Processo:18/19.0YUSTR-G.L1-PICRS
Data do Acordão: 25/05/2020Relator: RUI MIGUEL TEIXEIRATribunal:trl
Decisão: Meio processual:

- Em processo contra-ordenacional só é admissível recurso do despacho do juiz que não admite o recurso da decisão administrativa; - Não é admissível recurso do despacho do juiz de 1ª instância que fixa efeito diferente do desejado pelo recorrente; - A Constituição não exige duplo grau de jurisdição em sede contra-ordenacional (Sumário elaborado pelo Relator)

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
RUI MIGUEL TEIXEIRA
Descritores
RECURSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO ADMISSIBILIDADE DO RECURSO CONSTITUCIONALIDADE
No do documento
RL
Data do Acordão
05/26/2020
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
RECURSO PENAL
Decisão
IMPROCEDENTE
Sumário
- Em processo contra-ordenacional só é admissível recurso do despacho do juiz que não admite o recurso da decisão administrativa; - Não é admissível recurso do despacho do juiz de 1ª instância que fixa efeito diferente do desejado pelo recorrente; - A Constituição não exige duplo grau de jurisdição em sede contra-ordenacional (Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão integral
Acordam os juízes que compõem a Secção de Propriedade Intelectual, Supervisão, Regulação e Concorrência do Tribunal da Relação de Lisboa.

Reclama para a conferência da Secção de Propriedade Intelectual, Supervisão, Regulação e Concorrência deste Tribunal da Relação Meo - SERVIÇOS DE COMUNICAÇÕES E MULTIMÉDIA, S.A. ("MEO") da decisão Sumária de 17.02.2020 sustentando, no essencial, no que à reclamação diz respeito, que:

“(…) 20.– Nos termos do disposto no artigo 84.º n.º 1 da LdC, "cabe recurso das decisões proferidas pela Autoridade da Concorrência cuja irrecorribilidade não estiver expressamente prevista na presente lei".

21.– Já nos termos do n.º 3 do mencionado preceito, esse recurso é da competência do TCRS.

22.– Tal significa que, no figurino legal da impugnação das decisões interlocutórias da AdC em sede de processo de contraordenação, a AdC assume a qualidade de entidade recorrida (ou a quo) e o TCRS de tribunal de recurso (ou ad quem).

23.– O regime de interposição e tramitação desse recurso segue, nos termos do disposto no artigo 83.º da LdC, o disposto nos artigos 84.º e ss. da LdC e, subsidiariamente, o RGCO e, por remissão deste, o CPP.

24.– Apesar do exposto, a AdC, pela sua natureza de entidade administrativa, não exerce - nem tem de exercer, sob pena de violação do princípio da reserva de juiz - as competências que cabem ao juiz do tribunal a quo nos recursos expressamente regulados no CPP.

25.– Com efeito, a AdC não profere despacho de admissão ou rejeição do recurso e não fixa os termos da sua subida nem o seu efeito. À AdC cabe-lhe, simplesmente, nos termos do disposto nos artigos 85.º da LdC e 62.º do RGCO, remeter o requerimento com indicação do número de processo na fase organicamente administrativa, acompanhado de quaisquer elementos ou informações que a Autoridade da Concorrência considere relevantes para a decisão do recurso, podendo juntar alegações.

26. Isto para dizer que não há, na tramitação do recurso de decisão interlocutória da AdC para o TCRS, despacho equivalente ao despacho previsto no artigo 414.º n.º 1 do CPP.

27.– O recurso nunca pode ficar retido na AdC, mesmo que esta considere que a decisão interlocutória é irrecorrível, nem lhe pode ser fixado efeito por esta Autoridade, sendo a única entidade com competência para decidir admitir ou rejeitar o recurso e fixar-lhe o seu efeito de subida o Tribunal ao qual o recurso se dirige, ou seja, o TCRS.

28.– Nesse momento, o despacho que o TCRS profere quando recebe o recurso não é regulado - por não se lhe serem aplicáveis os respectivos pressupostos legais - pelo disposto no artigo 414.º n.s 1 do CPP.

29.– constituindo, antes, um despacho proferido nos termos do artigo 63.º do RGCO, no qual o Tribunal admite ou rejeita o recurso.

30.– Note-se que, nos termos legais, o meio de reação a esse despacho é o recurso (cfr. artigo 63.º n.º 2 do RGCO) e não qualquer reclamação para o Presidente do tribunal superior ou para a conferência.

31.– O que se entende porquanto, quando profere um despacho de admissão de um recurso ao abrigo do artigo 63.º do RGCO, o Tribunal não actua enquanto Tribunal recorrido (nos termos do disposto no artigo 414.º n.º 1 do CPP, cuja decisão seja reclamável, nos termos do artigo 405.º do CPP), nem actua enquanto relator do Tribunal de recurso (nos termos do disposto no artigo 417.º n.º 5 do CPP, cuja decisão seja reclamável para a conferência desse Tribunal, nos termos do disposto no artigo 417º. n.º 8 do CPP).

32.– Reitere-se: quando o TCRS profere um despacho que admite (ou rejeita) um recurso (nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 63.º do RGCO) e, consequentemente, lhe fixa o respectivo efeito, não existe instância de sindicância da decisão relativamente ao respetivo efeito junto do Presidente do Tribunal da Relação, porquanto o artigo 405.º do CPP apenas se aplica à reclamação de despachos que não admitam ou retenham recursos, não servindo para impugnar decisões quanto aos efeitos dos recursos, nem junto da Conferência do Tribunal da Relação, que não pode imiscuir-se em decisão tomada por tribunal de hierarquia inferior, salvo quando o caso lhe seja trazido por via de um recurso.

Que vias tem, então, o visado para reagir a um despacho do TCRS que, nos termos do artigo 63.º do RGCO, admite um recurso, mas fixa-lhe um efeito que o recorrente considera errado e desadequado e que acarreta, na sua perspectiva, a violação de direitos fundamentais do visado?

A resposta encontra-se na LdC: nos termos do artigo 89.º da LdC, "[d]os sentenças e despachos do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão cabe recurso para o tribunal da relação competente, que decide em última instância".

Esta norma tem, naturalmente, que ser interpretada no contexto dos restantes preceitos que regulam os recursos em processo contraordenacional da AdC e, em particular, o artigo 84.º n.º 2 da LdC que veda a recorribilidade às decisões de mero expediente.

Assim, todos os despachos do TCRS, proferidos em sede de recursos de decisões interlocutórias ou finais da AdC, desde que não configurem decisões de mero expediente, são, nos termos legais, passíveis de recurso para o TRL.

Perante este figurino legal, menos se compreende o teor da Decisão Sumária.”

*

São estes os termos relevantes da reclamação entendendo-se esta não como a sanção do despacho do relator mas sim não comporta e/ou pressupõe qualquer legitimação de eventual desautorização do seu autor, relator, fundada nalgum ideado critério de força/autoridade resultante de virtual somatório de diferentes sensibilidades da maioria [no âmbito do processo criminal de três desembargadores: relator, adjunto e presidente da Secção, (cfr. art.º 419.º/1/2 do CPP)], mas antes, evidentemente, tão-só a oportunidade para a respectiva submissão a plural escrutinação da sua (despacho judicial) racional conformação à adequada legalidade, pela deliberativa avaliação de pertinente, esclarecida e precisa fundamentação/argumentação técnico-jurídica que o reclamante necessária e responsavelmente aduza no respectivo acto reclamativo no sentido demonstrativo da objectiva ilicitude da concernente decisão do relator, posto que, pela própria natureza e definição, a figura jurídica de reclamação – em qualquer ramo do direito cuja disciplina a contemple –, sempre se haverá de constituir numa especial prerrogativa legal-procedimental de controlo, de fundamentada impugnação do acto decisório a que se reporte, posta à disposição do destinatário que por ele se considere prejudicado, tendente à referente revogação, modificação ou substituição, por eventual ilegalidade, por si exercitável, se e enquanto se não tiver conformado – expressa ou tacitamente – com o atinente acto .

Antes de avançarmos na decisão da questão que se nos coloca relembramos que aqui estamos, numa primeira fase, a conhecer da reclamação apresentada e não do recurso propriamente dito.

O conhecimento da matéria do recurso só existe em segundo plano e se se entender que a reclamação é fundamentada.

Desde já adiantemos que assim não é.

Na decisão reclamada foi considerado, além do mais que: “No caso concreto, decidida a admissão do recurso pelo Tribunal a quo”, o recorrente “não pode do mesmo reclamar.”.

Vamos esclarecer. O TCRS é o Tribunal a quo. Trata-se do Tribunal de 1ª instância e é de instância inferior ao Tribunal da Relação.

A referência feita ao Tribunal a quo é ao TCRS.

Mais se disse “Na verdade, o recorrente apenas pode reclamar para o presidente do tribunal a que o recurso se dirige, do despacho que não admitir ou do que retiver o recurso.”

Como bem refere a reclamante, no caso concreto do procedimento contraordenacional, a entidade administrativa não admite ou deixa de admitir recursos.

Efectivamente, nos termos do disposto nos artigos 85.º da LdC e 62.º do RGCO, a entidade administrativa limita-se a remeter o requerimento com indicação do número de processo na fase organicamente administrativa, acompanhado de quaisquer elementos ou informações que a Autoridade da Concorrência considere relevantes para a decisão do recurso, podendo juntar alegações.

É o Tribunal a quo (o TCRS) que vai definir a admissibilidade do recurso e o seu efeito.

Deste despacho pode a reclamante reagir como a própria sugere com um recurso mas só em caso de não admissão do mesmo (como aliás resulta expresso do artº 63º nº 2 do RGCO). Deste despacho não existe qualquer despacho que possa ser acolhido, como sugerido, ao abrigo do disposto 89º da LdC.

Como se salienta no Comentário Conimbricense à Lei da Concorrência, 2ª edição, Livraria Almedina, Coimbra, 2017, pág. 996 “ Da regra da recorribilidade não resulta porém que sejam passíveis de recurso todas as decisões do TCRS. Desde logo por força do disposto na al. a) do nº 2 deste artigo, que deve ser entendida nesta parte como uma regra geral de recorribilidade, as decisões de mero expediente não são recorríveis (…)”.

Ora, na decisão reclamada fez-se constar que “Tendo sido admitido o recurso e fixado o efeito e o regime de subida, não se verifica nenhuma das circunstâncias que podiam servir de base a reclamação e muito menos a recurso, para o que faleceria, desde logo, legitimidade ao recorrente, porquanto a sua pretensão foi, no essencial, admitida, não constituindo uma decisão contra ele proferida, ou que o afecte desfavoravelmente no rigor dos princípios.

O recurso foi admitido e não ficou retido”

Mais se fez constar na decisão reclamada que “Como defendia o Conselheiro Maia Gonçalves, em anotação ao artigo 405.º do CPP, a reclamação prevista no n.º1 do artigo 405.º do CPP é a única forma de atacar o despacho que não admitiu ou reteve o recurso, ficando, portanto, excluída a via de recurso, Seria incompreensível que a lei fornecesse aqui vias alternativas e mais garantias do que as que concede para impugnar decisões de fundo do tribunal.”

Assim, não pode proceder a reclamação. Conquanto o processo contraordenacional tenha regras próprias, o que nos leva a considerar que o despacho do juiz do TCRS que se debruça sobre processo administrativo que lhe é remetido só é passível de recurso se o Tribunal a quo (o TCRS) não admitir o recurso.

Se o recurso for admitido, embora com um efeito do qual o visado (recorrente) discorda, não há, como decidido, qualquer recurso.

É verdade que em tese admitimos que não é inócuo este ou aquele efeito de um recurso mas daí, repete-se, não resulta uma inconstitucionalidade.

Termos em que se julga improcedente a reclamação mantendo-se o decidido na decisão sumária.

Custas pela recorrente que se fixam em 3 (três) U.C.

Notifique

Acórdão elaborado pelo 1º signatário em processador de texto que o reviu integralmente sendo assinado pelo próprio e pela Veneranda Juiz Adjunta

Lisboa e Tribunal da Relação, 26 de Maio de 2020
Rui Miguel de Castro Ferreira Teixeira
Ana Isabel Mascarenhas Pessoa

Acordam os juízes que compõem a Secção de Propriedade Intelectual, Supervisão, Regulação e Concorrência do Tribunal da Relação de Lisboa. Reclama para a conferência da Secção de Propriedade Intelectual, Supervisão, Regulação e Concorrência deste Tribunal da Relação Meo - SERVIÇOS DE COMUNICAÇÕES E MULTIMÉDIA, S.A. ("MEO") da decisão Sumária de 17.02.2020 sustentando, no essencial, no que à reclamação diz respeito, que: “(…) 20.– Nos termos do disposto no artigo 84.º n.º 1 da LdC, "cabe recurso das decisões proferidas pela Autoridade da Concorrência cuja irrecorribilidade não estiver expressamente prevista na presente lei". 21.– Já nos termos do n.º 3 do mencionado preceito, esse recurso é da competência do TCRS. 22.– Tal significa que, no figurino legal da impugnação das decisões interlocutórias da AdC em sede de processo de contraordenação, a AdC assume a qualidade de entidade recorrida (ou a quo) e o TCRS de tribunal de recurso (ou ad quem). 23.– O regime de interposição e tramitação desse recurso segue, nos termos do disposto no artigo 83.º da LdC, o disposto nos artigos 84.º e ss. da LdC e, subsidiariamente, o RGCO e, por remissão deste, o CPP. 24.– Apesar do exposto, a AdC, pela sua natureza de entidade administrativa, não exerce - nem tem de exercer, sob pena de violação do princípio da reserva de juiz - as competências que cabem ao juiz do tribunal a quo nos recursos expressamente regulados no CPP. 25.– Com efeito, a AdC não profere despacho de admissão ou rejeição do recurso e não fixa os termos da sua subida nem o seu efeito. À AdC cabe-lhe, simplesmente, nos termos do disposto nos artigos 85.º da LdC e 62.º do RGCO, remeter o requerimento com indicação do número de processo na fase organicamente administrativa, acompanhado de quaisquer elementos ou informações que a Autoridade da Concorrência considere relevantes para a decisão do recurso, podendo juntar alegações. 26. Isto para dizer que não há, na tramitação do recurso de decisão interlocutória da AdC para o TCRS, despacho equivalente ao despacho previsto no artigo 414.º n.º 1 do CPP. 27.– O recurso nunca pode ficar retido na AdC, mesmo que esta considere que a decisão interlocutória é irrecorrível, nem lhe pode ser fixado efeito por esta Autoridade, sendo a única entidade com competência para decidir admitir ou rejeitar o recurso e fixar-lhe o seu efeito de subida o Tribunal ao qual o recurso se dirige, ou seja, o TCRS. 28.– Nesse momento, o despacho que o TCRS profere quando recebe o recurso não é regulado - por não se lhe serem aplicáveis os respectivos pressupostos legais - pelo disposto no artigo 414.º n.s 1 do CPP. 29.– constituindo, antes, um despacho proferido nos termos do artigo 63.º do RGCO, no qual o Tribunal admite ou rejeita o recurso. 30.– Note-se que, nos termos legais, o meio de reação a esse despacho é o recurso (cfr. artigo 63.º n.º 2 do RGCO) e não qualquer reclamação para o Presidente do tribunal superior ou para a conferência. 31.– O que se entende porquanto, quando profere um despacho de admissão de um recurso ao abrigo do artigo 63.º do RGCO, o Tribunal não actua enquanto Tribunal recorrido (nos termos do disposto no artigo 414.º n.º 1 do CPP, cuja decisão seja reclamável, nos termos do artigo 405.º do CPP), nem actua enquanto relator do Tribunal de recurso (nos termos do disposto no artigo 417.º n.º 5 do CPP, cuja decisão seja reclamável para a conferência desse Tribunal, nos termos do disposto no artigo 417º. n.º 8 do CPP). 32.– Reitere-se: quando o TCRS profere um despacho que admite (ou rejeita) um recurso (nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 63.º do RGCO) e, consequentemente, lhe fixa o respectivo efeito, não existe instância de sindicância da decisão relativamente ao respetivo efeito junto do Presidente do Tribunal da Relação, porquanto o artigo 405.º do CPP apenas se aplica à reclamação de despachos que não admitam ou retenham recursos, não servindo para impugnar decisões quanto aos efeitos dos recursos, nem junto da Conferência do Tribunal da Relação, que não pode imiscuir-se em decisão tomada por tribunal de hierarquia inferior, salvo quando o caso lhe seja trazido por via de um recurso. Que vias tem, então, o visado para reagir a um despacho do TCRS que, nos termos do artigo 63.º do RGCO, admite um recurso, mas fixa-lhe um efeito que o recorrente considera errado e desadequado e que acarreta, na sua perspectiva, a violação de direitos fundamentais do visado? A resposta encontra-se na LdC: nos termos do artigo 89.º da LdC, "[d]os sentenças e despachos do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão cabe recurso para o tribunal da relação competente, que decide em última instância". Esta norma tem, naturalmente, que ser interpretada no contexto dos restantes preceitos que regulam os recursos em processo contraordenacional da AdC e, em particular, o artigo 84.º n.º 2 da LdC que veda a recorribilidade às decisões de mero expediente. Assim, todos os despachos do TCRS, proferidos em sede de recursos de decisões interlocutórias ou finais da AdC, desde que não configurem decisões de mero expediente, são, nos termos legais, passíveis de recurso para o TRL. Perante este figurino legal, menos se compreende o teor da Decisão Sumária.” * São estes os termos relevantes da reclamação entendendo-se esta não como a sanção do despacho do relator mas sim não comporta e/ou pressupõe qualquer legitimação de eventual desautorização do seu autor, relator, fundada nalgum ideado critério de força/autoridade resultante de virtual somatório de diferentes sensibilidades da maioria [no âmbito do processo criminal de três desembargadores: relator, adjunto e presidente da Secção, (cfr. art.º 419.º/1/2 do CPP)], mas antes, evidentemente, tão-só a oportunidade para a respectiva submissão a plural escrutinação da sua (despacho judicial) racional conformação à adequada legalidade, pela deliberativa avaliação de pertinente, esclarecida e precisa fundamentação/argumentação técnico-jurídica que o reclamante necessária e responsavelmente aduza no respectivo acto reclamativo no sentido demonstrativo da objectiva ilicitude da concernente decisão do relator, posto que, pela própria natureza e definição, a figura jurídica de reclamação – em qualquer ramo do direito cuja disciplina a contemple –, sempre se haverá de constituir numa especial prerrogativa legal-procedimental de controlo, de fundamentada impugnação do acto decisório a que se reporte, posta à disposição do destinatário que por ele se considere prejudicado, tendente à referente revogação, modificação ou substituição, por eventual ilegalidade, por si exercitável, se e enquanto se não tiver conformado – expressa ou tacitamente – com o atinente acto . Antes de avançarmos na decisão da questão que se nos coloca relembramos que aqui estamos, numa primeira fase, a conhecer da reclamação apresentada e não do recurso propriamente dito. O conhecimento da matéria do recurso só existe em segundo plano e se se entender que a reclamação é fundamentada. Desde já adiantemos que assim não é. Na decisão reclamada foi considerado, além do mais que: “No caso concreto, decidida a admissão do recurso pelo Tribunal a quo”, o recorrente “não pode do mesmo reclamar.”. Vamos esclarecer. O TCRS é o Tribunal a quo. Trata-se do Tribunal de 1ª instância e é de instância inferior ao Tribunal da Relação. A referência feita ao Tribunal a quo é ao TCRS. Mais se disse “Na verdade, o recorrente apenas pode reclamar para o presidente do tribunal a que o recurso se dirige, do despacho que não admitir ou do que retiver o recurso.” Como bem refere a reclamante, no caso concreto do procedimento contraordenacional, a entidade administrativa não admite ou deixa de admitir recursos. Efectivamente, nos termos do disposto nos artigos 85.º da LdC e 62.º do RGCO, a entidade administrativa limita-se a remeter o requerimento com indicação do número de processo na fase organicamente administrativa, acompanhado de quaisquer elementos ou informações que a Autoridade da Concorrência considere relevantes para a decisão do recurso, podendo juntar alegações. É o Tribunal a quo (o TCRS) que vai definir a admissibilidade do recurso e o seu efeito. Deste despacho pode a reclamante reagir como a própria sugere com um recurso mas só em caso de não admissão do mesmo (como aliás resulta expresso do artº 63º nº 2 do RGCO). Deste despacho não existe qualquer despacho que possa ser acolhido, como sugerido, ao abrigo do disposto 89º da LdC. Como se salienta no Comentário Conimbricense à Lei da Concorrência, 2ª edição, Livraria Almedina, Coimbra, 2017, pág. 996 “ Da regra da recorribilidade não resulta porém que sejam passíveis de recurso todas as decisões do TCRS. Desde logo por força do disposto na al. a) do nº 2 deste artigo, que deve ser entendida nesta parte como uma regra geral de recorribilidade, as decisões de mero expediente não são recorríveis (…)”. Ora, na decisão reclamada fez-se constar que “Tendo sido admitido o recurso e fixado o efeito e o regime de subida, não se verifica nenhuma das circunstâncias que podiam servir de base a reclamação e muito menos a recurso, para o que faleceria, desde logo, legitimidade ao recorrente, porquanto a sua pretensão foi, no essencial, admitida, não constituindo uma decisão contra ele proferida, ou que o afecte desfavoravelmente no rigor dos princípios. O recurso foi admitido e não ficou retido” Mais se fez constar na decisão reclamada que “Como defendia o Conselheiro Maia Gonçalves, em anotação ao artigo 405.º do CPP, a reclamação prevista no n.º1 do artigo 405.º do CPP é a única forma de atacar o despacho que não admitiu ou reteve o recurso, ficando, portanto, excluída a via de recurso, Seria incompreensível que a lei fornecesse aqui vias alternativas e mais garantias do que as que concede para impugnar decisões de fundo do tribunal.” Assim, não pode proceder a reclamação. Conquanto o processo contraordenacional tenha regras próprias, o que nos leva a considerar que o despacho do juiz do TCRS que se debruça sobre processo administrativo que lhe é remetido só é passível de recurso se o Tribunal a quo (o TCRS) não admitir o recurso. Se o recurso for admitido, embora com um efeito do qual o visado (recorrente) discorda, não há, como decidido, qualquer recurso. É verdade que em tese admitimos que não é inócuo este ou aquele efeito de um recurso mas daí, repete-se, não resulta uma inconstitucionalidade. Termos em que se julga improcedente a reclamação mantendo-se o decidido na decisão sumária. Custas pela recorrente que se fixam em 3 (três) U.C. Notifique Acórdão elaborado pelo 1º signatário em processador de texto que o reviu integralmente sendo assinado pelo próprio e pela Veneranda Juiz Adjunta Lisboa e Tribunal da Relação, 26 de Maio de 2020 Rui Miguel de Castro Ferreira Teixeira Ana Isabel Mascarenhas Pessoa