos ou não pelo Tribunal, não suportará, nos termos do art. 304º do CIRE, as custas deste apenso. 
5 - Assim sendo, o douto despacho recorrido ao determinar a junção pelo Ministério Público de documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça violou as normas legais dos artigos 301º a 304º do ClRE, 145º, nº 1, 570º e 642º do CPC. 
6 - Termos em que o despacho recorrido deverá ser revogado e substituído por outro que dê sem efeito a notificação do Ministério Público para proceder ao pagamento da taxa de justiça, aceitando o requerimento, e, em consequência, ordenar o prosseguimento dos autos. 
Vossas Excelências, porém, apreciarão e decidirão como for de justiça.
                                                     *
Não há contra-alegação.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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II - Questões a decidir
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, pelo que a questão a decidir é esta:
- se é ou não devido o pagamento de taxa de justiça pela dedução de impugnação da lista dos créditos reconhecidos ao abrigo do disposto no art. 130º do CIRE
                                                   *
III - Fundamentação
A dinâmica processual a considerar é a descrita no relatório.
Embora nos art. 128º e 130º do CIRE conste que a reclamação de créditos e a impugnação são deduzidas através de «requerimento», decorre dos nºs 1 e 2 do art. 134º que esses requerimentos são articulados, pois aí se determina que às impugnações e às respostas é aplicável o disposto no nº 2 do art. 25º e que são apenas oferecidos pelo requerente ou, no caso de apresentação em suporte digital, extraídos pela secretaria, dois duplicados dos articulados e dos documentos que os acompanhem, um dos quais se destina ao arquivo do tribunal.
Conforme prescreve o art. 13º do CIRE as listas de créditos reconhecidos e não reconhecidos pelo administrador da insolvência, as impugnações e as respostas são autuadas por um único apenso.
Por sua vez, o art. 303º estabelece:
«Para efeitos de tributação, o processo de insolvência abrange o processo principal, a apreensão dos bens, os embargos do insolvente, ou do seu cônjuge, descendentes, herdeiros, legatários ou representantes, a liquidação do activo, a verificação do passivo, o pagamento aos credores, as contas de administração, os incidentes do plano de pagamentos, da exoneração do passivo restante, de qualificação da insolvência e quaisquer outros incidentes cujas custas hajam de ficar a cargo da massa, ainda que processados em separado.».
E o art. 304º prescreve: «As custas do processo de insolvência são encargo da massa insolvente ou do requerente, consoante a insolvência seja ou não decretada por decisão transitada em julgado.».
A regra consagrada no art 304º tem de ser conjugada com o disposto no art. 303º, pois decorre da última parte deste último que pode haver custas que não são encargo da massa insolvente. 
Na verdade, a entender-se, como pretende o recorrente, que todas as custas do apenso de reclamação e verificação de créditos ficam a cargo da massa insolvente, mesmo que algum reclamante ou impugnante fique vencido, seria uma excrescência o segmento «e quaisquer outros incidentes cujas custas hajam de ficar a cargo da massa, ainda que processados em separado».
Ora, na fixação do sentido e alcance da lei deve o intérprete presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (cfr art. 9º nº 3 do Código Civil).
Repare-se, aliás, que em anotação ao CIRE referem Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda referem: «Se houver impugnações, abre-se um incidente no processo de insolvência, regulado nos art. 131º a 140º (…)» (in Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas anotado, edição de 2009, pág. 456).
Por outro lado, o Regulamento das Custas Processuais não consagra nenhuma isenção objectiva de custas relativamente a esse incidente, sendo certo que a impugnação deduzida pelo Ministério Público em representação da autoridade tributária não está abrangida por alguma das isenções subjectivas contempladas no art. 4º desse diploma.
Assim, só na decisão de verificação dos créditos será fixada a responsabilidade pelo pagamento das custas, pelo que é devida taxa de justiça pela dedução da impugnação de créditos.
Por quanto se disse, e sufragando também o entendimento do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça citado na decisão recorrida, proferido em 29/04/2014 no Proc. 919/12.6TBGRD (in www.dgsi.pt), não assiste razão ao recorrente.
                                                       *
IV - Decisão
Pelo exposto, julga-se improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pelo apelante.

Lisboa, 27 de Setembro de 2018
 
Anabela Calafate
 
António Manuel Fernandes dos Santos        
 
Eduardo Petersen Silva (vencido, pelas razões constantes do acórdão que relatei no processo 1585/09.1TYLSB-AT.L1 julgado em 12.7.2018)

Acordam na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa I - Relatório No âmbito do processo em que foi declarada a insolvência de TB… Lda, foi proferido despacho em 03/10/2017 onde se lê, além do mais: «O Ministério Público impugna, em representação da Autoridade Tributária, a lista de credores reconhecidos, nos termos do art. 130º do CIRE. O Impugnante junta documentação sem que entre eles consta o comprovativo da taxa de justiça ou requerimento de protecção jurídica. Quid juris? O processo de verificação de créditos inicia-se extrajudicialmente com a remessa das reclamações de créditos ao administrador da insolvência nos termos do art. 128º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE). Apresentada a relação de créditos reconhecidos e não reconhecidos, os interessados podem impugnar a lista de credores reconhecidos (…) (…) As custas da insolvência que devam ficar a seu cargo são apenas aquelas em que a massa insolvente decaia e na medida de tal decaimento, sendo as restantes pelas partes intervenientes e na proporção da respectiva sucumbência - estas as conclusões alcançadas no acórdão do STJ, de 29/4/2014. in www.dgsi.pt. E, prossegue o mencionado acórdão, a pedra de toque de toda esta abordagem encontra-se nas regras gerais que norteiam a condenação em custas, decorrendo a tributação do incidente em causa e respectivo pagamento da taxa de justiça das normas gerais aplicáveis dos art. 1º, 2º, 3º do Regulamento das Custas Processuais e art. 527º a 529º e 530º do NCPC, dispondo o nº 1 deste preceito legal que a taxa de justiça é paga pela parte que, nomeadamente, demande na qualidade de recorrente ou recorrido e nos termos do disposto no Regulamento das Custas Processuais. (…) Termos em que deve ser determinada a junção de documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça no prazo máximo de dez dias. Em face do exposto, convido o impugnante a documentar nos autos o pagamento da taxa de justiça, no prazo máximo de 10 dias.». * Inconformado, apelou o Ministério Público, terminando a alegação com as seguintes conclusões: 1 - “No processo de insolvência, o impulso processual consubstanciado na apresentação de uma impugnação à lista de credores reconhecidos, nos termos do artigo 130º, nº 1 do CIRE, não gera a obrigação, para esse impugnante, de pagamento de taxa de justiça. 2 - Com efeito, integrando-se essa impugnação no quadro do procedimento concursal, na chamada tramitação regular de verificação de créditos, regulada nos artigos 128º a 140º do CIRE (a que é desencadeada pela apresentação das reclamações dentro do prazo fixado na sentença de insolvência), é ela abrangida pela regra geral, constante do artigo 304º do CIRE, que atribui a responsabilidade pelas custas, quando a insolvência é decretada, sempre à massa insolvente. 3 -Porque a obrigação de suportar o pagamento de taxa de justiça se refere ao impulso processual induzido por um interveniente processual que possa ser ulteriormente responsabilizado pelas custas, não é essa taxa devida quando a obrigação de custas não existe, logo à partida, para quem induz esse impulso processual.”? 4 - Ou seja, o impugnante do artigo 130º do ClRE, independentemente da circunstância e da medida em que os fundamentos da sua impugnação venham a ser atendidos ou não pelo Tribunal, não suportará, nos termos do art. 304º do CIRE, as custas deste apenso. 5 - Assim sendo, o douto despacho recorrido ao determinar a junção pelo Ministério Público de documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça violou as normas legais dos artigos 301º a 304º do ClRE, 145º, nº 1, 570º e 642º do CPC. 6 - Termos em que o despacho recorrido deverá ser revogado e substituído por outro que dê sem efeito a notificação do Ministério Público para proceder ao pagamento da taxa de justiça, aceitando o requerimento, e, em consequência, ordenar o prosseguimento dos autos. Vossas Excelências, porém, apreciarão e decidirão como for de justiça. * Não há contra-alegação. * Colhidos os vistos, cumpre decidir. * II - Questões a decidir O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, pelo que a questão a decidir é esta: - se é ou não devido o pagamento de taxa de justiça pela dedução de impugnação da lista dos créditos reconhecidos ao abrigo do disposto no art. 130º do CIRE * III - Fundamentação A dinâmica processual a considerar é a descrita no relatório. Embora nos art. 128º e 130º do CIRE conste que a reclamação de créditos e a impugnação são deduzidas através de «requerimento», decorre dos nºs 1 e 2 do art. 134º que esses requerimentos são articulados, pois aí se determina que às impugnações e às respostas é aplicável o disposto no nº 2 do art. 25º e que são apenas oferecidos pelo requerente ou, no caso de apresentação em suporte digital, extraídos pela secretaria, dois duplicados dos articulados e dos documentos que os acompanhem, um dos quais se destina ao arquivo do tribunal. Conforme prescreve o art. 13º do CIRE as listas de créditos reconhecidos e não reconhecidos pelo administrador da insolvência, as impugnações e as respostas são autuadas por um único apenso. Por sua vez, o art. 303º estabelece: «Para efeitos de tributação, o processo de insolvência abrange o processo principal, a apreensão dos bens, os embargos do insolvente, ou do seu cônjuge, descendentes, herdeiros, legatários ou representantes, a liquidação do activo, a verificação do passivo, o pagamento aos credores, as contas de administração, os incidentes do plano de pagamentos, da exoneração do passivo restante, de qualificação da insolvência e quaisquer outros incidentes cujas custas hajam de ficar a cargo da massa, ainda que processados em separado.». E o art. 304º prescreve: «As custas do processo de insolvência são encargo da massa insolvente ou do requerente, consoante a insolvência seja ou não decretada por decisão transitada em julgado.». A regra consagrada no art 304º tem de ser conjugada com o disposto no art. 303º, pois decorre da última parte deste último que pode haver custas que não são encargo da massa insolvente. Na verdade, a entender-se, como pretende o recorrente, que todas as custas do apenso de reclamação e verificação de créditos ficam a cargo da massa insolvente, mesmo que algum reclamante ou impugnante fique vencido, seria uma excrescência o segmento «e quaisquer outros incidentes cujas custas hajam de ficar a cargo da massa, ainda que processados em separado». Ora, na fixação do sentido e alcance da lei deve o intérprete presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (cfr art. 9º nº 3 do Código Civil). Repare-se, aliás, que em anotação ao CIRE referem Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda referem: «Se houver impugnações, abre-se um incidente no processo de insolvência, regulado nos art. 131º a 140º (…)» (in Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas anotado, edição de 2009, pág. 456). Por outro lado, o Regulamento das Custas Processuais não consagra nenhuma isenção objectiva de custas relativamente a esse incidente, sendo certo que a impugnação deduzida pelo Ministério Público em representação da autoridade tributária não está abrangida por alguma das isenções subjectivas contempladas no art. 4º desse diploma. Assim, só na decisão de verificação dos créditos será fixada a responsabilidade pelo pagamento das custas, pelo que é devida taxa de justiça pela dedução da impugnação de créditos. Por quanto se disse, e sufragando também o entendimento do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça citado na decisão recorrida, proferido em 29/04/2014 no Proc. 919/12.6TBGRD (in www.dgsi.pt), não assiste razão ao recorrente. * IV - Decisão Pelo exposto, julga-se improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida. Custas pelo apelante. Lisboa, 27 de Setembro de 2018 Anabela Calafate António Manuel Fernandes dos Santos        Eduardo Petersen Silva (vencido, pelas razões constantes do acórdão que relatei no processo 1585/09.1TYLSB-AT.L1 julgado em 12.7.2018)