Processo:10866/19.5T8LSB-A.L1-7
Data do Acordão: 13/07/2021Relator: EDGAR TABORDA LOPESTribunal:trl
Decisão: Meio processual:

I – O regime da apresentação da prova documental em processo civil mostra-se estruturado em três patamares temporais: - o regime-regra previsto no n.º 1 do artigo 423.º do Código de Processo Civil, de acordo com o qual “Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes”; - num segundo nível, de excepção, o n.º 2, permite que “Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado”; - e, num terceiro nível, o n.º 3, acrescenta que “Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior”. II – Este regime perdura até ao encerramento da discussão, nos termos do artigo 425.º. III – A ratio deste regime conjuga economia processual, auto-responsabilidade das partes, com uma cláusula geral de adequação, visando obstar à ocorrência de surpresas no julgamento, decorrentes da junção inesperada de documentos, com consequentes arrastamento ou adiamento de audiências, assim se promovendo uma maior lisura e cooperação processual na definição das estratégias probatórias”. IV - ultrapassado o momento inicial da acção (n.º 1) e o dos 20 dias antes do início da audiência (n.º 2), a junção de documentos, para ser admitida, pressupõe a presença de dois requisitos cumulativos (que têm de se alegados e provados pelo/a requerente: i- o não ter sido possível fazê-lo até esse momento; ii- que essa junção/apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior. V – A apreciação dos requisitos referidos deve ser feita considerando um padrão de comportamento de normal diligência por parte do/a apresentante. VI – O conceito de “ocorrência posterior” implica sempre uma apreciação casuística, mas só pode respeitar a factos instrumentais ou relativos a pressupostos processuais, e não a factos essenciais (porque se reportados aos principais, isso seria a abertura de uma porta lateral que o legislador não quis manifestamente abrir, ao lado da principal que fechou). VII – O objectivo deste regime não é o de permitir produzir uma nova prova sobre os factos, corrigindo a anteriormente feita (ou não) nos tempos processualmente adequados. VIII - A concreta configuração dos factos dada no decurso das suas declarações faz parte quer do que é a natureza (única e personalizada) de um depoimento testemunhal, quer do que é expectável num depoimento sobre o relacionamento comercial entre empresas. IX - O depoimento em que a testemunha se refira a factos anteriormente alegados nos autos não pode constituir ocorrência posterior justificativa de apresentação de documento fora dos tempos legalmente previstos, uma vez que não se reporta “a um facto novo de que o juiz pode conhecer”. X – O uso do princípio do inquisitório previsto no artigo 411.º do CPC nesta matéria deve estar reservado para obstar a situações iníquas, sob pena de constituir um benefício do infractor às regras razoáveis e compreensíveis que regem a apresentação da prova documental nos processos. XI - As declarações de parte não são um meio para a parte pontuar, comentar ou retocar a restante prova produzida, nem – noutro plano – constituem ou podem ter a veleidade de constituir uma segunda oportunidade para complementar probatoriamente as suas insuficiências anteriores, ou a displicência com que pudesse ter encarado a produção da prova, nomeadamente depois de esta já ter ocorrido e originado uma situação factual configurada ou estabelecida (devendo indeferir a realização de novas declarações de parte, a pedido desta, para “responder” a uma testemunha).

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
EDGAR TABORDA LOPES
Descritores
MEIOS DE PROVA DOCUMENTOS JUNÇÃO AOS AUTOS APRESENTAÇÃO FORA DOS ARTICULADOS OCORRÊNCIA POSTERIOR
No do documento
RL
Data do Acordão
07/14/2021
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO
Decisão
IMPROCEDENTE
Sumário
I – O regime da apresentação da prova documental em processo civil mostra-se estruturado em três patamares temporais: - o regime-regra previsto no n.º 1 do artigo 423.º do Código de Processo Civil, de acordo com o qual “Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes”; - num segundo nível, de excepção, o n.º 2, permite que “Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado”; - e, num terceiro nível, o n.º 3, acrescenta que “Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior”. II – Este regime perdura até ao encerramento da discussão, nos termos do artigo 425.º. III – A ratio deste regime conjuga economia processual, auto-responsabilidade das partes, com uma cláusula geral de adequação, visando obstar à ocorrência de surpresas no julgamento, decorrentes da junção inesperada de documentos, com consequentes arrastamento ou adiamento de audiências, assim se promovendo uma maior lisura e cooperação processual na definição das estratégias probatórias”. IV - ultrapassado o momento inicial da acção (n.º 1) e o dos 20 dias antes do início da audiência (n.º 2), a junção de documentos, para ser admitida, pressupõe a presença de dois requisitos cumulativos (que têm de se alegados e provados pelo/a requerente: i- o não ter sido possível fazê-lo até esse momento; ii- que essa junção/apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior. V – A apreciação dos requisitos referidos deve ser feita considerando um padrão de comportamento de normal diligência por parte do/a apresentante. VI – O conceito de “ocorrência posterior” implica sempre uma apreciação casuística, mas só pode respeitar a factos instrumentais ou relativos a pressupostos processuais, e não a factos essenciais (porque se reportados aos principais, isso seria a abertura de uma porta lateral que o legislador não quis manifestamente abrir, ao lado da principal que fechou). VII – O objectivo deste regime não é o de permitir produzir uma nova prova sobre os factos, corrigindo a anteriormente feita (ou não) nos tempos processualmente adequados. VIII - A concreta configuração dos factos dada no decurso das suas declarações faz parte quer do que é a natureza (única e personalizada) de um depoimento testemunhal, quer do que é expectável num depoimento sobre o relacionamento comercial entre empresas. IX - O depoimento em que a testemunha se refira a factos anteriormente alegados nos autos não pode constituir ocorrência posterior justificativa de apresentação de documento fora dos tempos legalmente previstos, uma vez que não se reporta “a um facto novo de que o juiz pode conhecer”. X – O uso do princípio do inquisitório previsto no artigo 411.º do CPC nesta matéria deve estar reservado para obstar a situações iníquas, sob pena de constituir um benefício do infractor às regras razoáveis e compreensíveis que regem a apresentação da prova documental nos processos. XI - As declarações de parte não são um meio para a parte pontuar, comentar ou retocar a restante prova produzida, nem – noutro plano – constituem ou podem ter a veleidade de constituir uma segunda oportunidade para complementar probatoriamente as suas insuficiências anteriores, ou a displicência com que pudesse ter encarado a produção da prova, nomeadamente depois de esta já ter ocorrido e originado uma situação factual configurada ou estabelecida (devendo indeferir a realização de novas declarações de parte, a pedido desta, para “responder” a uma testemunha).
Decisão integral
Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
 
Relatório
No decurso do processo declarativo sob a forma comum que G… intentou contra P…[1], em sede de audiência de julgamento veio a ser proferido o seguinte Despacho:
“I – Requerimento a ref.ª 32336224 [41996886] e resposta a ref.ª 32392716 [42057929]:
A Autora, a ref.ª 32336224 [41996886], veio requerer a admissão de 12 documentos, bem como requerer a nova tomada de declarações de parte de MS.
A ref.ª 32392716 [42057929], a Ré respondeu, opondo-se à junção dos documentos, bem como à nova tomada de declarações de MS, invocando, em suma, que não se verificam os pressupostos legais e inexistindo factos novos.
1 – Da junção dos documentos:
Para a junção dos documentos, a Autora invoca que na audiência final de 29 de Março, a testemunha AR aflorou matéria atinente à factura emitida pela Ré à Autora no valor de € 152.535,10, em Junho de 2017. Refere que a alegada existência de indicação ou aprovação da Autora, através de AC, para a emissão da factura em discussão, constitui um facto novo e que a suposta existência de valores de facturação premeditadamente inflacionadas pela Autora, por decisão de um antigo membro da sua administração, também constitui um facto novo.
Conclui que esses factos referidos por essa testemunha são falsos e que os documentos que ora requer a sua junção são relevantes e essenciais à descoberta da verdade, na exacta medida em que infirmam factos relatados na audiência final.
Invoca ainda que a testemunha SM, ouvido na segunda sessão, fez referência a débitos referentes a campanhas / acções promocionais assinadas por AC, sem nunca especificar a que débitos se referia, nem concretizou as acções promocionais subjacentes às notas emitidas, respectivas datas e valores em questão.
Refere que apesar de a Ré ter junto com a sua contestação documentos atinentes a supostas acções promocionais, nunca alegou que algum desses documentos houvesse sido assinado por AC, pelo que se trata de matéria nova e conclui que a junção dos documentos ora apresentados são pertinentes e relevantes para a descoberta da verdade.
Cumpre apreciar e decidir.
Nos termos dos artigos 423.º e 425.º do Código de Processo Civil, a apresentação de documentos em primeira instância pode ocorrer em três momentos distintos:
1 - com o articulado em que sejam alegados os factos correspondentes.
2 - até 20 dias antes da audiência final.
3 - até ao encerramento da discussão quando a apresentação, não tenha sido possível até àquele momento; ou se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.
Os documentos são apresentados depois de iniciada a audiência final e foi-o com a invocação de verificação de factos novos provenientes dos depoimentos das testemunhas AR e SM.
Invoca a Autora que essas testemunhas fizeram declarações que constituem factos novos e por isso, requer a junção de documentos para infirmar tais declarações.
A lei não indica o que possa considerar-se como ocorrência posterior. Mas a ocorrência posterior não pode decorrer das meras declarações de testemunhas.
Pois, as declarações das testemunhas não constituem factos mas são meios de prova para a afirmação ou não de factos.
Ora, as referidas testemunhas depuseram sobre factos já trazidos ao processo pelos diversos articulados apresentados pelas partes.
Se esses factos já foram invocados pelas partes nos respectivos articulados e enunciados nos temas da prova, os documentos deveriam ter sido juntos com os respectivos articulados ou, com multa, até 20 dias antes da data da audiência final, como decorre do artigo 423.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Ora, se as testemunhas se referiram a factos essenciais (alegadamente novos), os mesmos deveriam constar dos temas da prova e enquadrarem-se no objecto do litígio, o que não é o caso.
O depoimento, ou parte de depoimento, apto a constituir ocorrência posterior justificativa de apresentação de documento, fora dos tempos legalmente previstos, terá de ser aquele que afirma um facto novo de que o juiz pode conhecer. Como os factos essenciais têm de constar necessariamente de articulado ordinário ou extraordinário, poderá concluir-se que este facto novo será de natureza instrumental, complementar ou concretizador.
Quanto aos factos (não alegados) que sejam complemento ou concretização dos que as partes alegaram e resultem da instrução da causa, a sua consideração pelo juiz implica o contraditório pleno - refutação e prova – nos termos do artigo 5.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Civil.
Assim sendo, a introdução de um facto com tal natureza em sede de depoimento de uma testemunha, sempre autorizaria, por esta norma, a produção de prova, v.g. documental, em momento ulterior aos previstos no artigo 523.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil. A excepção da segunda parte do artigo 423.º, n.º 3, do CPC, é meramente concretizadora daquele princípio no que à prova documental concerne.
Os factos instrumentais, indiciários ou probatórios, serão assim o campo natural de aplicação da norma da segunda parte do artigo 423.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.
Factos instrumentais são os que interessam indirectamente à solução do pleito, por servirem para demonstrar a verdade ou falsidade dos factos pertinentes; não pertencem à norma fundamentadora do direito e são-lhe, em si, indiferentes, servindo apenas para, da sua existência, se concluir pela existência dos próprios factos fundamentadores do direito ou da excepção.
Conclui-se assim que o depoimento de uma testemunha pode constituir ocorrência posterior que torna necessária a apresentação de um documento fora dos momentos previstos no artigo 423.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil, desde que no seu depoimento invoque factos que sejam novos no processo e não possam ser qualificados como factos essenciais.
Ora, no entender da Autora, a testemunha AR no que concerne à emissão da factura no valor de € 152.535,10 refere que houve indicação ou aprovação da Autora, através de AC e que a existência de valores de facturação foram premeditadamente inflacionados pela Autora. Por outro lado, a testemunha SM não especifica a que débitos se refere, nem concretiza as acções promocionais, subjacentes às notas emitidas, respectivas datas e valores em questão.
Isto não são factos, são afirmações contrárias aos factos que constam dos articulados ou são afirmações vagas e / ou imprecisas.
Inexiste por isso ocorrência posterior justificativa da apresentação, pelo que conclui-se pela intempestividade da apresentação e inadmissibilidade da junção dos documentos.
2 – Das novas declarações de parte de MS.
A Autora requer que sejam tomadas novas declarações a MS, aos artigos referidos no requerimento ora em apreço.
Refere que MS já foi ouvido, mas estando em causa factualidade nova e relevante e que, no caso da alegada decisão da Autora de inflacionar facturas, chega a ser caluniosa e lesiva da sua honra, assistindo-lhe o direito de contraditá-la por via da prestação de novas declarações.
Ora, como foi anteriormente referido quanto à questão da junção dos documentos, não estamos perante factos novos, pelo que não há fundamento para ser ouvido novamente MS em declarações de parte.
*
Pelo exposto, indefere-se o requerido pela Autora no que respeita à junção dos documentos, bem como quanto às novas declarações de parte de MS e, em consequência, ordena-se o desentranhamento dos documentos apresentados com o requerimento de ref.ª 32336224 [41996886].
Tendo em conta que o requerimento em apreço é uma ocorrência estranha ao desenvolvimento normal da lide, condena-se a Autora nas custas do incidente que se fixa em 2 (duas) UC’s, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 7.º, n.º 4 e n.º 8, do Regulamento das Custas Processuais.
Notifique”.
Destes despachos veio a Autora apresentar Recurso lavrando as seguintes Conclusões:
A - Ao indeferir a junção aos autos dos documentos n.º 1 a n.º 8 apresentados pela Recorrente (requerimento com a referência Citius 41996886), o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 423.º, n.º 3 do CPC , bem como o princípio do inquisitório, consagrado no artigo 411.º do mesmo diploma legal.
B. - Nos termos do artigo 423.º, n.º 3 do CPC, após o limite temporal previsto no n.º 2 do mesmo preceito normativo, são admitidos no processo os documentos cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.
C. No caso vertente, no de curso do depoimento prestado em audiência, a testemunha AR relatou factos novos atinentes à emissão de um débito pela Recorrida no valor de EUR 152,535.10
D. A testemunha AR afirmou, designadamente, que a sua intervenção a esse respeito discutindo e validando a emissão do referido débito com a Recorrida, se deu a pedido de AC, da direcção comercial da Recorrente, e em estreita coordenação com aquele
E. Cotejando os articulados das partes, constata-se que as afirmações da testemunha AR vieram introduzir um elemento novo, nunca até então invocado no processo
F. Com efeito, nunca, nesses articulados a Recorrida mencionou o nome de AC, muito menos alegou que este tivesse estado presente, ainda que à distância, em qualquer reunião mantida com AR para discutir o débito em questão;
G. Em prol da sua pretensão, a Recorrida limitou se a alegar que as facturas emitidas pela Recorrente foram «emitidas por valores incorrectos, apenas parcialmente devidos» e que, com vista a rectificar a situação, acordou a emissão de uma nota de débito com AR, agente da Recorrente e pessoa que a Recorrida reputa sempre, ao longo dos referidos articulados, de «representante da Autora»
H. Por se tratar de factualidade nova, de que o Tribunal a quo pode conhecer, impunha-se que este tivesse admitido a junção do acervo de e mails apresentado pela Recorrente, ao abrigo do previsto no artigo 423.º, n.º 3 do CPC
I. Conforme tem vindo a ser defendido pela jurisprudência, consubstancia ocorrência posterior justificativa de apresentação de documento, fora dos prazos previstos no n.º 1 e n.º 2 do artigo 423.º do CPC, o depoimento que afirma um facto novo de que o juiz pode conhecer (cfr., por todos, o acórdão deste Venerando Tribunal com data de 26 de Setembro de 2019, proferido no âmbito do processo n.º 27/18.6T8ALQ27/18.6T8ALQ--A.L1A.L1--66 e disponível em www.dgsi.pt);
J. Configura também ocorrência posterior, para efeitos da lei, o depoimento prestado em audiência por testemunha, visando a junção de documentos demonstrar a falsidade dos factos referidos nesse depoimento (cfr. o acórdão deste Venerando Tribunal com data de 8 de Fevereiro de 2018, proferido no âmbito do processo n.º 207/14.3TVLSB.L1 e igualmente disponível em www.dgsi.pt)
K. Assim acontece no vertente caso;
L. Os documentos ora em causa, cuja pertinência só se fez sentir na sequência do depoimento de AR, tornam claro que, ao contrário do que este relatou, a emissão do débito em discussão não foi antecedida nem acompanhada de qualquer conversa com AC, muito menos de qualquer indicação sua;
M. Ainda que assim não fosse, sempre se impunha que os referidos documentos tivessem sido admitidos ao abrigo do princípio do inquisitório e do poder-dever previsto no artigo 411.º do CPC, visto que a relevância que assumem para a boa decisão da causa excede largamente as eventuais desvantagens decorrentes da sua junção;
N. Iguais conclusões podem ser retiradas relativamente aos documentos n.º 9 a n.º 11, juntos pela Recorrente;
O. No seu depoimento, AR aludiu a suposta decisão de PI, antigo administrador da Recorrente, de falsear valores de facturação, inflacionando-os deliberadamente, tudo com vista a permitir à Recorrente alcançar determinados resultados financeiros no fecho do exercício de 2016;
P. Tal explicaria, no dizer da testemunha, a necessidade da necessidade de rectificar as facturas emitidas pela Recorrente;
Q. Também aqui foi a Recorrente totalmente surpreendida pelo relato da testemunha, que para além de incidir sobre circunstancialismo novo, trazido então pela primeira vez ao processo, se mostra totalmente falso e assume carácter gravemente calunioso;
R. Por assim ser, nunca o Tribunal a quo podia ter decidido pela inadmissibilidade da junção dos documentos n.º 9 e n.º 10, documentos que comprovam, com toda a clareza, que aquando da emissão de parte muito significativa das referidas facturas pela Recorrente, já PI havia abandonado a empresa e a sua administração;
S. Do mesmo passo, deveria o Tribunal a quo ter admitido a junção do Doc. n.º 11, também pertinente e relevante, já que dele se retira que, contrariamente ao afirmado pela testemunha AR, a Recorrente não teve o fecho do seu ano financeiro em Junho de 2016;
T. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou mais uma vez o disposto nos artigo 423.º, n.º 3 e 411.º do CPC;
U. Sendo ainda certo que, ao coarctar à Recorrente a possibilidade de contraditar as afirmações ligeiras e caluniosas da testemunha, o Tribunal fez igual mente tábua rasa das exigências do princípio do contraditório (artigo 3.º, n.º 3 do CPC);
V. Censura idêntica merece a decisão recorrida no que tange ao Doc. n.º 12;
W. No seu depoimento, a testemunha SM afirmou que alguns dos débitos atinentes às acções promocionais alegadamente acordadas com a Recorrente foram assinados por AC;
X. Com a contestação, a Recorrida juntou aos autos documentos respeitantes a supostas acções promocionais (cfr. documentos 41 a 47 da contestação)
Y. Sucede que a Recorrida manteve sempre que era com AR, agente da Recorrente, que «em todos os momentos eram tidas conversações quanto à efectiva relação comercial, sendo este o contacto junto da R. para a discussão de qualquer assunto, nomeadamente, acordadas as quantidades a encomendar, as acções promocionais inerentes à comercialização dos produtos e todas as outras condições específicas» (artigo 33.º da contestação);
Z. Com efeito, nunca a Recorrida alegou que que algum desses documentos tivesse sido assinado por AC, a quem de resto, muito sintomaticamente, não é feita qualquer referência na contestação;
AA. Ao afirmar que AC assinou débitos promocionais, a testemunha SM introduziu factos novos no processo; 
BB. Por essa razão impunha se que o Tribunal a quo tivesse admitido a junção do referido Doc n.º 12 cujo teor permite infirmar que AC tenha aposto a sua assinatura em qualquer um dos débitos invocados pela Recorrida;
CC. Assim não sucedeu, porém, voltando o Tribunal a quo, com a sua decisão, a violar as normas dos artigo 423.º, n.º 3 e 411.º do CPC;
DD. Pelas razões invocadas, isto é, por se estar perante factualidade nova de que o Tribunal a quo pode conhecer, mal andou este ao indeferir a tomada de novas declarações de parte à Recorrente;
EE. Com tal decisão, o Tribunal a quo não apenas coarctou à Recorrente um direito que direito que lhe assiste nos termos do artigo 466.º, n.º 1 do CPC (direito esse direito esse cujo exercício não acarreta qualquer prejuízo para a igualdade de armas, visto que a Recorrida poderá sempre, a qualquer momento até ao início das alegações orais, a qualquer momento até ao início das alegações orais, requerer igualmente a prestação de declarações de parte), como voltou a sacrificar as exigências do contraditório e da descoberta da verdade material;
FF. Deve assim o despacho proferido ser integralmente revogado e substituído por outro que, aplicando correctamente as normas previstas nos artigos 423.º, n.º 3 e 411.º 3.º, n. º3 e 466., n.º 1 do CPC , admita os meios de prova requeridos pela Recorrente.
Por seu turno, a Recorrida apresentou Contra-Alegações, culminando com as seguintes Conclusões:
1. Não existe qualquer fundamento para que a Recorrente venha agora proceder à junção aos autos de diversos documentos, junção essa tardia e intempestiva, não lhe assistindo qualquer razão na sua pretensão.
2. Os documentos que a Recorrente pretende juntar foram apresentados depois de se ter dado início à audiência final, sendo certo que, nos termos dos artigos 423.º e 425.º do CPC, a junção de documentos apenas pode ocorrer nos três momentos distintos aí previstos.
3. Das declarações de duas das testemunhas arroladas pela Recorrida, os Senhores AR e SM, não resulta a introdução de quaisquer elementos novos nunca relatados nos autos, tal como invocando pela Recorrente, tais declarações são apenas meios de prova que visam confirmar, ou não, os factos já trazidos para os autos pelas Partes e que serviram de base à criação dos temas da prova em discussão.
4. Apesar de indicar várias vezes que existem factos novos a Recorrente não indica que factos são esses e que temas da prova daí deveriam resultar. 
5. Todos os documentos agora juntos são prévios à propositura da ação e podiam ter sido juntos com a Petição Inicial ou com a Réplica, sendo certo que a Recorrente optou por não os juntar, não existindo qualquer fundamento para admitir uma ocorrência posterior, justificativa de apresentação dos documentos fora dos tempos previstos no art.º 423.º do CPC.
6. O Tribunal a quo decidiu bem ao concluir pela intempestividade da apresentação dos documentos em causa que e pela inadmissibilidade da respectiva junção.
7. Diga-se ainda que, a propósito de eventuais declarações que poderiam ter sido prestadas pelo Senhor AC, testemunha arrolada pela Recorrente, as mesmas não ocorreram pelo simples facto de a Recorrente ter prescindido do seu depoimento.
8. De igual forma não existe fundamento no pedido apresentado pela Recorrente para a tomada de novas declarações de parte pelo Senhor MS, invocando que, estando em causa factualidade nova a discutir, lhe assiste o direito de sobre tais factos novos se pronunciar.
9. Tal como invocado a propósito da junção de novos documentos, também quanto à tomada de declarações de parte não existe qualquer fundamento para ser ouvido novamente o senhor MS.
10. A Recorrida acompanha integralmente o entendimento do Tribunal ad quo também quanto a este ponto.
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Questões a Decidir
São as Conclusões do(s)/a(s) recorrente(s) que, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, delimitam objectivamente a esfera de atuação do tribunal ad quem (exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial, como refere, ABRANTES GERALDES[2]), sendo certo que tal limitação já não abarca o que concerne às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artigo 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil), aqui se incluindo qualificação jurídica e/ou a apreciação de questões de conhecimento oficioso.
In casu, e na decorrência das Conclusões da Recorrente, há que verificar:
I – da correcção do despacho recorrido quanto ao indeferimento da junção de documentos em audiência;
I – da correcção do despacho recorrido quanto ao indeferimento de novas declarações de parte pela Autora.
Corridos que se mostram os Vistos, cumpre decidir.
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Fundamentação de Facto
A factualidade relevante é a constante do Relatório supra.
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Fundamentação de Direito       
“Os documentos não são factos, antes meios de prova de factos. Por isso se justifica que a sua apresentação coincida com a alegação dos factos que a parte se propõe demonstrar, solução que, em certa medida, foi agora estendida aos demais meios de prova, os quais devem ser apresentados ou requeridos com os articulados (artº 552º nº 2, 572º alínea d), 588º n.º 1 e n.º 5), ainda que seja admitida alteração posterior do requerimento probatório (art. 598º). Na realidade, a alegação dos factos não deve jamais desligar-se da indicação dos meios de prova disponíveis para a sua demonstração, fazendo, assim, todo o sentido a regra que faz coincidir a ocasião em que são alegados os factos com a constituição do ónus de indicação dos meios de prova, sem prejuízo dos casos de posterior modificação”: é assim que Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa começam por enquadrar a matéria da apresentação da prova documental nos processos judiciais.
Sob a epígrafe “Momento da apresentação” é o artigo 423.º do Código de Processo Civil que regula essa oportunidade de junção.
Assim, no seu n.º 1, começa por se definir o regime-regra, de acordo com o qual “Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes”.
Assente este primeiro nível, os números 2 e 3 prevêem, de seguida, situações de excepção:
- num segundo nível, o n.º 2, permite que “Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado”;
- e, num terceiro nível, o n.º 3, acrescenta que “Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior”.
O regime assim definido funciona até ao encerramento da discussão, como decorre do artigo 425.º[3] (“Apresentação em momento posterior”), onde se admite que, depois “do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento”.
Procurando explicar e fazer compreender este regime[4], afirma o Acórdão da Relação do Porto de 02/07/2020 (Processo n.º <a href="https://acordao.pt/decisoes/133864" target="_blank">285/14.5TVPRT.P1</a>-Paulo Duarte Teixeira) que o “elemento sistemático demonstra que o legislador optou por antecipar o momento preclusivo para a junção de documentos temperando essa exigência de economia, e auto-responsabilidade das partes, com uma cláusula geral de adequação que permite a introdução de novos meios de prova, quer no decurso do julgamento quer até num momento posterior ao da própria decisão em primeira instância.
Visa-se com estas normas, eliminar incidentes morosos na tramitação processual que a experiência demonstrava serem usados de forma habitual pelas partes impondo assim um dever de atuação célere às partes e seus mandatários”.
Na mesma linha, o Acórdão da Relação do Porto de 07/01/2019 (Processo n.º 3741/17.0T8MTS-A.P1-Carlos Querido) conclui que o “legislador visou evitar surpresas no julgamento, decorrentes da junção inesperada de um qualquer documento, com consequências negativas traduzidas, nomeadamente, no arrastamento e no adiamento das audiências, obrigando as partes a uma maior lisura e cooperação processual na definição das suas estratégias probatórias”[5].
A controvérsia que dá origem a recurso em apreciação suscita-se a propósito da interpretação do n.º 3 do artigo 423.º.
Quanto a este, há que sublinhar que ultrapassado o momento inicial da acção (n.º 1 – junção sem custos) e o dos 20 dias antes do início da audiência (n.º 2 – junção com multa[6], se não fizer a prova da impossibilidade de o fazer com o articulado), a junção de documentos, para ser admitida, pressupõe a presença de dois requisitos cumulativos:
i- o não ter sido possível fazê-lo até esse momento;
ii- que essa junção/apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior.
Trata-se, como assinalam - com pertinência - João de Castro Mendes-Miguel Teixeira de Sousa, de uma situação que é similar à que se prevê como fundamento do recurso de revisão, na alínea c), do artigo 696.º: “a impossibilidade de apresentação atempada do documento, pode ser subjectiva – se o documento já existia, mas a parte não tinha conhecimento dele – ou objectiva – se o documento nem sequer existia, porque só foi elaborado posteriormente”[7].
Com esta norma fica legitimada a “apresentação imediata, logo que cesse a impossibilidade de apresentação, não podendo aguardar pelo derradeiro momento pressuposto pela norma de dilação – o encerramento da discussão em primeira instância (art. 425.º)”[8]
Por certo temos – em qualquer caso – que a parte tem de alegar e provar os requisitos necessários[9] à pretendida junção de documentos[10], só devendo ser relevadas, [11]como se decidiu no Acórdão da Relação de Coimbra de 24/03/2015, “razões das quais resulte a impossibilidade do requerente, num quadro de normal diligência, ter tido conhecimento anterior da situação ou da existência do documento” (Processo n.º 4398/11.7T2OVR-A.P1.C1-Fonte Ramos), tudo apreciado, portanto, “segundo critérios objetivos e de acordo com padrões de normal diligência” (Relação de Lisboa 11/07/2019, Processo n.º 23712/12.1T2SNT-A.L1-7-Luís Filipe Pires de Sousa).
Para o que aos presentes autos releva é o conceito de ocorrência posterior que importa densificar, mas que, indubitavelmente, “tem uma natureza que deve ser casuisticamente averiguada”[12] e que:
- “não respeitará, por certo, a factos que constituam fundamento da ação ou da defesa (factos essenciais, na letra do art. 5.º), pois tais factos já hão de ter sido alegados nos articulados oportunamente apresentados ou, pelo menos, por ocasião da dedução de articulado de aperfeiçoamento (art. 590.º, n.º 4)”[13];
- não se reportará a “factos supervenientes, pois a alegação desses factos deve ser acompanhada dos respetivos documentos, sendo esse o meio da sua entrada nos autos (art. 588.º, n.º 5)”[14];
- não tem que ver com “um facto principal, pois este só pode ser introduzido na causa mediante alegação em articulado superveniente ou em articulado dum incidente, como o da habilitação do sucessor no direito litigioso (arts. 351 e 356), casos já cobertos pela norma do n.º 1” [15];
- a “apresentação do documento não se torna necessária em virtude de ocorrência posterior quando uma testemunha alude a um facto, ainda que em sentido contrário ao pretendido pelo apresentante, se se tratar de um facto essencial já alegado – ou de um facto puramente probatório. A ocorrência que torna necessária a apresentação deste meio de prova é a pretérita alegação desta matéria, cabendo a situação no n.º 1 deste artigo” [16].
João de Castro Mendes-Miguel Teixeira de Sousa apontam que, como “ocorrência posterior também pode valer uma prova produzida na audiência final. Assim, por exemplo, é admissível a junção de um documento que se destine a infirmar o depoimento de uma testemunha produzido nessa audiência”[17].
Lebre de Freitas-Isabel Alexandre sublinham que estará em causa “um facto instrumental relevante para a prova dos factos principais ou de um facto que interesse à verificação dos pressupostos processuais, casos em que o documento que prova esse facto não pode deixar de se ter formado, também ele, posteriormente”[18].
Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, “no plano dos factos, a ocorrência posterior dirá somente respeito a factos instrumentais ou a factos relativos  a pressupostos processuais”, não podendo “criar-se artificialmente eventos ou incidentes cujo objectivo substancial seja tão só o de inserir nos autos documentos que poderiam e deveriam ser apresentados em momento anterior, sob pena de frustração do objetivo disciplinador fixado pelo legislador e, assim, de prática que se quis assumidamente abolir”[19].
Esta será já uma das conclusões que podemos afirmar e que desde já se assume: a ocorrência posterior só pode respeitar a factos instrumentais[20] ou a pressupostos processuais, não a factos essenciais, portanto (porque se reportados aos principais, isso seria a abertura de uma porta lateral que o legislador não quis manifestamente abrir, ao lado da principal que fechou).
Fazendo um excurso – com alguma exaustividade – pela jurisprudência publicada encontramos algumas notas divergentes quanto às situações enquadráveis na ocorrência posterior prevista no n.º 3 do artigo 423.º:
- no Acórdão da Relação de Lisboa de 06/12/2017 (Processo n.º 3410-12.7TCLRS-A.L1-6-Cristina Neves) decidiu-se que com fundamento na parte final do nº 3 do artigo 423.º do CPC, o “depoimento de uma testemunha, arrolada nos autos, não constitui nunca ocorrência posterior que possibilite a junção de documentos. Considerar o contrário, seria permitir que, a cada testemunha, fosse possível à parte a junção de mais documentos, fora dos momentos temporais consignados na lei e ao arrepio da restrição que o legislador procurou estabelecer com esta norma”;
- no Acórdão da Relação de Évora de 21/12/2017 (Processo n.º 514/07.1TBGDL-A.E1-Victor Sequinho dos Santos) decidiu-se que não é ocorrência posterior a prestação de declarações de um perito em sede de audiência relativamente a uma matéria que constituía “um dos temas centrais” do processo e que, como tal, “não podia ser considerada, nesse momento processual, como uma questão nova, nem os esclarecimentos da perita podiam ser considerados, para o efeito previsto na parte final do n.º 3 do artigo 423.º do CPC, como uma ocorrência posterior que tivesse gerado a necessidade da apresentação dos documentos. Muito pelo contrário, tratava-se de uma questão que vinha de trás, que integrou o objecto da perícia e que foi respondida no relatório desta, pelo que os documentos em causa deviam ter sido juntos em momento anterior”;
- no Acórdão da Relação de Lisboa de 08/02/2018 (Processo n.º 207/14.3TVLSB-B.L1-6- António Santos) decidiu-se que “consubstancia ocorrência posterior, para efeitos do nº 3, in fine, do artº 423º, do CPC, o depoimento prestado em audiência por testemunha, e visando a junção de documentos demonstrar que não são verdadeiros factos referidos no depoimento pela referida testemunha”;
- no Acórdão da Relação de Lisboa de 07/06/2018 (Processo n.º <a href="https://acordao.pt/decisoes/108228" target="_blank">20112/15.5T8SNT.L1-6</a>-Maria de Deus Correia) decidiu-se que o disposto no artigo 423.º, n.º 3, do CPC não se destina às situações em que as partes não localizaram os documentos em tempo útil, por razões apenas a si imputáveis e que o “depoimento de testemunhas arroladas nos autos não constitui ocorrência posterior para efeitos de apresentação de documentos não juntos aos autos, com fundamento na parte final do nº3 do artº 423 do C.P.C.”, quando essa junção já seria necessária de acordo com a defesa apresentada na Contestação;
- no Acórdão da Relação de Lisboa de 25/09/2018 (Processo n.º 744/11.1TBFUN-D.L1-1-Rijo Ferreira) decidiu-se que o artigo 423.º apenas regula “o direito que assiste às partes de fazerem juntar ao processo documentos, independentemente da sua pertinência, da sua relevância e da apreciação do seu valor probatório”, acrescendo que isso “não invalida que a junção dos mesmos documentos possa ser ordenada pelo juiz ao abrigo dos poderes inquisitoriais previsto no art.º 411º do CPC”.
Mais de disse que a “ocorrência posterior deve ser relacionada com a dinâmica do desenvolvimento do próprio processo, designadamente tendo em vista a dialéctica que se desenvolve durante o processo de produção de prova no julgamento da causa (relativamente a alterações factuais exteriores ao processo a forma adequada de as tornar relevantes é a dedução de articulado superveniente, não se levantando aí qualquer problemática quanto à possibilidade de com esse articulado se apresentarem os correspondentes documentos). E nesse conspecto haverá de ter em conta o regime legal relativamente ao apuramento dos factos relevantes”.
- no Acórdão da Relação de Lisboa de 26/09/2019 (Processo n.º 27/18.6T8ALQ-A.L1-6-Ana Azeredo Coelho) decidiu-se que constitui “ocorrência posterior justificativa de apresentação de documento, fora dos tempos legalmente previstos, o depoimento que afirma um facto novo de que o juiz pode conhecer, não aquele em que a testemunha se refira a factos anteriormente alegados nos autos” e ainda que os “factos instrumentais, indiciários ou probatórios o campo natural de aplicação da norma da 2ª parte do artigo 423.º, n.º 3, do CPC”;
- no Acórdão da Relação de Évora de 21/11/2019 (Processo n.º <a href="https://acordao.pt/decisoes/203747" target="_blank">5145/18.8STB.E1-A</a>-Manuel Bargado) decidiu-se que as declarações de parte, bem como o depoimento de testemunhas, não constituem ocorrências posteriores para efeitos de apresentação de documentos não juntos aos autos, com fundamento na parte final do nº 3 do artigo 423º do CPC, sendo que, todavia, “é possível relacionar a “ocorrência posterior” com a dinâmica do desenvolvimento do próprio processo, designadamente tendo em vista a dialética que se desenvolve durante o processo de produção de prova no julgamento da causa, o que consistirá, na generalidade dos casos, na revelação de factos instrumentais, complementares ou concretizadores”, o que leva a concluir, aceitando esta ideia, que “as declarações de parte ou o depoimento de uma testemunha pode constituir ocorrência posterior que torna necessária a apresentação de um documento fora dos momentos previstos no artigo 423º, nº 1 e 2, do CPC, desde que no seu depoimento a parte ou a testemunha invoque factos que sejam novos no processo e não possam ser qualificados como factos essenciais”;
- no Acórdão da Relação de Lisboa de 20/02/2020 (Processo n.º 1279/13.3TVLSB-D.L1-1-Gabriela Marques)
- decidiu-se que a “junção tardia de documentos não pode assentar na circunstância de se pretender fazer contraprova da “narrativa das testemunhas” apresentadas, pois mesmo estando em causa a eventual contradita, esta não se destina à contraprova de um depoimento testemunhal, mas sim a abalar a credibilidade e a fé que a testemunha possa merecer ao tribunal;
- e acrescentou-se que, considerando “que os meios de prova se destinam à instrução da causa, ou seja aos factos necessitados de prova, a junção de documentos terá sempre como pressuposto a enunciação dos factos a cuja prova ou contraprova se destinam”, sendo que, se os documentos a juntar já existiam aquando dos articulados “e as testemunhas indicadas foram inquiridas sobre os factos que foram alegados em sede de articulados, inexistindo, ou não tendo o Autor alegado como justificativo de tal junção, factos instrumentais novos que possam determinar a justificação da junção extemporânea”, não pode justificar-se “a junção tardia de documentos a circunstância de se pretender fazer contra prova da “narrativa das testemunhas”, pois caso pretendesse contraditar tais depoimentos, ou abalar a credibilidade dos mesmos, teria de justificar a junção com a eventual contradita nos termos do artº 521º do CPC, mas esta com a indicação em concreto do pressuposto de tal figura. Por outro lado, tal como se decidiu no Acórdão desta Relação, datado de 6/12/2017 (in www.dgsi.pt/jtrl) a «contradita não se destina de todo à contraprova de um depoimento testemunhal, destina-se a abalar a credibilidade e a fé que a testemunha possa merecer ao tribunal, podendo por esse meio por em causa o teor do seu depoimento, por se demonstrar não ser esta isenta ou credível.». Também no Acórdão desta Relação de 8/2/2018 se conclui: não tem a contradita por desiderato por em cheque/causa o depoimento da testemunha propriamente dito, mas antes a pessoa do depoente, isto é, não se alega que o depoimento é falso, ou a testemunha mentiu, antes alega-se que por tais e tais circunstâncias exteriores ao depoimento, a testemunha não merece crédito. É que, como bem salienta J. Alberto dos Reis, “Só quando a contradita se dirige contra a razão de ciência invocada pela testemunha é que as declarações desta são postas em causa; mas, ainda aqui não se atacam directamente os factos narrados pelo depoente, só se ataca a fonte de conhecimento que ele aponta” (in Código de Processo Civil, Vol. IV, pág. 459);
- no Acórdão da Relação do Porto de 02/07/2020 (Processo n.º <a href="https://acordao.pt/decisoes/133864" target="_blank">285/14.5TVPRT.P1</a>-Paulo Duarte Teixeira) decidiu-se que não integra o conceito de ocorrência posterior “a necessidade de confrontar uma testemunha com esses documentos, pois os factos carecidos de prova são fixados em momento anterior.
Ou dito de outro modo qual é o facto posterior à data limite, não previsível, que pela sua relevância implique a necessidade da junção aferida de forma objetiva e à luz de um litigante normalmente diligente.
In casu, a autora admite que os documentos são pessoais, estavam na sua posse desde 2013 ou data da sua emissão e, como é evidente a sua pertinência, se dúvidas houvesse foi estabelecida com a apresentação da contestação e fixação dos temas de prova, ou seja, muito antes de maio de 2019.
Ou seja, parece claro que o motivo invocado (necessidade de demonstração de uma realidade) não era novo, mas já estava fixada em momento anterior e, qualquer parte diligente teria analisado os meios de prova de que dispunha, pelo menos, quando os temas de prova foram fixados.
Veja-se nesta matéria o recente Ac da RC de 22.10.2019, nº 958/19.1T8VIS.C1: “A necessidade da junção em virtude do julgamento proferido em 1ª instância (art.651 nº1 CPC) não abrange a hipótese de a parte pretender, com tal fundamento, juntar à alegação documento que já poderia e deveria ter apresentado em 1.ª Instância.
Aliás se assim não for, a justificação apresentada (necessidade de contraditar testemunha) abre a janela para a completa deturpação do regime fixado na lei com a dedução de perguntas e incidentes visando já uma junção “fraudulenta”.
Por causa disso, é que existe uma posição jurisprudencial, pelo menos maioritária segundo a qual a junção de documentos em julgamento não é justificável para confrontação de testemunhas ou até através da “falsa” dedução de incidentes como os de contradita. (cfr. Acs da RL de 6.12.2017 e 8.2.2018, in processos 3410/12 e 207/14, e 25.9.2018, nº 744/11.1TBFUN-D.L1-1 (Rijo Ferreira(…)”.
Apesar disto, o Acórdão acabou por concluir que “os documentos devem ser juntos ao abrigo do principio do inquisitório se o interesse destes para a decisão da causa for superior às desvantagens provocadas na sua tramitação, e afectação do direito de defesa da parte contrária”, sendo que a “utilização desse poder dever não afecta a independência do tribunal, pois, este desconhece e é alheio aos efeitos concretos da decisão; exerce um poder dever e visa carrear para os autos todos os elementos para uma decisão conforme com a realidade”;
- no Acórdão da Relação de Lisboa de 12/10/2021 (Processo n.º 5984/18.0T8FNC-B.L1-7-Cristina Maximiano) decidiu-se que a “tempestividade de um documento apresentado com a audiência final a decorrer implica a alegação e a prova de que a apresentação anterior não foi possível ou de que a apresentação se tornou necessária em virtude de ocorrência posterior”, a qual se não verifica “quando uma testemunha alude a um facto, ainda que em sentido contrário ao pretendido pelo apresentante dos documentos, se se tratar de um facto essencial anteriormente alegado nos autos”;
- no Acórdão da Relação do Porto de 18/10/2021 (Processo n.º 3221/20.6T8PNF-A.P1-Rita Romeira) decidiu-se que, se “a parte requereu a junção de documentos, no decurso da audiência de julgamento, invocando que a sua apresentação se tornou necessária em virtude de ocorrência posterior, concretizada no falso depoimento por parte do legal representante da Recorrida, a que visa retirar credibilidade, estamos perante a ocorrência posterior a que alude a parte final do nº 3 do art. 423º do CPC”: “Ou seja, ocorreu circunstância, de todo imprevisível para a apelante, que justifica, no caso, o pedido de junção dos ditos documentos”;
- no Acórdão da Relação de Guimarães de 31/03/2022 (Processo n.º <a href="https://acordao.pt/decisoes/188765" target="_blank">7080/19.3T8VNF.G1</a>-Antero Veiga) decidiu-se que o “depoimento de uma testemunha não constitui em si uma ocorrência posterior que possa justificar a junção de documento com esse fundamento, a menos que tal depoimento traga factos que sejam novos no processo e não possam ser qualificados como factos essenciais” e que é “de admitir a junção de documento relativos à situação do próprio depoente, por este referida no depoimento, se pela sua similitude com a situação em análise, for de concluir pela sua utilidade para a formação da convicção do julgador”;
- no Acórdão da Relação do Porto de 04/05/2022 (Processo n.º <a href="https://acordao.pt/decisoes/132178" target="_blank">24484/16.6T8PRT.P1</a>-Filipe Caroço) decidiu-se que o “depoimento de uma testemunha pode constituir ocorrência posterior que torna necessária, pela sua utilidade, a apresentação de um documento fora dos momentos previstos no art.º 423º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil (cf. respetivo nº 3), contanto que se refira a factos não essenciais e não previamente alegados.       
Não tem sido exatamente este o entendimento que, pelo menos, a jurisprudência mais recente tem produzido. Segundo esta, um depoimento testemunhal ou um depoimento de parte, por ex., produzidos em audiência, podem constituiu uma “ocorrência posterior” justificativa da apresentação e admissão de documentos naquela mesma sede, contanto que não se trate de factos essenciais da ação ou de exceção, a seu tempo invocados, já que, com a respetiva alegação, deverão ser entregues também os documentos destinados a fazer a sua prova.
A “ocorrência posterior a que se refere o nº 3 não é um facto principal ou essencial --- estes entram na causa através da alegação nos articulados normais, em articulado superveniente ou ainda em articulado de um incidente, como o da habilitação do sucessor no direito litigioso (art.ºs 351º e 356º); situações abrangidas pela norma do nº 1 do art.º 423º --- mas factos instrumentais e complementares ou concretizadores relevantes para a demonstração dos factos essenciais ou nucleares ou de facto que interesse à verificação dos pressupostos processuais. Note-se que estes factos nem sequer têm que ser alegados, bastando que resultem da instrução a causa (art.º 5º, nº 2, al.s a) e b), do Código de Processo Civil).
Assim, o depoimento de uma testemunha pode constituir ocorrência posterior que torna necessária, pela sua utilidade, a apresentação de um documento fora dos momentos previstos no art.º 423º, n.º 1 e 2, desde que no seu depoimento invoque factos que sejam novos no processo e não possam ser qualificados como factos essenciais ou principais e exista um elemento de novidade, mormente por se prefigurar, em resultado da instrução, nova factualidade instrumental idónea a suportar presunções judiciais, complementar ou concretizadora de factos essenciais (integrantes da causa de pedir ou de exceções oportunamente deduzidas). Os factos instrumentais, indiciários ou probatórios, serão assim o campo natural de aplicação da norma da 2ª parte do artigo 423º, n.º 3.
Assim sendo, e acompanhando aquela jurisprudência, temos para nós que o depoimento de uma testemunha pode constituir ocorrência posterior que torna necessária a apresentação de um ou mais documentos fora dos momentos previstos no artigo 423º, n.ºs 1 e 2, desde que no seu depoimento invoque factos relevantes que sejam novos no processo e não devam ser qualificados como factos essenciais” (carregado nosso).
“A junção dos documentos pode contribuir para o esclarecimento daqueles factos instrumentais probatórios, eliminação do alegado equívoco e, indiretamente, para boa decisão da causa. É, assim, uma junção de documentos com a utilidade necessária a contrariar a afirmação da testemunha. Tal junção não ofende eventuais interesses processuais das partes e a mesma está ainda abrangida pelo alcance dos temas da prova e das questões a decidir”;
- no Acórdão da Relação de Évora de 09/06/2022 (Processo n.º 2284/18.9T8FAR-A.E1-Paula do Paço) decidiu-se que “não é ocorrência posterior a inquirição de uma parte em sede de audiência, relativamente a uma questão que estava em debate desde a fase dos articulados, justificando a formulação de perguntas que colocassem em causa as afirmações prestadas pela recorrente em declarações de parte, sobre tal matéria”.
Depois desta viagem pelas decisões tomadas pelos Tribunais de recurso temos já o panorama global que respeita a esta matéria no que concerne à Doutrina e Jurisprudência.
Ora a situação dos presentes autos não é muito distinta daquelas que deram origem aos Acórdãos prolatados.
Objectivamente e em termos processuais situamo-nos no decurso da audiência de julgamento após inquirição de testemunhas. Logo, a possibilidade de junção de documentos pelas partes é regida pelo n.º 3 do artigo 423.º.
A Autora, após a inquirição das testemunhas AR e SM, veio invocar que no seu depoimento o primeiro tinha aflorado matéria atinente à factura emitida pela Ré à Autora no valor de € 152.535,10, em Junho de 2017, referindo-se a uma alegada existência de indicação ou aprovação da Autora, através de AC, para a sua emissão, considerando que isto constitui um facto novo e que a suposta existência de valores de facturação premeditadamente inflacionadas pela Autora, por decisão de um antigo membro da sua administração, também constitui um facto novo (sendo que quanto à outra testemunha já falaremos).
Assim, entendendo “que esses factos são falsos, pretendeu juntar documentos que, em seu entender são relevantes e essenciais à descoberta da verdade, na exacta medida em que infirmam factos relatados na audiência final.
Invoca ainda que a testemunha SM, ouvido na segunda sessão, fez referência a débitos referentes a campanhas/acções promocionais assinadas por AC, sem nunca especificar a que débitos se referia, nem concretizou as acções promocionais subjacentes às notas emitidas, respectivas datas e valores em questão.
Refere que apesar de a Ré ter junto com a sua contestação documentos atinentes a supostas acções promocionais, nunca alegou que algum desses documentos houvesse sido assinado por AC, pelo que se trata de matéria nova e conclui que a junção dos documentos ora apresentados são pertinentes e relevantes para a descoberta da verdade”.
A Autora defende:
- que os documentos em causa não se destinam a fazer prova de factos alegados na petição inicial ou na réplica, mas que visam infirmar declarações falsas, que incidem sobre circunstancialismo novo e que foram proferidas pela primeira vez em audiência (“Se em sede de audiência de julgamento se suscitam novos factos que possam servir de fundamento à defesa apresentada, assiste à contraparte o direito de reagir”);
- que em qualquer caso, sempre se imporia a admissão dos documentos em causa, ao abrigo do princípio do inquisitório e do poder-dever que dimana do artigo 411.º do CPC, face ao seu para a boa decisão da causa (que supera as eventuais desvantagens da sua junção).
A Recorrente não tem razão!
De facto, o que a Autora/Recorrente faz é, depois de produzida a prova e conhecendo-a, pretender fazer nova prova (dir-se-á “correctiva” da que tinha feito) ao arrepio de todas as regras processuais que regulam a matéria.
O Tribunal a quo refere com particular pertinência, “as declarações das testemunhas não constituem factos mas são meios de prova para a afirmação ou não de factos”.
E que “as referidas testemunhas depuseram sobre factos já trazidos ao processo pelos diversos articulados apresentados pelas partes.
Se esses factos já foram invocados pelas partes nos respectivos articulados e enunciados nos temas da prova, os documentos deveriam ter sido juntos com os respectivos articulados ou, com multa, até 20 dias antes da data da audiência final, como decorre do artigo 423.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil”.
E estas considerações são inatacáveis!
Ora, se as testemunhas se referiram a factos essenciais (alegadamente novos), os mesmos deveriam constar dos temas da prova e enquadrarem-se no objecto do litígio, o que não é o caso.
Mesmo respeitantes a factos instrumentais (os tais que constituem o principal campo de aplicação do artigo 423.º, n.º 3), por outro lado, o que se constata é que não se trata de matéria que possa ser considerada nova. 
Mais, convém ter presente, aliás, que a matéria a que as testemunhas se referiram é tudo menos nova no processo, pois desde a Petição Inicial que dela se fala nos autos (cfr. artigo 83.º da PI, onde já se refere “Deste modo, encontra-se em dívida, na presente data, a quantia de EUR 152,535.10, correspondente a fornecimentos de produtos realizados e faturados pela Autora à Ré e titulados pelas seguintes faturas: …”), sendo certo ainda que a intervenção da testemunha AR e o seu âmbito é discutida nos articulados desde o início.
Sendo esta última circunstância mais do que inultrapassável, iniludível, no sentido de que tudo o que com ela se relacionasse haveria de ter sido junto aos autos em termos de prova, pela parte, no momento legalmente adequado.
O que as testemunhas vieram dizer aos autos em sede de audiência, tal como se apresenta e no contexto apresentado é tudo menos novo, sendo mesmo o corolário da tese apresentada pela outra parte (Ré) desde o início dos autos.
A concreta configuração dos factos dada no decurso das suas declarações[21] faz parte do que é a natureza de um depoimento testemunhal e é expectável num depoimento sobre este tipo de matéria, sendo certo que dar conta das suas percepções não traz de per se um facto novo: como assinala – com acerto – a Recorrida, “as afirmações das testemunhas referidas pela Recorrente nas suas Alegações não são factos, e muito menos factos novos, trazidos para os autos com os respectivos depoimentos. São, isso sim, declarações que poderão confirmar ou contrariar os factos que se discutem e que estão respaldados nos Temas da Prova”.
Dizer, como faz a ora Recorrente, que “não lhe pode ser exigido que, com vista a antecipar toda e qualquer declaração que possa vir a ser produzida em audiência, tivesse carreado para os autos, indiscriminadamente, a totalidade do acervo documental que tem em sua posse”, só faria sentido e seria pertinente se não se tratasse da matéria que estava em discussão (e cuja prova lhe cabia…).
A prova pretendida juntar pode corresponder principalmente a correspondência trocada entre colaboradores da Recorrente, mas a Autora sabia desde o início do conflito com a Ré (e, para o que aqui releva, desde o início do processo) exactamente o que estava em causa (não se tratando, de forma alguma, de documentação respeitante a matéria nova ou imprevisível). 
Aquilo sobre o que as testemunhas em causa depuseram (em especial a testemunha AR) foi precisamente sobre o fulcro da questão, sobre a matéria que está (pelo menos) desde o início dos autos como controvertido. Como a Autora (e a Ré) bem sabem.
Não há, deste modo, uma razão plausível ou aceitável, para que os documentos pretendidos juntar (todos muito anteriores à existência deste processo) não o tivessem sido nos momentos processuais adequados, sendo que, por opção de estratégia processual da parte[22], não o foram…
Ora, tal como se referiu no já citado Acórdão da Relação de Lisboa de 26/09/2019 (Processo n.º 27/18.6T8ALQ-A.L1-6-Ana Azeredo Coelho), o depoimento em que a testemunha se refira a factos anteriormente alegados nos autos não pode constituir ocorrência posterior justificativa de apresentação de documento fora dos tempos legalmente previstos, uma vez que não se reporta “a um facto novo de que o juiz pode conhecer”.
Foi isto que o Tribunal a quo assumiu, disse e decidiu.
Estas considerações valem quer para os documentos 1 a 8, quer para os documentos 9 a 11 (duas actas e uma nota curricular), sendo que, neste último caso, a matéria está reportada a partes do depoimento da testemunha AR sobre um inflaccionamento de valores de facturação que continua a ser facto essencial), quer para o documento 12 (quatro documentos ou fragmentos de documentos em que se acha aposta a assinatura de AC, com vista a infirmar o relato da testemunha SM, qualificado como “genérico e impreciso, como genérica e imprecisa foi sempre a alegação da Recorrida”, pedindo que se confronte com os documentos 41, 42, 44, 45, 46 e 47 da contestação, para concluir que nenhum deles foi assinado por AC). Quanto a este último, é a própria Recorrente que desqualifica a sua pretensão, pois que, perante um depoimento que o próprio Tribunal afirma impreciso e vago (com a concordância da Recorrente…) junta documentos para confrontar com documentos que já tinham sido juntos com a Contestação e relativamente aos quais, conhecendo o processo, os seus contornos e origens, podia antes ter-se pronunciado.
*
Por fim e para que também essa questão não deixe de ser referida e explorada, a procura da verdade material, com o eventual recurso ao princípio do inquisitório, através do artigo 411.º do Código de Processo Civil[23], parece-nos estar completamente fora de cogitação, pois o princípio e o normativo não podem ser utilizados para introduzir no processo documentos que a parte – podendo – não apresentou atempadamente nos termos das regras processuais aplicáveis (nomeadamente do artigo 423.º).
O Acórdão da Relação de Lisboa de 25/09/2018 (Processo n.º 744/11.1TBFUN-D.L1-1-Rijo Ferreira), pela qualidade da sua argumentação, tem de nos servir de paradigma, deixando-nos as notas essenciais de referência: “Segundo a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem a garantia de processo equitativo (‘fair trial’) coloca o tribunal sob o dever de levar a cabo um exame aprofundado dos pedidos, fundamentos e provas aduzidos pelas partes; e se se reconhece uma larga margem de apreciação aos legisladores e tribunais nacionais para estabelecerem as regras de admissibilidade e apreciação das provas, não se deixa de afirmar que as restrições à apresentação de provas não podem ser arbitrárias ou desproporcionadas, antes têm de ser consistentes com a exigência de julgamento equitativo e que sempre se deve exigir que o procedimento na sua globalidade, incluindo os aspectos relativos à admissibilidade das provas, seja equitativo. E nesse sentido haverá de interpretar-se, também, o disposto no art. 20º, nº 4, da Constituição da República por força do disposto no art.º 16º, nº 2, do mesmo diploma.
A regra da não admissão de prova documental após o vigésimo dia anterior à audiência final, baseada apenas nesse limite temporal, pode, assim, levantar questões de conformidade com o princípio do processo equitativo (em particular quando o documento cuja junção se pretende seja relevante para o apuramento dos factos).
Se as primeiras apontadas situações se situam no campo das opções legislativas que, ainda que contraproducentes ou incorrectas, devem os tribunais respeitar, já o mesmo não acontece no caso da última referida situação, por estarem em causa direitos fundamentais, devendo os tribunais interpretar os normativos em causa em conformidade com os direitos fundamentais ou, mesmo, recusar a aplicação dos mesmos”.
Neste Acórdão, portanto, a consideração dada à Convenção Europeia dos Direitos Humanos é também usada para a própria definição do conceito de ocorrência posterior (patamar que já ultrapassámos), mas, mais à frente, acrescenta-se: “Mas ainda que tal se não verificasse, ainda assim não estava excluída de todo a possibilidade de junção de tais documentos, uma vez que para além do direito/ónus das partes a apresentarem documentos, impende sobre o juiz o poder/dever de, quantos aos factos que lhe é lícito conhecer – factos notórios, essenciais alegados, instrumentais, complementares e concretizadores desses - promover todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio (art.º 411º do NCPC). Não estaria, pois, descartada a possibilidade de ser ordenada a junção desses documentos por o juiz da causa entender que os mesmos se mostravam relevantes para o julgamento da causa (sendo que essa actividade do juiz corresponde, em nosso modo de ver, ao uso legal de um poder discricionário, pelo que das correspondentes decisões não cabe recurso – art.º 630º, nº 1, do CPC)”.
Ora, como nos parece bom de ver essa relevância começa por não ser devidamente contextualizada pela Autora-Recorrente, por se tratar assumidamente de matéria respeitante a factos essenciais e a instrumentais previsíveis, pelo que o poder inquisitorial do juiz só faria sentido ser utilizado para obstar a iniquidades (como o poderia ser um inevitável ganho ou perda de uma acção), uma vez que as limitações da regulação processual civil quanto à produção (junção) da prova documental (como atrás vimos), não são arbitrárias, são compreensíveis e são proporcionadas.
No contexto dos autos (com o que estava configurado no litígio e com o que as testemunhas disseram), usar o artigo 411.º para juntar ao processo os documentos pretendidos pela Autora seria como que dar um benefício ao infractor.
O Tribunal a quo apreciou globalmente a matéria e decidiu bem, nada havendo a apontar-lhe no que concerne à junção extemporânea e injustificada dos documentos.
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No que respeita ao indeferimento das novas declarações de parte pela Autora, em função do que foram os depoimentos das testemunhas, o Tribunal a quo também esteve bem.
A Autora entendia que embora tivesse já sido ouvida, “mas estando em causa factualidade nova e relevante e que, no caso da alegada decisão da Autora de inflacionar facturas, chega a ser caluniosa e lesiva da sua honra”, lhe assistia “o direito de contraditá-la por via da prestação de novas declarações”. 
De forma certeira o Tribunal sublinhou que, como já referira “quanto à questão da junção dos documentos, não estamos perante factos novos, pelo que não há fundamento para ser ouvido novamente MS em declarações de parte”. 
E esta sempre teria de ser a decisão, importando apenas acrescentar, sublinhando-o, que as declarações de parte não são um meio para a parte pontuar, comentar ou retocar a restante prova produzida, nem – noutro plano – constituem ou podem ter a veleidade de constituir uma segunda oportunidade para complementar probatoriamente as suas insuficiências anteriores, ou a displicência com que pudesse ter encarado a produção da prova, nomeadamente depois de esta já ter ocorrido e originado uma situação factual  configurada ou estabelecida.
Assim sendo, inexistia qualquer fundamento para novas declarações de parte, pelo que se impõe a confirmação do despacho recorrido. 
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Em ambas as situações decidiu bem, fundada e fundamentadamente, o Tribunal recorrido.
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DECISÃO
Com o poder fundado no artigo 202.º, n.ºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa, e nos termos do artigo 663.º do Código de Processo Civil, acorda-se, nesta 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, face à argumentação expendida e tendo em conta as disposições legais citadas, em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar os despachos recorridos.
Custas a cargo da Recorrente.
Notifique e, oportunamente remeta à 1.ª Instância (artigo 669.º CPC).

Lisboa, 14 de Julho de 2022
Edgar Taborda Lopes
Luís Filipe Pires de Sousa
José Capacete
_______________________________________________________
[1] Em que peticiona a condenação da Ré no pagamento do montante total de € 1.050.120,93 (correspondendo € 907,677.70 ao capital em dívida e € 142.443,23 a título de juros de mora vencidos, ao qual devem acrescer os juros vincendos até efetivo e integral pagamento.
[2] António Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 6.ª edição Atualizada, Almedina, 2020, página 183.
[3] Conjugado com os artigos 651.º, n.º 1 (“As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância) e 662.º, n.º 1 (“A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”). 
[4] Cuja teleologia, nas palavras de Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, “visa evitar a perturbação resultante da apresentação extemporânea de documentos” (Código de Processo Civil Anotado, Volume I Parte Geral e Processo de Declaração, 2.ª edição, 2020, página 519).
[5] Vendo a perspectiva afirmativa, ou positiva, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 17/01/2020 (Processo n.º 1227/10.2BEPRT-S1-Luís Migueis Garcia) constata que o legislador visou “estabilizar os meios de prova com certa antecedência em relação à realização da audiência final” (cfr., também, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12/09/2019, Processo n.º 587/17.9T8CHV-A.G1-A.S1-Catarina Serra).
[6] Artigo 27.º, n.º 1 e 2, do Regulamento das Custas Processuais.
[7] João de Castro Mendes-Miguel Teixeira de Sousa, Manual de Processo Civil, Volume II, AAFDL, 2022, página 531.
[8] Paulo Ramos de Faria-Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, 2.ª edição, Almedina, 2014, página 370.
[9] No que respeita a junção de documentos com as alegações de recurso e quanto à superveniência subjectiva, Rui Pinto (in Código de Processo Civil Anotado, Volume II, Coimbra, Almedina, 2018, página 314) refere que “não basta invocar que só se teve conhecimento da existência do documento depois do encerramento da discussão em 1.ª instância, já que isso abria de par em par a porta a todas as incúrias e imprevidências das partes: a parte deve alegar – e provar – a impossibilidade da sua junção naquele momento e, portanto, que o desconhecimento da existência do documento não deriva de culpa sua. Realmente, a superveniência subjectiva pressupõe o desconhecimento não culposo da existência do documento” (carregado nosso).
[10] Assim, expressamente, vd. o Acórdão da Relação do Porto de 15/02/2016 (Processo n.º 96/14.8TTVFR-A.P1-Domingos Morais), que considera caber ao “apresentante incumbe um duplo ónus: o da justificação temporal da apresentação e a indicação discriminada e fundamentada dos factos a que tal documento se destina”, sendo que, este último, tem “por objectivo, não só o de permitir à parte contrária exercer o direito do contraditório, estatuído no art. 427.º do CPC, como ainda o de permitir ao tribunal verificar da impertinência ou desnecessidade de tal junção (tardia)”.
[11] José Alberto dos Reis, a propósito do §4 do artigo 550.º do Código de Processo Civil de 1961 (“Os documentos destinados a fazer prova dos factos ocorridos posteriormente aos articulados, ou cuja junção se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior, podem ser oferecidos em qualquer estado do processo”), dá como exemplo desta ocorrência posterior (por nós sublinhada no inciso), “o caso de o documento se destinar a fazer a prova da inexactidão de afirmações feitas pelo réu no último articulado ou na alegação final, ou a demonstrar que não são verdadeiros  factos referidos pelos peritos ou pelas testemunhas”, acrescentando – e manifestando concordância – que o Acórdão do  STJ de 30/03/1937 (RLJ, 70.º, página 118), “entendeu que constitui ocorrência posterior o facto de uma testemunha afirmar facto que se pretende desmentir com a junção de documento” (Código de Processo Civil Anotado,  Volume IV -reimpressão-,  Coimbra Editora, 1987, páginas 19 e 20).
[12] Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo…, cit., página 520. 
[13] Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo…, cit., página 520.
[14] Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo…, cit., página 520.
[15] Lebre de Freitas-Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado - Volume 2.º-Artigos 362.º a 626.º, 4.ª Edição, Almedina, 2019, página 241.
[16] Paulo Ramos de Faria-Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, 2.ª edição, Almedina, 2014, página 370.
[17] João de Castro Mendes-Miguel Teixeira de Sousa, Manual…, cit., página 532.
[18] Lebre de Freitas-Isabel Alexandre, Código de Processo…, cit., página 241.
[19] Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo…, cit., página 520.
[20] “Os factos instrumentais, indiciários ou probatórios o campo natural de aplicação da norma da 2ª parte do artigo 423.º, n.º 3, do CPC” (Acórdão da Relação de Lisboa de 26/09/2019 (Processo n.º 27/18.6T8ALQ-A.L1-6-Ana Azeredo Coelho).
[21] Cada depoimento testemunhal é, em si, único e personalizado.
[22] Aliás, não deixa de ser significativo (e de ter de se relevar como elemento adjuvante de argumentação) que o AC a que a testemunha AR se refere era mesmo uma das testemunhas que a Autora tinha arrolado como testemunha.
[23] “Incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer”.

Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa Relatório No decurso do processo declarativo sob a forma comum que G… intentou contra P…[1], em sede de audiência de julgamento veio a ser proferido o seguinte Despacho: “I – Requerimento a ref.ª 32336224 [41996886] e resposta a ref.ª 32392716 [42057929]: A Autora, a ref.ª 32336224 [41996886], veio requerer a admissão de 12 documentos, bem como requerer a nova tomada de declarações de parte de MS. A ref.ª 32392716 [42057929], a Ré respondeu, opondo-se à junção dos documentos, bem como à nova tomada de declarações de MS, invocando, em suma, que não se verificam os pressupostos legais e inexistindo factos novos. 1 – Da junção dos documentos: Para a junção dos documentos, a Autora invoca que na audiência final de 29 de Março, a testemunha AR aflorou matéria atinente à factura emitida pela Ré à Autora no valor de € 152.535,10, em Junho de 2017. Refere que a alegada existência de indicação ou aprovação da Autora, através de AC, para a emissão da factura em discussão, constitui um facto novo e que a suposta existência de valores de facturação premeditadamente inflacionadas pela Autora, por decisão de um antigo membro da sua administração, também constitui um facto novo. Conclui que esses factos referidos por essa testemunha são falsos e que os documentos que ora requer a sua junção são relevantes e essenciais à descoberta da verdade, na exacta medida em que infirmam factos relatados na audiência final. Invoca ainda que a testemunha SM, ouvido na segunda sessão, fez referência a débitos referentes a campanhas / acções promocionais assinadas por AC, sem nunca especificar a que débitos se referia, nem concretizou as acções promocionais subjacentes às notas emitidas, respectivas datas e valores em questão. Refere que apesar de a Ré ter junto com a sua contestação documentos atinentes a supostas acções promocionais, nunca alegou que algum desses documentos houvesse sido assinado por AC, pelo que se trata de matéria nova e conclui que a junção dos documentos ora apresentados são pertinentes e relevantes para a descoberta da verdade. Cumpre apreciar e decidir. Nos termos dos artigos 423.º e 425.º do Código de Processo Civil, a apresentação de documentos em primeira instância pode ocorrer em três momentos distintos: 1 - com o articulado em que sejam alegados os factos correspondentes. 2 - até 20 dias antes da audiência final. 3 - até ao encerramento da discussão quando a apresentação, não tenha sido possível até àquele momento; ou se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior. Os documentos são apresentados depois de iniciada a audiência final e foi-o com a invocação de verificação de factos novos provenientes dos depoimentos das testemunhas AR e SM. Invoca a Autora que essas testemunhas fizeram declarações que constituem factos novos e por isso, requer a junção de documentos para infirmar tais declarações. A lei não indica o que possa considerar-se como ocorrência posterior. Mas a ocorrência posterior não pode decorrer das meras declarações de testemunhas. Pois, as declarações das testemunhas não constituem factos mas são meios de prova para a afirmação ou não de factos. Ora, as referidas testemunhas depuseram sobre factos já trazidos ao processo pelos diversos articulados apresentados pelas partes. Se esses factos já foram invocados pelas partes nos respectivos articulados e enunciados nos temas da prova, os documentos deveriam ter sido juntos com os respectivos articulados ou, com multa, até 20 dias antes da data da audiência final, como decorre do artigo 423.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil. Ora, se as testemunhas se referiram a factos essenciais (alegadamente novos), os mesmos deveriam constar dos temas da prova e enquadrarem-se no objecto do litígio, o que não é o caso. O depoimento, ou parte de depoimento, apto a constituir ocorrência posterior justificativa de apresentação de documento, fora dos tempos legalmente previstos, terá de ser aquele que afirma um facto novo de que o juiz pode conhecer. Como os factos essenciais têm de constar necessariamente de articulado ordinário ou extraordinário, poderá concluir-se que este facto novo será de natureza instrumental, complementar ou concretizador. Quanto aos factos (não alegados) que sejam complemento ou concretização dos que as partes alegaram e resultem da instrução da causa, a sua consideração pelo juiz implica o contraditório pleno - refutação e prova – nos termos do artigo 5.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Civil. Assim sendo, a introdução de um facto com tal natureza em sede de depoimento de uma testemunha, sempre autorizaria, por esta norma, a produção de prova, v.g. documental, em momento ulterior aos previstos no artigo 523.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil. A excepção da segunda parte do artigo 423.º, n.º 3, do CPC, é meramente concretizadora daquele princípio no que à prova documental concerne. Os factos instrumentais, indiciários ou probatórios, serão assim o campo natural de aplicação da norma da segunda parte do artigo 423.º, n.º 3, do Código de Processo Civil. Factos instrumentais são os que interessam indirectamente à solução do pleito, por servirem para demonstrar a verdade ou falsidade dos factos pertinentes; não pertencem à norma fundamentadora do direito e são-lhe, em si, indiferentes, servindo apenas para, da sua existência, se concluir pela existência dos próprios factos fundamentadores do direito ou da excepção. Conclui-se assim que o depoimento de uma testemunha pode constituir ocorrência posterior que torna necessária a apresentação de um documento fora dos momentos previstos no artigo 423.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil, desde que no seu depoimento invoque factos que sejam novos no processo e não possam ser qualificados como factos essenciais. Ora, no entender da Autora, a testemunha AR no que concerne à emissão da factura no valor de € 152.535,10 refere que houve indicação ou aprovação da Autora, através de AC e que a existência de valores de facturação foram premeditadamente inflacionados pela Autora. Por outro lado, a testemunha SM não especifica a que débitos se refere, nem concretiza as acções promocionais, subjacentes às notas emitidas, respectivas datas e valores em questão. Isto não são factos, são afirmações contrárias aos factos que constam dos articulados ou são afirmações vagas e / ou imprecisas. Inexiste por isso ocorrência posterior justificativa da apresentação, pelo que conclui-se pela intempestividade da apresentação e inadmissibilidade da junção dos documentos. 2 – Das novas declarações de parte de MS. A Autora requer que sejam tomadas novas declarações a MS, aos artigos referidos no requerimento ora em apreço. Refere que MS já foi ouvido, mas estando em causa factualidade nova e relevante e que, no caso da alegada decisão da Autora de inflacionar facturas, chega a ser caluniosa e lesiva da sua honra, assistindo-lhe o direito de contraditá-la por via da prestação de novas declarações. Ora, como foi anteriormente referido quanto à questão da junção dos documentos, não estamos perante factos novos, pelo que não há fundamento para ser ouvido novamente MS em declarações de parte. * Pelo exposto, indefere-se o requerido pela Autora no que respeita à junção dos documentos, bem como quanto às novas declarações de parte de MS e, em consequência, ordena-se o desentranhamento dos documentos apresentados com o requerimento de ref.ª 32336224 [41996886]. Tendo em conta que o requerimento em apreço é uma ocorrência estranha ao desenvolvimento normal da lide, condena-se a Autora nas custas do incidente que se fixa em 2 (duas) UC’s, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 7.º, n.º 4 e n.º 8, do Regulamento das Custas Processuais. Notifique”. Destes despachos veio a Autora apresentar Recurso lavrando as seguintes Conclusões: A - Ao indeferir a junção aos autos dos documentos n.º 1 a n.º 8 apresentados pela Recorrente (requerimento com a referência Citius 41996886), o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 423.º, n.º 3 do CPC , bem como o princípio do inquisitório, consagrado no artigo 411.º do mesmo diploma legal. B. - Nos termos do artigo 423.º, n.º 3 do CPC, após o limite temporal previsto no n.º 2 do mesmo preceito normativo, são admitidos no processo os documentos cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior. C. No caso vertente, no de curso do depoimento prestado em audiência, a testemunha AR relatou factos novos atinentes à emissão de um débito pela Recorrida no valor de EUR 152,535.10 D. A testemunha AR afirmou, designadamente, que a sua intervenção a esse respeito discutindo e validando a emissão do referido débito com a Recorrida, se deu a pedido de AC, da direcção comercial da Recorrente, e em estreita coordenação com aquele E. Cotejando os articulados das partes, constata-se que as afirmações da testemunha AR vieram introduzir um elemento novo, nunca até então invocado no processo F. Com efeito, nunca, nesses articulados a Recorrida mencionou o nome de AC, muito menos alegou que este tivesse estado presente, ainda que à distância, em qualquer reunião mantida com AR para discutir o débito em questão; G. Em prol da sua pretensão, a Recorrida limitou se a alegar que as facturas emitidas pela Recorrente foram «emitidas por valores incorrectos, apenas parcialmente devidos» e que, com vista a rectificar a situação, acordou a emissão de uma nota de débito com AR, agente da Recorrente e pessoa que a Recorrida reputa sempre, ao longo dos referidos articulados, de «representante da Autora» H. Por se tratar de factualidade nova, de que o Tribunal a quo pode conhecer, impunha-se que este tivesse admitido a junção do acervo de e mails apresentado pela Recorrente, ao abrigo do previsto no artigo 423.º, n.º 3 do CPC I. Conforme tem vindo a ser defendido pela jurisprudência, consubstancia ocorrência posterior justificativa de apresentação de documento, fora dos prazos previstos no n.º 1 e n.º 2 do artigo 423.º do CPC, o depoimento que afirma um facto novo de que o juiz pode conhecer (cfr., por todos, o acórdão deste Venerando Tribunal com data de 26 de Setembro de 2019, proferido no âmbito do processo n.º 27/18.6T8ALQ27/18.6T8ALQ--A.L1A.L1--66 e disponível em www.dgsi.pt); J. Configura também ocorrência posterior, para efeitos da lei, o depoimento prestado em audiência por testemunha, visando a junção de documentos demonstrar a falsidade dos factos referidos nesse depoimento (cfr. o acórdão deste Venerando Tribunal com data de 8 de Fevereiro de 2018, proferido no âmbito do processo n.º 207/14.3TVLSB.L1 e igualmente disponível em www.dgsi.pt) K. Assim acontece no vertente caso; L. Os documentos ora em causa, cuja pertinência só se fez sentir na sequência do depoimento de AR, tornam claro que, ao contrário do que este relatou, a emissão do débito em discussão não foi antecedida nem acompanhada de qualquer conversa com AC, muito menos de qualquer indicação sua; M. Ainda que assim não fosse, sempre se impunha que os referidos documentos tivessem sido admitidos ao abrigo do princípio do inquisitório e do poder-dever previsto no artigo 411.º do CPC, visto que a relevância que assumem para a boa decisão da causa excede largamente as eventuais desvantagens decorrentes da sua junção; N. Iguais conclusões podem ser retiradas relativamente aos documentos n.º 9 a n.º 11, juntos pela Recorrente; O. No seu depoimento, AR aludiu a suposta decisão de PI, antigo administrador da Recorrente, de falsear valores de facturação, inflacionando-os deliberadamente, tudo com vista a permitir à Recorrente alcançar determinados resultados financeiros no fecho do exercício de 2016; P. Tal explicaria, no dizer da testemunha, a necessidade da necessidade de rectificar as facturas emitidas pela Recorrente; Q. Também aqui foi a Recorrente totalmente surpreendida pelo relato da testemunha, que para além de incidir sobre circunstancialismo novo, trazido então pela primeira vez ao processo, se mostra totalmente falso e assume carácter gravemente calunioso; R. Por assim ser, nunca o Tribunal a quo podia ter decidido pela inadmissibilidade da junção dos documentos n.º 9 e n.º 10, documentos que comprovam, com toda a clareza, que aquando da emissão de parte muito significativa das referidas facturas pela Recorrente, já PI havia abandonado a empresa e a sua administração; S. Do mesmo passo, deveria o Tribunal a quo ter admitido a junção do Doc. n.º 11, também pertinente e relevante, já que dele se retira que, contrariamente ao afirmado pela testemunha AR, a Recorrente não teve o fecho do seu ano financeiro em Junho de 2016; T. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou mais uma vez o disposto nos artigo 423.º, n.º 3 e 411.º do CPC; U. Sendo ainda certo que, ao coarctar à Recorrente a possibilidade de contraditar as afirmações ligeiras e caluniosas da testemunha, o Tribunal fez igual mente tábua rasa das exigências do princípio do contraditório (artigo 3.º, n.º 3 do CPC); V. Censura idêntica merece a decisão recorrida no que tange ao Doc. n.º 12; W. No seu depoimento, a testemunha SM afirmou que alguns dos débitos atinentes às acções promocionais alegadamente acordadas com a Recorrente foram assinados por AC; X. Com a contestação, a Recorrida juntou aos autos documentos respeitantes a supostas acções promocionais (cfr. documentos 41 a 47 da contestação) Y. Sucede que a Recorrida manteve sempre que era com AR, agente da Recorrente, que «em todos os momentos eram tidas conversações quanto à efectiva relação comercial, sendo este o contacto junto da R. para a discussão de qualquer assunto, nomeadamente, acordadas as quantidades a encomendar, as acções promocionais inerentes à comercialização dos produtos e todas as outras condições específicas» (artigo 33.º da contestação); Z. Com efeito, nunca a Recorrida alegou que que algum desses documentos tivesse sido assinado por AC, a quem de resto, muito sintomaticamente, não é feita qualquer referência na contestação; AA. Ao afirmar que AC assinou débitos promocionais, a testemunha SM introduziu factos novos no processo; BB. Por essa razão impunha se que o Tribunal a quo tivesse admitido a junção do referido Doc n.º 12 cujo teor permite infirmar que AC tenha aposto a sua assinatura em qualquer um dos débitos invocados pela Recorrida; CC. Assim não sucedeu, porém, voltando o Tribunal a quo, com a sua decisão, a violar as normas dos artigo 423.º, n.º 3 e 411.º do CPC; DD. Pelas razões invocadas, isto é, por se estar perante factualidade nova de que o Tribunal a quo pode conhecer, mal andou este ao indeferir a tomada de novas declarações de parte à Recorrente; EE. Com tal decisão, o Tribunal a quo não apenas coarctou à Recorrente um direito que direito que lhe assiste nos termos do artigo 466.º, n.º 1 do CPC (direito esse direito esse cujo exercício não acarreta qualquer prejuízo para a igualdade de armas, visto que a Recorrida poderá sempre, a qualquer momento até ao início das alegações orais, a qualquer momento até ao início das alegações orais, requerer igualmente a prestação de declarações de parte), como voltou a sacrificar as exigências do contraditório e da descoberta da verdade material; FF. Deve assim o despacho proferido ser integralmente revogado e substituído por outro que, aplicando correctamente as normas previstas nos artigos 423.º, n.º 3 e 411.º 3.º, n. º3 e 466., n.º 1 do CPC , admita os meios de prova requeridos pela Recorrente. Por seu turno, a Recorrida apresentou Contra-Alegações, culminando com as seguintes Conclusões: 1. Não existe qualquer fundamento para que a Recorrente venha agora proceder à junção aos autos de diversos documentos, junção essa tardia e intempestiva, não lhe assistindo qualquer razão na sua pretensão. 2. Os documentos que a Recorrente pretende juntar foram apresentados depois de se ter dado início à audiência final, sendo certo que, nos termos dos artigos 423.º e 425.º do CPC, a junção de documentos apenas pode ocorrer nos três momentos distintos aí previstos. 3. Das declarações de duas das testemunhas arroladas pela Recorrida, os Senhores AR e SM, não resulta a introdução de quaisquer elementos novos nunca relatados nos autos, tal como invocando pela Recorrente, tais declarações são apenas meios de prova que visam confirmar, ou não, os factos já trazidos para os autos pelas Partes e que serviram de base à criação dos temas da prova em discussão. 4. Apesar de indicar várias vezes que existem factos novos a Recorrente não indica que factos são esses e que temas da prova daí deveriam resultar. 5. Todos os documentos agora juntos são prévios à propositura da ação e podiam ter sido juntos com a Petição Inicial ou com a Réplica, sendo certo que a Recorrente optou por não os juntar, não existindo qualquer fundamento para admitir uma ocorrência posterior, justificativa de apresentação dos documentos fora dos tempos previstos no art.º 423.º do CPC. 6. O Tribunal a quo decidiu bem ao concluir pela intempestividade da apresentação dos documentos em causa que e pela inadmissibilidade da respectiva junção. 7. Diga-se ainda que, a propósito de eventuais declarações que poderiam ter sido prestadas pelo Senhor AC, testemunha arrolada pela Recorrente, as mesmas não ocorreram pelo simples facto de a Recorrente ter prescindido do seu depoimento. 8. De igual forma não existe fundamento no pedido apresentado pela Recorrente para a tomada de novas declarações de parte pelo Senhor MS, invocando que, estando em causa factualidade nova a discutir, lhe assiste o direito de sobre tais factos novos se pronunciar. 9. Tal como invocado a propósito da junção de novos documentos, também quanto à tomada de declarações de parte não existe qualquer fundamento para ser ouvido novamente o senhor MS. 10. A Recorrida acompanha integralmente o entendimento do Tribunal ad quo também quanto a este ponto. * Questões a Decidir São as Conclusões do(s)/a(s) recorrente(s) que, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, delimitam objectivamente a esfera de atuação do tribunal ad quem (exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial, como refere, ABRANTES GERALDES[2]), sendo certo que tal limitação já não abarca o que concerne às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artigo 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil), aqui se incluindo qualificação jurídica e/ou a apreciação de questões de conhecimento oficioso. In casu, e na decorrência das Conclusões da Recorrente, há que verificar: I – da correcção do despacho recorrido quanto ao indeferimento da junção de documentos em audiência; I – da correcção do despacho recorrido quanto ao indeferimento de novas declarações de parte pela Autora. Corridos que se mostram os Vistos, cumpre decidir. * Fundamentação de Facto A factualidade relevante é a constante do Relatório supra. * Fundamentação de Direito       “Os documentos não são factos, antes meios de prova de factos. Por isso se justifica que a sua apresentação coincida com a alegação dos factos que a parte se propõe demonstrar, solução que, em certa medida, foi agora estendida aos demais meios de prova, os quais devem ser apresentados ou requeridos com os articulados (artº 552º nº 2, 572º alínea d), 588º n.º 1 e n.º 5), ainda que seja admitida alteração posterior do requerimento probatório (art. 598º). Na realidade, a alegação dos factos não deve jamais desligar-se da indicação dos meios de prova disponíveis para a sua demonstração, fazendo, assim, todo o sentido a regra que faz coincidir a ocasião em que são alegados os factos com a constituição do ónus de indicação dos meios de prova, sem prejuízo dos casos de posterior modificação”: é assim que Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa começam por enquadrar a matéria da apresentação da prova documental nos processos judiciais. Sob a epígrafe “Momento da apresentação” é o artigo 423.º do Código de Processo Civil que regula essa oportunidade de junção. Assim, no seu n.º 1, começa por se definir o regime-regra, de acordo com o qual “Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes”. Assente este primeiro nível, os números 2 e 3 prevêem, de seguida, situações de excepção: - num segundo nível, o n.º 2, permite que “Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado”; - e, num terceiro nível, o n.º 3, acrescenta que “Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior”. O regime assim definido funciona até ao encerramento da discussão, como decorre do artigo 425.º[3] (“Apresentação em momento posterior”), onde se admite que, depois “do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento”. Procurando explicar e fazer compreender este regime[4], afirma o Acórdão da Relação do Porto de 02/07/2020 (Processo n.º 285/14.5TVPRT.P1-Paulo Duarte Teixeira) que o “elemento sistemático demonstra que o legislador optou por antecipar o momento preclusivo para a junção de documentos temperando essa exigência de economia, e auto-responsabilidade das partes, com uma cláusula geral de adequação que permite a introdução de novos meios de prova, quer no decurso do julgamento quer até num momento posterior ao da própria decisão em primeira instância. Visa-se com estas normas, eliminar incidentes morosos na tramitação processual que a experiência demonstrava serem usados de forma habitual pelas partes impondo assim um dever de atuação célere às partes e seus mandatários”. Na mesma linha, o Acórdão da Relação do Porto de 07/01/2019 (Processo n.º 3741/17.0T8MTS-A.P1-Carlos Querido) conclui que o “legislador visou evitar surpresas no julgamento, decorrentes da junção inesperada de um qualquer documento, com consequências negativas traduzidas, nomeadamente, no arrastamento e no adiamento das audiências, obrigando as partes a uma maior lisura e cooperação processual na definição das suas estratégias probatórias”[5]. A controvérsia que dá origem a recurso em apreciação suscita-se a propósito da interpretação do n.º 3 do artigo 423.º. Quanto a este, há que sublinhar que ultrapassado o momento inicial da acção (n.º 1 – junção sem custos) e o dos 20 dias antes do início da audiência (n.º 2 – junção com multa[6], se não fizer a prova da impossibilidade de o fazer com o articulado), a junção de documentos, para ser admitida, pressupõe a presença de dois requisitos cumulativos: i- o não ter sido possível fazê-lo até esse momento; ii- que essa junção/apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior. Trata-se, como assinalam - com pertinência - João de Castro Mendes-Miguel Teixeira de Sousa, de uma situação que é similar à que se prevê como fundamento do recurso de revisão, na alínea c), do artigo 696.º: “a impossibilidade de apresentação atempada do documento, pode ser subjectiva – se o documento já existia, mas a parte não tinha conhecimento dele – ou objectiva – se o documento nem sequer existia, porque só foi elaborado posteriormente”[7]. Com esta norma fica legitimada a “apresentação imediata, logo que cesse a impossibilidade de apresentação, não podendo aguardar pelo derradeiro momento pressuposto pela norma de dilação – o encerramento da discussão em primeira instância (art. 425.º)”[8] Por certo temos – em qualquer caso – que a parte tem de alegar e provar os requisitos necessários[9] à pretendida junção de documentos[10], só devendo ser relevadas, [11]como se decidiu no Acórdão da Relação de Coimbra de 24/03/2015, “razões das quais resulte a impossibilidade do requerente, num quadro de normal diligência, ter tido conhecimento anterior da situação ou da existência do documento” (Processo n.º 4398/11.7T2OVR-A.P1.C1-Fonte Ramos), tudo apreciado, portanto, “segundo critérios objetivos e de acordo com padrões de normal diligência” (Relação de Lisboa 11/07/2019, Processo n.º 23712/12.1T2SNT-A.L1-7-Luís Filipe Pires de Sousa). Para o que aos presentes autos releva é o conceito de ocorrência posterior que importa densificar, mas que, indubitavelmente, “tem uma natureza que deve ser casuisticamente averiguada”[12] e que: - “não respeitará, por certo, a factos que constituam fundamento da ação ou da defesa (factos essenciais, na letra do art. 5.º), pois tais factos já hão de ter sido alegados nos articulados oportunamente apresentados ou, pelo menos, por ocasião da dedução de articulado de aperfeiçoamento (art. 590.º, n.º 4)”[13]; - não se reportará a “factos supervenientes, pois a alegação desses factos deve ser acompanhada dos respetivos documentos, sendo esse o meio da sua entrada nos autos (art. 588.º, n.º 5)”[14]; - não tem que ver com “um facto principal, pois este só pode ser introduzido na causa mediante alegação em articulado superveniente ou em articulado dum incidente, como o da habilitação do sucessor no direito litigioso (arts. 351 e 356), casos já cobertos pela norma do n.º 1” [15]; - a “apresentação do documento não se torna necessária em virtude de ocorrência posterior quando uma testemunha alude a um facto, ainda que em sentido contrário ao pretendido pelo apresentante, se se tratar de um facto essencial já alegado – ou de um facto puramente probatório. A ocorrência que torna necessária a apresentação deste meio de prova é a pretérita alegação desta matéria, cabendo a situação no n.º 1 deste artigo” [16]. João de Castro Mendes-Miguel Teixeira de Sousa apontam que, como “ocorrência posterior também pode valer uma prova produzida na audiência final. Assim, por exemplo, é admissível a junção de um documento que se destine a infirmar o depoimento de uma testemunha produzido nessa audiência”[17]. Lebre de Freitas-Isabel Alexandre sublinham que estará em causa “um facto instrumental relevante para a prova dos factos principais ou de um facto que interesse à verificação dos pressupostos processuais, casos em que o documento que prova esse facto não pode deixar de se ter formado, também ele, posteriormente”[18]. Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, “no plano dos factos, a ocorrência posterior dirá somente respeito a factos instrumentais ou a factos relativos  a pressupostos processuais”, não podendo “criar-se artificialmente eventos ou incidentes cujo objectivo substancial seja tão só o de inserir nos autos documentos que poderiam e deveriam ser apresentados em momento anterior, sob pena de frustração do objetivo disciplinador fixado pelo legislador e, assim, de prática que se quis assumidamente abolir”[19]. Esta será já uma das conclusões que podemos afirmar e que desde já se assume: a ocorrência posterior só pode respeitar a factos instrumentais[20] ou a pressupostos processuais, não a factos essenciais, portanto (porque se reportados aos principais, isso seria a abertura de uma porta lateral que o legislador não quis manifestamente abrir, ao lado da principal que fechou). Fazendo um excurso – com alguma exaustividade – pela jurisprudência publicada encontramos algumas notas divergentes quanto às situações enquadráveis na ocorrência posterior prevista no n.º 3 do artigo 423.º: - no Acórdão da Relação de Lisboa de 06/12/2017 (Processo n.º 3410-12.7TCLRS-A.L1-6-Cristina Neves) decidiu-se que com fundamento na parte final do nº 3 do artigo 423.º do CPC, o “depoimento de uma testemunha, arrolada nos autos, não constitui nunca ocorrência posterior que possibilite a junção de documentos. Considerar o contrário, seria permitir que, a cada testemunha, fosse possível à parte a junção de mais documentos, fora dos momentos temporais consignados na lei e ao arrepio da restrição que o legislador procurou estabelecer com esta norma”; - no Acórdão da Relação de Évora de 21/12/2017 (Processo n.º 514/07.1TBGDL-A.E1-Victor Sequinho dos Santos) decidiu-se que não é ocorrência posterior a prestação de declarações de um perito em sede de audiência relativamente a uma matéria que constituía “um dos temas centrais” do processo e que, como tal, “não podia ser considerada, nesse momento processual, como uma questão nova, nem os esclarecimentos da perita podiam ser considerados, para o efeito previsto na parte final do n.º 3 do artigo 423.º do CPC, como uma ocorrência posterior que tivesse gerado a necessidade da apresentação dos documentos. Muito pelo contrário, tratava-se de uma questão que vinha de trás, que integrou o objecto da perícia e que foi respondida no relatório desta, pelo que os documentos em causa deviam ter sido juntos em momento anterior”; - no Acórdão da Relação de Lisboa de 08/02/2018 (Processo n.º 207/14.3TVLSB-B.L1-6- António Santos) decidiu-se que “consubstancia ocorrência posterior, para efeitos do nº 3, in fine, do artº 423º, do CPC, o depoimento prestado em audiência por testemunha, e visando a junção de documentos demonstrar que não são verdadeiros factos referidos no depoimento pela referida testemunha”; - no Acórdão da Relação de Lisboa de 07/06/2018 (Processo n.º 20112/15.5T8SNT.L1-6-Maria de Deus Correia) decidiu-se que o disposto no artigo 423.º, n.º 3, do CPC não se destina às situações em que as partes não localizaram os documentos em tempo útil, por razões apenas a si imputáveis e que o “depoimento de testemunhas arroladas nos autos não constitui ocorrência posterior para efeitos de apresentação de documentos não juntos aos autos, com fundamento na parte final do nº3 do artº 423 do C.P.C.”, quando essa junção já seria necessária de acordo com a defesa apresentada na Contestação; - no Acórdão da Relação de Lisboa de 25/09/2018 (Processo n.º 744/11.1TBFUN-D.L1-1-Rijo Ferreira) decidiu-se que o artigo 423.º apenas regula “o direito que assiste às partes de fazerem juntar ao processo documentos, independentemente da sua pertinência, da sua relevância e da apreciação do seu valor probatório”, acrescendo que isso “não invalida que a junção dos mesmos documentos possa ser ordenada pelo juiz ao abrigo dos poderes inquisitoriais previsto no art.º 411º do CPC”. Mais de disse que a “ocorrência posterior deve ser relacionada com a dinâmica do desenvolvimento do próprio processo, designadamente tendo em vista a dialéctica que se desenvolve durante o processo de produção de prova no julgamento da causa (relativamente a alterações factuais exteriores ao processo a forma adequada de as tornar relevantes é a dedução de articulado superveniente, não se levantando aí qualquer problemática quanto à possibilidade de com esse articulado se apresentarem os correspondentes documentos). E nesse conspecto haverá de ter em conta o regime legal relativamente ao apuramento dos factos relevantes”. - no Acórdão da Relação de Lisboa de 26/09/2019 (Processo n.º 27/18.6T8ALQ-A.L1-6-Ana Azeredo Coelho) decidiu-se que constitui “ocorrência posterior justificativa de apresentação de documento, fora dos tempos legalmente previstos, o depoimento que afirma um facto novo de que o juiz pode conhecer, não aquele em que a testemunha se refira a factos anteriormente alegados nos autos” e ainda que os “factos instrumentais, indiciários ou probatórios o campo natural de aplicação da norma da 2ª parte do artigo 423.º, n.º 3, do CPC”; - no Acórdão da Relação de Évora de 21/11/2019 (Processo n.º 5145/18.8STB.E1-A-Manuel Bargado) decidiu-se que as declarações de parte, bem como o depoimento de testemunhas, não constituem ocorrências posteriores para efeitos de apresentação de documentos não juntos aos autos, com fundamento na parte final do nº 3 do artigo 423º do CPC, sendo que, todavia, “é possível relacionar a “ocorrência posterior” com a dinâmica do desenvolvimento do próprio processo, designadamente tendo em vista a dialética que se desenvolve durante o processo de produção de prova no julgamento da causa, o que consistirá, na generalidade dos casos, na revelação de factos instrumentais, complementares ou concretizadores”, o que leva a concluir, aceitando esta ideia, que “as declarações de parte ou o depoimento de uma testemunha pode constituir ocorrência posterior que torna necessária a apresentação de um documento fora dos momentos previstos no artigo 423º, nº 1 e 2, do CPC, desde que no seu depoimento a parte ou a testemunha invoque factos que sejam novos no processo e não possam ser qualificados como factos essenciais”; - no Acórdão da Relação de Lisboa de 20/02/2020 (Processo n.º 1279/13.3TVLSB-D.L1-1-Gabriela Marques) - decidiu-se que a “junção tardia de documentos não pode assentar na circunstância de se pretender fazer contraprova da “narrativa das testemunhas” apresentadas, pois mesmo estando em causa a eventual contradita, esta não se destina à contraprova de um depoimento testemunhal, mas sim a abalar a credibilidade e a fé que a testemunha possa merecer ao tribunal; - e acrescentou-se que, considerando “que os meios de prova se destinam à instrução da causa, ou seja aos factos necessitados de prova, a junção de documentos terá sempre como pressuposto a enunciação dos factos a cuja prova ou contraprova se destinam”, sendo que, se os documentos a juntar já existiam aquando dos articulados “e as testemunhas indicadas foram inquiridas sobre os factos que foram alegados em sede de articulados, inexistindo, ou não tendo o Autor alegado como justificativo de tal junção, factos instrumentais novos que possam determinar a justificação da junção extemporânea”, não pode justificar-se “a junção tardia de documentos a circunstância de se pretender fazer contra prova da “narrativa das testemunhas”, pois caso pretendesse contraditar tais depoimentos, ou abalar a credibilidade dos mesmos, teria de justificar a junção com a eventual contradita nos termos do artº 521º do CPC, mas esta com a indicação em concreto do pressuposto de tal figura. Por outro lado, tal como se decidiu no Acórdão desta Relação, datado de 6/12/2017 (in www.dgsi.pt/jtrl) a «contradita não se destina de todo à contraprova de um depoimento testemunhal, destina-se a abalar a credibilidade e a fé que a testemunha possa merecer ao tribunal, podendo por esse meio por em causa o teor do seu depoimento, por se demonstrar não ser esta isenta ou credível.». Também no Acórdão desta Relação de 8/2/2018 se conclui: não tem a contradita por desiderato por em cheque/causa o depoimento da testemunha propriamente dito, mas antes a pessoa do depoente, isto é, não se alega que o depoimento é falso, ou a testemunha mentiu, antes alega-se que por tais e tais circunstâncias exteriores ao depoimento, a testemunha não merece crédito. É que, como bem salienta J. Alberto dos Reis, “Só quando a contradita se dirige contra a razão de ciência invocada pela testemunha é que as declarações desta são postas em causa; mas, ainda aqui não se atacam directamente os factos narrados pelo depoente, só se ataca a fonte de conhecimento que ele aponta” (in Código de Processo Civil, Vol. IV, pág. 459); - no Acórdão da Relação do Porto de 02/07/2020 (Processo n.º 285/14.5TVPRT.P1-Paulo Duarte Teixeira) decidiu-se que não integra o conceito de ocorrência posterior “a necessidade de confrontar uma testemunha com esses documentos, pois os factos carecidos de prova são fixados em momento anterior. Ou dito de outro modo qual é o facto posterior à data limite, não previsível, que pela sua relevância implique a necessidade da junção aferida de forma objetiva e à luz de um litigante normalmente diligente. In casu, a autora admite que os documentos são pessoais, estavam na sua posse desde 2013 ou data da sua emissão e, como é evidente a sua pertinência, se dúvidas houvesse foi estabelecida com a apresentação da contestação e fixação dos temas de prova, ou seja, muito antes de maio de 2019. Ou seja, parece claro que o motivo invocado (necessidade de demonstração de uma realidade) não era novo, mas já estava fixada em momento anterior e, qualquer parte diligente teria analisado os meios de prova de que dispunha, pelo menos, quando os temas de prova foram fixados. Veja-se nesta matéria o recente Ac da RC de 22.10.2019, nº 958/19.1T8VIS.C1: “A necessidade da junção em virtude do julgamento proferido em 1ª instância (art.651 nº1 CPC) não abrange a hipótese de a parte pretender, com tal fundamento, juntar à alegação documento que já poderia e deveria ter apresentado em 1.ª Instância. Aliás se assim não for, a justificação apresentada (necessidade de contraditar testemunha) abre a janela para a completa deturpação do regime fixado na lei com a dedução de perguntas e incidentes visando já uma junção “fraudulenta”. Por causa disso, é que existe uma posição jurisprudencial, pelo menos maioritária segundo a qual a junção de documentos em julgamento não é justificável para confrontação de testemunhas ou até através da “falsa” dedução de incidentes como os de contradita. (cfr. Acs da RL de 6.12.2017 e 8.2.2018, in processos 3410/12 e 207/14, e 25.9.2018, nº 744/11.1TBFUN-D.L1-1 (Rijo Ferreira(…)”. Apesar disto, o Acórdão acabou por concluir que “os documentos devem ser juntos ao abrigo do principio do inquisitório se o interesse destes para a decisão da causa for superior às desvantagens provocadas na sua tramitação, e afectação do direito de defesa da parte contrária”, sendo que a “utilização desse poder dever não afecta a independência do tribunal, pois, este desconhece e é alheio aos efeitos concretos da decisão; exerce um poder dever e visa carrear para os autos todos os elementos para uma decisão conforme com a realidade”; - no Acórdão da Relação de Lisboa de 12/10/2021 (Processo n.º 5984/18.0T8FNC-B.L1-7-Cristina Maximiano) decidiu-se que a “tempestividade de um documento apresentado com a audiência final a decorrer implica a alegação e a prova de que a apresentação anterior não foi possível ou de que a apresentação se tornou necessária em virtude de ocorrência posterior”, a qual se não verifica “quando uma testemunha alude a um facto, ainda que em sentido contrário ao pretendido pelo apresentante dos documentos, se se tratar de um facto essencial anteriormente alegado nos autos”; - no Acórdão da Relação do Porto de 18/10/2021 (Processo n.º 3221/20.6T8PNF-A.P1-Rita Romeira) decidiu-se que, se “a parte requereu a junção de documentos, no decurso da audiência de julgamento, invocando que a sua apresentação se tornou necessária em virtude de ocorrência posterior, concretizada no falso depoimento por parte do legal representante da Recorrida, a que visa retirar credibilidade, estamos perante a ocorrência posterior a que alude a parte final do nº 3 do art. 423º do CPC”: “Ou seja, ocorreu circunstância, de todo imprevisível para a apelante, que justifica, no caso, o pedido de junção dos ditos documentos”; - no Acórdão da Relação de Guimarães de 31/03/2022 (Processo n.º 7080/19.3T8VNF.G1-Antero Veiga) decidiu-se que o “depoimento de uma testemunha não constitui em si uma ocorrência posterior que possa justificar a junção de documento com esse fundamento, a menos que tal depoimento traga factos que sejam novos no processo e não possam ser qualificados como factos essenciais” e que é “de admitir a junção de documento relativos à situação do próprio depoente, por este referida no depoimento, se pela sua similitude com a situação em análise, for de concluir pela sua utilidade para a formação da convicção do julgador”; - no Acórdão da Relação do Porto de 04/05/2022 (Processo n.º 24484/16.6T8PRT.P1-Filipe Caroço) decidiu-se que o “depoimento de uma testemunha pode constituir ocorrência posterior que torna necessária, pela sua utilidade, a apresentação de um documento fora dos momentos previstos no art.º 423º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil (cf. respetivo nº 3), contanto que se refira a factos não essenciais e não previamente alegados.       Não tem sido exatamente este o entendimento que, pelo menos, a jurisprudência mais recente tem produzido. Segundo esta, um depoimento testemunhal ou um depoimento de parte, por ex., produzidos em audiência, podem constituiu uma “ocorrência posterior” justificativa da apresentação e admissão de documentos naquela mesma sede, contanto que não se trate de factos essenciais da ação ou de exceção, a seu tempo invocados, já que, com a respetiva alegação, deverão ser entregues também os documentos destinados a fazer a sua prova. A “ocorrência posterior a que se refere o nº 3 não é um facto principal ou essencial --- estes entram na causa através da alegação nos articulados normais, em articulado superveniente ou ainda em articulado de um incidente, como o da habilitação do sucessor no direito litigioso (art.ºs 351º e 356º); situações abrangidas pela norma do nº 1 do art.º 423º --- mas factos instrumentais e complementares ou concretizadores relevantes para a demonstração dos factos essenciais ou nucleares ou de facto que interesse à verificação dos pressupostos processuais. Note-se que estes factos nem sequer têm que ser alegados, bastando que resultem da instrução a causa (art.º 5º, nº 2, al.s a) e b), do Código de Processo Civil). Assim, o depoimento de uma testemunha pode constituir ocorrência posterior que torna necessária, pela sua utilidade, a apresentação de um documento fora dos momentos previstos no art.º 423º, n.º 1 e 2, desde que no seu depoimento invoque factos que sejam novos no processo e não possam ser qualificados como factos essenciais ou principais e exista um elemento de novidade, mormente por se prefigurar, em resultado da instrução, nova factualidade instrumental idónea a suportar presunções judiciais, complementar ou concretizadora de factos essenciais (integrantes da causa de pedir ou de exceções oportunamente deduzidas). Os factos instrumentais, indiciários ou probatórios, serão assim o campo natural de aplicação da norma da 2ª parte do artigo 423º, n.º 3. Assim sendo, e acompanhando aquela jurisprudência, temos para nós que o depoimento de uma testemunha pode constituir ocorrência posterior que torna necessária a apresentação de um ou mais documentos fora dos momentos previstos no artigo 423º, n.ºs 1 e 2, desde que no seu depoimento invoque factos relevantes que sejam novos no processo e não devam ser qualificados como factos essenciais” (carregado nosso). “A junção dos documentos pode contribuir para o esclarecimento daqueles factos instrumentais probatórios, eliminação do alegado equívoco e, indiretamente, para boa decisão da causa. É, assim, uma junção de documentos com a utilidade necessária a contrariar a afirmação da testemunha. Tal junção não ofende eventuais interesses processuais das partes e a mesma está ainda abrangida pelo alcance dos temas da prova e das questões a decidir”; - no Acórdão da Relação de Évora de 09/06/2022 (Processo n.º 2284/18.9T8FAR-A.E1-Paula do Paço) decidiu-se que “não é ocorrência posterior a inquirição de uma parte em sede de audiência, relativamente a uma questão que estava em debate desde a fase dos articulados, justificando a formulação de perguntas que colocassem em causa as afirmações prestadas pela recorrente em declarações de parte, sobre tal matéria”. Depois desta viagem pelas decisões tomadas pelos Tribunais de recurso temos já o panorama global que respeita a esta matéria no que concerne à Doutrina e Jurisprudência. Ora a situação dos presentes autos não é muito distinta daquelas que deram origem aos Acórdãos prolatados. Objectivamente e em termos processuais situamo-nos no decurso da audiência de julgamento após inquirição de testemunhas. Logo, a possibilidade de junção de documentos pelas partes é regida pelo n.º 3 do artigo 423.º. A Autora, após a inquirição das testemunhas AR e SM, veio invocar que no seu depoimento o primeiro tinha aflorado matéria atinente à factura emitida pela Ré à Autora no valor de € 152.535,10, em Junho de 2017, referindo-se a uma alegada existência de indicação ou aprovação da Autora, através de AC, para a sua emissão, considerando que isto constitui um facto novo e que a suposta existência de valores de facturação premeditadamente inflacionadas pela Autora, por decisão de um antigo membro da sua administração, também constitui um facto novo (sendo que quanto à outra testemunha já falaremos). Assim, entendendo “que esses factos são falsos, pretendeu juntar documentos que, em seu entender são relevantes e essenciais à descoberta da verdade, na exacta medida em que infirmam factos relatados na audiência final. Invoca ainda que a testemunha SM, ouvido na segunda sessão, fez referência a débitos referentes a campanhas/acções promocionais assinadas por AC, sem nunca especificar a que débitos se referia, nem concretizou as acções promocionais subjacentes às notas emitidas, respectivas datas e valores em questão. Refere que apesar de a Ré ter junto com a sua contestação documentos atinentes a supostas acções promocionais, nunca alegou que algum desses documentos houvesse sido assinado por AC, pelo que se trata de matéria nova e conclui que a junção dos documentos ora apresentados são pertinentes e relevantes para a descoberta da verdade”. A Autora defende: - que os documentos em causa não se destinam a fazer prova de factos alegados na petição inicial ou na réplica, mas que visam infirmar declarações falsas, que incidem sobre circunstancialismo novo e que foram proferidas pela primeira vez em audiência (“Se em sede de audiência de julgamento se suscitam novos factos que possam servir de fundamento à defesa apresentada, assiste à contraparte o direito de reagir”); - que em qualquer caso, sempre se imporia a admissão dos documentos em causa, ao abrigo do princípio do inquisitório e do poder-dever que dimana do artigo 411.º do CPC, face ao seu para a boa decisão da causa (que supera as eventuais desvantagens da sua junção). A Recorrente não tem razão! De facto, o que a Autora/Recorrente faz é, depois de produzida a prova e conhecendo-a, pretender fazer nova prova (dir-se-á “correctiva” da que tinha feito) ao arrepio de todas as regras processuais que regulam a matéria. O Tribunal a quo refere com particular pertinência, “as declarações das testemunhas não constituem factos mas são meios de prova para a afirmação ou não de factos”. E que “as referidas testemunhas depuseram sobre factos já trazidos ao processo pelos diversos articulados apresentados pelas partes. Se esses factos já foram invocados pelas partes nos respectivos articulados e enunciados nos temas da prova, os documentos deveriam ter sido juntos com os respectivos articulados ou, com multa, até 20 dias antes da data da audiência final, como decorre do artigo 423.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil”. E estas considerações são inatacáveis! Ora, se as testemunhas se referiram a factos essenciais (alegadamente novos), os mesmos deveriam constar dos temas da prova e enquadrarem-se no objecto do litígio, o que não é o caso. Mesmo respeitantes a factos instrumentais (os tais que constituem o principal campo de aplicação do artigo 423.º, n.º 3), por outro lado, o que se constata é que não se trata de matéria que possa ser considerada nova. Mais, convém ter presente, aliás, que a matéria a que as testemunhas se referiram é tudo menos nova no processo, pois desde a Petição Inicial que dela se fala nos autos (cfr. artigo 83.º da PI, onde já se refere “Deste modo, encontra-se em dívida, na presente data, a quantia de EUR 152,535.10, correspondente a fornecimentos de produtos realizados e faturados pela Autora à Ré e titulados pelas seguintes faturas: …”), sendo certo ainda que a intervenção da testemunha AR e o seu âmbito é discutida nos articulados desde o início. Sendo esta última circunstância mais do que inultrapassável, iniludível, no sentido de que tudo o que com ela se relacionasse haveria de ter sido junto aos autos em termos de prova, pela parte, no momento legalmente adequado. O que as testemunhas vieram dizer aos autos em sede de audiência, tal como se apresenta e no contexto apresentado é tudo menos novo, sendo mesmo o corolário da tese apresentada pela outra parte (Ré) desde o início dos autos. A concreta configuração dos factos dada no decurso das suas declarações[21] faz parte do que é a natureza de um depoimento testemunhal e é expectável num depoimento sobre este tipo de matéria, sendo certo que dar conta das suas percepções não traz de per se um facto novo: como assinala – com acerto – a Recorrida, “as afirmações das testemunhas referidas pela Recorrente nas suas Alegações não são factos, e muito menos factos novos, trazidos para os autos com os respectivos depoimentos. São, isso sim, declarações que poderão confirmar ou contrariar os factos que se discutem e que estão respaldados nos Temas da Prova”. Dizer, como faz a ora Recorrente, que “não lhe pode ser exigido que, com vista a antecipar toda e qualquer declaração que possa vir a ser produzida em audiência, tivesse carreado para os autos, indiscriminadamente, a totalidade do acervo documental que tem em sua posse”, só faria sentido e seria pertinente se não se tratasse da matéria que estava em discussão (e cuja prova lhe cabia…). A prova pretendida juntar pode corresponder principalmente a correspondência trocada entre colaboradores da Recorrente, mas a Autora sabia desde o início do conflito com a Ré (e, para o que aqui releva, desde o início do processo) exactamente o que estava em causa (não se tratando, de forma alguma, de documentação respeitante a matéria nova ou imprevisível). Aquilo sobre o que as testemunhas em causa depuseram (em especial a testemunha AR) foi precisamente sobre o fulcro da questão, sobre a matéria que está (pelo menos) desde o início dos autos como controvertido. Como a Autora (e a Ré) bem sabem. Não há, deste modo, uma razão plausível ou aceitável, para que os documentos pretendidos juntar (todos muito anteriores à existência deste processo) não o tivessem sido nos momentos processuais adequados, sendo que, por opção de estratégia processual da parte[22], não o foram… Ora, tal como se referiu no já citado Acórdão da Relação de Lisboa de 26/09/2019 (Processo n.º 27/18.6T8ALQ-A.L1-6-Ana Azeredo Coelho), o depoimento em que a testemunha se refira a factos anteriormente alegados nos autos não pode constituir ocorrência posterior justificativa de apresentação de documento fora dos tempos legalmente previstos, uma vez que não se reporta “a um facto novo de que o juiz pode conhecer”. Foi isto que o Tribunal a quo assumiu, disse e decidiu. Estas considerações valem quer para os documentos 1 a 8, quer para os documentos 9 a 11 (duas actas e uma nota curricular), sendo que, neste último caso, a matéria está reportada a partes do depoimento da testemunha AR sobre um inflaccionamento de valores de facturação que continua a ser facto essencial), quer para o documento 12 (quatro documentos ou fragmentos de documentos em que se acha aposta a assinatura de AC, com vista a infirmar o relato da testemunha SM, qualificado como “genérico e impreciso, como genérica e imprecisa foi sempre a alegação da Recorrida”, pedindo que se confronte com os documentos 41, 42, 44, 45, 46 e 47 da contestação, para concluir que nenhum deles foi assinado por AC). Quanto a este último, é a própria Recorrente que desqualifica a sua pretensão, pois que, perante um depoimento que o próprio Tribunal afirma impreciso e vago (com a concordância da Recorrente…) junta documentos para confrontar com documentos que já tinham sido juntos com a Contestação e relativamente aos quais, conhecendo o processo, os seus contornos e origens, podia antes ter-se pronunciado. * Por fim e para que também essa questão não deixe de ser referida e explorada, a procura da verdade material, com o eventual recurso ao princípio do inquisitório, através do artigo 411.º do Código de Processo Civil[23], parece-nos estar completamente fora de cogitação, pois o princípio e o normativo não podem ser utilizados para introduzir no processo documentos que a parte – podendo – não apresentou atempadamente nos termos das regras processuais aplicáveis (nomeadamente do artigo 423.º). O Acórdão da Relação de Lisboa de 25/09/2018 (Processo n.º 744/11.1TBFUN-D.L1-1-Rijo Ferreira), pela qualidade da sua argumentação, tem de nos servir de paradigma, deixando-nos as notas essenciais de referência: “Segundo a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem a garantia de processo equitativo (‘fair trial’) coloca o tribunal sob o dever de levar a cabo um exame aprofundado dos pedidos, fundamentos e provas aduzidos pelas partes; e se se reconhece uma larga margem de apreciação aos legisladores e tribunais nacionais para estabelecerem as regras de admissibilidade e apreciação das provas, não se deixa de afirmar que as restrições à apresentação de provas não podem ser arbitrárias ou desproporcionadas, antes têm de ser consistentes com a exigência de julgamento equitativo e que sempre se deve exigir que o procedimento na sua globalidade, incluindo os aspectos relativos à admissibilidade das provas, seja equitativo. E nesse sentido haverá de interpretar-se, também, o disposto no art. 20º, nº 4, da Constituição da República por força do disposto no art.º 16º, nº 2, do mesmo diploma. A regra da não admissão de prova documental após o vigésimo dia anterior à audiência final, baseada apenas nesse limite temporal, pode, assim, levantar questões de conformidade com o princípio do processo equitativo (em particular quando o documento cuja junção se pretende seja relevante para o apuramento dos factos). Se as primeiras apontadas situações se situam no campo das opções legislativas que, ainda que contraproducentes ou incorrectas, devem os tribunais respeitar, já o mesmo não acontece no caso da última referida situação, por estarem em causa direitos fundamentais, devendo os tribunais interpretar os normativos em causa em conformidade com os direitos fundamentais ou, mesmo, recusar a aplicação dos mesmos”. Neste Acórdão, portanto, a consideração dada à Convenção Europeia dos Direitos Humanos é também usada para a própria definição do conceito de ocorrência posterior (patamar que já ultrapassámos), mas, mais à frente, acrescenta-se: “Mas ainda que tal se não verificasse, ainda assim não estava excluída de todo a possibilidade de junção de tais documentos, uma vez que para além do direito/ónus das partes a apresentarem documentos, impende sobre o juiz o poder/dever de, quantos aos factos que lhe é lícito conhecer – factos notórios, essenciais alegados, instrumentais, complementares e concretizadores desses - promover todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio (art.º 411º do NCPC). Não estaria, pois, descartada a possibilidade de ser ordenada a junção desses documentos por o juiz da causa entender que os mesmos se mostravam relevantes para o julgamento da causa (sendo que essa actividade do juiz corresponde, em nosso modo de ver, ao uso legal de um poder discricionário, pelo que das correspondentes decisões não cabe recurso – art.º 630º, nº 1, do CPC)”. Ora, como nos parece bom de ver essa relevância começa por não ser devidamente contextualizada pela Autora-Recorrente, por se tratar assumidamente de matéria respeitante a factos essenciais e a instrumentais previsíveis, pelo que o poder inquisitorial do juiz só faria sentido ser utilizado para obstar a iniquidades (como o poderia ser um inevitável ganho ou perda de uma acção), uma vez que as limitações da regulação processual civil quanto à produção (junção) da prova documental (como atrás vimos), não são arbitrárias, são compreensíveis e são proporcionadas. No contexto dos autos (com o que estava configurado no litígio e com o que as testemunhas disseram), usar o artigo 411.º para juntar ao processo os documentos pretendidos pela Autora seria como que dar um benefício ao infractor. O Tribunal a quo apreciou globalmente a matéria e decidiu bem, nada havendo a apontar-lhe no que concerne à junção extemporânea e injustificada dos documentos. * No que respeita ao indeferimento das novas declarações de parte pela Autora, em função do que foram os depoimentos das testemunhas, o Tribunal a quo também esteve bem. A Autora entendia que embora tivesse já sido ouvida, “mas estando em causa factualidade nova e relevante e que, no caso da alegada decisão da Autora de inflacionar facturas, chega a ser caluniosa e lesiva da sua honra”, lhe assistia “o direito de contraditá-la por via da prestação de novas declarações”. De forma certeira o Tribunal sublinhou que, como já referira “quanto à questão da junção dos documentos, não estamos perante factos novos, pelo que não há fundamento para ser ouvido novamente MS em declarações de parte”. E esta sempre teria de ser a decisão, importando apenas acrescentar, sublinhando-o, que as declarações de parte não são um meio para a parte pontuar, comentar ou retocar a restante prova produzida, nem – noutro plano – constituem ou podem ter a veleidade de constituir uma segunda oportunidade para complementar probatoriamente as suas insuficiências anteriores, ou a displicência com que pudesse ter encarado a produção da prova, nomeadamente depois de esta já ter ocorrido e originado uma situação factual  configurada ou estabelecida. Assim sendo, inexistia qualquer fundamento para novas declarações de parte, pelo que se impõe a confirmação do despacho recorrido. * Em ambas as situações decidiu bem, fundada e fundamentadamente, o Tribunal recorrido. * DECISÃO Com o poder fundado no artigo 202.º, n.ºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa, e nos termos do artigo 663.º do Código de Processo Civil, acorda-se, nesta 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, face à argumentação expendida e tendo em conta as disposições legais citadas, em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar os despachos recorridos. Custas a cargo da Recorrente. Notifique e, oportunamente remeta à 1.ª Instância (artigo 669.º CPC). Lisboa, 14 de Julho de 2022 Edgar Taborda Lopes Luís Filipe Pires de Sousa José Capacete _______________________________________________________ [1] Em que peticiona a condenação da Ré no pagamento do montante total de € 1.050.120,93 (correspondendo € 907,677.70 ao capital em dívida e € 142.443,23 a título de juros de mora vencidos, ao qual devem acrescer os juros vincendos até efetivo e integral pagamento. [2] António Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 6.ª edição Atualizada, Almedina, 2020, página 183. [3] Conjugado com os artigos 651.º, n.º 1 (“As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância) e 662.º, n.º 1 (“A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”). [4] Cuja teleologia, nas palavras de Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, “visa evitar a perturbação resultante da apresentação extemporânea de documentos” (Código de Processo Civil Anotado, Volume I Parte Geral e Processo de Declaração, 2.ª edição, 2020, página 519). [5] Vendo a perspectiva afirmativa, ou positiva, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 17/01/2020 (Processo n.º 1227/10.2BEPRT-S1-Luís Migueis Garcia) constata que o legislador visou “estabilizar os meios de prova com certa antecedência em relação à realização da audiência final” (cfr., também, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12/09/2019, Processo n.º 587/17.9T8CHV-A.G1-A.S1-Catarina Serra). [6] Artigo 27.º, n.º 1 e 2, do Regulamento das Custas Processuais. [7] João de Castro Mendes-Miguel Teixeira de Sousa, Manual de Processo Civil, Volume II, AAFDL, 2022, página 531. [8] Paulo Ramos de Faria-Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, 2.ª edição, Almedina, 2014, página 370. [9] No que respeita a junção de documentos com as alegações de recurso e quanto à superveniência subjectiva, Rui Pinto (in Código de Processo Civil Anotado, Volume II, Coimbra, Almedina, 2018, página 314) refere que “não basta invocar que só se teve conhecimento da existência do documento depois do encerramento da discussão em 1.ª instância, já que isso abria de par em par a porta a todas as incúrias e imprevidências das partes: a parte deve alegar – e provar – a impossibilidade da sua junção naquele momento e, portanto, que o desconhecimento da existência do documento não deriva de culpa sua. Realmente, a superveniência subjectiva pressupõe o desconhecimento não culposo da existência do documento” (carregado nosso). [10] Assim, expressamente, vd. o Acórdão da Relação do Porto de 15/02/2016 (Processo n.º 96/14.8TTVFR-A.P1-Domingos Morais), que considera caber ao “apresentante incumbe um duplo ónus: o da justificação temporal da apresentação e a indicação discriminada e fundamentada dos factos a que tal documento se destina”, sendo que, este último, tem “por objectivo, não só o de permitir à parte contrária exercer o direito do contraditório, estatuído no art. 427.º do CPC, como ainda o de permitir ao tribunal verificar da impertinência ou desnecessidade de tal junção (tardia)”. [11] José Alberto dos Reis, a propósito do §4 do artigo 550.º do Código de Processo Civil de 1961 (“Os documentos destinados a fazer prova dos factos ocorridos posteriormente aos articulados, ou cuja junção se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior, podem ser oferecidos em qualquer estado do processo”), dá como exemplo desta ocorrência posterior (por nós sublinhada no inciso), “o caso de o documento se destinar a fazer a prova da inexactidão de afirmações feitas pelo réu no último articulado ou na alegação final, ou a demonstrar que não são verdadeiros  factos referidos pelos peritos ou pelas testemunhas”, acrescentando – e manifestando concordância – que o Acórdão do  STJ de 30/03/1937 (RLJ, 70.º, página 118), “entendeu que constitui ocorrência posterior o facto de uma testemunha afirmar facto que se pretende desmentir com a junção de documento” (Código de Processo Civil Anotado,  Volume IV -reimpressão-,  Coimbra Editora, 1987, páginas 19 e 20). [12] Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo…, cit., página 520. [13] Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo…, cit., página 520. [14] Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo…, cit., página 520. [15] Lebre de Freitas-Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado - Volume 2.º-Artigos 362.º a 626.º, 4.ª Edição, Almedina, 2019, página 241. [16] Paulo Ramos de Faria-Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, 2.ª edição, Almedina, 2014, página 370. [17] João de Castro Mendes-Miguel Teixeira de Sousa, Manual…, cit., página 532. [18] Lebre de Freitas-Isabel Alexandre, Código de Processo…, cit., página 241. [19] Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo…, cit., página 520. [20] “Os factos instrumentais, indiciários ou probatórios o campo natural de aplicação da norma da 2ª parte do artigo 423.º, n.º 3, do CPC” (Acórdão da Relação de Lisboa de 26/09/2019 (Processo n.º 27/18.6T8ALQ-A.L1-6-Ana Azeredo Coelho). [21] Cada depoimento testemunhal é, em si, único e personalizado. [22] Aliás, não deixa de ser significativo (e de ter de se relevar como elemento adjuvante de argumentação) que o AC a que a testemunha AR se refere era mesmo uma das testemunhas que a Autora tinha arrolado como testemunha. [23] “Incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer”.