Processo:27389/20.2T8LSB-A.L1-7
Data do Acordão: 19/06/2023Relator: ANA RODRIGUES DA SILVATribunal:trl
Decisão: Meio processual:

1.–O art. 14º-A, nº 1 do NRAU atribui a natureza de título executivo ao contrato de arrendamento, conjugado com o comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida; 2.–Trata-se de um título executivo composto, integrado pelo contrato de arrendamento, e pela comunicação ao devedor, apenas existindo quando resulte da conjugação destes documentos, não valendo isoladamente nem o contrato de arrendamento nem os comprovativos das referidas comunicações; 3.–Estando em causa comunicação que integre título executivo para pagamento de rendas, encargos ou despesas, a mesma segue o regime estabelecido nos arts. 9º e 10º do NRAU; 4.–Em caso de domicílio convencionado, o senhorio fica dispensado do envio de nova carta quando o destinatário se recuse a receber a primeira carta enviada ou quando o aviso de recepção tiver sido assinado por pessoa diferente do destinatário, cfr. art. 10º, nº 2, al. b) do NRAU.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
ANA RODRIGUES DA SILVA
Descritores
EXECUÇÃO TÍTULO EXECUTIVO NRAU CONTRATO DE ARRENDAMENTO RENDAS
No do documento
RL
Data do Acordão
06/20/2023
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO
Decisão
PROCEDENTE
Sumário
1.–O art. 14º-A, nº 1 do NRAU atribui a natureza de título executivo ao contrato de arrendamento, conjugado com o comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida; 2.–Trata-se de um título executivo composto, integrado pelo contrato de arrendamento, e pela comunicação ao devedor, apenas existindo quando resulte da conjugação destes documentos, não valendo isoladamente nem o contrato de arrendamento nem os comprovativos das referidas comunicações; 3.–Estando em causa comunicação que integre título executivo para pagamento de rendas, encargos ou despesas, a mesma segue o regime estabelecido nos arts. 9º e 10º do NRAU; 4.–Em caso de domicílio convencionado, o senhorio fica dispensado do envio de nova carta quando o destinatário se recuse a receber a primeira carta enviada ou quando o aviso de recepção tiver sido assinado por pessoa diferente do destinatário, cfr. art. 10º, nº 2, al. b) do NRAU.
Decisão integral
Acordam na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:


 
I.–RELATÓRIO


1.–A […… - Actos Médicos e Cirúrgicos, Lda], intentou acção executiva sumária contra B [Nuno……],   C [José……] e D [Maria……], alegando ter celebrado com o Executado B um contrato de arrendamento urbano para fins habitacionais, relativamente a fracção autónoma que identifica, e no âmbito do qual se constituíram fiadores os Executados C e D, os quais se obrigaram, solidariamente, a cumprir todas as Cláusulas do Contrato de Arrendamento.
Mais alega que se encontra em dívida o valor de € 4.000,00, respeitante a rendas vencidas nos meses de Junho, Julho, Agosto, Setembro e Novembro de 2020, e que, tendo procedido à notificação prevista no art. 14º-A, 1 da Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro, os Executados não procederam ao pagamento da quantia em dívida.
Apresentou como título executivo contrato de arrendamento e comprovativo da comunicação ao inquilino do montante em dívida em rendas, encargos ou despesas.
2.–Na sequência de várias diligências de penhora, foi proferido despacho, no qual, ao abrigo do disposto no art 734º do CPC, se rejeitou a execução relativamente aos executados B e C, por não existir titulo executivo relativamente a estes dois executados.
3.–É deste despacho que a Exequente recorre, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
“A.–O Tribunal a quo, no douto despacho recorrido, decidiu indeferir liminarmente, com relação ao Executado B, o requerimento executivo apresentado pela aqui Recorrente com fundamento no incumprimento dos formalismos exigidos pelo art. 14.º-A do NRAU e nos pressupostos de notificação, nos termos do disposto pelos arts. 9.º e 10.º do NRAU.
B.–Sucede que, ao fazê-lo, aquele mesmo Tribunal, não fez a correta aplicação do Direito, desconsiderando a parte final da alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º do NRAU.
C.–Em 09-11-2020, mediante carta registada com aviso de receção, remetida para o locado (conforme domicílio convencionado pelas partes, na Cláusula 21.ª do contrato de arrendamento), pela aqui Recorrente foi comunicado ao Executado Arrendatário, o valor das rendas em dívida, a indemnização devida de 20%, e o prazo de 08 (oito) dias para a regularização da situação, tudo nos termos do art. 1041.º, n.º 1 do Código Civil, e do art. 9.º, n.º 1 e art. 14.º-A, n.º 1 do NRAU;
D.–Acontece que o aviso de receção foi assinado por pessoa distinta do arrendatário, o destinatário daquela notificação.
E.–De acordo com o art. 9.º n.ºs 1 e 2 do NRAU, a comunicação relativa ao montante em dívida, por falta de pagamento de rendas, deve ser realizada por carta registada com aviso de receção para o local arrendado, na falta de indicação em contrário, o que foi feito;
F.–Nos termos do n.º 1 do art. 10.º do NRAU, a comunicação considera-se realizada mesmo que “o aviso de receção tenha sido assinado por pessoa diferente do destinatário”.
G.–Ora, na medida em que, no contrato de arrendamento, foi convencionado o domicílio das partes, as comunicações previstas no art. 10.º, n.º 1, alínea a) do NRAU produziram os seus efeitos, sem qualquer nulidade prevista na lei;
H.–De facto, a exceção prevista no n. º 2 al. b) do mesmo art. 10.º do NRAU apenas se aplica nos casos em que não existe domicílio convencionado no contrato de arrendamento, o que não é o caso, entendimento este sufragado na doutrina por Soares Machado/Regina Santos Pereira, in “Arrendamento Urbano (NRAU)”, 3.ª ed., Petrony Editora, p. 265), e na jurisprudência no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 08-10-2020, e que se acompanha.
I.–Assim sendo, considera-se a comunicação enviada ao Arrendatário/Executado B válida e eficaz, produzindo todos os seus efeitos legais, pelo que deve a execução prosseguir também contra este”.

4.–Citados os Executados para os termos da causa e para os termos do recurso, não foram apresentadas contra-alegações.
*

II.–QUESTÕES A DECIDIR
Considerando o disposto nos arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do CPC, nos termos dos quais as questões submetidas a recurso são delimitadas pelas conclusões de recurso, impõe-se concluir que a única questão submetida a recurso é determinar se a exequente dispõe de título executivo quanto ao executado NR.
*

III.–FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos a atender no presente recurso são os que resultam do relatório supra.
*

IV.–FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Face ao teor das alegações de recurso, iniciemos a sua análise.
Prende-se a questão trazida a juízo com a apreciação relativa aos documentos apresentados pela exequente como título executivo e se os mesmos podem servir de base à presente execução.
Nos termos do art. 10º, nº 5 do CPC, toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva.
O título executivo é a condição para o exercício da acção executiva, determinando-se a legitimidade activa e passiva para a acção de acordo com esse título.
Prevê o art. 703º do CPC as espécies de títulos executivos, dispondo o seu nº 1 al. d) que podem servir de base à execução os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva.
Por seu turno, nos termos do art. 14º-A, nº 1 da Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro (Novo Regime do Arrendamento Urbano - doravante NRAU) “O contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do arrendatário”.
Constata-se, pois, que o art. 14º-A, nº 1 do NRAU atribui a natureza de título executivo ao contrato de arrendamento, conjugado com o comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida.
Estamos, assim, perante um título executivo composto, integrado pelo contrato de arrendamento, e pela comunicação ao devedor, apenas existindo quando resulte da conjugação destes documentos, não valendo isoladamente nem o contrato de arrendamento nem os comprovativos das referidas comunicações.
No caso dos autos, entendeu o tribunal recorrido que a exequente não dispunha de título executivo quanto aos executados NR e JCR face à inexistência, quanto a estes, das comunicações referidas no citado art. 14º-A, nº 1.
Para tanto, entendeu que as comunicações efectuadas aos executados B e C não obedeciam às formalidades necessárias, não podendo considerar-se válidas nos termos e para os efeitos do art. 14ºA, nº 1 do NRAU.
Em alegações, a apelante apenas suscita a questão da validade de tal comunicação relativamente ao executado B, pelo que a inexistência de título executivo quanto ao executado C se mostra definitivamente decidida.
Tal como resulta dos autos, a exequente intentou a presente execução apresentando como título executivo o contrato de arrendamento celebrado com o Arrendatário B, e no qual os demais executados tiveram intervenção como fiadores), relativo à fracção autónoma designada pela letra “M”, correspondente ao 4.º andar, lado esquerdo, do prédio sito na Rua ..... ..... ....., n.º ..., em L____, bem como, relativamente a este executado, notificação, remetida pela exequente, mediante carta registada com aviso de recepção, datada de 09-11-2020, e dirigida ao locado, comunicando o valor das rendas em dívidas, a indemnização devida de 20%, e o prazo de 08 (oito) dias para regularização da situação.
Entendeu o tribunal recorrido que “a carta enviada ao executado B foi entregue a um terceiro conforme resulta do AR anexo ao requerimento executivo, não se podendo, pois, considerar uma comunicação válida para os efeitos previstos no art 14-A do NRAU (cf art 10 nº1 al. b) e nº2 dal. B) do RAU)”.
No que se refere à comunicação prevista no citado art.14º-A, nº 1, estando em causa comunicação que integre título executivo para pagamento de rendas, encargos ou despesas, importa atender ao regime estabelecido nos arts. 9º e 10º do NRAU.
Dispõe o art. 9º, nº 1 que “Salvo disposição da lei em contrário, as comunicações legalmente exigíveis entre as partes relativas a cessação do contrato de arrendamento, atualização da renda e obras são realizadas mediante escrito assinado pelo declarante e remetido por carta registada com aviso de receção”, mais referindo o nº 2 que “As cartas dirigidas ao arrendatário, na falta de indicação por escrito deste em contrário, devem ser remetidas para o local arrendado”.

Por seu turno, o art. 10º do NRAU estabelece que:
“1–A comunicação prevista no n.º 1 do artigo anterior considera-se realizada ainda que:
a)-A carta seja devolvida por o destinatário se ter recusado a recebê-la;
b)-O aviso de receção tenha sido assinado por pessoa diferente do destinatário.
2–O disposto no número anterior não se aplica às cartas que:
a)-Constituam iniciativa do senhorio para a transição para o NRAU e atualização da renda, nos termos dos artigos 30.º e 50.º;
b)-Integrem título para pagamento de rendas, encargos ou despesas ou que possam servir de base ao procedimento especial de despejo, nos termos dos artigos 14.º-A e 15.º, respetivamente, salvo nos casos de domicílio convencionado nos termos da alínea c)-do n.º 7 do artigo anterior.
c)-Sejam devolvidas por não terem sido levantadas no prazo previsto no regulamento dos serviços postais.

3–Nas situações previstas no número anterior, o remetente deve enviar nova carta registada com aviso de receção, decorridos que sejam 30 a 60 dias sobre a data do envio da primeira carta.

4–Se a nova carta voltar a ser devolvida, nos termos da alínea a) do n.º 1 e da alínea c) do n.º 2, considera-se a comunicação recebida no 10.º dia posterior ao do seu envio.

5–Nos casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 7 do artigo anterior, se:
a)-O destinatário da comunicação recusar a assinatura do original ou a receção do duplicado da comunicação e cópia dos documentos que a acompanhem, o advogado, solicitador ou agente de execução lavra nota do incidente e a comunicação considera-se efetuada no próprio dia face à certificação da ocorrência;
b)-Não for possível localizar o destinatário da comunicação, o senhorio remete carta registada com aviso de receção para o local arrendado, decorridos 30 a 60 dias sobre a data em que o destinatário não foi localizado, e considera-se a comunicação recebida no 10.º dia posterior ao do seu envio”.

Defende a apelante que as partes, na Cláusula 21ª do contrato de arrendamento, estabeleceram domicílio convencionado no locado, o que determina a validade da comunicação efectuada.

Com efeito, em caso de domicílio convencionado, o senhorio fica dispensado do envio de nova carta quando o destinatário se recuse a receber a primeira carta enviada ou quando o aviso de recepção tiver sido assinado por pessoa diferente do destinatário, cfr. art. 10º, nº 2, al. b) do NRAU.

Tal como se explica no Ac. TRP de 21-04-2022, proc. <a href="https://acordao.pt/decisoes/131555" target="_blank">7871/19.5T8VNG.P1</a>, relator Carlos Portela, “do disposto no art.º 10º nº3 do NRAU o que se extrai é o seguinte:
Nas situações previstas no número anterior (o nº2), o remetente deve enviar nova carta registada com aviso de recepção, decorridos que sejam 30 a 60 dias sobre a data do envio da primeira carta.

Mas quais são as situações que estão previstas nesse nº2 do art.º 10º:
São os casos em que as cartas (1º) constituam iniciativa do senhorio para transição para o NRAU e actualização de renda, (2º) integrem título para pagamento de rendas, encargos ou despesas ou possam servir de base ao procedimento especial de despejo, (3º) sejam devolvidas por não terem sido levantadas no prazo previsto no regulamento dos serviços postais.
Resulta em nosso entender claro que nestas três situações, a comunicação não se considera realizada se tiver sido devolvida por o destinatário se ter recusado a recebê-la ou se o aviso de recepção tiver sido assinado por pessoa diferente do destinatário.
Contudo, nas hipóteses em que a carta integre título para pagamento de rendas, encargos ou despesas ou possa servir de base ao procedimento especial de despejo, mostra-se evidente que a lei dispensa o senhorio do envio de uma nova carta quando exista domicílio convencionado (cf. artigo 10º, nº 2 alínea b) parte final).
Dito de outra forma, quando exista domicílio convencionado, fica o senhorio dispensado do envio de nova carta registada com aviso de recepção, decorridos que sejam 30 a 60 dias sobre a data do envio da primeira carta, devendo considerar-se a comunicação recebida com o envio da primeira carta”.

Também no Ac. TRE de 08-10-2020, proc. 1857/19.7T8STB-A.E1, relator Ana Margarida Carvalho Pinheiro Leite, se pode ler que “Conforme decorre da ressalva constante da parte final da citada alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º – salvo nos casos de domicílio convencionado nos termos da alínea c) do n.º 7 do artigo anterior –, a existência de domicílio convencionado, nos indicados termos, afasta a inaplicabilidade do disposto no n.º 1 às cartas que integrem, designadamente, título para pagamento de rendas, encargos ou despesas, nos termos dos artigos 14.º-A.

Em anotação ao n.º 2 do mencionado artigo 10.º, apreciando a questão da não aplicação das consequências previstas no n.º 1, designadamente para as situações de assinatura do aviso de receção por pessoa diversa, nos casos de comunicação que integre título para pagamento de rendas, assinalam Soares Machado/Regina Santos Pereira (Arrendamento Urbano (NRAU), 3.ª edição revista e aumentada, Petrony Editora, p. 265) o seguinte: “Atenção no entanto para o facto de, no caso dos títulos para pagamento de rendas, se poderem aplicar as consequências previstas no n.º 1 quando no contrato de arrendamento em questão as partes tenham convencionado domicílio”.”.

Por outro lado, impõe-se referir que domicílio convencionado é aquele que “é fixado pelas partes em contratos escritos para efeito de o eventual devedor ser procurado pelo credor ou por algum órgão judicial ou administrativo com vista ao cumprimento das obrigações deles decorrentes. Dir-se-á que o domicílio convencionado é o que visa o accionamento para a demanda que seja motivada pelo incumprimento do contrato em causa por algum dos respectivos outorgantes” (Salvador da Costa in A Injunção e as Conexas Acção e Execução, 6ª ed., pág. 56, Almedina apud Ac. TRC de 10-05-2016, proc. 580/14.3T8GRD-A.C1, relator Sílvia Pires).

Revertendo estas considerações para o caso dos autos, importa referir que consta na cláusula 21ª do contrato de arrendamento junto como título executivo que “para efeitos de correspondência devem ser considerados os endereços constantes do contrato, devendo as partes comunicar mutuamente a alteração daquele”.

Não obstante o carácter vago desta cláusula tem de se entender que a mesma pretende fixar um domicílio convencionado para efeitos de comunicações previstas no NRAU e no âmbito da relação contratual firmada entre as partes através do aludido contrato.

Com efeito, esta cláusula tem de ser analisada de acordo com as regras gerais relativas à interpretação da declaração negocial constantes dos arts. 236º e ss. do CC.

Como nos ensina Carlos Alberto da Mota Pinto in Teoria Geral do Direito Civil, 4ª edição, pág. 441, a interpretação de um negócio jurídico consiste em “determinar o conteúdo das declarações e vontade e, consequentemente, os efeitos que o negócio visa produzir, em conformidade com tais declarações”.

Por outro lado, essa interpretação deve reger-se de acordo com as regras dos arts. 236º e ss. do CC.

Assim, a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele (art. 236º, nº 1).

Nos casos em que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida (nº 2 do art. 236º).

Em qualquer caso, e nos termos do art. 238º, nº 1 do CC, nos negócios formais, a declaração não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto, salvo se corresponder à vontade real das partes e as razões determinantes da forma do negócio se não opuserem a essa validade (nº 2).

No que aos autos diz respeito, interpretando a citada cláusula 21ª de acordo com as aludidas regras tem de se concluir que as partes pretenderam estabelecer uma regra relativa às moradas para as quais a correspondência relativa ao contrato seria enviada, sendo este o único sentido útil a atribuir a esta fixação de morada. Isto é, resulta dos autos, e sem quaisquer ambiguidades, que as partes optaram por acordar que a correspondência relativa ao contrato seria enviada para as moradas nele referidas.

Por outro lado, e no que ao executado Nuno se reporta, mostra-se indicada no contrato como sendo a sua morada a do locado, não constando qualquer outra.

Conclui-se, pois, pela existência de domicílio convencionado entre as partes relativamente a todas as comunicações efectuadas no âmbito do NRAU e, por conseguinte, nos termos e para os efeitos do art. 10º, nº 2, al. b) do NRAU.

Assim, decorrendo dos documentos juntos que a comunicação foi dirigida ao arrendatário para o local convencionado, ao abrigo do disposto no art. 10º, nº 1, al. b) do RAU tem de se considerar realizada essa comunicação, apesar de ter o aviso de recepção sido assinado por terceiro.

Consequentemente, e no que se refere ao executado Nuno, dispõe a apelante de título executivo, o que determina a procedência da apelação, com a revogação da decisão recorrida, na parte em que rejeitou a execução relativamente ao executado B, contra quem deve a execução prosseguir.

Aqui chegados, impõe-se a apreciação da condenação em custas quer no âmbito dos autos de execução, quer no âmbito da presente apelação.

Nos termos do disposto no art. 527º, nº 1 do CPC, a decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito, acrescentando o nº 2 deste preceito que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.

Nos termos do art. 1º, nº 2 do RCP, considera-se processo autónomo para efeitos de custas, cada recurso, desde que origine tributação própria.

No despacho recorrido consta que as custas serão pela exequente, na proporção de 2/3 das custas globais, atendendo, naturalmente à prossecução da execução apenas contra a executada.

Face à procedência da apelação, forçoso é concluir que o despacho recorrido deve ser alterado na parte relativa às custas, devendo ser substituído por outro que determine que as custas devem ser suportadas pela exequente, na proporção de 1/3 das custas globais.

No que se refere às custas respeitantes à presente apelação, não tendo os executados dado causa à decisão recorrida, nem tendo contra-alegado, não pode funcionar o princípio da causalidade ínsito no citado art. 527º, nº 1, nem se podem os mesmos considerar-se vencidos na causa, nos termos e para os efeitos do art. 527º, nº 2 do CPC.

Assim, tem aplicação aos autos o disposto na parte final do nº 1 do art. 527º do CPC, devendo as custas da presente apelação, na modalidade de custas de parte, ser suportadas pela apelante, por ser quem do recurso tirou proveito (cfr. art. 527º, nº 1 in fine do CPC).
*

V.–DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar procedente a apelação, revogando o despacho recorrido, o qual deve ser substituído por outro que determine o prosseguimento dos ulteriores termos do processo de execução quanto ao executado B e ainda as custas sejam suportadas pela exequente, na proporção de 1/3 das custas globais.
Custas pela apelante, cfr. art. 527º, nº 1 do CPC..
*


Lisboa, 20 de Junho de 2023


Ana Rodrigues da Silva
Edgar Taborda Lopes
Carlos Oliveira

Acordam na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I.–RELATÓRIO 1.–A […… - Actos Médicos e Cirúrgicos, Lda], intentou acção executiva sumária contra B [Nuno……],   C [José……] e D [Maria……], alegando ter celebrado com o Executado B um contrato de arrendamento urbano para fins habitacionais, relativamente a fracção autónoma que identifica, e no âmbito do qual se constituíram fiadores os Executados C e D, os quais se obrigaram, solidariamente, a cumprir todas as Cláusulas do Contrato de Arrendamento. Mais alega que se encontra em dívida o valor de € 4.000,00, respeitante a rendas vencidas nos meses de Junho, Julho, Agosto, Setembro e Novembro de 2020, e que, tendo procedido à notificação prevista no art. 14º-A, 1 da Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro, os Executados não procederam ao pagamento da quantia em dívida. Apresentou como título executivo contrato de arrendamento e comprovativo da comunicação ao inquilino do montante em dívida em rendas, encargos ou despesas. 2.–Na sequência de várias diligências de penhora, foi proferido despacho, no qual, ao abrigo do disposto no art 734º do CPC, se rejeitou a execução relativamente aos executados B e C, por não existir titulo executivo relativamente a estes dois executados. 3.–É deste despacho que a Exequente recorre, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: “A.–O Tribunal a quo, no douto despacho recorrido, decidiu indeferir liminarmente, com relação ao Executado B, o requerimento executivo apresentado pela aqui Recorrente com fundamento no incumprimento dos formalismos exigidos pelo art. 14.º-A do NRAU e nos pressupostos de notificação, nos termos do disposto pelos arts. 9.º e 10.º do NRAU. B.–Sucede que, ao fazê-lo, aquele mesmo Tribunal, não fez a correta aplicação do Direito, desconsiderando a parte final da alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º do NRAU. C.–Em 09-11-2020, mediante carta registada com aviso de receção, remetida para o locado (conforme domicílio convencionado pelas partes, na Cláusula 21.ª do contrato de arrendamento), pela aqui Recorrente foi comunicado ao Executado Arrendatário, o valor das rendas em dívida, a indemnização devida de 20%, e o prazo de 08 (oito) dias para a regularização da situação, tudo nos termos do art. 1041.º, n.º 1 do Código Civil, e do art. 9.º, n.º 1 e art. 14.º-A, n.º 1 do NRAU; D.–Acontece que o aviso de receção foi assinado por pessoa distinta do arrendatário, o destinatário daquela notificação. E.–De acordo com o art. 9.º n.ºs 1 e 2 do NRAU, a comunicação relativa ao montante em dívida, por falta de pagamento de rendas, deve ser realizada por carta registada com aviso de receção para o local arrendado, na falta de indicação em contrário, o que foi feito; F.–Nos termos do n.º 1 do art. 10.º do NRAU, a comunicação considera-se realizada mesmo que “o aviso de receção tenha sido assinado por pessoa diferente do destinatário”. G.–Ora, na medida em que, no contrato de arrendamento, foi convencionado o domicílio das partes, as comunicações previstas no art. 10.º, n.º 1, alínea a) do NRAU produziram os seus efeitos, sem qualquer nulidade prevista na lei; H.–De facto, a exceção prevista no n. º 2 al. b) do mesmo art. 10.º do NRAU apenas se aplica nos casos em que não existe domicílio convencionado no contrato de arrendamento, o que não é o caso, entendimento este sufragado na doutrina por Soares Machado/Regina Santos Pereira, in “Arrendamento Urbano (NRAU)”, 3.ª ed., Petrony Editora, p. 265), e na jurisprudência no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 08-10-2020, e que se acompanha. I.–Assim sendo, considera-se a comunicação enviada ao Arrendatário/Executado B válida e eficaz, produzindo todos os seus efeitos legais, pelo que deve a execução prosseguir também contra este”. 4.–Citados os Executados para os termos da causa e para os termos do recurso, não foram apresentadas contra-alegações. * II.–QUESTÕES A DECIDIR Considerando o disposto nos arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do CPC, nos termos dos quais as questões submetidas a recurso são delimitadas pelas conclusões de recurso, impõe-se concluir que a única questão submetida a recurso é determinar se a exequente dispõe de título executivo quanto ao executado NR. * III.–FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Os factos a atender no presente recurso são os que resultam do relatório supra. * IV.–FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Face ao teor das alegações de recurso, iniciemos a sua análise. Prende-se a questão trazida a juízo com a apreciação relativa aos documentos apresentados pela exequente como título executivo e se os mesmos podem servir de base à presente execução. Nos termos do art. 10º, nº 5 do CPC, toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva. O título executivo é a condição para o exercício da acção executiva, determinando-se a legitimidade activa e passiva para a acção de acordo com esse título. Prevê o art. 703º do CPC as espécies de títulos executivos, dispondo o seu nº 1 al. d) que podem servir de base à execução os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva. Por seu turno, nos termos do art. 14º-A, nº 1 da Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro (Novo Regime do Arrendamento Urbano - doravante NRAU) “O contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do arrendatário”. Constata-se, pois, que o art. 14º-A, nº 1 do NRAU atribui a natureza de título executivo ao contrato de arrendamento, conjugado com o comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida. Estamos, assim, perante um título executivo composto, integrado pelo contrato de arrendamento, e pela comunicação ao devedor, apenas existindo quando resulte da conjugação destes documentos, não valendo isoladamente nem o contrato de arrendamento nem os comprovativos das referidas comunicações. No caso dos autos, entendeu o tribunal recorrido que a exequente não dispunha de título executivo quanto aos executados NR e JCR face à inexistência, quanto a estes, das comunicações referidas no citado art. 14º-A, nº 1. Para tanto, entendeu que as comunicações efectuadas aos executados B e C não obedeciam às formalidades necessárias, não podendo considerar-se válidas nos termos e para os efeitos do art. 14ºA, nº 1 do NRAU. Em alegações, a apelante apenas suscita a questão da validade de tal comunicação relativamente ao executado B, pelo que a inexistência de título executivo quanto ao executado C se mostra definitivamente decidida. Tal como resulta dos autos, a exequente intentou a presente execução apresentando como título executivo o contrato de arrendamento celebrado com o Arrendatário B, e no qual os demais executados tiveram intervenção como fiadores), relativo à fracção autónoma designada pela letra “M”, correspondente ao 4.º andar, lado esquerdo, do prédio sito na Rua ..... ..... ....., n.º ..., em L____, bem como, relativamente a este executado, notificação, remetida pela exequente, mediante carta registada com aviso de recepção, datada de 09-11-2020, e dirigida ao locado, comunicando o valor das rendas em dívidas, a indemnização devida de 20%, e o prazo de 08 (oito) dias para regularização da situação. Entendeu o tribunal recorrido que “a carta enviada ao executado B foi entregue a um terceiro conforme resulta do AR anexo ao requerimento executivo, não se podendo, pois, considerar uma comunicação válida para os efeitos previstos no art 14-A do NRAU (cf art 10 nº1 al. b) e nº2 dal. B) do RAU)”. No que se refere à comunicação prevista no citado art.14º-A, nº 1, estando em causa comunicação que integre título executivo para pagamento de rendas, encargos ou despesas, importa atender ao regime estabelecido nos arts. 9º e 10º do NRAU. Dispõe o art. 9º, nº 1 que “Salvo disposição da lei em contrário, as comunicações legalmente exigíveis entre as partes relativas a cessação do contrato de arrendamento, atualização da renda e obras são realizadas mediante escrito assinado pelo declarante e remetido por carta registada com aviso de receção”, mais referindo o nº 2 que “As cartas dirigidas ao arrendatário, na falta de indicação por escrito deste em contrário, devem ser remetidas para o local arrendado”. Por seu turno, o art. 10º do NRAU estabelece que: “1–A comunicação prevista no n.º 1 do artigo anterior considera-se realizada ainda que: a)-A carta seja devolvida por o destinatário se ter recusado a recebê-la; b)-O aviso de receção tenha sido assinado por pessoa diferente do destinatário. 2–O disposto no número anterior não se aplica às cartas que: a)-Constituam iniciativa do senhorio para a transição para o NRAU e atualização da renda, nos termos dos artigos 30.º e 50.º; b)-Integrem título para pagamento de rendas, encargos ou despesas ou que possam servir de base ao procedimento especial de despejo, nos termos dos artigos 14.º-A e 15.º, respetivamente, salvo nos casos de domicílio convencionado nos termos da alínea c)-do n.º 7 do artigo anterior. c)-Sejam devolvidas por não terem sido levantadas no prazo previsto no regulamento dos serviços postais. 3–Nas situações previstas no número anterior, o remetente deve enviar nova carta registada com aviso de receção, decorridos que sejam 30 a 60 dias sobre a data do envio da primeira carta. 4–Se a nova carta voltar a ser devolvida, nos termos da alínea a) do n.º 1 e da alínea c) do n.º 2, considera-se a comunicação recebida no 10.º dia posterior ao do seu envio. 5–Nos casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 7 do artigo anterior, se: a)-O destinatário da comunicação recusar a assinatura do original ou a receção do duplicado da comunicação e cópia dos documentos que a acompanhem, o advogado, solicitador ou agente de execução lavra nota do incidente e a comunicação considera-se efetuada no próprio dia face à certificação da ocorrência; b)-Não for possível localizar o destinatário da comunicação, o senhorio remete carta registada com aviso de receção para o local arrendado, decorridos 30 a 60 dias sobre a data em que o destinatário não foi localizado, e considera-se a comunicação recebida no 10.º dia posterior ao do seu envio”. Defende a apelante que as partes, na Cláusula 21ª do contrato de arrendamento, estabeleceram domicílio convencionado no locado, o que determina a validade da comunicação efectuada. Com efeito, em caso de domicílio convencionado, o senhorio fica dispensado do envio de nova carta quando o destinatário se recuse a receber a primeira carta enviada ou quando o aviso de recepção tiver sido assinado por pessoa diferente do destinatário, cfr. art. 10º, nº 2, al. b) do NRAU. Tal como se explica no Ac. TRP de 21-04-2022, proc. 7871/19.5T8VNG.P1, relator Carlos Portela, “do disposto no art.º 10º nº3 do NRAU o que se extrai é o seguinte: Nas situações previstas no número anterior (o nº2), o remetente deve enviar nova carta registada com aviso de recepção, decorridos que sejam 30 a 60 dias sobre a data do envio da primeira carta. Mas quais são as situações que estão previstas nesse nº2 do art.º 10º: São os casos em que as cartas (1º) constituam iniciativa do senhorio para transição para o NRAU e actualização de renda, (2º) integrem título para pagamento de rendas, encargos ou despesas ou possam servir de base ao procedimento especial de despejo, (3º) sejam devolvidas por não terem sido levantadas no prazo previsto no regulamento dos serviços postais. Resulta em nosso entender claro que nestas três situações, a comunicação não se considera realizada se tiver sido devolvida por o destinatário se ter recusado a recebê-la ou se o aviso de recepção tiver sido assinado por pessoa diferente do destinatário. Contudo, nas hipóteses em que a carta integre título para pagamento de rendas, encargos ou despesas ou possa servir de base ao procedimento especial de despejo, mostra-se evidente que a lei dispensa o senhorio do envio de uma nova carta quando exista domicílio convencionado (cf. artigo 10º, nº 2 alínea b) parte final). Dito de outra forma, quando exista domicílio convencionado, fica o senhorio dispensado do envio de nova carta registada com aviso de recepção, decorridos que sejam 30 a 60 dias sobre a data do envio da primeira carta, devendo considerar-se a comunicação recebida com o envio da primeira carta”. Também no Ac. TRE de 08-10-2020, proc. 1857/19.7T8STB-A.E1, relator Ana Margarida Carvalho Pinheiro Leite, se pode ler que “Conforme decorre da ressalva constante da parte final da citada alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º – salvo nos casos de domicílio convencionado nos termos da alínea c) do n.º 7 do artigo anterior –, a existência de domicílio convencionado, nos indicados termos, afasta a inaplicabilidade do disposto no n.º 1 às cartas que integrem, designadamente, título para pagamento de rendas, encargos ou despesas, nos termos dos artigos 14.º-A. Em anotação ao n.º 2 do mencionado artigo 10.º, apreciando a questão da não aplicação das consequências previstas no n.º 1, designadamente para as situações de assinatura do aviso de receção por pessoa diversa, nos casos de comunicação que integre título para pagamento de rendas, assinalam Soares Machado/Regina Santos Pereira (Arrendamento Urbano (NRAU), 3.ª edição revista e aumentada, Petrony Editora, p. 265) o seguinte: “Atenção no entanto para o facto de, no caso dos títulos para pagamento de rendas, se poderem aplicar as consequências previstas no n.º 1 quando no contrato de arrendamento em questão as partes tenham convencionado domicílio”.”. Por outro lado, impõe-se referir que domicílio convencionado é aquele que “é fixado pelas partes em contratos escritos para efeito de o eventual devedor ser procurado pelo credor ou por algum órgão judicial ou administrativo com vista ao cumprimento das obrigações deles decorrentes. Dir-se-á que o domicílio convencionado é o que visa o accionamento para a demanda que seja motivada pelo incumprimento do contrato em causa por algum dos respectivos outorgantes” (Salvador da Costa in A Injunção e as Conexas Acção e Execução, 6ª ed., pág. 56, Almedina apud Ac. TRC de 10-05-2016, proc. 580/14.3T8GRD-A.C1, relator Sílvia Pires). Revertendo estas considerações para o caso dos autos, importa referir que consta na cláusula 21ª do contrato de arrendamento junto como título executivo que “para efeitos de correspondência devem ser considerados os endereços constantes do contrato, devendo as partes comunicar mutuamente a alteração daquele”. Não obstante o carácter vago desta cláusula tem de se entender que a mesma pretende fixar um domicílio convencionado para efeitos de comunicações previstas no NRAU e no âmbito da relação contratual firmada entre as partes através do aludido contrato. Com efeito, esta cláusula tem de ser analisada de acordo com as regras gerais relativas à interpretação da declaração negocial constantes dos arts. 236º e ss. do CC. Como nos ensina Carlos Alberto da Mota Pinto in Teoria Geral do Direito Civil, 4ª edição, pág. 441, a interpretação de um negócio jurídico consiste em “determinar o conteúdo das declarações e vontade e, consequentemente, os efeitos que o negócio visa produzir, em conformidade com tais declarações”. Por outro lado, essa interpretação deve reger-se de acordo com as regras dos arts. 236º e ss. do CC. Assim, a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele (art. 236º, nº 1). Nos casos em que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida (nº 2 do art. 236º). Em qualquer caso, e nos termos do art. 238º, nº 1 do CC, nos negócios formais, a declaração não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto, salvo se corresponder à vontade real das partes e as razões determinantes da forma do negócio se não opuserem a essa validade (nº 2). No que aos autos diz respeito, interpretando a citada cláusula 21ª de acordo com as aludidas regras tem de se concluir que as partes pretenderam estabelecer uma regra relativa às moradas para as quais a correspondência relativa ao contrato seria enviada, sendo este o único sentido útil a atribuir a esta fixação de morada. Isto é, resulta dos autos, e sem quaisquer ambiguidades, que as partes optaram por acordar que a correspondência relativa ao contrato seria enviada para as moradas nele referidas. Por outro lado, e no que ao executado Nuno se reporta, mostra-se indicada no contrato como sendo a sua morada a do locado, não constando qualquer outra. Conclui-se, pois, pela existência de domicílio convencionado entre as partes relativamente a todas as comunicações efectuadas no âmbito do NRAU e, por conseguinte, nos termos e para os efeitos do art. 10º, nº 2, al. b) do NRAU. Assim, decorrendo dos documentos juntos que a comunicação foi dirigida ao arrendatário para o local convencionado, ao abrigo do disposto no art. 10º, nº 1, al. b) do RAU tem de se considerar realizada essa comunicação, apesar de ter o aviso de recepção sido assinado por terceiro. Consequentemente, e no que se refere ao executado Nuno, dispõe a apelante de título executivo, o que determina a procedência da apelação, com a revogação da decisão recorrida, na parte em que rejeitou a execução relativamente ao executado B, contra quem deve a execução prosseguir. Aqui chegados, impõe-se a apreciação da condenação em custas quer no âmbito dos autos de execução, quer no âmbito da presente apelação. Nos termos do disposto no art. 527º, nº 1 do CPC, a decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito, acrescentando o nº 2 deste preceito que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for. Nos termos do art. 1º, nº 2 do RCP, considera-se processo autónomo para efeitos de custas, cada recurso, desde que origine tributação própria. No despacho recorrido consta que as custas serão pela exequente, na proporção de 2/3 das custas globais, atendendo, naturalmente à prossecução da execução apenas contra a executada. Face à procedência da apelação, forçoso é concluir que o despacho recorrido deve ser alterado na parte relativa às custas, devendo ser substituído por outro que determine que as custas devem ser suportadas pela exequente, na proporção de 1/3 das custas globais. No que se refere às custas respeitantes à presente apelação, não tendo os executados dado causa à decisão recorrida, nem tendo contra-alegado, não pode funcionar o princípio da causalidade ínsito no citado art. 527º, nº 1, nem se podem os mesmos considerar-se vencidos na causa, nos termos e para os efeitos do art. 527º, nº 2 do CPC. Assim, tem aplicação aos autos o disposto na parte final do nº 1 do art. 527º do CPC, devendo as custas da presente apelação, na modalidade de custas de parte, ser suportadas pela apelante, por ser quem do recurso tirou proveito (cfr. art. 527º, nº 1 in fine do CPC). * V.–DECISÃO Pelo exposto, acordam os juízes desta 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar procedente a apelação, revogando o despacho recorrido, o qual deve ser substituído por outro que determine o prosseguimento dos ulteriores termos do processo de execução quanto ao executado B e ainda as custas sejam suportadas pela exequente, na proporção de 1/3 das custas globais. Custas pela apelante, cfr. art. 527º, nº 1 do CPC.. * Lisboa, 20 de Junho de 2023 Ana Rodrigues da Silva Edgar Taborda Lopes Carlos Oliveira